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MATO GROSSO E SUAS AÇÕES NO CENÁRIO INTERNACIONAL (1995-2010) DOUTORADO EM CIÊNCIAS SOCIAIS

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Luis Henrique Soares Gatto

MATO GROSSO E SUAS AÇÕES NO CENÁRIO INTERNACIONAL

(1995-2010)

DOUTORADO EM CIÊNCIAS SOCIAIS

PUC/ São Paulo-SP

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

Luis Henrique Soares Gatto

MATO GROSSO E SUAS AÇÕES NO CENÁRIO INTERNACIONAL

(1995-2010)

DOUTORADO EM CIÊNCIAS SOCIAIS

Tese apresentada à banca examinadora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como exigência parcial para obtenção do título de Doutor em Ciências Sociais, sob orientação do Prof. Doutor Henrique Altemani de Oliveira.

PUC/ São Paulo-SP

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FOLHA DE APROVAÇÃO:

Banca Examinadora

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AGRADECIMENTOS

À Priscila que sempre esteve ao meu lado; e que durante o período de elaboração desta Tese, foi minha namorada, noiva e esposa. Como se não bastasse a sua luta diária para me ensinar a aproveitar o momento, ainda me deu de presente Maria Clara e Marco Antônio, completando assim a nossa família.

Aos meus Pais que me deram toda a base da minha formação e patrocinaram, em todos os aspectos, o meu sonho.

Aos meus irmãos, que mesmo distantes dividiram este sonho comigo.

À Tia Rosa e ao Tio Jairo, todo o meu reconhecimento e agradecimento por preencherem de forma maravilhosa o tempo dos meus filhos.

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RESUMO

O acentuado processo de globalização no Pós-Guerra Fria, aliado a uma presença brasileira mais intensa no comércio internacional, propiciou às unidades federativas (estados ou municípios) significativa ampliação de seus processos de inserção internacional. Em decorrência desse fenômeno, algumas abordagens teóricas em Relações Internacionais aventam a hipótese de que as unidades federativas adquiriram maior autonomia para atuação externa. A presente Tese concentra-se na análise das ações internacionais do Estado de Mato Grosso (MT) a partir da realidade de ser uma das unidades da federação que mais exportam; pela ausência de bibliografia que analise as suas ações externas e pelo fato de fazer fronteira com a Bolívia, situação que proporciona diversas trocas de experiências. Dessa forma, pretende-se refletir sobre a existência de autonomia para um ente da federação elaborar as suas ações externas; até onde essa autonomia vai; e, dentro desta perspectiva, como Mato Grosso se posiciona em relação a sua inserção no cenário internacional e como empreende essa busca.

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ABSTRACT

The accentuated globalization process post Cold War, associate with a stronger Brazilian presence in international trade, propitiate to the Federation Units (states or counties) significant expansion of its international integration processes. Due this phenomenon some theoretical approaches in International Relations suggest the hypothesis that the federal units have acquired greater autonomy for external action. This thesis focuses on the analysis of the international actions of the State of Mato Grosso (MT) from the reality that being one of the Federation Units leading export; the absence of literature analyzing their external actions and by the fact bordering with Bolivia, a situation that provides several exchanges’ experiences. Thus, we intend to reflect about the existence of autonomy to a Federation’s entity prepare their external actions, whither this autonomy will, and, within this perspective, such Mato Grosso is positioned in relation to their integration into the international scene and to engage this quest.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO... 7

CAPÍTULO 1

A diplomacia federativa como um novo paradigma... . 18

1.1 Globalização e soberania ... .19

1.2 Ações externas federativas ... .34

1.3 Ações externas – questões jurídicas... .52

1.4 Ações externas federativas – A AFEPA ... .70

CAPÍTULO 2

Os planos de governo nas ideias... .79

2.1 Os planos de governo Dante de Oliveira e Rogério Salles (1995 a 06-04-2002 / 06-04-2002 a 31-12-2002) ... .80

2.2 Os planos de governo Blario Maggi e Silval Barbosa (1-1-2003 a 30-03-2010 / 31-03-2010 a 31-12-2010) ... .96

CAPÍTULO 3

Reflexões sobre os planos de governo ... .109

CAPÍTULO 4

Integração: a fronteira com a Bolívia e o centro oeste

sul-americano ... 156

CONCLUSÃO ... 195

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS... 210

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INTRODUÇÃO

É ponto pacífico que, no mundo atual, cada vez mais governos subnacionais, sejam municípios ou unidades federadas – no caso brasileiro, participam do cenário internacional, entre outras razões, para defender os seus interesses. A maior intensificação das ações desses novos atores dentro do contexto internacional ocorreu, em grande medida, no período do pós Guerra Fria, por diversas razões que veremos adiante. Uma delas, sem dúvida, foi o fato de a agenda internacional deixar de ser pautada, principalmente, pelas questões de segurança.

Assim, com o fim da União Soviética (1991) e também com a queda do Muro de Berlim (1989), o liberalismo econômico encontrou um terreno fértil para se propagar como ideologia mais acertada, por diversos países:

Assim, com a vitória, de forma pacífica, dos Estados Unidos sobre a União Soviética e com o fim da guerra fria, propagou-se a esperança de que os valores do liberalismo, vinculando democracia e mercado, tendiam a uma irreversível universalização, com a possibilidade de estabelecimento de uma paz mais duradoura e que os recursos econômicos, anteriormente destinados à produção de armas, seriam direcionados aos processos de desenvolvimento econômico e social. Enfim, a tendência agora seria de cooperação entre os países e não de conflitos (OLIVEIRA, 2006, p. VIII).

O fato é que, desde então, um novo cenário se apresentou e novas possibilidades e desafios foram colocados, pelo que se convencionou chamar de globalização, conceito que abordaremos no próximo capítulo. Com ela se apresentou um debate internacional mais voltado para as questões econômicas; muitos Estados passaram a defender o livre comércio internacional, sem a imposição de barreiras tarifárias. Alguns estudiosos chegaram a acreditar em um mundo totalmente pacífico e regido por regras aceitas por todos.

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poderíamos denominar “paz Kantiana”, um mundo regido por regras construídas e aceitas por todos (VIDIGAL, 2006, p. 1).

Frente à globalização, ao liberalismo econômico e a outras transformações como a tecnológica, por exemplo, os governos subnacionais se viram obrigados, em muitos casos, a buscar o cenário externo para enfrentar os desafios deste novo contexto e também para buscar desenvolvimento para as suas regiões.

Esses novos desafios também impuseram aos subnacionais uma nova realidade na forma de se relacionarem internamente com o governo central, uma vez que, para poder defender os seus interesses, se viram obrigados a buscar uma maior interferência na elaboração da política externa do país.

A partir dos anos 90, porém, a aceleração do processo de globalização e o consequente acirramento da competição internacional, ao mesmo tempo em que impulsionam o avanço dos processos de integração regional, alteram os papéis dos governos nacionais e subnacionais, obrigando os gestores públicos, em todas as instâncias, a incluir esse tema em suas agendas, sob pena de exclusão dos fluxos de comércio e de capital. Nesse sentido, os governos subnacionais vêem-se impelidos a desenvolver estratégias para viabilizar a sua participação pró-ativa nesse processo, em busca de uma posição protagônica. Este aspecto constitui a segunda consideração (...), caracterizada pelo reconhecimento de que o atual papel atribuído aos governos nacionais não lhes assegura monopólio de ação na área internacional nem lhes outorga o direito de serem os únicos orientadores das ações dos governos subnacionais (BARRETO, 2001, p. 13-14).

Esse movimento, chamado por alguns de paradiplomacia, vem ganhando cada vez mais espaço e adeptos no cenário externo. O que provoca um aumento de atores internacionais e também gera a necessidade de se regulamentar tais ações, principalmente no Brasil.

Inúmeros são os países que admitem esta prática, que traduz a crescente multiplicidade das instâncias e dos atores que, na atualidade, atuam no campo internacional. Acrescem a este tema os pactos firmados pelas unidades da Federação – estados, municípios e o Distrito Federal – com entidades similares no exterior. À atuação internacional dessas subunidades convencionou-se chamar paradiplomacia, fenômeno amplamente regulamentado nos países industriais avançados, que ostenta graus elevadíssimos de institucionalização na Europa e na Ásia, e que se verifica amiúde também no continente africano (LESSA, 2007a, p. 421).

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Panayotis Soldatos, para designar as atividades diplomáticas desenvolvidas entre unidades políticas não centrais situadas em diferentes países.

No Brasil, o termo adotado pelo Itamaraty para designar as ações externas dos entes federados é diplomacia federativa. Como destaca Brigagão (2005):

O fenômeno das relações internacionais federativas, entes descentralizados (ou governos subnacionais conforme terminologia que varia muito) atinge diversos países, mesmo aqueles cuja forma de Estado não é federal. Internacionalmente, denomina-se paradiplomacia essa possibilidade de Estados-membros, províncias, regiões e cidades formular e executar uma política externa própria, com ou sem o auxílio da União. No Brasil, Estados e Municípios, como entidades federativas autônomas, formulam e executam, cada vez mais, o que o Itamaraty passou a denominar

diplomacia federativa, expressão que busca assimilar esse movimento descentralizado como uma derivação da própria diplomacia da União. Noutra perspectiva, mais próxima dos governos subnacionais, o fenômeno pode ser denominado também de política externa federativa (BRIGADÃO, 2005, p. 19).

Considerando a realidade brasileira, em 1997, a Assessoria de Relações Federativas (ARF) foi criada pelo Itamaraty, posteriormente denominada de Assessoria Especial de Assuntos Federativos e Parlamentares (AFEPA):

Por determinação do presidente Fernando Henrique Cardoso, o Itamaraty criou, em 1997, a Assessoria de Relações Federativas (ARF), junto ao gabinete do Ministro das Relações Exteriores com o propósito de incentivar a aproximação com os Estados e Municípios, valendo-se de escritórios regionais, que atuariam como se fossem ‘Embaixadas Federativas’ dentro do próprio País, para atender às novas demandas e somar-se ao que oficialmente passou a ser denominada pelo governo federal a diplomacia federativa. Com o governo de Luis Inácio Lula da Silva, a ARF foi transformada em Assessoria Especial de Assuntos Federativos e Parlamentares (AFEPA) e a Presidência da República criou a Subchefia de Assuntos Federativos, que passou a coordenar as ações do Executivo visando dar um novo perfil, mais cooperativo, às relações entre a União, os Estados e Municípios, incluindo o tema das relações internacionais (BRIGADÃO, 2005, p. 21).

Sobre a criação da ARF Barreto (2001), citando o decreto 2246/97, que a institui, lembra que ela tem o objetivo de fazer a relação do Ministério das Relações Exteriores “com os Governos dos Estados e Municípios brasileiros, com o objetivo de assessorá-los em suas iniciativas externas, tratativas com Governos estrangeiros, organismos internacionais e organizações não governamentais” (p. 23).

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incentivar, apoiar e orientar as ações internacionais deles, sempre respeitando os limites constitucionais.

É dentro deste contexto que a presente tese se insere. Ela tem por objetivo geral analisar as ações internacionais do estado de Mato Grosso (MT) no período entre os anos de 1995-2010. Partindo da seguinte hipótese: MT, como unidade federada, teria despertado para implementação de ações externas, buscando uma maior inserção internacional, defendendo seus interesses e sem interferência do governo central? Essa hipótese se sustenta, ao menos inicialmente, com base na vertente teórica que aponta para uma autonomia dos governos não centrais no que diz respeito às ações externas.

Assim podemos dizer que temos como objetivo específico verificar como Mato Grosso vem promovendo os seus interesses no cenário externo. Para tanto, será necessário estudarmos o comportamento dos governos subnacionais frente à elaboração da política externa do país e também qual a margem de manobra deles. Neste sentido, é importante perceber como as unidades federadas vêm se comportando externamente, bem como diagnosticar qual a margem para as suas manobras nos assuntos externos.

Entendemos que fazendo esse estudo poderemos checar, inclusive, se MT tem mesmo ações internacionais ou se apenas segue orientações e políticas do Governo Federal.

Em que pese parecer ser o período estudado bastante longo e o tema muito extenso, veremos que a nossa pretensão não é tão ampla que não possa ser estudada. Primeiro porque detectamos não serem muitas as ações externas; e, segundo, por terem sido apenas dois1 os governadores eleitos em todo o período que estudamos, o que nos permite afirmar que não houve grandes mudanças na forma de pensar o contexto externo. Essa afirmação se confirma quando analisamos os Planos de Governo e também os Planos Plurianuais referentes ao período estudado.

A escolha do estado de Mato Grosso não se deu ao acaso, ela se justifica principalmente por: a) fazer fronteira com a Bolívia; b) se tratar de uma das unidades da federação que mais exporta, tendo com isso um grande peso na balança

1

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comercial brasileira; e c) pela ausência de bibliografia que analise as suas ações externas levando em consideração aspectos não só econômicos mas também políticos.

Veremos, no decorrer do trabalho, que a fronteira com a Bolívia possui um movimento intenso, que obriga Mato Grosso, em muitas situações, a tratar dos mais variados assuntos diretamente com o governo boliviano ou com os representantes dos departamentos, sem necessariamente passar por órgãos do governo federal brasileiro. Essas ações são justificadas pelas autoridades mato-grossenses com base na falta de celeridade do governo federal, que muitas vezes não consegue atender às demandas, muitas vezes particulares, que envolvem ambas as regiões. Constatamos que os assuntos tratados entre Bolívia e Mato Grosso são os mais variados e abarcaram questões que vão desde energia, segurança, vigilância sanitária, turismo até o comércio bilateral.

Outro ponto importante que foi considerado é o grande fluxo de comércio internacional existente no estado. Como se sabe, em 2005, Mato Grosso foi o estado que mais exportou grãos no Brasil e, desde então, se mantém na segunda colocação entre as unidades da federação que mais exportam grãos. Ocupa atualmente o 7° lugar entre os estados que mais exportam no Brasil. Figura entre os maiores produtores de carne, soja, arroz, milho, algodão e outras commodities, tem também, desde 2004, o maior rebanho de bovinos do Brasil2. Desta forma, atrai para

si grandes empresas multinacionais que realizam diversos investimentos no agronegócio. Entendemos que, principalmente pela posição de destaque nas exportações brasileiras, as ações externas do estado passaram a ter uma importância anteriormente nunca alcançada. Essa grande movimentação internacional colocou MT em destaque no mundo como sendo o “celeiro” do Brasil.

Importante ressaltar também a dimensão ambiental do estado, que tem parte do seu território na Amazônia Legal e no Pantanal – dois ecossistemas que chamam a atenção de ONG´s e indústrias do mundo todo que enviam seus representantes para estudar e até mesmo fiscalizar as reservas naturais do estado.

Diante dos pontos elencados acima, a escassez de bibliografa e estudos sobre a região, no que diz respeito a ações internacionais, saltam aos olhos. O que

2 Dados da Federação das Indústrias de Mato Grosso (FIEMT), referente ao ano de 2008. Disponível em:

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encontramos em algumas situações são trabalhos que trazem principalmente o ponto de vista econômico das exportações, sem, contudo, comentar questões ligadas à política e tomada de decisões.

O momento histórico abarcou a administração de quatro governadores, a saber: Dante de Oliveira (1995-2002), Rogério Sales (6/4/2002 - 31/12/2002), Blairo Maggi (2003-2010) e Silval Barbosa (31/03/2010 - 31/12/2010). Cabe ressalvar que, tanto Rogério Sales como Silval Barbosa assumiram o governo do estado apenas por um período curto de tempo, em função dos governadores eleitos, Dante de Oliveira e Blairo Maggi, disputarem as eleições para o senado; apenas como registro, o primeiro saiu derrotado nas urnas e o segundo conseguiu se eleger. Neste sentido percebemos que os dois vices apenas deram continuidade às ações que já estavam em andamento, sem terem uma autonomia para a implementação de novas ações externas.

O presente trabalho esta dividido em seis partes denominadas da seguinte maneira: Introdução; capítulo 1 – Diplomacia Federativa como um novo Paradigma, capítulo 2 - Os planos de governo no mundo das ideias; capítulo 3 - Os planos de governo no mundo real; capítulo 4 – Integração: a fronteira com a Bolívia e o Centro Oeste Sul Americano; Conclusão.

Em linhas gerais, o capítulo 1 traz à tona a discussão sobre o conceito de diplomacia federativa e política externa federativa. Para tanto faz o debate acerca de temas que influenciam na elaboração dos conceitos dentre os quais a globalização, o federalismo e a soberania dos Estados Nação. Todos foram tratados de forma conjunta para que se pudesse chegar a uma análise mais completa sobre as ações internacionais dos governos subnacionais. No referido capítulo está clara também a posição deste pesquisador no sentido de afirmar que o Estado Nação ainda é o principal ator no contexto externo, assim, o que estamos destacando é que dentro deste contexto começam a aparecer novos atores.

O capítulo 1 contempla ainda algumas questões jurídicas relacionadas ao tema, diplomacia federativa e também o relato e uma abordagem analítica sobre os Escritórios de Representação que o Itamaraty mantém em algumas unidades da federação, bem como, um debate sobre o papel da Assessoria Especial de Assuntos Federativos e Parlamentares ligada ao Itamaraty.

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capítulo tem como base os Planos de Governo que foram apresentados para a população pelos candidatos vencedores, como sendo o que eles iriam implementar se eleitos fossem; e também os Planos Plurianuais (PPAs), documento que mostra as metas, objetivos e diretrizes da administração pública, por parte do Executivo.

No referido capítulo abordamos principalmente os documentos mencionados, uma vez que entendemos que ambos demonstram o compromisso dos governantes para com a população; eles também nos permitem perceber o que foi planejado, mas não implementado, em nível de ações externas. Importante mencionar a utilização de jornais, artigos e livros de autores que debateram o assunto.

O capítulo 3 complementa o anterior na medida em que promove uma análise dos Planos de Governo e PPAs. Para tanto foram feitas entrevistas com agentes políticos que estiveram envolvidos diretamente em alguns dos episódios aqui estudados.

Com esta dinâmica a ideia foi fazer com que tivéssemos o maior número de informações disponíveis para análise; bem como promover uma complementação das informações evitando, assim, uma análise parcial.

Por fim, o capítulo 4, baseado principalmente em entrevistas, contempla a questão da Integração, particularmente os assuntos relacionados à fronteira de MT e à Bolívia, bem como à ideia do Centro Oeste Sul-americano. A opção por se abordar ambos os assuntos em capítulo específico deve-se ao fato de que eles são mencionados constantemente ao longo do período estudado, como sendo o foco mais comum das ações internacionais de MT.

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Entendemos que, dessa forma, pudemos realizar uma análise que levasse em consideração "as relações entre pensamento e ação política’’ (BARRETO, 1977, p. 16), estas sempre relacionadas aos Homens de Estado3.

Afirmamos ser qualitativa a pesquisa na medida em que muito das informações obtidas não puderam ser quantificadas, por serem parte de ações e pensamentos políticos dos Homens de Estado. Neste sentido, a opção pela metodologia qualitativa foi a mais acertada, por ser propícia para abordar assuntos que permeiam o universo de valores, crenças e percepções. Desta forma conseguimos apreender o significado de muitas posições e ideias das ações governamentais.

Nos dizeres de Minayo (2007):

A pesquisa qualitativa responde a questões muito particulares. Ela se ocupa, nas Ciências Sociais, com um nível de realidade que não pode ou não deveria ser quantificado. Ou seja, ela trabalha com o universo dos significados, dos motivos, das aspirações das crenças, dos valores e das atitudes. Esse conjunto de fenômenos humanos é entendido aqui como parte da realidade social, pois o ser humano se distingue não só por agir, mas por pensar sobre o que faz e por interpretar suas ações dentro e a partir da realidade vivida e partilhada com seus semelhantes. O universo da produção humana que pode ser resumido no mundo das relações, das representações e da intencionalidade e é o objeto da pesquisa qualitativa dificilmente pode ser traduzido em números e indicadores quantitativos (MINAYO, 2007, p. 21).

Quanto à utilização de entrevistas no presente trabalho, afirmamos que foi de extrema importância. Elas foram um complemento para atingirmos a completude da análise qualitativa e para a obtenção de informações que não estavam expressas nos documentos analisados. As entrevistas ajudaram-nos ainda a compreender de forma clara o espírito que permeou o planejamento e as tomadas de decisões.

No entendimento de Cervo e Bervian (1996):

A entrevista tornou-se, nos últimos anos, um instrumento do qual se servem constantemente os pesquisadores em ciências sociais e psicológicas. Recorrem estes à entrevista sempre que têm necessidade de obter dados que não podem ser encontrados em registros e fontes documentais e que podem ser fornecidos por certas pessoas. Esses dados serão utilizados

3Aqui entendemos por

Homens de Estado não somente a figura do Chefe de Estado/Governador, representante

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tanto para o estudo de “fatos” como de casos ou de opiniões (CERVO; BERVIAN, 1996, p. 136).

Dentro de uma análise qualitativa, entendemos que as entrevistas feitas nos deram uma maior compreensão dos fatos, bem como uma determinação dos sentimentos que faziam parte do momento histórico estudado. Pudemos, assim, descobrir planos de ação que efetivamente não foram implementados, mas pensados, o que nos ajudou a compreender de forma mais ampla uma determinada situação de ação ou omissão.

Assim, as entrevistas nos proporcionaram algumas vantagens, dentre as quais citamos:

(...) maior oportunidade para avaliar atitudes, condutas, podendo o entrevistado ser observado naquilo que diz e como diz: registro de reações e gestos;

(...) oportunidade para a obtenção de dados que não se encontram em fontes documentais e que sejam relevantes e significativos;

(...) possibilidade de conseguir informações mais precisas, podendo ser comprovadas, de imediato, as discordâncias (MARCONI; LAKATOS, 2010, p. 181).

Para Minayo (2007), a entrevista pode ser vista como uma técnica privilegiada de comunicação. “Ela tem o objetivo de construir informações pertinentes para um objeto de pesquisa, e abordagem pelo entrevistador, de temas igualmente pertinentes com vistas a este objetivo” (p. 64).

A mesma autora tem a seguinte classificação para as entrevistas, que segundo ela, são conversas com finalidade e se caracterizam pela sua forma de organização:

(a) Sondagem de opinião (...); (b) Semi estruturada (...);

(c) Aberta ou em profundidade, em que o informante é convidado a falar livremente sobre um tema e as perguntas do investigador, quando são feitas, buscam dar mais profundidade às reflexões;

(d) Focalizada (...);

(e) Projetiva (...) (MINAYO, 2007, p. 64-65).

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abertamente sobre as ações internacionais do estado de MT no período estudado que entendessem ser relevantes.

Minayo faz também a relação da realização de entrevistas com a investigação qualitativa. Para ela, o fornecimento de dados primários, que são objetos principais das pesquisas qualitativas, podem ser obtidos e construídos por meio do diálogo. Tais dados, que são subjetivos, fazem parte da realidade dos entrevistados e são formados por suas crenças, ideias, opiniões e maneira de pensar. Nesse sentido vejamos a passagem abaixo:

A entrevista como fonte de informação pode nos fornecer dados secundários e primários de duas naturezas: (a) os primeiros dizem respeito aos fatos que o pesquisador poderia conseguir por meio de outras fontes como censos, estatísticas, registros civis, documentos, atestados de óbito e outros; (b) os segundos - que são objetos principais da investigação qualitativa – referem-se a informações diretamente construídas no diálogo com o indivíduo entrevistado e tratam da reflexão do próprio sujeito sobre a realidade que vivencia. Os cientistas sociais costumam denominar esses últimos de dados “subjetivos”, pois só podem ser conseguidos com a contribuição da pessoa. Constituem uma representação da realidade: ideias, crenças, maneira de pensar; opiniões, sentimentos, maneiras de sentir; maneiras de atuar; condutas; projeções para o futuro; razões conscientes ou inconscientes de determinadas atitudes e comportamentos (MINAYO, 2007, p. 65).

A utilização de entrevistas vai ao encontro da metodologia qualitativa, uma vez que se apresenta como forma privilegiada de interação social e está sujeita à mesma dinâmica das relações existentes na própria sociedade (MINAYO, 2007). Desta maneira, da mesma forma como o método qualitativo, que se debruça sobre a realidade e contexto em que a pesquisa é feita, a entrevista, quando analisada, “precisa incorporar o contexto de sua produção e, sempre que possível, ser acompanhada e complementada por informações provenientes de observação participante” (p. 66). Minayo (2007) conclui da seguinte maneira as suas considerações sobre a entrevista: “Desta forma, além da fala que é seu material primordial, o investigado qualitativista terá em mãos elementos de relações, práticas, cumplicidades, omissões e imponderáveis que pontuam o cotidiano” (p. 66).

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Nesta etapa de discussões metodológicas cabe ainda uma observação. Como dito acima, o objetivo geral é analisar as ações internacionais do estado de MT no período de 1995-2010. Como objetivos específicos temos a busca pela resposta de três questionamentos: a) Mato Grosso vem promovendo ações no cenário externo e defendendo os seus interesses à revelia do governo central? b) Qual o comportamento dos governos subnacionais frente à elaboração da política externa do governo central? c) E por fim, detectar se Mato Grosso tem ações externas ou apenas segue orientações do governo federal?

Para a formulação de tais objetivos partimos da seguinte hipótese: tendo por base as vertentes teóricas que apontam a ideia de uma autonomia das unidades federadas no âmbito internacional, para nós, neste momento, Diplomacia Federativa, o estado de Mato Grosso teria despertado para o cenário internacional passando a realizar diversas ações no âmbito externo, buscando, uma maior inserção naquele contexto e defendendo seus interesses; sem que, para isso, contasse com real apoio do governo federal?

Assim, buscou-se, com base no estudo deste caso específico, refletir até que ponto MT foi capaz de se posicionar (interna e externamente) para defender seus interesses; se conseguiu idealizar e implementar suas ações externas, bem como a sua autonomia para se relacionar com o exterior, não só com empresas privadas, ONG´s, organizações internacionais, mas também com outros Estados.

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Capítulo 1

A DIPLOMACIA FEDERATIVA COMO UM NOVO

PARADIGMA

Neste capítulo nos propomos a conceituar e detalhar a concepção teórica da ideia de diplomacia federativa. Para tanto, importante se faz abordar temas afins que influenciam diretamente na elaboração de tal conceito. Assim, antes de adentrar especificamente ao tema, falaremos também sobre a globalização, o federalismo e a soberania dos Estados Nação. Entendemos que todos devem ser tratados de forma conjunta para podermos chegar a uma análise mais completa sobre as ações internacionais dos entes federados, no nosso caso, de Mato Grosso.

Assim acreditamos também ser possível mostrar que, diferente de alguns autores que veremos abaixo, a diplomacia federativa ou as ações internacionais das unidades federadas não indicam uma queda no protagonismo do Estado Nação nas relações internacionais, que continua sendo o ator mais importante no cenário externo.

O objetivo do presente capítulo não é defender uma ou outra concepção teórica, que acredita, ou não, no fim do protagonismo do Estado Nação, este debate será feito, mas como forma de ajudar a compreender os movimentos externos dos entes federados. O que destacamos é o fato de existir, dentro do cenário externo, vários atores que coexistem, sendo que o principal é o Estado Nação, detentor legítimo4 de poderes para representar seus cidadãos nas relações internacionais.

Veremos abaixo, não as diferentes correntes teóricas das relações internacionais e suas análises sobre as várias possibilidades de se interpretar a realidade e os acontecimentos externos, mas sim a versão de cientistas sociais, economistas, historiadores e outros estudiosos abordando os temas mencionados acima, dentro de uma perspectiva histórica e analítica, demonstrando suas percepções sobre as grandes transformações mundiais e seus impactos. É nesse cenário de grandes mudanças e incertezas que está sendo construída a ideia e o conceito de diplomacia federativa.

4 Entendemos que a legitimidade do Estado Nação pode ser comprovada ao menos de duas maneiras. A primeira

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1.1 Globalização e soberania

Comecemos, então, mencionando os escritos de Ianni (2001) que destacam a internacionalização do capital no pós Segunda Guerra como um fator de grande novidade no cenário internacional, tendo provocado grandes mudanças nos mais variados setores da sociedade. Segundo o autor, esse processo de internacionalização ocorreu em escala – intensidade e generalidade – jamais vista, fazendo com que o capital deixasse de lado o seu componente nacional para se manifestar em escala internacional. Essa conotação mundial se tornou mais intensa após o fim da Guerra Fria.

Para Ianni (2001), o período da Guerra Fria (1946-89) foi um momento em que o capitalismo se desenvolveu de maneira intensiva pelo mundo, modificando a divisão internacional do trabalho, flexibilizando processos produtivos e também marcando o momento em que empresas, corporações e conglomerados transnacionais adquiriram preeminência sobre as economias nacionais. Afirma que: “Tanto é assim que as transnacionais redesenham o mapa do mundo, em termos geoeconômicos e geopolíticos muitas vezes bem diferentes daqueles que haviam sido desenhados pelos mais fortes Estados nacionais” (p. 56). Conclui que a existência das empresas transnacionais, que passaram a predominar desde o fim da Segunda Guerra Mundial, está dentro de uma nova ordem mundial.

Evidente que esta percepção não é plenamente compartilhada por todos os analistas, como veremos adiante. Principalmente se considerarmos que as ações das empresas transnacionais decorrem precipuamente das decisões tomadas nas instituições multilaterais, como, por exemplo, o Acordo Geral de Tarifas e Comércio (GATT) e o Fundo Monetário Internacional (FMI), ou ainda das decisões unilaterais dos EUA, por exemplo, o Plano Marshall, quando se diz respeito à recuperação das economias destruídas durante a Segunda Guerra. Destaca-se também o protecionismo instaurado pela Comunidade Econômica Europeia e também pelo Japão, como forma de fortalecer e desenvolver as suas transnacionais.

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tomado por uma euforia, viu surgir a crença de que a Democracia, vitoriosa contra o totalitarismo, (Segunda Guerra Mundial e Guerra Fria), “se tornaria, enfim, valor universal e que o livre-mercado, visto o colapso das economias de comando, seria adotado como a melhor forma de organização racional da vida econômica pela maioria, se não todos os países. Criava-se assim, para Moreira, uma atmosfera de otimismo que levaria à crença de que se formavam, no mundo dos valores, grandes unanimidades” (p. 13).

Moreira (2000) retrata os anos 80 como sendo o período de desregulamentação dos sistemas financeiros, o que contribuiu para a intensificação de fluxos financeiros em nível global; pujança econômica, também facilitada por novas tecnologias, processos produtivos, avanços nos setores de comunicação e de transportes, grandes investimentos em pesquisas; todos esses fatores facilitaram e contribuíram para o efetivo desenvolvimento de mercados globais (p. 15).

Gelson Fonseca Júnior (1994), analisando o “fim dramático e repentino” da Guerra Fria, afirma que a ordem política, os mecanismos de segurança e de solução de controvérsias e o papel dos organismos multilaterais, tiveram que ser repensados [...] (p. 70).

Particularmente sobre o assunto globalização, muitos são os conceitos possíveis. Vejamos por exemplo o de Aguillar (2009), que aborda aspectos econômicos, financeiros, tecnológicos entre outros para, então, conceituar a globalização:

Globalização significa o fenômeno econômico de busca de conquista de mercados sem restrições às fronteiras nacionais, o fenômeno político da crescente interdependência dos países, o fenômeno cultural de influências recíprocas entre habitantes de países diversos, o fenômeno social do frequente deslocamento e fixação de residência de habitantes de um país em outros, o fenômeno tecnológico da revolução informática e das telecomunicações, o fenômeno financeiro dos investimentos especulativos planetários, causando simultaneamente a reestruturação dos agentes econômicos, a transformação do papel do Estado e do direito em todos os países envolvidos (AGUILLAR, 2009, p. 59, 60).

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Para ele o termo globalização “refere-se, em última análise, à reorganização das estruturas de produção de bens e serviços e ao aumento dos fluxos comerciais e financeiros” (TRICHES, 1999, p. 5). Aqui, mais uma vez, aparecem as empresas transnacionais. Para Triches (1999) elas são responsáveis por promover um grande desenvolvimento tecnológico que faz com que os produtos e a própria tecnologia percam suas identidades nacionais, por serem produzidos em várias partes do globo.

Afirma ainda que a globalização financeira está associada à grande mobilidade de fluxos de capitais internacionais e a uma crescente interdependência econômica entre os países; ela ainda “aumenta a oportunidade de investimentos com a diversificação de instrumentos financeiros e com maior alavancagem de recursos” (TRICHES, 1999, p. 5).

O autor conclui dizendo que a nova ordem internacional está vinculada à difusão das inovações tecnológicas, no campo da computação e comunicação, bem como ao “acelerado processo de desregulamentação dos mercados financeiros domésticos e do surgimento de novos mercados e novas instituições” (TRICHES, 1999, p. 6). São parte desta realidade os conglomerados bancários, empresas multinacionais e outros.

Em sua opinião, essa nova ordem internacional, na qual impera a globalização econômica, os mercados comerciais e financeiros integrados em blocos, faz com que as economias locais e nacionais sejam desafiadas constantemente. Para ele, “as nações e até mesmo as regiões tendem a perder graus de liberdade no que se refere à condução de políticas econômicas, bem como nas questões relacionadas à soberania e a tomada de decisão política” (TRICHES, 1999, p. 15).

Outro autor, Marcos Galvão (1998a), sustenta que a “globalização expressa uma sensação de ruptura entre o momento atual e o passado recente” e que no Brasil essa sensação se reforçou por conta da proximidade temporal

entre a consolidação da hegemonia do pensamento liberal em âmbito mundial – queda do Muro de Berlim, “fim da história” – e, no plano interno, a redemocratização completada com as eleições presidenciais de 1989 e a abertura econômica empreendida a partir de 1990 (GALVÃO, 1998a, p. 36).

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da supremacia da Guerra Fria à proeminência da globalização e da competição econômica, o Brasil mudou e consolidou a sua democracia e alterou profundamente o modelo de desenvolvimento, que se baseava na intervenção estatal, no fechamento da economia e em políticas de crescimento que geravam inflação progressiva (p. 199).

A nova ordem mundial, em ambos os autores mencionados acima, tem como uma de suas principais características a proeminência de questões econômicas. Nesse contexto, como veremos adiante, o papel do Estado Nação começa também a ser repensado.

Nossa percepção de Globalização decorre das considerações de Anthony Giddens (1990), principalmente na percepção de que ela corresponde a modos de vida e de organização sociais que surgiram na Europa, por volta do século XVII e passaram a ter influência de alcance mais ou menos mundial. Assim, Globalização corresponderia à intensificação de relações sociais de alcance mundial, que vinculam lugares distantes de tal forma que acontecimentos locais são influenciados por eventos remotos e vice versa.

Corresponde exatamente à pressão pós fim da Guerra Fria que começou a enfatizar a existência de valores universais que estariam unificando o mundo (para muitos, a humanidade) em um ambiente estável, pacífico e cooperativo.

Fonseca e Lafer (1994) demonstram esta visão de uma forma bem clara quando apontam que, no primeiro momento do pós-Guerra Fria, a ideia dominante era a de que conflitos eram coisas do passado e que, a partir desta universalização, os Estados estariam direcionados muito mais a ações cooperativas que favoreceriam os processo de desenvolvimento econômico, gerando um clima contínuo de prosperidade. Observam, no entanto, que esta visão foi passageira com a irrupção de uma multiplicidade de conflitos, de exacerbação de nacionalismos e de ampliação do fosso entre países desenvolvidos e não desenvolvidos.

A globalização, ainda segundo Giddens (1990), apresenta quatro dimensões, não excludentes e não necessariamente cooperativas:

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b) Sistema de Estados-Nação: todos os espaços são de soberania de algum Estado, monopólio da violência em seus territórios. Por maior que seja o poder de algumas empresas, não são organizações militares e não podem estabelecer-se como legais ou capazes de governar um determinado espaço geográfico;

c) Ordem militar mundial - O poder destruidor das armas nucleares, embora previna o confronto direto, permite que os Estados se envolvam como influências organizadoras em conflitos periféricos;

d) Desenvolvimento industrial - A indústria moderna é intrinsecamente baseada em divisões do trabalho, não apenas ao nível das tarefas individuais ou coletivas, mas também da especialização regional (GALVÃO, 1998a, p. 41-45)5.

Veremos agora, de forma mais focada, os impactos que os Estados Nação vêm sofrendo com a globalização. Perceberemos que, para alguns autores, eles estão enfraquecendo e perdendo legitimidade para atuar e defender os interesses de sua população no cenário internacional; para outros apenas sofrem com um momento de transição e reacomodação de novos participantes neste cenário, mas ainda exercem papel preponderante.

Para Ianni (2001, p. 59), “o significado do Estado-nação tem sido alterado drasticamente, quando examinado à luz da globalização do capitalismo, intensificada desde o término da Segunda Guerra e acelerada com o fim da Guerra Fria”. Para ele, essa internacionalização do capital e consequente fortalecimento das grandes empresas, faz com que os Estados Nação tenham seus interesses prejudicados e com isso algumas das suas características clássicas parecem não ter mais sentido:

Algumas das características “clássicas” do Estado-nação parecem modificadas, ou radicalmente transformadas. As condições e as possibilidades de soberania, projeto nacional, emancipação nacional, reforma institucional, liberalização das políticas econômicas ou a revolução social, entre outras mudanças mais ou menos substantivas em âmbito nacional, passam a estar determinadas por exigências de instituições, organizações e corporações multilaterais, transnacionais ou propriamente mundiais, que pairam acima das nações (IANNI, 2001, p. 59).

Sobre as mudanças nas características do capital financeiro, o autor aponta para o fato de que no passado, tal capital, estava preso ou ligado a decisões do Estado Nação, o que não ocorre nos dia de hoje. Esse novo cenário conta com a

5 Resumo do pensamento de Giddens realizado por GALVÃO, Marcos B. A.. Globalização: arautos, céticos e

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participação de novos atores que têm grande influência dentro dos Estados e também no contexto internacional:

A rigor, o capital financeiro parece adquirir mais força do que em qualquer época anterior, quando ainda se encontrava enraizado em centros decisórios nacionais, mais ou menos subordinados ao Estado-nação. Além da mundialização acelerada e generalizada das forças produtivas, dos processos econômicos, da nova divisão internacional do trabalho, formam-se redes e circuitos informatizados, por meio dos quais as transnacionais e os bancos movem o capital por todos os centros do mundo (IANNI, 2001, p. 69).

Ianni apresenta esta nova sociedade mundial como sendo formada por um sistema de atores. Atores de todos os tipos:

Estados nacionais, empresas transnacionais, organizações bilaterais e multilaterais, narcotráfico, terrorismo, Grupo dos 7, ONU, FMI, BIRD, FAO, OIT, AIEA e muitos outros, compreendendo naturalmente também as organizações não governamentais (ONG’s) dedicadas a problemas ambientais, defesa de populações nativas, proteção de direitos humanos, denúncias de práticas de violência e tortura.

Também podem adquirir relevância regional e mundial atores de tipo nacional, podendo entrar ativa ou passivamente no jogo das pendências regionais e mundiais. Uns e outros sintetizariam muito do que são as relações, controvérsias, soluções e impasses correntes no âmbito da mundialização (IANNI, 2001, p. 78, 79).

Mas, mesmo nesse sistema internacional, Ianni afirma a importância dos Estados nacionais que continuam a desempenhar os papéis de atores privilegiados, ainda que frequentemente desafiados pelas corporações, empresas ou conglomerados” (IANNI, 2001, p. 79). Frente a esta constatação, o autor toca em outro ponto bastante relevante em sua análise quando compara a relação entre Estados, que no cenário internacional aparecem como sendo formalmente iguais.

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Assim, podemos dizer que Ianni faz uma análise alertando para as diferenças reais que existem entre os Estados. Para ele, o cenário em que todos são apresentados como iguais é fictício, a igualdade seria apenas uma formalidade que acaba criando um contexto de enfrentamento entre eles, levando ao questionamento da soberania e hegemonia dos Estados:

Note-se que as noções de soberania e hegemonia revelam-se não só problemáticas, mas centrais, nas análises sistêmicas. Grande parte dessas análises dedica-se a codificar as condições e as possibilidades de soberania e hegemonia. São temas da maior relevância numa época em que o mundo se torna cenário de muitas ações, em geral polarizadas por algumas mais fortes [...] (IANNI, 2001, p. 87).

Por outro lado, não se furta a destacar que, atualmente, por conta das grandes transformações técnicas nos meios de produção, barreiras culturais, sociais, linguísticas, religiosas e territoriais têm sido superadas (IANNI, 2001, p. 104) fortalecendo assim a noção de mundo globalizado.

Pontifica o fortalecimento das grandes corporações econômicas, que estão se transformando em estruturas mundiais de poder, e se colocando lado a lado de Estados nacionais. Ao adquirirem força, versatilidade e generalidade graças “a globalização do capitalismo, nessa mesma medida reduzem-se ou subordinam-se as possibilidades dos Estados nacionais, que eram as figuras por excelência do imperialismo e da interdependência” (IANNI, 2001, p. 186).

Caracteriza a globalização do capitalismo como sendo detentora do conhecimento em: técnicas eletrônicas, microeletrônica, automação, robótica, informática; que passam a ser disseminadas em caráter global intensificando e modificando os processos de trabalho e produção. Essas características promovem mudanças também na “geografia das fábricas, usinas, montadoras e zonas francas, bem como promovem, simultaneamente, uma nova divisão internacional do trabalho e produção” (IANNI, 2001, p. 195).

Os impactos da globalização acabam abalando mais ou menos profundamente os parâmetros históricos e geográficos, ou as categorias de tempo e espaço, que haviam sido elaborados com base no Estado nação, nas configurações e movimentos da sociedade nacional [...]” (IANNI, 2001, p. 205, 206).

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apenas estudar os Estados Nacionais. Alerta que muito do pensamento científico na atualidade tem como paradigma para as suas reflexões os Estados Nacionais, e que por isso são insuficientes para refletir sobre globalização e as transformações que ela provoca. Por essa situação os novos desafios são grandes para os pesquisadores e estudiosos.

O pensamento científico, em suas produções mais notáveis, elaborado primordialmente com base na reflexão sobre a sociedade nacional, não é suficiente para apreender a constituição e os movimentos da sociedade global.

O paradigma clássico das ciências sociais foi constituído e continua a desenvolver-se com base na reflexão sobre as formas e os movimentos da sociedade nacional. Mas a sociedade nacional está sendo recoberta, assimilada ou subsumida pela sociedade global, uma realidade que não está ainda suficientemente reconhecida e codificada. A sociedade global apresenta desafios empíricos e metodológicos, ou históricos e teóricos, que exigem novos conceitos, outras categorias, diferentes interpretações (IANNI, 2001, p. 237).

Esta ideia é aprofundada na continuação do texto de Ianni (2001), quando ainda nos diz que, as reflexões construídas a partir da sociedade nacional começam a ser revistas e passam a ter como novo paradigma a sociedade global. Mas em sua conclusão afirma que essa situação, por si só, não nos autoriza a dizer que a sociedade nacional deve ser desconsiderada em novas análises, mas apenas que elas já não explicam a totalidade dos movimentos globais que vem ocorrendo.

[...] É óbvio que a sociedade nacional continua a ter vigência, com seu território, sua população, seu mercado, sua moeda, seu hino, sua bandeira, seu governo, sua constituição, sua cultura, sua religião, sua história e demais formas de organização social e técnica do trabalho, façanhas, heróis, santos, monumentos, ruínas. Ela constitui o cenário no qual seus membros movimentam-se, vivem, trabalham, lutam, pensam, fabulam, morrem. Tanto assim que subsistem e ressurgem nacionalismos, provincialismos, regionalismos, etnicismos, fundamentalismos e identidades em muitos lugares, nos diversos quadrantes do mundo. Mas a sociedade nacional não dá conta, nem empírica nem metodologicamente, nem histórica ou teoricamente, de toda a realidade na qual se inserem indivíduos e classes, nações e nacionalidades, culturas e civilizações. [...] (IANNI, 2001, p. 239).

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Há noções que sofrem em uma espécie de obsolescência, em certos casos parcial, em outros total. O Estado nação, por exemplo, entra em declínio, como realidade e conceito. Não se trata de dizer que deixará de existir, mas que está realmente em declínio, passa por uma fase crítica, busca reformular-se. As forças sociais, econômicas, políticas, culturais, geopolíticas, religiosas e outras, que operam em escala mundial, desafiam o Estado nação, com sua soberania, como o lugar da hegemonia. Sendo assim, os espaços do projeto nacional, seja qual for a sua tonalidade política ou econômica, reduzem-se, anulam-se ou somente podem ser recriados sob outras condições. A globalização cria injunções e estabelece parâmetros, anula e abre horizontes. Mas o pensamento científico parece um tanto tímido, surpreso ou mesmo atônito, diante das implicações epistemológicas da globalização (IANNI, 2001, p. 244).

Em um artigo denominado A política mudou de lugar, Ianni (2002) confirma a sua ideia de que, algumas categorias do pensamento político são desafiadas e questionadas pelos dilemas e horizontes da globalização: “sociedade civil, estado, partido político, sindicato, movimento social, opinião pública, povo, classe social, cidadania, soberania e hegemonia, entre outras” (p. 17). Os novos desafios e dilemas que abarcam os vários setores da sociedade fazem com que haja uma crise do Estado-nação e na ideia de soberania nacional. Para ele, a transnacionalização da economia além de reorientar, reduz a capacidade decisória do governo nacional, sem setores da economia, finanças e outros; o que causa crise no princípio de soberania nacional.

[...] Ao intensificarem e generalizarem as injunções “externas”, as condições e as possibilidades da soberania alteram-se, redefinem-se e também reduzem-se. Se cresce a importância das injunções “externas”, configurando a dinâmica da globalização, pode reduzir-se a importância das forças sociais “internas”, no que se refere à organização e às diretrizes do poder estatal (IANNI, 2001, p.18).

Ainda sobre a globalização e seus impactos, Flávia Oliveira (2002), destaca a velocidade com que as transformações vêm ocorrendo:

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Corsi (2002) é mais um que alerta para o enfraquecimento dos Estados nacionais em meio ao processo de globalização6, tal situação ocorre principalmente,

segundo ele, pela pujança da economia e pelo fortalecimento de grandes conglomerados empresariais, que muitas vezes têm faturamento maior que muitos Estados. Para ele, a pujança econômica gerada pela globalização estaria comprometendo inclusive a soberania dos Estados (CORSI, 2002, p. 102, 103).

A recente crise financeira global (a partir de 2008), com epicentro nos Estados Unidos e nas economias dos países desenvolvidos, no entanto, colocou um profundo questionamento frente estas ponderações ao constatar que as economias que pouco foram afetadas ou que se recuperaram mais rapidamente foram exatamente as em que o Estado tinha um papel mais atuante do que as “forças do mercado”. De qualquer forma, a crise retomou a percepção da necessidade do Estado exercer um papel de regulador em torno das forças do mercado.

Soares (2002) concentra seu foco na diplomacia, que segundo ele sofreu mudanças dentro do mundo globalizado. Afirma que são possíveis três acepções para a globalização:

a) Uma transformação das regras e formas da tradicional diplomacia bilateral, Estado a Estado, e sua adaptação às realidades da diplomacia multilateral, nas suas variadas formas, por exigências do Século XX, e b) Uma visão, no campo tradicionalmente reservado às Chancelarias e aos diplomatas, por parte de outros agentes, seja funcionários dos Estados (como os Ministérios da Fazenda, da Indústria e Comércio, dos Ministérios de Comércio Exterior, quando existem, de vários Conselhos ligados ao comércio exterior ou a finanças internacionais), seja de grupos oficiais ou não oficias de natureza privada (por ex.: as empresas sob controle estatal, as organizações não governamentais, as ONG´s, em particular aquelas que contam com um apoio oficioso dos Estados).

Enfim, há uma terceira acepção para “globalização”, que, como se verá, quereria significar uma intrusão de determinados temas internacionais, naquelas esferas tradicionalmente reservadas à competência interna dos Estados. São assim três aspectos da realidade das relações internacionais neste final de século e que denominamos “globalização”: a predominância da diplomacia a setores generalizados da sociedade e, enfim, um esmaecimento da linha divisória, em alguns assuntos, entre a esfera da política interna e das relações internacionais (SOARES, 2002, p. 126, 127).

6 Para Corsi (2002) a globalização tem as seguintes características: a formação de oligopólios transnacionais em

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Ainda sobre a diplomacia, Lampreia (1999), em artigo já mencionado acima, afirma que: “A diplomacia é uma tarefa de permanente recriação da tradição e do patrimônio que o passado nos deixou. É essa dialética entre a tradição e a inovação que justifica nosso trabalho de estabelecer uma ponte entre nosso país e o mundo” (p. 199).

Entendemos que em seu escrito, Lampreia (1999), ao considerar especificamente a diplomacia brasileira, está afirmando que ela tem que mudar e atentar para novas formas de promoção dos interesses do Estado. “Aqui entra em cena uma diplomacia mais atuante para promover uma nova e mais eficaz inserção externa do Brasil” (p. 199). Assim, está reconhecendo, além dos efeitos da globalização, o novo momento de adesão ao modelo liberal por parte do Brasil.

Fernando Henrique Cardoso (2001) confirma que:

Tendo aberto seu mercado ao comércio internacional e, sobretudo, tendo alcançado a estabilidade monetária, o Brasil tornou-se capaz de estabelecer uma relação inteiramente diferente com a economia internacional: uma relação que já não se baseia na ideia de ameaça, mas na ideia de desafio (CARDOSO, 2001, p. 7).

Mas demonstrava, no entanto, suas inquietações quanto ao fato dos fluxos financeiros seguirem desgovernados e ameaçando as economias em desenvolvimento.

“Entre esses pontos de interrogação, existe um que se destaca do ponto de vista da política externa do Brasil: até onde poderemos ir na direção de crescentes fluxos transnacionais e de uma interdependência internacional cada vez maior sem o desenvolvimento proporcional de estruturas de governança? Não existe, acaso, um déficit de governança em um mundo que se torna, a cada dia, mais globalizado, mas no qual a cooperação internacional deixa de responder a alguns dos problemas mais sérios? [...] A questão é que o Brasil e outros países emergentes poderiam ter um desempenho melhor se a arquitetura financeira internacional fosse mais estável, mais previsível. Isso exige um esforço sério no sentido do fortalecimento da coordenação e para assegurar uma estrutura financeira que favoreça o investimento produtivo, e não a especulação desenfreada (CARDOSO, 2001, p. 8, 9).

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Há tantas políticas externas em um país, quanto são os interesses em jogo. Dessa forma, pelo menos três instâncias podem ser identificadas como tendo políticas externas: o tradicional lócus, a Chancelaria em princípio a grande responsável tanto pela formulação, quanto pela implementação da política externa e da política internacional do Brasil; as Forças Armadas, principalmente no que tange aos temas ligados à defesa do Estado; e os setores econômicos (MIYAMOTO; GONÇALVES, 2000, p. 173).

No que diz respeito a considerações acerca de questões ligadas à segurança nacional, mesmo em um mundo Pós Guerra Fria e globalizado, onde esse assunto possa parecer sem sentido e sem cabimento, José Luiz Machado e Costa (1999) destaca que a preocupação com as questões de defesa devem ser mantidas, para ele:

O desordenamento que se verifica no quadro de poder mundial torna essencial a avaliação crítica do atual processo de acomodação de forças, de forma a habilitar o País a estabelecer referenciais próprios que orientem sua postura no campo da defesa. Conceitos tradicionais como identidade nacional, soberania e balança de poder, que logo após o término da Guerra Fria foram relativizados, voltaram a adquirir importância, e a presença constante do conflito no cenário internacional evidencia o fato de que a capacitação militar é ainda relevante nas relações entre os Estados (COSTA, 1999, p. 67, 68).

Desta forma, Costa (1999) chama a atenção daqueles autores que acreditam que, com a globalização, os assuntos relacionados à segurança estarão apenas em segundo plano nas relações entre os Estados, preteridos pelas questões comerciais baseadas na concepção de liberalismo.

Para ele, o fim do ordenamento global bipolar, em que os inimigos se encontravam de forma clara e definida em lados opostos, torna difícil o reconhecimento de novas ameaças, o que acaba colocando em cheque todas as perspectivas de defesa até então existentes. Por isso os Estados devem buscar novos “objetivos e condicionantes de natureza estratégica, bem como o estabelecimento de parâmetros de autodefesa distintos dos convencionais” (COSTA, 1999, p. 68). Alerta que nesse contexto deve ser considerada também a participação crescente de atores transnacionais. “Enquanto não se delinear uma ordem mundial mais previsível, a maioria das nações deverá manter uma atitude de prudência na reformulação de suas organizações militares” (COSTA, 1999, p. 68).

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[...] o tema da segurança ainda não foi e dificilmente será descartado pelos Estados – nações. Mesmo quando se diz que este conceito está sendo rapidamente superado e substituído por um mundo global, onde as fronteiras fazem parte do passado.

Tais fatos mostram claramente que apesar das discussões, suscitadas sobre os processos de globalização e/ou mundialização, privilegiando as relações diplomáticas, econômicas e culturais, o tema da segurança ainda não foi e dificilmente será descartado pelos Estados – nações. Mesmo quando se diz que este conceito está sendo rapidamente superado e substituído por um mundo global, onde as fronteiras fazem parte do passado (MIYAMOTO, 2002, p. 277).

Como podemos perceber, Miyamoto (2002) não acredita em um enfraquecimento do Estado – nação, principalmente nas questões que envolvem segurança, seu tema de estudo. Dessa forma considera que “os Estados - nações, com todas as suas deficiências e restrições, continuarão existindo e manterão políticas de defesa própria ou de blocos, com identificações ideológicas, econômicas, políticas, geoestratégicas, etc” (p. 277).

Apontando a relação entre a globalização e a soberania, Jorge Castro (2003) faz uma análise que considera necessária prudência aos autores que acreditam no fim do Estado Nação e também da sua soberania e legitimidade, para representarem os interesses de sua população no cenário internacional. Segundo ele, a crise dos Estados “na atualidade é consequência da distância que existe entre os sistemas políticos estatais, que continuam sendo realidades nacionais e territoriais, e a globalização da economia e das finanças, que afeta essencialmente todos os países” (p. 173). Para ele, a origem da crise “está na revolução tecnológica do processamento da informação, surgida e reforçada nos últimos vinte anos” (p. 173).

Mesmo diante dos impactos provocados pela globalização, Castro não acredita no desaparecimento do poder político estatal. Nos seus dizeres o que existe de diferente neste momento é a autonomia da economia:

[...] a característica diferenciada dessa nova situação estrutural é que existe uma virtual autonomia do econômico, sustentado na revolução tecnológica, que vem se descolando das questões políticas. O pensamento neoliberal universaliza e idealiza esta situação de ordem conjuntural, transformando-a numa doutrina de ordem geral (CASTRO, 2003, p. 173).

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173); acredita que esse declínio não significa o desaparecimento dela; para ele: “A soberania tem uma nova forma, composta de uma série de organismos nacionais e supranacionais, unidos sob uma nova e única fórmula” (p. 174).

Refletindo sobre a atual conjuntura globalizada e também sobre o embate entre política e economia, Castro (2003) conclui dizendo que:

Com ou sem Estado – Nação forte, sempre existe uma superioridade do político, não como substância alheia à história, mas como momento de unidade e de projeção da totalidade dos momentos sociais. Nesse sentido, todas as crises desatam tendências e contra-tendências. Não existe choque final na história, a história jamais se enclausura, jamais revela seus segredos (CASTRO, 2003, p. 182).

Bauman (1999), diferentemente de Castro, aponta para uma prevalência do econômico sobre o político, em um contexto globalizado. Para ele a globalização é “o destino irremediável do mundo, um processo irreversível; é também um processo que nos afeta a todos na mesma medida e da mesma maneira” (p. 7). Dentro de sua perspectiva ela, a globalização, provoca um abalo na soberania dos Países, principalmente no componente econômico. Isso porque, cada vez mais, os Estados-nação não conseguem suportar as pressões advindas das grandes empresas. As regras de livre mercado, o volatilidade do capital e das finanças, fogem, dentro deste contexto, do controle político que outrora era exercido pelos Estados. Na sua concepção, “o Estado não deve tocar em coisa alguma relacionada à vida econômica: qualquer tentativa nesse sentido enfrentaria imediata e furiosa punição dos mercados mundiais” (p. 37, 74).

Diferentemente dos que acreditam, como Bauman, na prevalência dos fatores econômicos sobre os políticos, bem como, na globalização como sendo um caminho sem volta, afetando diretamente a soberania dos Estados; Amado Luiz Cervo (2002) confronta tal perspectiva fazendo uma análise do cenário internacional e mostrando o posicionamento de alguns Estados frente às várias crises internacionais ocorridas na década de noventa. Assim, constata a ação protecionista em várias situações de conflitos comerciais em que nada tem haver com a concepção de liberalismo, apresentadas por alguns autores como sendo soberana nas relações comerciais externas.

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sua competitividade externa; para tanto, o governo brasileiro atuou em várias frentes tentando alcançar do GATT-OMC um sistema multilateral com regras transparentes, fixas e justas e dos blocos regionais idênticos dispositivos” (Cervo, 2002, p. 16). Mas, diante de dificuldades conjunturais, o governo brasileiro se deparou com medidas ecoprotecionistas e de caráter fitossanitárias, entre outras, dos governos de países desenvolvidos que contrariavam o discurso liberal.

Como lembra Cervo (2002, p. 18), os EUA7 “mantinham seu arsenal de barreiras às importações brasileiras de manufaturados e primários; e o Canadá mostrou à diplomacia brasileira o jogo duro que significa lidar com contenciosos comerciais” quando escondeu seus subsídios e castigou as exportações de carne brasileira divulgando contaminação pelo mal da vaca louca. Sobre a União Europeia, lembra que ela não abria mão dos subsídios agrícolas.

Cervo destaca que na globalização as exigências de implementação do liberalismo foram feitas pelos países avançados aos países em desenvolvimento. Mesmo durante as crises que apareceram:

A globalização financeira comportou duas exigências dos países avançados sobre as economias emergentes: o livre fluxo de capitais e a abertura dos sistemas financeiro, empresarial e dos mercados de valores a sua penetração. Quando as reformas dos Estados satisfizeram tais exigências, dois também foram os efeitos que se generalizaram: o aumento dos fluxos, em boa medida de capitais especulativos, e as crises financeiras. Quando as crises financeiras abalavam essas economias (México em 1994-95, Ásia em 1997-98, Rússia em 1998 e Argentina em 2001), o G7 apenas de leve cogitou na possibilidade de introduzir controles ou salvaguardas para os efeitos predatórios dos capitais especulativos (CERVO, 2002, p. 19).

O resultado da política governamental que apostou no liberalismo gerou prejuízos para o Brasil, Cervo (2002) lembra que: “O grave perfil das contas públicas, em sintonia com instruções vinculadas aos socorros concedidos pelo FMI desde 1990, retirava investimentos produtivos, provocando outras crises, como a escassez de energia elétrica, e bloqueava o crescimento econômico” (p. 20). O resultado final foi o grande movimento de capitais especulativos, desapropriação dos ativos nacionais (por meio das privatizações) e aumento da dependência estrutural, financeira e econômica do Brasil. “O Brasil transitou, pois, da década perdida à década perversa” (p. 20, 21).

7 Destaca que os EUA colocaram barreiras tarifárias nos seguintes produtos: suco de laranja, calçados, carnes

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Diante do quadro apresentado acima, o mais importante para nós é compreender que a globalização provocou sim várias mudanças e transformações em diversos setores da sociedade da economia e da política; e que o papel do Estado foi preponderante para a resolução de todos os percalços. Assim, entendemos que é ele quem decide qual o caminho a seguir, por ser soberano e ter legitimidade. Desta forma cabe ao Estado definir se vai ou não implementar uma política econômica liberal; neste sentido acreditamos como Marcos Galvão (1998b), que [...] “a liberalização (da economia) foi fruto de decisão política e a supervisão vai até onde tal vontade permite” (p. 121).

Não compartilhamos da ideia de que com a globalização caminhamos para um mundo sem opções de escolha, no qual os Estados estariam com os dias contados e a economia caminhando para a liberdade total de mercado, para alguns, seria o fim da história. Nosso entendimento pode ser bem expressado no posicionamento de Galvão (1998b) ao afirmar que “a globalização não é um processo monolítico e unidirecional, ao qual países e sociedades se devam ajustar passiva e automaticamente. Continua a existir a possibilidade – e a necessidade - de tomar decisões e escolher caminhos” (p. 150). O que existe efetivamente de novo é o fato de não existir a bi-polaridade da Guerra Fria, mas sim um amplo leque de alternativas que se evidencia concretamente na variedade das experiências históricas contemporâneas (p. 150). E para nós, neste contexto, o Estado-nação ainda é o ator principal.

1.2 Ações externas federativas

O objetivo de termos abordado a globalização até o presente momento foi para mostrar seus vários aspectos e elementos que fazem parte hoje do cenário internacional e acabam influenciando os países internamente.

Referências

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