RES E N HA
B U AWOY, M ichael. The poitics of production: factory regimes under capi
talism and socialism.
2.ed. New York British Library,
1 987. 277p.
Delvair de Bito Alves*
Michael Burawoy, professor da Universidade da California, Berkeley, patindo de relexoes das teorias marxistas do processo de trabalho, especialmente da obra de Harry Braverman: "Trabalho e capital monopolista", chega a conclusoes das implicacoes para a polftica atraves de sua ''teoria de producao." Os estudos deste teo rico sao realizados a patir de experiencias em cada uma das areas por ele analisadas, 0 que dao ao seu livro, As politicas de podug1o, un campo raro de comparacoes intenacionais e aprofundamento emplrico.
Este e un livro cuja tese contem duas pates, ou seja, a argumentayao de que a classe tra balhadora industrial ten feito intervenyoes significativas e auto-conscientes na historia, e que essas intervenyoes foram e continuam a ser formadas pelo processo de produao. Com esta obra , critica o s estudos sobre processo d e trabalho q u e se concentram na explicaao econ6mica e desafia a separacao da base econ6mica da super-estrutura polltica. Nesta linha , considera que a recons trucao do marxismo passa pelo exame de como 0 processo de produao forma a cia sse trabalhadora industrial, nao a penas objetivamente, isto e, pelo tipo de trabalho que faz, mas tambem subjeti vamente, ou seja, pelas lutas engendradas por uma experiencia espedica ou interpreta5es daquele trabalho.
Estrutura seu livro em cinco capltulos: 0 processo de trabalho na sociedade capitalista ; Karl Max e as fabricas satanicas; a transformacao dos regimes fabris sob 0 capitalismo avancado; tra ba lhadores em estado socialista e 0 lar oculto do sub-desenvolvimento.
A analise de BURAWOY sobre a obra de BRAVERMAN e um tanto paradoxal pois, ao tempo em que a reconhece como insuperavel, se pro poe a critica-Ia; ao tempo em que nega a infiuencia de BRAVERMAN na sua vida diaria , admite manter-se no maxismo e utiliza os pressupostos deste teorico para enriquecer as suas analises e, particularmente, 0 segundo capitulo de As Poicas de rodugio. Entretanto, ao lado de BRAVERMAN , ele e criticado por nao privilegiar a subjetividade e pela postura essencialista , que tambem 0 faz superestimar 0 poder do gerente.
Ao Emtender, d iferentemente de BRAVERMAN(1 ), que e 0 ocultamento simultaneo a garantia do excedente e nao 0 controle, a essencia do processo de trabalho capitalista, Burawoy busca 0 seu fundamento no feudalismo, por considerar que nos modos de producao nao capitalista a exploracao e transparente. Com esta posiao, ica a ideia de que os trabalhadores (sevos) assumem a explora9ao de forma consciente e imediata . Entretanto, a ausencia de evidencias emplricas e teoricas que confirme
r
esta indica9ao nos leva a questionar: neste caso, estaria 0 consentimento ligado a uma pseudo-consciencia?* Enfenlleira, Professora Adjllnta da Escola de Enfenllagem da UFBa. Mestre em Edllca�io e DOlltora em Edllca�lo pela FACED-UFBa.
Burawoy considera as formas de controle assumidas por BRAVERMAN(l), ou seja , separagao entre concepyao e execugao e fragmentagao do trabalho limitantes pois, para ele, 0 controle se d,a pela hegemonia (que nasce na fabrica) e pelo consentimento (resultante de negociagoes e de jogos) . Consideramos que, teoricamente, BRAVERMAN esta correto ao pensar as suas duas formas de controle como especfficas da sociedade capitalista . Entretanto, apesar de insuicientes ·as evidemcias empiricas, a existencia de outras sociedades de cia sse concretas, nos leva a refJetir, como Burawoy, que 0 controle nao e especifico do modo de produgao capit�listl , e a pensar no . fato de que, em todas as sociedades de classe, a separagao ent,re concepgao .e execugao e uma realidade. Entendemos, contudo, que 0 problema , na sociedade capitalista , parece se deslocar para a existencia de trabalhadores assalariados, ditos "Iivres", dependentes, contudo, da venda de s,ua forya de trabalho. Por outro lado, consideramos inovadora a atitude de Burawoy, de tomar para analise 0 jogo como forma de controle, apesar de 0 criticarmos por nao ter analisado 0 seu papel
na convergencia de interesses entre capital e trabalho. . . .
RetQmando a critic
a
que BURAWOy(2) diz teren feito a "Escola de Recursos Hu manos de EltonMayo", ou seja, que este teorico presta pouca atengao ao ambiente e mais a fabrica , e que ignora as restri90es advindas da tecnologia , dando importancia as rela90es humanas, podemos tambem, i mputa-Ias ao proprio Burawoy que, em sua obra , confere espa90 privilegiado ao "ponto de produ9ao", recomendando inclusive, nao abandbna-Io comb a arena decisiva para a forma9ao da classe trabalhadora , alem de relativizar a na9ao com aspectos politicos e ideol6gicos (fatores subjetivos do trabalho). Esta posi9ao 0 faz tomar a produgao do consentimento, no ponto de produgao, como algo independente de fatores externos . .de condigoes de mercado. As criticas feitas a ele, em relagao a este aspecto, aparecem expressas nas colocagoes de CASTRO e G U IMARAES(3) que, embora considerem seminal 0 seu pensamento, 0 criticam por ter explorado, de forma secundaria , os efeitos das relagoes exterhas (principalmente das relagoes etnicas' e de genero) sobre a produyao. Esta mesma critica e feita por LlTLER(5) e THOMPSON (7). .
De acordo com CLAWSON e FANTASIA apud RAMALHd6:41 ), a principal fraqueza da obra de Burawoy esta no fato de este autor considerar que os trabalhadores, que participam do jogo do "making-out", pensam que estao restringindo a produ9ao, mas simultaneamente, estao sendo levados a produzir mais do que estes teoricos, pois a afirma9ao de Burawoy sugere que os trabalhadores sao desprovidos da consciencia de explora9ao, a ponto de se submeterem a um esquema de produ9ao de mais valia superior aquele que ocorre sob coeryao. Dizem ainda, que, ao contrario, pode-se pensar que os trabalhadores que se empenharam em maximizar a produ9ao (e portanto, os lucros) estao tambem ganhando experiencia e criando condigoes que tornariam
possivel a transformagao do processo de trabalho. . .
Somando-se a estes autores, KNIGHTS(4:31 1 ) considera que a mais seria fraqueza de Burawoy . .. esta na tendencia em cair em uma teoia essenciaista da natureza humana. Esse essencialismo, segundo este autor, impede Burawoy de explicar a preocupa9ao do ponto de produ9ao com 0 sucesso no jogo. Para ele . .. uma pate dessa expicaqJo deve estar na preocupaqJo dos homens
com sua pr6pria identidade mascu/ina, mas Burawoy e 'cego ' no que concene a questoes de gtmeo. RAMALHo'6:42) diz que pela analise de KN IGHTS, Burawoy . . . fechou qua/quer possibii dade de aprofundar a analise da subjetividade e simp/esmente repete uma fraqueza da teoria do pocesso trabalho: a nlo investigaqlo de subjetividade . . .
Apesar das criticas, a obra d e Burawoy e muito rica , nao apenas por suas contribuicOes sobre o processo de trabalho, como tambem pela gama de questoes que coloca a disposi9ao do leitor, para futuras investigayOes. Sugere por exemplo, pesquisas que podem ser desenvolvidas de quatro maneiras: primeiro, . . uma analise mais cuidadosa das tendencias atuais do modo de poduqlo
capitaista - das contradiqaes e crises que elas pomovem . . . ; terceiro, uma investiga9ao das .. .
condiqoes em que estes mecanismos deverlo ser ativados para neutraizar 0 desenvo/vimento de crises ou contradiqoes - poblema que intimamente envolve lutar e a maneira que elas slo formadas pelas pol/ticas e pela ideologia; quarto, uma investigagao das .. . circunstancias em que este mecanisme tem, realmente, a capacidade para compensar crises ou contradiaes . . . (p. 62) .
358 R . Bras. Enferlll. Brasilia, v. 46, n . 3/4, 3 57-359, juidez. 1 993
---Oa analise de As Poticas de Poduq!O , consideramos que outras questoes continuam em
abeto, ou seja: a separavao entre concep:ao e execu:ao e, realmente, um principio inerente ao capitalismo? Como 0 jogo funciona para promover a convergencia de interesses entre capital e trabalho? Por que os trabalhadores consentem em ser explorados ate 0 limite maximo? 0 consentimento esta vinculado a falsa consciencia ou a consciencia da Gondi;ao de homem livre? Em que medida a desqualifica;ao do trabalhador favorece 0 consentimento? Como 0 desen volvimento da subjetividade e possibilitado no ponto de prod u:ao , independente de fatores eter nos?
E
necessario reintroduzir 0 sujeito desaparecido, como sugere THOMPSON(7) ou (re) descobri-Io nos limites dados pela estrutura da qual faz parte?Finalmente, tomamos 0 que nos diz KNIGHTS(4) de que Burawoy nao ve dificuldade em atribuir a toda a gerencia 0 interesse comum em ocultar e garantir a mais valia e·a sua sugestao de que, para ser consistente, Burawoy deveria investigar como interesse e ideologia sao gerados e reproduzidos no cotidiano do trabalho do gerente.
REFERENCIAS BI BLIOG RAFICAS
1 . BRAVERMAN, Harry. Trabalho e capital lIIonopolista: a degrada:io do trabalho no seculo XX. Trad,ao por
Nathanael C. Caixeiro. 3. ed. Rio d� Janeiro : Zahar, 1 9 8 1 ,
3 79 p .
2. BURA WOY, M ichael ( 1 99 1 ). TIl! anthropology of industrial work. Annual Review of Anthropoloyc Palo Alto (Califomia), n. 8 p. 23 1 -266, 1 979.
3. CASTRO, Nadya Aralljo, GUIMAR.ES, Antonio Sergio Al fredo. Alem de Bravennan, depois d� Burawoy: vert!ntes analiticas na sociologia do trabalho. Revista Brasileira de
Ciencia Sociais, nO 1 7, a. 6, p. 44-52, out. 1 99 1 .
4. KNIGHTS, David. Subj ectivity, po,ver and the labour proc ess. In: KNIGHTS, David, W ILLMO', Hugh (orgs.). Labour process theory. London: M acmi l lan, 1 990.
5. LITTLER, Craig R. ·n! labour process debates: a theoretical
reviews 1 974- 1 9 88. In : KN IGHTS, David, WILLMOTT,
Hugh (orgs). Labour process theory. London : M acmillan,
1 990.
6. RAM ALBO, Jose Ricardo. Controle, conlito e consenti mento na teoria do processo do trabalho: um balanyo do debate. BB. Rio de Janeiro, n. 32, p. 3 1 -49, 1 99 1 . 7 . THOM PSON, Pau\ . Crawling from the wreckage : the labour
process and the politics of production. In: KNIGHTS, David, W I LLMOTI, Hugh (orgs). Labour process theory.
London: Maclllillan. 1 990.