Vamos supor, como na geometria plana, que nossa geometria possui uma func¸ ˜ao dist ˆancia, isto ´e, uma func¸ ˜ao que a cada par de pontos A e B associa um n ´umero real d (A, B) que satisfaz:
d (A, B) ≥ 0 e d (A, B) = 0 ⇔ A = B. d (A, B) = d (B, A)
d (A, B) ≤ d (A, C) + d (C, B). Definic¸ ˜ao
Com esta func¸ ˜ao, definimos a medida de um segmento AB, que ser ´a denotado por AB como
Muitos resultados envolvendo a dist ˆancia entre dois pontos ou comprimento de segmentos nos ajudam a calcular dist ˆancia entre pontos. Um deles ´e o Teorema de Pit ´agoras. Isto ocorre porque muitas vezes dispomos das medidas das projec¸ ˜oes de um segmento segundo duas direc¸ ˜oes perpendiculares. Esta situac¸ ˜ao frequentemente ocorre tamb ´em no espac¸o.
Novamente, a ferramenta a utilizar ´e o Teorema de Pit ´agoras. Diagonal de um paralelep´ıpedo
Consideremos o problema de calcular a diagonal BH = D de um paralelep´ıpedo ret ˆangulo ABCEFGHI de arestas
AB = b, AF = a e AC = c. Vamos aplicar o teorema de Pit ´agoras nos tri ˆangulos ret ˆangulos 4ECH e 4BEH (este segundo tri ˆangulo ´e ret ˆangulo porque BE ´e perpendicular ao plano da base e, assim, perpendicular `a reta←EH que est ´a→ contida nesta base). Temos:
EH2=a2+b2(no tri ˆangulo4ECH)
e
D2=EH2+c2(no tri ˆangulo4BEH). Logo,
D2=a2+b2+c2.
Em particular, a diagonal de um cubo de aresta a mede D = a√3.
Dados um ponto P e um plano α no espac¸o, a dist ˆancia entre P e o plano ´e definida como a menor dist ˆancia poss´ıvel entre P e um ponto do plano. O ponto do plano que se situa a menor dist ˆancia de P ´e exatamente aquele que se encontra na intersec¸ ˜ao da reta passando por P que ´e perpendicular ao plano. Portanto, a dist ˆancia do ponto P ao plano ´e o comprimento do segmento de reta entre estes dois pontos.
Note que se R ´e um outro ponto qualquer do plano, o tri ˆangulo 4PQR ´e ret ˆangulo e tem PQ como cateto e PR como
hipotenusa. Assim, o comprimento da perpendicular PQ ´e menor que o comprimento de qualquer obl´ıqua PR.
Exemplo
Em um tetraedro regular ABCD de aresta a, qual ´e a dist ˆancia do v ´ertice A ao plano BCD? (Isto ´e, qual ´e altura do tetraedro?)
Empregamos, mais uma vez o teorema de Pit ´agoras. Seja H a projec¸ ˜ao de A sobre o plano BCD. J ´a vimos antes que o ponto H ´e o centro do tri ˆangulo equil ´atero 4BCD. Examinemos o tri ˆangulo ret ˆangulo 4AHB. O lado AB ´e a aresta do tetraedro; logo, AB = a. O lado HB ´e o raio do c´ırculo circunscrito no tri ˆangulo equil ´atero de lado a; logo
HB = a √
3 3 . Temos ent ˜ao que
AH2+ a √ 3 4 !2 =a2,
o que implica que
AH = a √
6 3 .
Na figura representamos n ˜ao somente o tri ˆangulo 4AHB mas a sec¸ ˜ao completa (o tri ˆangulo 4ABM) determinada no
tetraedro regular pelo plano que o cont ´em. O ponto M ´e o ponto m ´edio da aresta CD. No tri ˆangulo 4ABM aparecem quase todos os elementos m ´etricos importantes do tetraedro regular. Al ´em da altura do tetraedro (que ´e a altura relativa a A do tri ˆangulo 4ABM), nele aparecem o ˆangulo entre duas faces, o ˆangulo entre uma aresta e uma face, a dist ˆancia entre arestas opostas e os raios das esferas inscrita, circunscrita e tangente `as arestas do tetraedro.
As possiveis posic¸ ˜oes entre reta e plano s ˜ao: eles se cruzam ou s ˜ao paralelos. No primeiro caso, a dist ˆancia entre eles ´e nula. Vamos ver que no segundo caso est ´a bem definida a dist ˆancia da reta e plano. De fato, se uma reta r ´e paralela a um plano, todos os seus pontos est ˜ao a igual dist ˆancia do plano. De fato, se de dois pontos P1e P2da reta r paralela a α
trac¸amos as perpendiculares P1Q1e P2Q2a α, obtemos um
ret ˆangulo P1P2Q2Q1. Logo, P1Q1=P2Q2.
A dist ˆancia entre a reta e o plano, neste caso, ´e dada pela distancia entre um ponto da reta e o plano.
Analogamente, se β ´e um plano paralelo a α, todos os seus pontos est ˜ao `a mesma dist ˆancia d de α. O n ´umero d ´e a dist ˆancia entre os planos α e β. Note que d ´e igual ao comprimento do segmento determinado pelos planos em qualquer reta perpendicular a ambos. Note tamb ´em que qualquer segmento de extremos em α e β tem comprimento maior do que ou igual a d .
Dado um ponto P e uma reta r do espac¸o, o ponto Q em que a reta r corta o plano perpendicular a r passando por P ´e
O comprimento do segmento PQ ´e a dist ˆancia de P a r .
Quando P n ˜ao pertence `a reta r , os pontos P e Q s ˜ao distintos e←PQ ´e a ´unica reta perpendicular a r trac¸ada por P (P e r→ definem um ´unico plano e, neste plano, PQ ´e a ´unica perpendicular a r passando por P). Se R ´e um outro ponto qualquer de r , o tri ˆangulo 4PQR tem hipotenusa PR e cateto PQ; logo PQ < PR (isto ´e, o comprimento da perpendicular ´e menor que o comprimento de qualquer obl´ıqua).
Assim, o c ´alculo da dist ˆancia de um ponto a uma reta envolve o trac¸ado da perpendicular `a reta passando pelo ponto. Uma situac¸ ˜ao muito comum ´e aquela onde a reta r esteja situada sobre umplano de refer ˆencia(por exemplo, o plano do ch ˜ao). Nestas situac¸ ˜oes, ´e muitas vezes desej ´avel que a construc¸ ˜ao da reta perpendicular se apoie em elementos deste plano de refer ˆencia. Isto se torna simples com o aux´ılio do chamado Teorema das Tr ˆes Perpendiculares.
Teorema
Se por um ponto P trac¸amos a perpendicular PP0 ao plano α e por um ponto qualquer Q de α trac¸amos a reta r perpendicular a←P−0→Q, ent ˜ao a reta←PQ ´e perpendicular a r .→
Basta observar que as retas←→PP0 e←P−0→Q s ˜ao ambas ortogonais a r , j ´a que←→PP0 ´e perpendicular a um plano contendo r e←P−0→Q ´e perpendicular a r . Logo, o plano definido por essas retas ´e perpendicular a r e, portanto, a reta←PQ desse plano ´e→ perpendicular a r .
Observe que a dist ˆancia de P a r (isto ´e, o comprimento do segmento PQ) pode ser calculada com o aux´ılio do Teorema de Pit ´agoras, uma vez conhecidos os comprimentos dos segmentos PP0 (dist ˆancia de P a α) e P0Q (dist ˆancia de P0 `a reta r ). Em muitos problemas pr ´aticos, estas duas ´ultimas dist ˆancias s ˜ao f ´aceis de calcular, bastando escolher convenientemente oplano de refer ˆenciacontendo r . Exemplo
Considere um paralelep´ıpedo ret ˆangulo ABCDEFGH em que AB = 15, AD = 20 e AE = 16. Qual a medida do menor segmento que liga o v ´ertice E a um ponto da reta←BD?→
A perpendicular baixada de E ao plano ABCD corta esse plano em A; da´ı, trac¸amos a perpendicular AM a BD. Pelo teorema das tr ˆes perpendiculares, EM ´e perpendicular a BD e ´e, portanto, o menor segmento que liga E a BD. Para calcular seu comprimento, trabalhamos em dois tri ˆangulos ret ˆangulos. No tri ˆangulo 4ABD, conhecemos os catetos AB = 15 e AD = 20; da´ı, obtemos a hipotenusa BD = 25 e a altura
AM = 15 × 20 25 =12.
No tri ˆangulo 4EAM s ˜ao conhecidos os catetos EA = 16 e AM = 12. Da´ı, obtemos a hipotenusa EM = 20.
Vimos acima diversos casos em que definimos a dist ˆancia entre duas figuras, isto ´e, dois conjuntos de pontos do espac¸o. Todos estes casos s ˜ao situac¸ ˜oes particulares abrangidas pela seguinte definic¸ ˜ao: dadas duas figuras F1e F2, definimos a
dist ˆancia entre F1e F2como o comprimento do menor
segmento que tem extremos em F1e F2.
Por exemplo, a dist ˆancia de um ponto a um plano foi definida de modo a ser, de fato, o comprimento do menor segmento com um extremo no ponto dado e outro no plano.
Vamos empregar esta definic¸ ˜ao para um par de retas do espac¸o. Segundo esta definic¸ ˜ao, a dist ˆancia entre duas retas concorrentes (ou coincidentes) ´e igual a zero. Se as retas s ˜ao paralelas (logo coplanares), ocorre uma situac¸ ˜ao j ´a estudada na Geometria Plana: cada ponto da primeira reta est ´a a uma dist ˆancia constante da segunda. Esta dist ˆancia constante (que ´e o comprimento do segmento determinado por qualquer perpendicular a ambas) ´e a dist ˆancia entre as retas.
A dist ˆancia entre duas retas reversas dever ´a ser dado pela menos dist ˆancia entre dois pontos, um em cada reta.
A dist ˆancia entre duas retas reversas, r e s, ´e a dist ˆancia entre um ponto qualquer de uma delas e o plano que passa pela outra e ´e paralelo `a primeira reta.
Observe que esta ´e a dist ˆancia entre os dois planos paralelos tais que cada um contem uma das duas retas reversas.
Vamos provar que de fato existem pontos, um em cada reta, tais que a dist ˆancia entre estes pontos ´e a dist ˆancia entre as retas reversas e que de fato esta ´e menor dist ˆancia entre dois pontos, um em cada reta.
Construc¸ ˜ao da perpendicular comum a duas retas
reversas.
Vamos provar que existe uma reta perpendicular comum a um par de retas reversas.
Comec¸amos por trac¸ar o par de planos paralelos α e β contendo cada uma das retas (para obter tais planos basta construir, por um ponto de cada uma das retas, uma paralela `a outra). A seguir, por um ponto A1qualquer de r trac¸amos uma
reta t, perpendicular ao plano β, que o corta em B1. Por B1,
trac¸amos a paralela r0a r . A reta r0 est ´a contida em β e corta s no ponto B2. Finalmente, por B2trac¸amos a reta t0 paralela a
←−→
A1B1. Note que as retas t0, t, r e r0 est ˜ao todas em um mesmo
A reta t0 forma ˆangulo reto com r e s (por ser perpendicular aos planos α e β) e ´e concorrente com ambas. E, portanto, uma perpendicular comum a r e s.
A perpendicular comum←−→A2B2entre as reversas r e s
constru´ıda acima ´e ´unica; basta observar que se existisse outra perpendicular comum←CD, ela seria necessariamente→ paralela a←−→A2B2, por serem ambas perpendiculares aos planos
αe β. Mas assim os pontos C, D, A2e B2estariam todos no
mesmo plano. Desta forma, as retas r e s seriam coplanares, o que ´e uma contradic¸ ˜ao.
Como a perpendicular comum a r e s ´e tamb ´em a
perpendicular comum aos planos α e β, o comprimento do segmento por ela determinado ´e o menor comprimento poss´ıvel de um segmento cujos extremos sejam quaisquer pontos de α e β. Em particular, como r e s est ˜ao
respectivamente contidas em α e β, qualquer segmento com extremos nesta reta ter ´a comprimento maior que o segmento da perpendicular comum. Logo, o comprimento do segmento da perpendicular comum exprime a dist ˆancia entre as duas retas.
ˆ
Angulo Entre Retas
J ´a vimos como podemos medir ˆangulo entre retas quaisquer no espac¸o: basta tomar duas retas paralelas a elas passando por um ponto arbitr ´ario. O ˆangulo formado por essas retas concorrentes ´e o ˆangulo formado pelas retas dadas inicialmente. Conv ´em lembrar, da Geometria Plana, que o ˆangulo formado por duas retas concorrentes ´e definido como o menor dos quatro ˆangulos que elas formam; est ´a, portanto, compreendido entre 0o(quando as retas s ˜aoparalelas ou
ˆ
Angulo Entre Planos
Ao definir planos perpendiculares j ´a introduzimos a forma pela qual o ˆangulo entre dois planos α e β ´e medido. Quando α e β s ˜ao secantes, trac¸amos um plano γ perpendicular `a reta de intersec¸ ˜ao de α e β, que corta α e β segundo as retas r e s, respectivamente. A medida do ˆangulo entre os planos ´e, por definic¸ ˜ao, igual `a medida do ˆangulo entre as retas r e s ( ´e, assim, um valor entre 0oe 90o). Note que este ˆangulo ´e o mesmo qualquer que seja o plano: todos os planos
perpendiculares `a reta de intersec¸ ˜ao de α e β s ˜ao paralelos entre si, determinando com α e β retas de intersec¸ ˜ao respectivamente paralelas.
Teorema
O ˆangulo formado por dois planos ´e igual ao ˆangulo formado por duas retas respectivamente perpendiculares a estes planos.
Prova. Tomemos agora um ponto A qualquer sobre o plano γ e a partir dele trac¸amos as retas r0 e s0 perpendiculares a α e β. Estas retas est ˜ao contidas em γ e s ˜ao perpendiculares a r e s, respectivamente. Portanto, o ˆangulo formado por r0e s0 ´e igual ao ˆangulo formado por r e s, que por sua vez ´e igual ao ˆangulo formado pelos planos.
Definic¸ ˜ao
Um diedro (ou ˆangulo diedro) ´e a figura formada por dois semiplanos -chamados de faces do diedro- limitados pela mesma reta,chamada de aresta do diedro.
Para medir um diedro, trac¸amos um plano perpendicular `a aresta e medimos o ˆangulo entre as semirretas determinadas em cada face. Observe que a medida de um ˆangulo diedro pode variar entre 0oe 180o. Note tamb ´em que o ˆangulo entre dois planos secantes ´e igual `a medida do menor diedro formado por eles.
ˆ
Angulo entre Reta e Plano
Vejamos agora como definir o ˆangulo entre uma reta e um plano. Naturalmente, este ˆangulo dever ´a ser igual a 90o quando a reta ´e perpendicular ao plano e dever ´a ser igual a zero quando a reta est ´a contida no plano ou ´e paralela a ele. Se uma reta r ´e obl´ıqua a um plano α, definimos o ˆangulo entre r e α como o ˆangulo que r forma com sua projec¸ ˜ao ortogonal r0 sobre α.
Teorema
O ˆangulo entre uma reta r e um plano ´e igual ao menor ˆangulo formado por r e uma reta qualquer do plano.
Prova. Consideremos uma reta qualquer s contida no plano α e vamos comparar o ˆangulo θ0 formado por r e s com o ˆangulo θformado por r e α. Podemos supor que s passa pelo ponto O em que r corta α. Por um ponto P de s exterior a α tracemos a perpendicular←PQ ao plano α, Q ∈ α e a perpendicular→ ←PR `a→ reta s. Os tri ˆangulos ret ˆangulos 4OQP e 4ORP t ˆem a hipotenusa comum OP, enquanto os catetos opostos aos ˆangulos θ e θ0 s ˜ao tais que PR > PQ. Em consequ ˆencia, sen θ0 > sen θ e, assim, θ0 > θ. Al ´em disso, a igualdade s ´o ocorre quando a reta s ´e a projec¸ ˜ao ortogonal de r sobre α.
Exemplo
A figura abaixo mostra a planta do telhado de uma casa. Cada plano contendo uma porc¸ ˜ao do telhado ´e chamado de “ ´agua”; o telhado da figura, portanto, possui 4 ´aguas. Ao longo da reta de intersec¸ ˜ao de duas ´aguas corre uma calha. Sabendo que cada ´agua ´e inclinada de 30oem relac¸ ˜ao `a horizontal, qual ´e a
inclinac¸ ˜ao em relac¸ ˜ao `a horizontal da calha AM assinalada na figura?
A figura abaixo mostra uma vista em perspectiva do telhado, no qual est ˜ao representados os pontos P, Q e R, obtidos,
respectivamente, projetando o ponto M sobre as beiradas AB e AD do telhado e sobre o plano ABCD.
Os ˆangulos que as ´aguas ABM e ADMN formam com a horizontal s ˜ao iguais, respectivamente, aos ˆangulos ∠MPR e ∠MQR. Como estes ˆangulos s ˜ao ambos iguais a 30o, os tri ˆangulo ret ˆangulos 4MQR e 4MPR s ˜ao congruentes, j ´a que possuem um cateto comum MR. Assim, designando a menor dimens ˜ao do ret ˆangulo ABCD, por 2a temos:
RP = RQ = a e MR = RQtg30o=a √
3 3
O ˆangulo α que a reta←→AM forma com o plano horizontal ´e igual ao ˆangulo ∠RAM do tri ˆangulo ret ˆangulo 4MAR, do qual conhecemos os catetos MR (calculado acima) e AR (diagonal do quadrado APRQ). Assim:
tgα = MR AR = a √ 3 3 a√2 = √ 6 6 Logo, α ∼= 22o.
A Esfera
Ceratamente a figura geom ´etrica mais diretamente ligada com a noc¸ ˜ao de dist ˆancia ´e a esfera:
Definic¸ ˜ao
Asuperf´ıcie esf ´erica(ou simplesmenteesfera) de centro O e raio R ´e o conjunto dos pontos do espac¸o cuja dist ˆancia a O ´e igual a R.
A esfera ´e o an ´alogo tridimensional do c´ırculo, inclusive na ambiguidade de terminologia: a palavra esfera tanto pode ser usada para se referir `a superf´ıcie esf ´erica quanto ao s ´olido por ela determinado.
A posic¸ ˜ao de um ponto em relac¸ ˜ao a uma esfera ´e
determinada pela sua dist ˆancia ao centro da esfera. Assim, pontos cuja dist ˆancia ao centro sejamenor que,maior que, ou igualao raio s ˜ao, respectivamente,interiores,exterioresou est ˜ao sobrea superf´ıcie da esfera.
A esfera ´e o an ´alogo tridimensional do c´ırculo, inclusive na ambiguidade de terminologia: a palavra esfera tanto pode ser usada para se referir `a superf´ıcie esf ´erica quanto ao s ´olido por ela determinado.
A posic¸ ˜ao de um ponto em relac¸ ˜ao a uma esfera ´e
determinada pela sua dist ˆancia ao centro da esfera. Assim, pontos cuja dist ˆancia ao centro sejamenor que,maior que, ou igualao raio s ˜ao, respectivamente,interiores,exterioresou est ˜ao sobrea superf´ıcie da esfera.
Da mesma forma, a posic¸ ˜ao de uma reta ou plano em relac¸ ˜ao a uma esfera ´e determinada pela dist ˆancia do centro a esta reta ou plano. Quando a dist ˆancia ´e maior que o raio, temos uma reta ou plano exterior `a esfera (ou seja, sem pontos de intersec¸ ˜ao com a esfera).
Da mesma forma, a posic¸ ˜ao de uma reta ou plano em relac¸ ˜ao a uma esfera ´e determinada pela dist ˆancia do centro a esta reta ou plano. Quando a dist ˆancia ´e maior que o raio, temos uma reta ou plano exterior `a esfera (ou seja, sem pontos de intersec¸ ˜ao com a esfera).
Uma reta ou plano cuja dist ˆancia ao centro seja exatamente igual ao raio ´e tangente `a esfera; isto ´e, tem apenas um ponto em comum com a esfera. Este ponto ´e justamente o p ´e da perpendicular conduzida do centro da esfera a esta reta ou plano.
Finalmente, se a dist ˆancia ao centro ´e menor que o raio, a reta ou plano ´e secante `a esfera.
A intersec¸ ˜ao de uma reta secante com a esfera ´e um par de pontos, enquanto um plano secante corta a esfera segundo um c´ırculo. De fato, os pontos de intersec¸ ˜ao de um plano com uma esfera s ˜ao os pontos P do plano cuja dist ˆancia PO ao centro O da esfera ´e igual a seu raio R. Seja Q o p ´e da perpendicular baixada de O ao plano α.
Qualquer que seja o ponto P em α, o tri ˆangulo 4POQ ´e ret ˆangulo em Q. Logo, PO2=PQ2+OQ2e, assim, PO = R se e somente se PQ2=R2− d2, onde d = OQ ´e a dist ˆancia
de O a α. Portanto, quando d < R, os pontos de α que est ˜ao na esfera se encontram em um c´ırculo de centro Q e raio r =√R2− d2. Observe que esse raio ´e m ´aximo quando d = 0
(isto ´e, quando o plano cont ´em o centro da esfera). C´ırculos assim obtidos s ˜ao chamados dec´ırculos m ´aximosda esfera e t ˆem o mesmo centro e o mesmo raio que a esfera.
Exemplo
Calcule o raio das esferas circunscrita, inscrita e tangente `as arestas a um cubo de aresta a.
Em qualquer paralelep´ıpedo, todas as diagonais (isto ´e, os segmentos que ligam v ´ertices opostos) t ˆem um ponto comum, que ´e o ponto m ´edio de cada uma delas (basta observar que as diagonais de um paralelep´ıpedo s ˜ao, duas a duas, diagonais de paralelogramos. O ponto de intersec¸ ˜ao das diagonais ´e, na verdade, o centro de simetria do paralelep´ıpedo. Se o
paralelep´ıpedo ´e ret ˆangulo, todas as diagonais t ˆem o mesmo comprimento; logo, existe uma esfera centrada nesse ponto e que passa por todos os v ´ertices. Essa esfera ´e chamada de esfera circunscrita ao paralelep´ıpedo. No caso do cubo, o centro ´e tamb ´em equidistante das 6 faces e equidistante das 12 arestas. Logo, com o mesmo centro, existe tamb ´em uma esfera tangente `as faces (que ´e a esfera inscrita no cubo) e uma esfera tangente `as arestas. ´E f ´acil ver que os raios das esferas circunscrita, inscrita e tangente `as arestas do cubo t ˆem raios respectivamente iguais `a metade de uma diagonal, `a metade da aresta e `a metade da diagonal de uma face.
Logo, esses raios s ˜ao respectivamente: R = a √ 3 2 , r = a 2, e r 0 = a √ 2 2
Vamos aqui estudar, de uma forma geral, os s ´olidos formados porfaces, os chamados poliedros. Dizer apenas que poliedros s ˜ao s ´olidos formados por faces (partes limitadas de um plano), pode dar uma ideia do que eles sejam, mas n ˜ao serve
absolutamente como definic¸ ˜ao. Ali ´as, uma das causas da dificuldade que os matem ´aticos do passado tiveram para demonstrar teoremas sobre poliedros, estava justamente na falta de uma definic¸ ˜ao precisa do significado dessa palavra. Ainda que tomassemos a seguinte definic¸ ˜ao:
Definic¸ ˜ao
Poliedro ´e uma reuni ˜ao de um n ´umero finito de pol´ıgonos planos, onde cada lado de um desses pol´ıgonos ´e tamb ´em lado de um, e apenas um, outro pol´ıgono. Cada um desses pol´ıgonos chama-se umafacedo poliedro, cada lado comum a duas faces chama-se umaaresta do poliedro e cada v ´ertice de uma face ´e tamb ´em chamadov ´erticedo poliedro.
Esta definic¸ ˜ao permite que a seguinte figura seja classificada como poliedro:
Para evitar tal tipo de figura iremos incluir em nossa definic¸ ˜ao mais uma restric¸ ˜ao:
Definic¸ ˜ao
Poliedro ´e uma reuni ˜ao de um n ´umero finito de pol´ıgonos planos chamados faces onde:
1 Cada lado de um desses pol´ıgonos ´e tamb ´em lado de um,
e apenas um, outro pol´ıgono.
2 A intersec¸ ˜ao de duas faces quaisquer ou ´e um lado
comum, ou ´e um v ´ertice ou ´e vazia. Cada lado de um pol´ıgono, comum a exatamente duas faces, ´e chamado uma aresta do poliedro e cada v ´ertice de uma face ´e um v ´ertice do poliedro.
3 E sempre poss´ıvel ir de um ponto de uma face a um ponto´
de qualquer outra, sem passar por nenhum v ´ertice (ou seja, cruzando apenas arestas).
Todo poliedro (no sentido da definic¸ ˜ao anterior), limita uma regi ˜ao do espac¸o chamada de interior desse poliedro. Dizemos que um poliedro ´econvexose o seu interior ´e convexo. Vamos recordar o que isto significa:
Definic¸ ˜ao
Um conjunto C, do plano ou do espac¸o, diz-se convexo, quando qualquer segmento de reta que liga dois pontos de C est ´a inteiramente contido em C.
No caso dos poliedros, podemos substituir essa definic¸ ˜ao por outra equivalente, que nos ser ´a mais ´util:
Definic¸ ˜ao
Um poliedro ´e convexo se qualquer reta (n ˜ao paralela a nenhuma de suas faces) o corta em, no m ´aximo, dois pontos.
As Primeiras Relac¸ ˜
oes
Dado um poliedro, vamos agora tratar do problema de contar as suas faces, os seus v ´ertices, e as suas arestas.
Representaremos ent ˜ao por A, o n ´umero de arestas, por F , o n ´umero de faces e por V o seu n ´umero de v ´ertices. Ainda, como as faces podem ser de g ˆeneros diferentes,
representaremos por Fn(n > 3), o n ´umero de faces que
possuem n lados. Da mesma forma, como os v ´ertices tamb ´em podem ser de g ˆeneros diferentes, representaremos por Vno
n ´umero de v ´ertices nos quais concorrem n arestas, e observe que, pelo item (2) da definic¸ ˜ao do poliedro, cada v ´ertice ´e um ponto comum a tr ˆes ou mais arestas. S ˜ao ent ˜ao evidentes as relac¸ ˜oes:
F = F3+F4+ · · · ,
Imagine agora que o poliedro foi desmontado e que todas as faces est ˜ao em cima de sua mesa. Quantos lados todos esses pol´ıgonos possuem? F ´acil. Basta multiplicar o n ´umero de tri ˆangulos por 3, o n ´umero de quadril ´ateros por 4, o n ´umero de pent ´agonos por 5 e assim por diante, e depois somar os resultados. Mas, como cada aresta do poliedro ´e lado de exatamente duas faces, a soma anterior ´e igual ao dobro do n ´umero de arestas, ou seja,
2A = 3F3+4F4+5F5+ · · · .
Podemos tamb ´em contar as arestas observando os v ´ertices do poliedro. Se em cada v ´ertice contarmos quantas arestas nele concorrem, somando os resultados obteremos tamb ´em o dobro do n ´umero de arestas (porque cada aresta ter ´a sido contada duas vezes: em um extremo e no outro). Logo,
Duas Desigualdades Dessas primeiras relac¸ ˜oes entre os elementos de um poliedro podemos deduzir duas
desigualdades: 1 2A ≥ 3F 2 2A ≥ 3V De fato, 2A = 3F3+4F4+5F5+ · · · 2A = 3(F3+F4+F5+ · · · ) +F 4 + 2F 5 + · · · 2A = 3F + F4+2F5+ · · · 2A ≥ 3F
Repare que a igualdade s ´o vale se F4=F5= · · · =0, ou seja,
se o poliedro tiver apenas faces triangulares. A segunda desigualdade se justifica de forma an ´aloga e, neste caso, a igualdade ocorrer ´a apenas quando em todos os v ´ertices concorrerem 3 arestas.
O resultado central deste cap´ıtulo ´e o Teorema de Euler. Seu enunciado, por sua beleza e simplicidade, costuma fascinar os alunos quando tomam contato com ele pela primeira vez:
V − A + F = 2.
A observac¸ ˜ao do resultado em desenhos de poliedros ou em objetos do cotidiano ´e estimulante e, sobretudo, intrigante. Porque sempre ocorre isso? Na verdade, a relac¸ ˜ao de Euler n ˜ao ´e verdadeira para todos os poliedros de acordo com nossa definic¸ ˜ao. Mas, para os poliedros convexos ela ´e verdadeira. Em contextos mais gerais, onde inclusive se adota uma definic¸ ˜ao de poliedro menos restritiva que a nossa, o valor de V − A + F ´e chamado de caracter´ıstica do poliedro.
O Teorema de Euler foi descoberto em 1758. Desde ent ˜ao, diversas demonstrac¸ ˜oes apareceram na literatura e algumas continham falhas (como a de Cauchy), que foram descobertas muitos anos mais tarde. Essas falhas eram devidas `a falta de precis ˜ao na definic¸ ˜ao de poliedro. Mesmo Euler nunca se preocupou em definir precisamente essa palavra. A
demonstrac¸ ˜ao que mostraremos aqui para poliedros convexos segue quase integralmente a que foi publicada na RPM no. 3 (1983) pelo professor Zoroastro Azambuja Filho.
Teorema
(Teorema de Euler) Em todo poliedro convexo com A arestas, V v ´ertices e F faces, vale a relac¸ ˜ao
Prova. Iniciamos a demonstrac¸ ˜ao calculando a soma dos ˆangulos internos de todas as faces de um poliedro convexo P. As faces s ˜ao numeradas de 1 at ´e F e seja nk o g ˆenero da
k - ´esima face (1 ≤ k ≤ F ). Lembrando que a soma dos ˆangulos internos de um pol´ıgono convexo de g ˆenero n ´e igual a π(n − 2) e observando que se um poliedro ´e convexo ent ˜ao todas as suas faces s ˜ao pol´ıgonos convexos, teremos para a soma dos ˆangulos internos de todas as faces de P a express ˜ao:
S = π(n1− 2) + π(n2− 2) + · · · + π(nF − 2)
ou ainda,
S = π[(n1+n2+ · · · +nF) − (2 + 2 + · · · + 2)].
No primeiro par ˆentese, a soma dos n ´umeros de lados de todas as faces ´e igual ao dobro do n ´umero de arestas e no segundo par ˆentese, a soma das F parcelas ´e igual a 2F . Assim,
Vamos agora calcular o valor de S. Para isso vamos introduzir a noc¸ ˜ao de regi ˜ao iluminada e regi ˜ao sombria de um poliedro em relac¸ ˜ao a uma direc¸ ˜ao.
Vamos agora escolher uma reta r que n ˜ao seja paralela a nenhuma das faces de P. Tomamos tamb ´em um plano H, que n ˜ao intersecta P e que seja perpendicular a r . O plano H ser ´a chamado plano horizontal e as retas paralelas a r (logo
perpendiculares a H) ser ˜ao chamadas retas verticais. H divide o espac¸o em dois semi-espac¸os, um dos quais cont ´em o poliedro P. Este ser ´a chamado o semi-espac¸o superior e diremos que seus pontos est ˜ao acima de H. Para melhor ilustrar o nosso racioc´ınio, imaginaremos o sol brilhando a pino sobre o semi-espac¸o superior de modo que seus raios sejam retas verticais.
A cada ponto X do semi-espac¸o superior corresponde um ponto X0 em H, chamado sombra de X . A sombra de qualquer conjunto C, contido no semiespac¸o superior ´e, por definic¸ ˜ao, o conjunto C0, contido em H, formado pelas sombras dos pontos de C.
Consideremos ent ˜ao a sombra P0do poliedro P. Como P ´e convexo, cada ponto de P0 ´e sombra de um ou dois pontos de P (veja a nossa definic¸ ˜ao alternativa de poliedro convexo). Ora, a sombra P0 do poliedro P tem como contorno um pol´ıgono convexo K0, sombra de uma poligonal fechada K formada por arestas de P. Cada ponto de K0 ´e sombra de um ´unico ponto de P. A poligonal K ´e chamada de contorno aparente do poliedro P. Cada ponto interior de P0 (portanto n ˜ao
pertencente a K0) ´e sombra de exatamente dois pontos de P. Dados dois pontos de P que t ˆem mesma sombra, ao mais alto (mais distante de H) chamaremos ponto iluminado e o mais baixo ser ´a chamado sombrio. Depois dessas considerac¸ ˜oes, vamos calcular novamente a soma de todos os ˆangulos das faces de P, observando que a soma dos ˆangulos internos de uma face ´e a mesma soma dos ˆangulos internos de sua sombra (ambos s ˜ao pol´ıgonos de mesmo g ˆenero).
Sejam: V1o n ´umero de v ´ertices iluminados, V2o n ´umero de
v ´ertices sombrios e V0o n ´umero de v ´ertices do contorno
aparente K . Ent ˜ao, V = V0+V1+V2. Notemos ainda que V0 ´e
o n ´umero de v ´ertices (e de lados) da poligonal K0, contorno de P0.
Consideremos ent ˜ao a sombra das faces iluminadas. A sombra das faces iluminadas ´e um pol´ıgono convexo com V0v ´ertices
em seu contorno e V1pontos interiores, sombra dos v ´ertices
iluminados de P. A soma de todos os ˆangulos ´e: S1=2πV1+ π(V0− 2).
Por racioc´ınio inteiramente an ´alogo, obter´ıamos para a soma de todos os ˆangulos da sombra das faces sombrias,
S2=2πV2+ π(V0− 2).
Somando as duas, obtemos:
S = 2πV1+2πV2+2π(V0− 2)
S = 2π(V1+V2+V0− 2)
Comparando (F) e (FF) e dividindo por 2π, resulta que A − F = V − 2, ou seja,
V − A + F = 2, o que termina a demonstrac¸ ˜ao.
Coment ´arios ´
E f ´acil encontrar exemplos de poliedros n ˜ao convexos que satisfazem a relac¸ ˜ao de Euler. Por exemplo, se um
poliedro P n ˜ao convexo puder ser colocado em uma posic¸ ˜ao de modo que sua sombra seja um pol´ıgono onde cada um de seus pontos seja sombra de no m ´aximo dois pontos de P.
Todas as relac¸ ˜oes que encontramos s ˜ao apenas
condic¸ ˜oes necess ´arias. Isto quer dizer que n ˜ao basta que tr ˆes n ´umeros A, V e F satisfac¸am a elas para que se tenha certeza da exist ˆencia de um poliedro com essas
Exemplo
A bola de futebol que apareceu pela primeira vez na Copa de 70 foi inspirada em um conhecido poliedro convexo
(descoberto por Arquimedes) formado por 12 faces pentagonais e 20 faces hexagonais, todas regulares. Pergunta-se quantos v ´ertices possui tal poliedro.
De acordo com nossa notac¸ ˜ao, temos F5=12, F6=20 e
portanto F = 32. Determinamos em seguida o n ´umero de arestas desse poliedro:
2A = 5F5+6F6=5.12 + 6.20 = 180
Logo,
A = 90.
Como o poliedro ´e convexo, vale a relac¸ ˜ao de Euler V − A + F = 2,
de onde conclu´ımos que
Exemplo
Descreva e mostre uma possibilidade para o desenho de um poliedro convexo que possui 13 faces e 20 arestas.
Para provar a desigualdade 2A ≥ 3F , t´ınhamos encontrado a relac¸ ˜ao
2A = 3F + F4+2F5+ · · · .
ou seja,
2A − 3F = F 4 + 2F 5 + · · · .
Como A = 20 e F = 13, temos 1 = F4+2F5+ · · ·, o que s ´o ´e
poss´ıvel se F4=1 e F5=F6= · · · =0. Isto quer dizer que
este poliedro deve possuir uma ´unica face quadrangular e todas as outras 12 faces triangulares. Como pela relac¸ ˜ao de Euler ele deve possuir 9 v ´ertices.