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Divulgação científica e ensino de ciências no ensino médio : relato dos professores de física

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Academic year: 2021

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INSTITUTO FEDERAL DO ESPÍRITO SANTO

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO EM CIÊNCIAS E MATEMÁTICA

FRÉDÉRIC ANDRÉ ROBERT VAILLANT

DIVULGAÇÃO CIENTÍFICA E ENSINO DE CIÊNCIAS NO ENSINO MÉDIO: RELATOS DOS PROFESSORES DE FÍSICA

Vitória 2017

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FRÉDERIC ANDRÉ ROBERT VAILLANT

DIVULGAÇÃO CIENTÍFICA E ENSINO DE CIÊNCIAS NO ENSINO MÉDIO: RELATOS DOS PROFESSORES DE FÍSICA

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-graduação em Educação em Ciências e Matemática - Campus Vitória do Instituto Federal do Espírito Santo, como requisito parcial para obtenção do grau de Mestre em Educação em Ciências e Matemática.

Orientador: Prof. Dr. Carlos Roberto Pires Campos

Vitória 2017

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(Biblioteca Nilo Peçanha do Instituto Federal do Espírito Santo) V131d Vaillant, Frédéric André Robert.

Divulgação científica e ensino de ciências no ensino médio: relato dos professores de física / Frédéric André Robert Vaillant. – 2017.

185 f. : il. ; 30 cm

Orientadora: Carlos Roberto Pires Campos.

Dissertação (mestrado) – Instituto Federal do Espírito Santo, Programa de Pós-graduação em Educação em Ciências e Matemática, Vitória, 2017. 1. Física – Estudo e ensino. 2. Divulgação científica. 3. Educação – Estudo e ensino. 4. Ciências – Estudo e ensino. I. Campos, Carlos Roberto Pires. II. Instituto Federal do Espírito Santo. III. Título.

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A Emilia, minha esposa amada, companheira e amiga de todas as horas.

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AGRADECIMENTOS

A meus pais Michèle e Claude (in memoriam) para quem a cultura e a educação são bens preciosos. Obrigado pelo amor, pela visão humanista e pelo sonho compartilhado que um mundo mais justo é possível e necessário.

A Emilia, minha grande amiga e companheira de todas as horas, pelo amor, pela compreensão e o incentivo, pela paciência também nos meus momentos de fraqueza, e por todos os momentos maravilhosos que vivemos juntos.

A minha filha, Maria Clara, que cada dia me incentiva a me reinventar e a olhar o mundo com maravilha e amor.

Ao meu orientador, Carlos Roberto Pires Campos, por me acolher como orientando e por toda a atenção e aprendizado durante o Mestrado.

A todos os meus colegas de mestrado, pelas experiências e conhecimentos compartilhados, em especial aos membros do grupo de pesquisa DIVIPOP e às minhas amigas de estudo, Carime e Bianca, pelos momentos ricos e inesquecíveis.

À minha segunda família, pelo seu acolhimento e seu apoio, em especial a Carmen, Riane, Patrícia e Renata.

Aos amigos, em especial Fábio, Leonara, Elda e Helder, pelo incentivo e ajuda para concretizar este trabalho.

Aos membros da Banca Examinadora, Dr. Carlos Roberto Pires Campos, Dra. Maria Alice Veiga de Souza, Dr. Emmanuel Marcel Favre Nicolin e Dr. Antonio Carlos Frasson, como também às professoras Dra. Fernanda Zanetti Becalli e Dra. Manuela Villar Amado, pela riqueza de suas contribuições ao trabalho.

A todos os professores que aceitaram participar desta pesquisa, todo meu respeito e minha gratidão.

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Aos professores do Programa EDUCIMAT, Dr. Sidnei Quezada Meireles, Dr. Alex Jordan de Oliveira e Dra. Maria das Graças Ferreira Lobino, pela acolhida e generosidade em partilhar suas experiências sobre a educação.

Ao Pedagogo Alessandro Poleto Oliveira (EDUCIMAT), pela atenção e auxílio nos momentos em que precisei.

A todos os professores que contribuíram para a minha formação, e, em especial, a meu mestre do fundamental I, Pierre Giovanelli (in memoriam) pelo seu ensino humanista que ainda hoje é, para mim, uma fonte de emoção e de inspiração.

Por último, não poderia deixar de agradecer à Fundação de Amparo à Pesquisa e Inovação do Espírito Santo (FAPES) pela concessão de bolsa, essencial para realização e conclusão do meu trabalho.

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A capacidade de se atingir certos fins, de realizar certas atividades, não depende só de você, depende de certas condições. Tive uma grande sorte de ter tido oportunidades e de ter sabido aproveitá-las. Quando era menino, vi companheiros que não lograram desenvolver seu potencial, porque morreram ou foram encaminhados para atividades que aprisionam as pessoas. De qualquer maneira, acho que a coisa mais difícil que fiz foi permanecer fiel à minha classe de origem.

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MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO

INSTITUTO FEDERAL DO ESPÍRITO SANTO

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO EM CIÊNCIAS E MATEMÁTICA

RESUMO

As últimas décadas viram surgir a necessidade democrática de uma maior alfabetização científica, de modo a permitir ao cidadão uma leitura ampliada e crítica do mundo, que o capacite a participar dos debates e das decisões sociais e políticas ligadas à ciência e à tecnologia. Em face dessa demanda e das interrogações sobre as práticas pedagógicas no ensino de ciências, sobre o papel social da educação científica e da divulgação científica, é o momento de questionarmos sobre a relevância do diálogo entre o ensino de ciências e a divulgação científica. Nesse contexto, a questão de pesquisa que ora apresentamos é se há utilização dos Textos de Divulgação Científica (TDC) nas aulas de Física no Ensino Médio e como os professores transformam os TDC em recursos didáticos para suas aulas? Trata-se de um estudo qualitativo e exploratório, cujo objetivo geral é analisar os relatos sobre o uso de TDC em aulas de 14 professores de Física do Ensino Médio de escolas estaduais da Grande Vitória. A coleta de dados foi realizada por meio de entrevistas semiestruturadas, gravadas em áudio e transcritas na íntegra. Para analisar o corpus, foi utilizada a análise de conteúdo temática, conforme a apresentação de Bardin (2009); Blanchet e Gotman (2010). Os resultados mostram que, quando os TDC são utilizados como recurso para preparar as aulas, eles são pouco lidos e explorados em sala de aula. O conceito de TDC é largamente desconhecido pelos professores, que frequentemente o confunde com artigo científico. Foi identificado que a utilização de TDC pelos professores é orientada pelo sentido que eles atribuem ao ato de ler (decodificar, interpretar). Também evidenciamos que, pela sua leitura em voz alta, em sala de aula, acompanhada de comentários, os professores tendem a reduzir a diversidade de interpretações do texto pelos alunos, distanciando-se de uma leitura crítica e das possibilidades de debate. Como fruto desta pesquisa, foi elaborado um guia didático destinado a auxiliar os professores de Física do Ensino Médio na utilização de TDC em sala de aula.

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MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO

INSTITUTO FEDERAL DO ESPÍRITO SANTO

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO EM CIÊNCIAS E MATEMÁTICA

ABSTRACT

Recent decades have seen the democratic need for greater scientific literacy able to allow citizens a larger reading and critical of the world, that empower to participate in debates and social and political decisions related to science and technology. In the face of this demand and questions about the pedagogical practices in science teaching, about the social role of science education and popularization of science, is the moment of questioning the relevance of the dialogue between science teaching and popularization of science, In this context, the question of research that we present is if there is use of Popularization of Science Texts (PST) in physics classes in high school and how teachers transform the PST in teaching resources for your classroom? This is a qualitative and exploratory study whose general objective is to analyze the reports of about the use of PST by 14 teachers of physics of high school, that teach in State publics schools of the Grande Vitória. The data were collected through semi-structured interviews, which were recorded on audio and transcribed in full. To analyze the corpus was used the thematic content analysis as the presentation of Bardin (2009); Blanchet and Gotman (2010). The results show that if PST are used as a resource for preparing lessons, they are little read and explored in the classroom. The concept of PST is largely unknown by the teachers, who often confused with scientific article. It was identified that the use of PST by teachers is guided by the sense that they attributed to the act of reading (decoding, interpreting). It also showed that by your reading aloud in the classroom, accompanied by comments, teachers tend to reduce the diversity of interpretations of the text by students, distancing himself from a critical reading and discussion opportunities. As a result of this research was elaborated a didactic guide designed to assist high school Physics teachers in the use of PST in the classroom.

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MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO

INSTITUTO FEDERAL DO ESPÍRITO SANTO

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO EM CIÊNCIAS E MATEMÁTICA

RÉSUMÉ

Ces dernières décennies ont vu la nécessité démocratique d‘une plus grande alphabétisation scientifique capable de permettre aux citoyens une lecture plus ample et critique du monde, etqui les habilite à participer des débats et des décisions sociales et politiques liées aux sciences et aux technologies. Face à cette demande et aux questions sur les pratiques pédagogiques dans l‘enseignement des sciences, sur le rôle social de l‘éducation scientifique et de la vulgarisation scientifique, il est utile de s‘interroger sur la pertinence du dialogue entre l‘enseignement des sciences et la vulgarisation scientifique. Dans ce contexte, la question de recherche que nous présentons est si il y a utilisation de Textes de Vulgarisation Scientifique (TVS) en classe desciences physiques en lycée et comment les enseignants transforment le TVS en ressource pedagogique?Il s‘agit d‘une étude qualitative et exploratoire qui vise à analyser le discoursde 14 professeurs de physique, qui enseignent dans des lycées publics d‘étatde la région de la Grande Vitória, surl‘utilisation de TVS. Les données ont été recueillies au moyen d‘entretiens semi-structurés, enregistrés en audio et transcrits dans leur intégralité. Pour analyser le corpus, a été utilisé l‘analyse de contenu thématique telle que la présentent Bardin (2009) ; Blanchet et Gotman (2010). Les résultats montrent que si les TVS sont utilisés en tant que ressource pour la préparation des leçons, ils sont peu lus et étudiés en classe. Le concept de TVSest largement méconnu des enseignants, qui souvent le confondent avec un article scientifique. A étéconstaté que l‘utilisation de TVS par les enseignants est orientée par le sens qu‘ils attribuent à la lecture (décodage, interprétation). Il a également été montré que, par leur lecture à voix haute en salle de classe, accompagnée de commentaires, les enseignants ont tendance à réduire la diversité des interprétations du texte par les élèves, s‘éloignant de une lecture critique et des possibilités de débat. Comme résultat de cette recherche a été élaboré un guide didactique visant à aider les professeurs de physique de lycée dans l‘utilisation en classe de TVS.

Mots clés: Alphabétization scientifique. Vulgarisation scientifique. Enseignement de la physique.

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1- Social appropriation modes for science ... 54

Figura 2- Three models of science and culture ... 55

Figura 3 - A Espiral da Cultura Científica ... 56

Figura 4 - Escolarização dos entrevistados: Repartição entre rede pública e privada ... 81

Figura 5 - Percursos dos entrevistados do Ensino Médio até a Licenciatura de Física ... 83

Figura 6 - Biblioteca de uma das 12 escolas estaduais em que lecionam os entrevistados .... 112

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LISTA DE QUADROS

Quadro 1- Objetivos possíveis do uso de TDC no ensino de ciências ... 58

Quadro 2- Estratégias aplicadas no uso de TDC ... 60

Quadro 3 - Blocos temáticos do roteiro da entrevista ... 69

Quadro 4 - Perfil dos professores entrevistados ... 73

Quadro 5 - Número de Professores de Ensino Médio regular e especial do Espírito Santo em todas as disciplinas por gênero (2015) ... 74

Quadro 6 - Divisão por gênero dos candidatos aprovados em 2017 em diferentes licenciaturas na UFES (campus Vitória) ... 74

Quadro 7 - Repartição por gênero dos discentes matriculados em Mestrado de Ensino de Física no IFES Campus Cariacica e na UFES desde a abertura dos programas em 2013 e 2011 ... 77

Quadro 8 - Organização dos 13 licenciados entrevistados segundo a instituição onde foi cursada a licenciatura de Física ... 82

Quadro 9 - Razões que motivaram a escolha do curso de Licenciatura em Física (ou da complementação pedagógica em Física) ... 84

Quadro 10 - Motivos invocados para justificar a escolha da profissão docente... 86

Quadro 11 - Organização das horas das disciplinas obrigatórias no currículo da Licenciatura em Física na UFES (2001-2008) ... 88

Quadro 12 - Repartição das horas das disciplinas obrigatórias na grade curricular da Licenciatura em Física na sua versão de 2008 ... 89

Quadro 13 - Obstáculos citados pelos entrevistados no desenvolvimento da sua atividade docente ... 91

Quadro 14 - Perfil das escolas públicas estaduais do Espírito Santo em que lecionam os entrevistados... 96

Quadro 15 - Trabalho experimental em sala de aula em função da existência do laboratório?98 Quadro 16 - Número de docentes no Ensino Médio (Regular e Especial) na Rede Pública Estadual do Espírito Santo por situação funcional, regime de contratação ou tipo de vínculo (2015) ... 104

Quadro 17 - Diferentes utilizações dos TDC identificadas ... 109

Quadro 18 - Divisão dos entrevistados em função do uso de TDC ... 120

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Quadro 20 - Divisão para cada grupo dos entrevistados em função da escolarização dos pais ...

... 121

Quadro 21 - Repartição dos entrevistados por tipo de leitura e por grupo ... 122

Quadro 22- Elementos para construir uma definição de TDC ... 124

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LISTA DE TABELAS

Tabela 1 - Nível de escolaridade do pai e da mãe dos entrevistados ... 79 Tabela 2- Nível de escolaridade dos pais dos estudantes de cursos de Licenciatura (a exceção dos cursos de Pedagogia) no Brasil (2005) ... 80

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LISTA DE SIGLAS

AAAS – American Association for the Advancement of Science AIDS – Síndrome da Imunodeficiência Adquirida

CAPES – Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior CNPq - Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico COPUS – Comitê de Compreensão Pública da Ciência

CTS – Ciência Tecnologia Sociedade DC – Divulgação Científica

DCN – Diretrizes Curriculares Nacionais

DIVIPOP – Grupo de Estudos e Pesquisas em Divulgação e Popularização da Ciência DT – Designação Temporária

EJA – Educação de Jovens e Adultos

ENADE – Exame Nacional de Desempenho de Estudantes ENEM – Exame Nacional do Ensino Médio

ENPEC – Encontro Nacional de Pesquisa em Educação em Ciências ESCR – Economic and Social Research Council

EUA – Estados Unidos da América

FAPESP – Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo

FUNDEB – Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação

FUNDEF – Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério

IFES – Instituto Federal do Espírito Santo

INEP – Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira IUFM – Institut Uniservitaire de Formation des Maitres

MNPEF – Mestrado Nacional Profissional de Ensino de Física OGM – Organismo Geneticamente Modificado

PCN – Parâmetros Curriculares Nacionais

PIBIB – Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência PNBE – Programa Nacional Biblioteca nas Escolas

PPC – Projeto Pedagógico de Curso PPP – Projeto Político Pedagógico

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PRESTE – Plano de renovação do Ensino de Ciência e Tecnologia na Escola PUS – Public Understanding of Science

RDC – Revista de Divulgação Científica

SBPC – Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência SEDU – Secretaria Estadual da Educação

SISU – Sistema de Seleção Unificada

TCLE – Termo de Consentimento Livre e Esclarecido TDC – Texto de Divulgação Científica

UFES – Universidade Federal do Espírito Santo

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ... 22

2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA ... 31

2.1 DA DIVULGAÇÃO CIENTÍFICA À CULTURA CIENTÍFICA ... 31

2.1.1 A Divulgação Científica... 32

2.1.2 Alfabetização Científica ... 41

2.1.3 Cultura Científica ... 53

2.2 O USO DE TEXTO DE DIVULGAÇÃO CIENTÍFICA NO ENSINO DE CIÊNCIAS . 57 2.3 A PEDAGOGIA LIBERTADORA DE PAULO FREIRE ... 61

3 PERCURSO METODOLÓGICO ... 67

3.1 CRITÉRIOS DE SELEÇÃO DA AMOSTRA ... 68

3.2 COLETA E ANÁLISE DOS DADOS ... 68

3.2.1 As entrevistas ... 68

3.2.2 Análise temática de conteúdo ... 69

4 OS SUJEITOS DA PESQUISA ... 73

4.1 GÊNERO E REPRESENTATIVIDADE DA AMOSTRA ... 74

4.2 IDADE E TEMPO DE ATUAÇÃO NO ENSINO MÉDIO ... 79

4.3 NÍVEL DE FORMAÇÃO DOS PAIS ... 79

4.4 ESCOLARIDADE ... 81

4.5 DO MÉDIO À LICENCIATURA DE FÍSICA ... 81

4.6 CONDIÇÕES DE TRABALHO DOCENTE ... 91

4.6.1 Teoria da atividade de Leontiev ... 92

4.6.2 Dificuldades do trabalho docente ... 95

5 O USO DE TEXTO DE DIVULGAÇÃO CIENTÍFICA (TDC) ... 109

5.1 POR QUE TÃO POUCO?... 110

5.1.1 As dificuldades evocadas pelos entrevistados ... 111

5.1.2 Relação dos entrevistados com a leitura e os TDC ... 119

5.1.2.1 Capital cultural ... 120

5.1.2.2 Hábitos de leitura ... 122

5.1.2.3 Conceitos de TDC e RDC conhecidos ... 123

5.1.2.4 Cultura ... 129

5.1.2.5 Formação e potencialidades dos TDC em sala de aula ... 131

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5.1.1.7 Autonomia ... 134

5.2 O USO DE TDC EM SALA DE AULA ... 137

5.2.1 Objetivos e vantagens do uso de TDC em sala de aula ... 137

5.2.2 Os Critérios de escolha dos TDC... 148

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 161

REFERÊNCIAS ... 165

APÊNDICES ... 176

APÊNDICE A- Formas ou dimensões da alfabetização científica segundo alguns autores ... 177

APÊNDICE B- Diferentes definições do alfabetizado cientificamente ou da alfabetização científica ... 178

APÊNDICE C- Roteiro de entrevista individual para professores e professoras de Física do Ensino Médio ... 179

APÊNDICE D- Termo de consentimento livre e esclarecido ... 180

ANEXOS ... 181

ANEXO A- Carta de anuência da Secretaria Estadual da Educação ... 182

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1 INTRODUÇÃO

Nas últimas décadas, esforços foram feitos para repensar o ensino das ciências na Educação Básica que, ainda hoje, tende, muitas vezes, a se limitar à transmissão descontextualizada de conteúdos. Entre as alternativas possíveis, discutidas nas últimas décadas, podemos citar a utilização da história e Filosofia da ciência (MARTINS, 2006; MATTHEWS, 1995; MAURINES; MAYRARGUE, 2007) e a abordagem da perspectiva do movimento Ciência, Tecnologia, Sociedade (CTS) (AIKENHEAD, 1994; SANTOS; MORTIMER, 2000) por promoverem uma educação em ciências mais rica e mais abrangente, em diversos contextos (ético, social, histórico, filosófico e tecnológico) contribuindo para um ensino que contemple não só o conteúdo das ciências, mas, também, acerca da natureza da ciência (MATTHEWS, 1995). Outra proposta que pretende promover uma maior compreensão da natureza das ciências pelos estudantes consiste em desenvolver práticas de pesquisa ou de investigação em sala de aula enfatizando a ciência enquanto processo (DEMO, 1992; SASSERON, 2015). Contudo, a apropriação possível pelos professores da Educação Básica, das pesquisas em ensino de ciências, depende de inúmeros fatores, tais como: das condições objetivas e subjetivas de trabalho, do exercício da docência, da sua formação, de suas convicções políticas e filosóficas.

Durante minha formação no Institut Universitaire de Formation des Maitres (IUFM), o modelo dominante de ensino da Física era alternar aulas expositivas com a turma inteira, com aulas experimentais em meia turma. O planejamento e a realização bem sucedida desse tipo de aula experimental ocupavam uma posição central, as quais seguiam o seguinte modelo: 1) Exposição do objetivo do experimento, às vezes com uma breve contextualização histórica; 2) Distribuição de um roteiro; 3) Informações e instruções a seguir; 4) Realização dos experimentos, respeitando-se o roteiro; 5) Organização do material; 6) Redação de um pequeno relatório. Do ponto de vista do professor, esse tipo de organização do ensino traz-lhe maior segurança e cada vez que os alunos conseguem realizar todo o roteiro, sem quebrar a sequência, responder às questões e redigir o relatório, a aula passa a ser considerada um sucesso. Na verdade, o que chamavam de aula experimental bem sucedida, conferia muito pouca autonomia aos alunos, pouco espaço para a reflexão e nenhuma oportunidade para a investigação. Mesmo assim, oferecer aos alunos o ensejo de manipular, observar de perto os fenômenos era (e ainda é) valioso, mesmo que de forma tradicional. Contudo, quando ganhei mais experiência, aprendi a permitir um maior grau de autonomia para meus estudantes para,

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por exemplo, escolher o material, conceber o protocolo do experimento, interpretar os resultados.

A primeira vez que ouvi falar de ensino por investigação foi em 1994, quando ainda era estagiário. Assisti a uma palestra de Jean Pierre Astolfi sobre as situações-problema e os obstáculos epistemológicos. Ao fim da conferência, na roda de questões, um jovem professor da minha turma do IUFM indagou: ―tudo isso que o Professor apresentou é muito interessante, muito bonito, mas concretamente na minha sala, como eu faço para utilizar?‖ O professor Astolfi respondeu humildemente que ele não tinha a resposta, que não podia dar uma receita, que se meu colega estivesse interessado, ele poderia experimentar. Ele acrescentou: ―isso não é fácil, necessita energia e perseverança‖. Eu me lembro que eu fiquei interessado, mas ao final, eu não experimentei.

Em 1996, Georges Charpak (Premio Nobel de Física em 1992), iniciou a operação Main à la

pâte, inspirado do programa Hands On, criado por Leon Lederman em Chicago, que promove

um ensino das ciências baseado na experimentação, na observação, no questionamento e que propõe desenvolver a capacidade de escuta e de raciocínio das crianças, articular a aprendizagem científica, promover o domínio da língua, educação e a cidadania. A partir do ano de 2002, a abordagem por investigação entrou oficialmente como um dos fundamentos do ensino de ciências na França. Seguindo as recomendações do Plano de Renovação do Ensino de Ciência e Tecnologia na Escola (PRESTE), de 2000, e os princípios de Main à la Pâte, o currículo de ciência da escola primária (Fundamental I) foi reformado. Em 2008, foi a vez do Ensino Fundamental II, no documento Bulletin officiel spécial n. 6, de 28 de agosto de 2008:

Na continuidade da escola primária, os programas do Fundamental II privilegiam uma abordagem de investigação nas disciplinas científicas e tecnológicas. [...] esta abordagem não é exclusiva [...] Cabe o professor determinar os assuntos que serão objetos de uma apresentação e aqueles para os quais uma abordagem de investigação seja relevante (FRANÇA, 2008, p.169, tradução nossa).

O mesmo documento oficial propunha, em outro momento, uma sequência organizada em sete etapas para desenvolver uma investigação: 1) Escolha pelo professor de uma situação-problema; 2) Apropriação do problema pelos alunos; 3) Formulação de conjeturas, hipóteses explicativos, e de protocolos possíveis; 4) Investigação ou resolução do problema pelos alunos; 5) Argumentação acerca das propostas elaboradas; 6) Aquisição e estruturação do conhecimento; 7) Mobilização do conhecimento. Aparece a ideia, neste documento, de que é

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importante construir o problema antes de construir os conhecimentos, o que pode ser aproximado com a concepção de Bachelard:

Em primeiro lugar, é preciso saber formular problemas. E, digam o que disserem na vida científica, os problemas não se formulam de modo espontâneo. É justamente esse sentido do problema que caracteriza o verdadeiro espírito científico. Para o espírito científico, todo conhecimento é resposta a uma pergunta. Se não há pergunta, não pode haver conhecimento científico. Nada é evidente. Nada é gratuito. Tudo é construído. (BACHELARD, 2005, p.18. Grifo do autor).

Segundo esse documento, na primeira etapa, o professor teria que identificar as concepções e as representações dos alunos e escolher uma situação que favorecesse a criação de um conflito cognitivo diante da impossibilidade de explicar o fenômeno observado a partir dessas concepções. A resolução do problema permitiria uma mudança conceitual e/ou a (re)-construção do conhecimento pelos alunos.

O documento ainda salienta o papel fundamental de mediação do professor durante as fases de argumentação (5 e 6) acerca das propostas elaboradas pelos alunos e de aquisição e estruturação do conhecimento. O professor ajudaria os alunos a destacar os novos elementos de saber utilizados durante a resolução do problema e, por meio de uma pesquisa e leitura de documentos, incentivaria uma confrontação desses elementos com o saber científico. Finalmente, o professor ajuda os alunos a reformular por meio da escrita os novos conhecimentos adquiridos em fim de sequência.

Em 2010, foi a vez, finalmente, do Ensino Médio, dando continuidade à reforma do colégio, de enfatizar a abordagem por investigação. Houve um forte incentivo, por parte dos Inspetores Pedagógicos Regionais1, das disciplinas que adotariam esse tipo de abordagem em vez das aulas experimentais tradicionais. Foi feito um esforço, em termos de investimento, para equipar os laboratórios e novos materiais, e em termo de formação docente. Todavia, essa formação continuada era meramente utilitária e tecnicista, dando alguns exemplos de sequências elaboradas e testadas por outros professores, mostrando como poderia ser realizado esse tipo de ensino, sem propor uma reflexão sobre seus pressupostos epistemológicos ou didáticos. É interessante constatar que o documento oficial já citado não menciona explicitamente as referências que sustentam teoricamente a proposta da reforma,

1

Os Inspetores Pedagógicos Regionais trabalham por disciplinas e têm em outras atribuições, a implantação das políticas de educação nas salas de aulas e nos estabelecimentos, além de avaliar e supervisar o trabalho dos professores de sua região acadêmica e de sua disciplina.

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dificultando o debate, a apropriação, e, também, a contestação pelos professores.

Experimentei, a partir de 2010, essa abordagem por investigação, timidamente no início e depois com mais intensidade. Essa abordagem tem alguns aspectos positivos, quais sejam: poder dar aulas agradáveis pelo fato de que os alunos se envolvem e são ativos; permite incentivar a leitura como fonte de reflexão para gerar hipóteses e para confrontar os resultados como o saber científico; as etapas 3, 4 e 5 da sequência organizada em sete etapas para desenvolver uma investigação abrem espaços de diálogo e de colaboração entre alunos, entre a turma e o professor, que dá a oportunidade aos alunos de se expressarem, argumentarem e constituírem uma ―comunidade discursiva‖ (BERNIÉ; 2002; JAUBERT; RIBIERE; 2010). Essas práticas epistêmicas na ―comunidade científica escolar‖ permitiriam aos alunos vivenciar uma cultura hibrida entre cultura escolar e cultura científica: uma cultura científica escolar (SASSERON, 2015).

Percebemos, também, alguns pontos negativos, quais sejam: existir um risco de supervalorização dos experimentos, reforçando uma visão empirista e indutivista da ciência. Ora ―algumas teorias científicas não são generalizações, que a maior parte das hipóteses científicas não são geradas por indução e, sobretudo, que a observação requer a teoria‖ (MATTHEWS, 1995, p. 186); Além disso, durante a etapa de argumentação (5), é importante guardar em mente que a validação social deve se apoiar sobre a confrontação com o real e não sobre a força de argumentação dos participantes da ―comunidade científica‖ da turma. Tomando em consideração o tempo limitado e os recursos disponíveis, essa confrontação com real nem sempre é possível. Acaba que muitas vezes é o professor quem formula a síntese dos trabalhos.

Depois de uma fase de experimentação intensa, acabei por adotar a abordagem por investigação duas ou três vezes por ano e por turma. Mesmo assim, esta experimentação provocou repercussões positivas sobre minha prática. Ela me incitou a fazer um esforço para contextualizar os problemas que eu podia trazer para meus alunos, obrigou-me a repensar os respectivos papeis do professor e dos alunos, o que me incitou a conferir mais autonomia aos alunos e a abrir espaços de diálogos em sala de aula.

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Outra reforma que aconteceu na mesma época foi o ensino por competência. Não encontrou em mim aprovação, mas minha resistência, apesar da propaganda às vezes agressiva e da afirmação de que um funcionário do Estado deve ser obediente, conforme exposto por Basso:

A atividade de ensino escolar é realizada com a presença de professor e alunos, e o professor mantém autonomia para escolher metodologia, fazer seleção de conteúdos e de atividades pedagógicas mais adequadas a seus alunos, segundo o interesse ou suas necessidades e dificuldades. Essa autonomia garantida pela própria particularidade do trabalho docente indica que os professores podem dificultar as ações do Estado com pretensão de controle. (BASSO, 1994, p. 22-23).

Essa reforma, inspirada no ―Relatório da Comissão Internacional para a Educação do Século XXI‖, organizado por Jacques Delors (1998), promovia uma educação baseada em quatro pilares: aprender a conhecer (no Brasil se fala aprender a aprender), aprender a fazer, aprender a viver juntos, aprender a ser. A partir das recomendações do Parlamento Europeu (UNESCO, 2006) sobre as competências essenciais para a aprendizagem ao longo da vida, essa pedagogia por competência invadiu os currículos da Educação Básica. Estou convencido de que a filosofia que fundamenta essa abordagem da educação promove um ensino acrítico, tecnicista e utilitarista, cujos objetivos principais são responder à demanda do mercado de trabalho, que precisa de uma mão de obra flexível capaz de se adaptar rapidamente às mudanças, melhorar a competitividade e a produtividade.

Durante meus 18 (dezoito) anos de docência, tentei também inovar, por conta própria, fora dos grandes movimentos provocados pelas reformas educacionais. Assim, tentei utilizar a riqueza de documentos diversos para introduzir os temas a serem estudados, tais como: vídeos, filmes, artigos de jornais e de revistas, às vezes capítulos de livros de divulgação, obras literárias, não só porque eu pensava que fossem úteis para minhas aulas, mas, também, porque permitiam abrir os horizontes culturais de meus alunos. Foi uma grande felicidade mostrar aos alunos como as palavras são carregadas de cultura, que elas são historicamente construídas. Eu me lembro que desenvolver uma atividade extraclasse, em um ateliê teatral com os alunos de primeiro ano do Ensino Médio, em que pedi para interpretarem uma seleção de textos. Ler o texto, interpretar, compreender seu contexto, quais são os sentimentos e as motivações das personagens, buscar um diálogo entre isso e nossa realidade, nossa vivência. Trabalho exigente, meticuloso, mas que mostrou a riqueza do ato de ler, a importância da escuta durante as representações. Alguns alunos escreveram textos e, em confiança, os leram na frente da turma. Sem surpresa, a atitude dos alunos frente à leitura, a interpretação dos textos, que mudou, refletiu sobre a qualidade daquele trabalho em sala de aula.

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No Brasil, já como aluno de mestrado, no transcurso das reuniões do Grupo de Estudos e Pesquisas em Divulgação e Popularização da Ciência (DIVIPOP), observei que não existe consenso sobre o conceito de ―alfabetização científica‖, quanto à sua definição, seus objetivos e como ela pode ser alcançada. Contudo, um aspecto comum que encontramos em vários autores (SHEN, 1975; SHAMOS, 1995; DURANT, 2005, entre outros) é que, para eles, a ―alfabetização científica‖ é multidimensional. Por exemplo, em Durant (2005) encontramos três dimensões:

A primeira põe ênfase no conteúdo da ciência (isto é, no conhecimento científico); a segunda acentua a importância dos processos da ciência (isto é, os procedimentos mentais e manuais que produzem o conhecimento científico, que são muitas vezes referidos coletivamente como ―o método científico‖); a terceira concentra-se nas estruturas sociais ou nas instituições da ciência (isto é, o que pode ser chamado de cultura científica). (DURANT, 2005, p.15).

Mesmo que as diferentes dimensões da alfabetização científica propostas pelos diferentes autores não se sobreponham exatamente, as discussões apontam para a necessidade democrática de uma alfabetização científica que ultrapasse a compreensão de conceitos e métodos científicos e permita ao ator social contextualizar a produção e as utilizações das ciências e técnicas em relação às instituições sociais.

O conceito de alfabetização científica, scientific literacy, em inglês, nasceu nos Estados Unidos da América (EUA) no fim dos anos 1950, após o choque do lançamento do satélite

Sputnik e no contexto de guerra fria. Serviu de slogan para transmitir a ideia de que aprender

ciências deveria ser algo tão imprescindível quanto aprender a leitura e a escrita, uma apropriação desejável para todos os seres humanos, a ser estabelecida a partir de um fenômeno de massa (TEIXEIRA, 2013). A scientific literacy serviu de fundamentação à reforma do sistema educacional nos EUA e passou a ser considerada como principal objetivo do ensino de ciências como, por exemplo, a American Association for the Advancement of

Science (AAAS, 1989), que criou um documento denominado ―Science for all american‖. O conceito de scientific literacy foi, desde sua origem, relacionado à Public Understanding of

Science (PUS), o que resultou em definir o conceito de functional literacy às habilidades

mínimas necessárias para um cidadão atuar em uma sociedade industrial contemporânea (MILLER, 2010, p. 243). Do mesmo modo, o termo scientific literacy foi fortemente relacionado à exposição do público à divulgação científica e deveria permitir ao scientifically

(28)

popular e de se envolver numa conversa social sobre a validade das conclusões (NATIONAL RESEARCH COUNCIL (EUA), 1996).

Quando iniciamos nosso trabalho, tínhamos em mente uma necessária alfabetização científica que possibilitasse uma leitura de mundo mais ampla e mais crítica e que permitisse ao cidadão posicionar-se e tomar decisões responsáveis sobre questões que envolvem as ciências e as tecnologias, considerando as imbricações políticas, sociais, econômicas, e ambientais (encontramos aqui as temáticas do movimento CTS). No decorrer de nosso estudo, demos ênfase ao acesso, à apropriação da cultura científica e da cultura em geral que nos parece ter uma dimensão maior que a alfabetização científica e que tem a vantagem de ser um processo coletivo, multidimensional e participativo. De acordo com Teixeira (2013) e Norris e Phillips (2003), focamos nossa atenção sobre o sentido literal da alfabetização científica, considerando-a como uma ferramenta cultural por ser parte do processo de formação da leitura e da escrita.

O grupo de pesquisa DIVIPOP, liderado por Carlos Roberto Pires Campo, busca ampliar as discussões relacionadas à divulgação científica, tomando-a como uma forma de disseminar o conhecimento sobre Ciência e Tecnologia, sem as quais se torna impossível a construção de uma cultura científica e muito menos o desenvolvimento da real cidadania. No transcurso das reuniões do grupo de pesquisa, as discussões apontaram para o fato de que a divulgação científica, particularmente na sua forma escrita, pode ficar inoperante sem a apropriação na escola de bases conceituais e de ferramentas culturais que possibilitem o acesso ao saber elaborado.

Reflexões assim nos levaram a questionar alguns pontos, entre os quais: Qual pode ser o elo entre a Escola e a Divulgação Científica? Quais são as inter-relações e, talvez, a sinergia possível, entre o ensino de ciências nas escolas e a divulgação científica? Qual pode ser o papel dos professores nesta aproximação? No âmbito destas questões, focamos nossa atenção sobre a forma escrita, os Textos de Divulgação Científica e sobre sua possível utilização em aula de Física, nossa disciplina de formação e de atuação profissional. As questões de pesquisa são se há utilização dos Textos de Divulgação Científica nas aulas de Física no Ensino Médio e como os professores transformam os Textos de Divulgação Científica em recursos didáticos para suas aulas?

(29)

Para investigar essas questões, entendemos como importante conhecer quais são as experiências, as concepções dos professores em relação com os Textos de Divulgação Científica e sua possível utilização em sala de aula?

Assim, o objetivo geral de nossa pesquisa é analisar os relatos de professores de Física do Ensino Médio de escolas públicas estaduais da Grande Vitória/ES sobre a utilização de Textos de Divulgação Científica em suas aulas. E os objetivos específicos que nos ajudarão a atingir o objetivo geral dessa pesquisa estão, a seguir, elencados:

 Identificar, a partir dos relatos dos professores, as práticas pedagógicas e o uso que fazem dos Textos de Divulgação Científica.

 Analisar os sentidos atribuídos pelos professores às práticas pedagógicas que envolvem o uso de Textos de Divulgação Científica.

 Elaborar um guia didático que possa auxiliar os professores no uso de Textos de Divulgação Científica em sala de aula.

Dessa forma, nossa dissertação tem a estrutura de exposição seguinte:

Na introdução, foi apresentada a trajetória profissional e acadêmica do pesquisador e sua inserção no objeto e os propósitos da pesquisa.

No primeiro capítulo, Fundamentação teórica, propomos uma discussão do referencial sobre os conceitos de divulgação científica e de alfabetização científica, buscando entender o contexto histórico no qual elas se desenvolveram, assim como a ideologia e a filosofia que os fundamentam. Abordamos, também, o conceito de cultura científica. Por meio de uma revisão de literatura, buscamos as contribuições de pesquisas recentes no que diz respeito ao uso de Textos de Divulgação Científica em sala de aula. Apresentamos, em seguida, a pedagogia libertadora de Paulo Freire a partir da leitura da obra ―Pedagogia do Oprimido‖, de Freire (1987).

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O segundo capítulo, Percurso metodológico, apresenta o estudo, os sujeitos, assim como o desenvolvimento utilizado na pesquisa. Apresentamos, ainda, a análise de conteúdo temática, metodologia apresentada por Bardin (2009); Blanchet e Gotman (2010).

O terceiro capítulo, Os Sujeitos da Pesquisa, aborda, a partir da análise do corpus, o perfil dos professores, as condições objetivas e subjetivas de trabalho dos entrevistados, além das condições materiais (inadequação da estrutura física das escolas, a falta de material de apoio). Toda análise foi realizada à luz da Teoria da Atividade de Leontiev (2009a, 2009b; 2009c).

O quarto capítulo, O Uso de Texto de Divulgação Científica (TDC), busca entender, em um primeiro momento, porque apesar de ser utilizado como recurso para preparar as aulas, os Textos de Divulgação Científica (TDC) são pouco lidos e explorados em sala de aula. Em seguida, focalizamos nossa atenção sobre os usos de TDC em sala de aula que incluíam a leitura do texto pelos alunos. A análise foi guiada pelas seguintes categorias: objetivos e vantagens do uso de TDC; critérios de escolha dos textos; estratégias utilizadas para usar os TDC em sala de aula.

Finalmente, nas considerações finais, são articulados os resultados e as ponderações sobre o estudo realizado.

(31)

2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

A descoberta dos conceitos de alfabetização científica e de divulgação científica desencadeou, como principal questão sobre as suas funções sociais: a exposição à Divulgação Científica é o bastante para alcançar a Alfabetização Científica? É a partir dessa questão que o tema da pesquisa foi se delimitando acerca das possíveis interações entre o Ensino de Ciências e a Divulgação Científica e, singularmente, sobre o uso didático de Textos de Divulgação Científica em sala de aula por professores de Física do Ensino Médio.

Propomos, aqui, a discussão do referencial sobre os conceitos de divulgação científica e de alfabetização científica, buscando entender o contexto histórico no qual elas se desenvolveram, assim como a ideologia e a filosofia que os fundamentam. O conceito de cultura científica também será abordado por ser um fenômeno coletivo, mais amplo que o processo individual de alfabetização científica e incita a se afastar do modelo dominante de divisão do conhecimento científico.

Por meio de uma revisão de literatura, buscamos as contribuições de pesquisas recentes no que diz respeito ao uso de Textos de Divulgação Científica em sala de aula. Isso permitiu encontrarmos elementos sobre seus objetivos possíveis e sobre as estratégias didáticas que ele necessita salientando o papel do professor, que deve fornecer um trabalho cuidadoso de preparação e de reflexão para planejar o uso didático de texto de divulgação científica em suas aulas.

Apresentamos, em seguida, a pedagogia libertadora de Paulo Freire, a partir da leitura da obra ―Pedagogia do Oprimido‖, de Freire (1987).

2.1 DA DIVULGAÇÃO CIENTÍFICA À CULTURA CIENTÍFICA

E agora, estou trabalhando com a idéia da música como uma troca, uma maneira de conversarmos. Uma língua com qual nos comunicamos com os outros seres humanos. Se ninguém estivesse nos ouvindo, não haveria razão para a música. Então, para mim, a troca entre quem compõe, quem toca e quem ouve, é o ciclo completo. (Philip Glass2).

2

Ver o documentário: GONZATTO, Camila. What are you looking for? 2008. Dur.8‖. P&B. Rio Grande do Sul, 2008. Disponível em: http://portacurtas.org.br/filme/?name=what_are_you_looking_for. Acesso em: 13 maio 2017.

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2.1.1 A Divulgação Científica

A Divulgação Científica (DC) é, segundo Jacobi, Schiele e Cyr (1990), um conjunto de práticas sociais, o qual usa várias mídias, contribuindo para a apropriação da cultura científica e técnica por não especialistas, fora da escola.

Para identificar a divulgação científica, proporemos separá-la do campo da educação dita formal usando, por exemplo, um conceito anglo-saxónico: informal education (Lucas, 1983) [...] De forma diferente, nos lugares diferentes, com outros recursos e com outros métodos, a divulgação científica propõe-se contribuir à aculturação do público dos não especialistas (Lucas, 1983). (JACOBI; SCHIELE; CYR, 1990, p. 84, tradução nossa).

Jacobi, Schiele e Cyr (1990) apontam a finalidade cultural da divulgação científica. Podemos destacar que, conforme Lucas (1983), citado por eles, há a utilização do termo ―acculturation‖ em vez de ―enculturation‖.3

Isso indica que, para esses autores, a cultura científica é outra cultura, uma segunda cultura que deve ser apropriada.

Para esses autores, a divulgação científica não pertence ao campo da educação formal. Eles usaram a expressão ―não formal‖ em vez do termo ―informal‖, para não deixar a impressão de que a divulgação científica não é estruturada, organizada, não tem consistência institucional ou não dispõe de recursos financeiros, o que, segundo eles, não corresponde à realidade dos museus científicos ou das mídias interessadas na divulgação científica. Não é bastante a questão de localização e de estrutura; os autores destacam, como critérios de diferenciação entre educação formal e não formal, os objetivos e os métodos, o público alvo e a validação social: a educação não-formal ―escolhe seus conteúdos, seus métodos e seus objetivos fora dos constrangimentos das instruções oficiais. Destina-se a um público não-cativo. Ele não participa do jogo das certificações sociais conferidas pelos diplomas‖ (JACOBI; SCHIELE; CYR, 1990, p.84, tradução nossa).

Para aprofundar nossa reflexão sobre os objetivos e a função social da divulgação científica, é necessário considerar as relações entre ciência e sociedade, relações que vão se modificando ao longo do tempo.

3

O termo ―acculturation‖ diz respeito à apropriação da própria cultura em vez de que o termo ―enculturation‖ diz respeito à apropriação de uma segunda cultura.

(33)

A palavra divulgação vem do verbo latim divulgare constituído de dis (movimento para fora) e vulgus (gente comum, a multidão). Assim, divulgação é ação de fazer conhecer, de tornar público. Em francês, o termo divulgação significa ação de levar o conhecimento ao público, levar uma informação que estava ignorada, secreta. Ou seja, esta informação passa de um círculo de iniciados para ir até o público. Encontramos um exemplo da utilização por Diderot na sua obra ―L’histoire et le secret de la peinture en cire‖ do verbo ―divulguer‖: ―Caso ocorre que uma invenção favorável ao progresso das ciências e das artes chegue a meu conhecimento, eu morro de vontade de divulgá-la‖ (DIDEROT, 1755, p. 63, tradução nossa). No entanto, em vez de ―divulgation‖ ou de ―popularisation‖, a expressão ―vulgarisation

scientifique‖ é hoje usada em francês (enquanto que ―divulgação científica‖ é utilizada no

Brasil e popularization of science nos países de língua inglesa).4 No fim do século XX, a expressão ―vulgarisation scientifique‖ passou a perder seu caráter pejorativo:

Aceitamos, portanto, decididamente, corajosamente, esta palavra antiga, dedicada pelo uso, "vulgarização", lembrando "vulgus" significa povo e não vulgar, que as línguas ditas "vulgares" são as línguas vivas e que a própria Bíblia não se espalhou no mundo que graças à tradução chamado de Vulgata... Sim, aceito a palavra, mas esforçamos em todas as oportunidades para restaurar a estima que merece a coisa. (ROSTAN, 1966, p. 35 apud BENSAUDE-VINCENT, 1993, p. 63, tradução nossa).

Segundo Bensaude-Vincent (1993), essa referência à Vulgata do século IV teria o mérito de salientar a função ideológica que se dá à vulgarização científica, aquela de sacralização da Ciência traduzindo em língua vulgar seu texto sagrado e propagando a boa palavra. Quando num texto em francês das últimas décadas encontramos essa expressão, ela será traduzida por ―divulgação científica‖.

Para Bensaude-Vincent (2010), essa evolução lexical é sintomática de uma mudança importante na relação entre a ciência e a sociedade. Na França, a partir de 1640, passaram a existir cursos de botânica em francês (e não em latim) no Jardim Real das Plantas medicinais abertos ao público. Em 1686, Fontenelle publicou sua obra ―Diálogos sobre a pluralidade dos mundos‖, que num divertimento refinado em forma de diálogos com uma marquesa difunde conhecimentos da época sobre astronomia5. Esse novo gênero literário prospera no século XVIII, com livros que são reeditados varias vezes, como ―O espetáculo da natureza‖, do

4

No Brasil houve um movimento inverso em que passou do uso de ―vulgarização científica‖ para ―divulgação científica‖. Ver Vergara (2008).

5

Galileu escreveu em italiano seu Diálogo sobre os dois sistemas máximos do mundo, publicado em 1632. Assim, por conta dessa escolha da língua vernácula em vez do latim, poderíamos considerar Galileu como um precursor da vulgarização científica, antes de Fontenelle. No entanto, como ressalta Jurdant (2010), o projeto de Galileu era convencer seus pares apresentando todos seus argumentos em favor do sistema de Copérnico, e também, que não se trata de uma reformulação simplificada de uma escrita mais complexa.

(34)

abade Pluche, editado em oitos volumes em 1732. O gosto pela ciência é cultivado dentro de salão e é reservado ao um público mundano. O século é marcado pela publicação da Enciclopédia de Diderot e D‘Alembert. No entanto, esse esforço de difusão não pode ser relacionado com a Vulgarisation scientifique que aparece no início do século XIX (BENSAUDE-VINCENT, 1993, p. 49- 50).

Uma série de aperfeiçoamentos na qualidade da impressão permite o aparecimento de publicações de grande tiragem, e com preço de venda baixo ao alcance de todos. Por exemplo,

Le journal des connaissances utiles6, fundado em 1831, que contou até 132 000 assinantes, ou o jornal Le Globe, fundado em 1825, que publicou regularmente os relatos das reuniões da Academia das ciências, foram costumes adotados por outros jornais da época. A presença da ciência na vida social torna-se ainda mais forte a partir da segunda metade do século com a aparição das exposições universais (1851, em Londres e 1857, em Paris), que celebram o desenvolvimento da civilização e progresso, as técnicas que se expõem na forma de máquinas maiores e mais espetaculares, e a difusão de pouco de conhecimento sobre ciências:

Se a ciência é mais discreta no espaço físico das exposições, ela é onipresente nos discursos que os acompanham, exaltado, alugado, elogiaram como uma condição para o progresso e a proeza tecnológica. Também, além de questões econômicas, comerciais e industriais, potenciais rivalidades nacionais, operações políticas de prestígio ou esperanças para a paz social, as exposições se apresentam como uma grande empresa de vulgarização. A maioria delas difunde magro conhecimento, apesar das boas intenções educacionais, mas transmitem imagens fortes de Ciências e técnicas e anexa a elas impressões, sensações, que contribuem significativamente para a sua penetração no tecido social (BENSAUDE-VINCENT, 1993, p. 51, tradução nossa).

Essas exposições universais conseguiam atrair milhões de pessoas e elas inauguram uma ―cultura de massa‖.7

Na França, o desenvolvimento se faz seguindo duas direções. De um lado, os cientistas da Academia das Ciências para os quais se trata de difundir e traduzir as notícias da ciência a partir dos relatórios da Academia. Do outro lado, a ciência popular, cuja finalidade é ―promover a cultura da ciência em todas as camadas da sociedade, de permitir a cada um acessar os conhecimentos mais avançados e de praticar a pesquisa enquanto amador‖ (BENSAUDE- VINCENT, 1993, p.59). Uma ciência popular que como Flammarion e outros,

6―O jornal dos conhecimentos úteis‖ 7

Bensaude-Vincent (1993) indica que foram 6 milhões de visitantes em 1851, em Londres; 16 milhões em 1878, 27 milhões em 1893, em Chicago e 50 milhões, em Paris, em 1900.

(35)

como Raspail, defendem que a ciência popular deve permitir aos amadores ter uma prática científica rigorosa que não é inferior à pratica ―profissional‖ dos cientistas da Academia. Mesmo sendo em concorrência e às vezes em oposição, os apoiadores da ciência oficial da Academia e da ciência popular têm em comum a fé na unidade do saber para evitar a fragmentação em disciplinas das ciências e pretendem fazer um difusão da ciência de alta qualidade. Assim, quando no fim do século XIX, Camille Flammarion utilizou a palavra vulgarização, esta possuindo uma conotação fortemente pejorativa:

Nós queremos popularizar a ciência, ou seja, para torná-la acessível sem diminuí-la ou alterá-la, a todas as inteligências que entendem o seu valor e que estão dispostos a se dar o luxo de prestar alguma atenção aos estudos sérios; Mas nós não queremos vulgarizá-la, trazê-la para o nível do vulgar indiferente, irrefletido ou brincalhão. Há uma distinção que não é feita suficientemente. (FLAMMARION, 1882, p.3 apud BENSAUDE-VINCENT, 2010, p. 4, tradução nossa).

Ao contrário, com a vulgarização não se trata mais de praticar a ciência, mas de consumir a ciência em forma de revistas, livros, espetáculos. Para atrair, seduzir e fidelizar seu público não cativo, ela apresenta o mundo científico em constante ebulição, produzindo invenções maravilhosas sem parar, apresentando os cientistas como seres de exceção, heróis do progresso (BENSAUDE-VINCENT, 2010, p. 4).

No mundo da edição, a vulgarização científica se torna um gênero próspero que permite o crescimento econômico de editores. A partir da segunda metade do século XIX, um número crescente de periódicos sobre a ciência é criado. Esse movimento se desenvolveu também no Brasil, favorecido pelo interesse do Imperador D. Pedro II pela ciência.8 Como na Europa, ―os principais divulgadores são homens ligados à ciência por sua prática profissional como professores, engenheiros ou médicos ou por suas atividades científicas‖ (MOREIRA; MASSARANI, 2002, p. 52).

Mais tarde, no fim do século XIX, a ciência popular declina e os cientistas não se envolvem tanto na Divulgação Científica. No início do século XX, após a primeira guerra mundial, a ―vulgarisation scientifique‖ torna-se profissional, havendo, aí, uma aliança entre jornalistas, industriais e cientistas, buscando legitimar a ciência oficial, de modo a restaurar, por exemplo, a imagem da química, manchada pela utilização dos gases de combate. Assim, o Science

Service, criado em 1921, desenvolveu, nos Estados Unidos, esforço para reunir notícias

consistentemente fidedignas sobre ciência e novas tecnologias, para, então, distribuí-las de

8

Para explorar os aspectos históricos da Divulgação Científica no Brasil ver Moreira e Massarani (2002, p. 43-64).

(36)

forma compreensível e atraente para um público por meio das mídias facilmente acessíveis (BENNET, 2013, p.4). As atividades do Science Service, em relação aos cientistas, a imprensa, figuras políticas, agências governamentais, tinham, como objetivo, obter maior aceitação, apreciação e suporte da população para a ciência e a tecnologia. Emerge, assim, a figura predominante do jornalista científico como sendo central na atividade de Divulgação Científica.

As atividades de comunicação pública da ciência e da tecnologia possuem, hoje, varias denominações, como: difusão da ciência, disseminação da ciência, divulgação da ciência, que não se referem exatamente às mesmas práticas. Kunth (1994), num extrato de um estudo sobre as atividades de comunicação pública da ciência dos pesquisadores do Centro Nacional de Pesquisa Cientifica (França), faz a distinção entre três práticas que ele chama de ―difusão da informação científica especializada‖, ―difusão cientifica interdisciplinar‖ e ―divulgação científica‖, usando, como critério discriminante, o perfil do público destinatário da comunicação:

Difusão da informação científica especializada: o pesquisador se dirige a um pesquisador da sua especialidade [...] Difusão científica interdisciplinar: o pesquisador se dirige a um pesquisador, a um engenheiro, um técnico de outra disciplina [...] Divulgação científica: trata-se da difusão da cultura científica e técnica; o pesquisador se dirige ao grande público ou aos jovens. (KUNTH, 1994, p.41-42, tradução nossa).

Assim, a difusão da ciência corresponde a toda prática de comunicação pública da ciência e da tecnologia. Quando a difusão científica é orientada a um público especializado, da mesma área ou não, isso é, de acordo com Bueno (1985), uma disseminação intrapares ou extrapares:9

A disseminação intrapares diz respeito à circulação de informações científicas e tecnológicas entre especialistas de uma mesma área ou de áreas conexas [...] A disseminação extrapares diz respeito à circulação de informações científicas e tecnológicas para especialistas que se situam fora da área-objeto da disseminação (BUENO, 1985, p.1425).

Em Bueno (1985), encontramos, também, duas afirmações sobre a divulgação científica que podem servir de base para reflexão:

[...] a divulgação científica compreende a utilização de recursos, técnicas e processos para a veiculação de informações científicas e tecnológicas ao público em geral. [...] a divulgação pressupõe um processo de recodificação, isto é, a transposição de uma

9

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linguagem especializada, com objetivo de tornar o conteúdo acessível a uma vasta audiência. (BUENO, 1985, p. 1421- 1422).

Estas duas afirmações esboçam um modelo puramente comunicacional da divulgação científica que é associado a um modelo do déficit, que descreve o grande público como tendo um déficit de conhecimento sobre a ciência, o qual provoca sua incompreensão e desinteresse e, em certas circunstâncias, sua hostilidade para a ciência10.

Assim, o conceito de divulgação científica articula-se em forma de três eixos: o público (público em geral, não especialista, leigo), a linguagem (adaptada ao público) e a intenção (veicular, democratizar a informação ou o conhecimento científico). Trata-se de uma atividade de comunicação unilateral que, cronologicamente, parte de uma fonte (o cientista ou a ciência enquanto instituição ou comunidade), a um transmissor (o divulgador) que vai codificar sua mensagem a fim de que seu conteúdo (a ciência) seja bem recebido e decodificado por um receptor, o público alvo (público leigo)11.

Assim, segundo Jurdant (1973), a divulgação científica é historicamente marcada por uma ideologia cientificista, apresentando a ciência como uma verdade universal que se impõe a todos, uma ciência que trabalha pelo bem da humanidade a qual é sinônimo de progresso e que nada a pode parar. O advento da mídia de massa no século XX possibilitou realizar a divulgação universal da verdade científica, dos centros de produção até o grande público profano, para permitir ao homem comum acompanhar este progresso e evitar o agravamento do fosso entre si e a ciência.

Para Bensaude-Vincent (2010), a divulgação científica que define o regime do saber dominante do século XX, fundamenta-se sobre três postulados:

1) Existe um fosso entre ciência e público que continua a crescer com o progresso das ciências, da especialização e da tecnicidade dos conhecimentos. De um lado, encontramos os produtores do saber e, do outro, um público definido negativamente por uma falta de ciência e não por suas qualidades, ou mesmo suas preocupações ou interesses (o modelo de déficit);

2) o fosso chama mediadores ou divulgadores, cujo trabalho é fazer a ponte entre a elite científica e a massa popular, seja para "traduzir" a linguagem dos especialistas, seja para encenar a saga da conquista científica que empurra os limites do

10

É importante precisar que este modelo não é defendido por Bueno. Ver (BUENO, 1985, p. 1425). No entanto, ele afirma que o jornalismo científico deve atender seis funções básicas: informativa, educativa, social, cultural, econômica, político-ideológica.

11

(38)

desconhecido. O divulgador sempre fala « em nome da ciência », ele estabelece uma comunicação unidirecional (modelo de difusão);

3) Finalmente, o terceiro postulado é aquele que inscreve-se na fé cega: é necessário - e é suficiente - para lutar contra a ignorância, difundir a ciência para reconciliar o público com a ciência e, consequentemente, facilitar a aceitabilidade social das inovações técnicas. (BENSAUDE-VINVENT, 2010, p. 5-6, tradução nossa).

O fosso evocado no primeiro postulado foi onipresente nas inquietações e debates depois do lançamento do Sputnik em 1957. Ao constatar um atraso na corrida espacial, iniciou-se, nos Estados Unidos, uma reforma do ensino das ciências e começou-se a preocupar-se com a compreensão pública da ciência (MILLER, 2010, p.1998). O fosso entre o público e a ciência ameaçaria os esforços dos Estados Unidos para reconquistar e preservar a liderança científica e tecnológica. A partir do início dos anos 1980, pesquisadores como Miller, nos Estados Unidos, e Durant, na Grã-Bretanha, intensificaram esforços para desenvolver pesquisas sobre a Public Understanding of Science (PUS). Assim, depois da publicação do Bodmer Report, em 1985, na Grã-Bretanha, foi criado, pela Royal Society, um Comitê de Compreensão Pública da Ciência (COPUS). Isso levou ao financiamento de projetos de pesquisa para medir os conhecimentos do público, e promover uma melhor compreensão pública da ciência. Uma primeira enquete de opinião pública feita pela Economic and Social Research Council (ESCR) trouxe resultados preocupantes sobre o conhecimento científico dos britânicos. Houve um estímulo para que mais tempo e mais espaço fossem reservados nas mídias à divulgação das ciências (como, por exemplo, a inclusão de uma seção semanal de ciência nos jornais). O relatório defendeu como um dever moral dos cientistas a divulgação da ciência, uma vez que o financiamento de suas pesquisas advém de recursos públicos. Uma segunda enquete de opinião pública, feita em 1996 revelou pouca melhoria dos conhecimentos científicos dos britânicos, marcando um fracasso por esse modelo de déficit de conhecimento sobre a ciência a ser combatido graças à divulgação científica.

No segundo postulado, aparece a figura do divulgador, ―terceiro homem‖, mediador e tradutor do discurso da ciência, e um modelo puramente comunicacional e unidirecional da divulgação entre produtores da ciência e o receptor passivo, reduzido a consumir a ciência. Esse modelo, associado àquele do déficit, é contestado. A noção de tradução do discurso da ciência em discurso popular pode, de acordo com Bensaude-Vincent (1993), ser ultrapassada:

Quanto ao fosso entre o discurso científico e o popular, ele tende a desvanecer um pouco na medida em que o estudo das práticas científicas destaca o trabalho incessante de reformulação dos enunciados científicos e revela um continuum de textos, adaptados para diversos públicos, desde os colegas e especialistas da

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disciplina até o ―público em geral‖ (BENSAUDE-VINCENT, 1993, p. 55, grifo nosso, tradução nossa).

Para ilustrar essa noção de continuum de textos, entre dois polos, que seriam o esotérico de um lado e o exotérico de outro, Jacobi (1984) dá o exemplo de um cientista que publica diversos textos para expor os resultados de sua pesquisa. O texto, destinado aos especialistas da disciplina, é esotérico (Jacobi tem em mente um público potencial n< 5000). Os outros textos, exotéricos, visam a atingir um público maior de duas revistas de divulgação científica (respectivamente n = 80 000 e n = 300 000). O texto esotérico pode ser parafraseado por um jornalista que vai citá-lo ou utilizá-lo para outra publicação (JACOBI, 1984, p.24). Podemos acrescentar que, para cada um desses textos, o autor imagina um leitor virtual e o adapta para sua textualidade, o que Orlandi (2005, p. 151) chama de efeito-leitor: ―Ao produzir um texto, o autor faz gestos de interpretação que prendem o leitor nessa textualidade constituindo assim ao mesmo tempo uma gama de efeitos-leitor correspondente‖.

É possível, ainda, ter uma visão menos redutiva e mais positiva desse público composto de sujeitos capazes, em momento de crises (Chernobyl, epidemia de AIDS), de participar e de intervir no processo mesmo de pesquisa, derrubando o modelo instalado pela propaganda, segundo a qual a "ciência descobre, indústria aplica e conforma-se o homem" (BENSAUDE-VINCENT, 2010, p. 4).12 Podemos exemplificar o papel ativo de associações e de cidadãos na rejeição dos Organismos Geneticamente Modificados (OGM) na França, como exemplo de não aceitação de uma submissão à ―Ciência‖ e aos imperativos técnicos e econômicos. Assim, quando a média de massa dá conta de assuntos como os OGM, o efeito de estufa e o aquecimento global, a voz da ciência pode ser dividida até por clivagens ideológicas e afogar-se numa multiplicidade de vozes diversas (MOIRAND, 2004).

No terceiro postulado apresentado por Bensaude-Vincent (2010), encontramos um aspecto abordado por Lévy-Leblond (2008) que diz respeito ao fato de que não é necessariamente por ignorância ou falta de compreensão que os cidadãos não suportam tanto como anteriormente o desenvolvimento da ciência. Além de compreenderem a ciência, eles gostariam de poder participar das decisões sobre o desenvolvimento da tecnociência. Esta abordagem política quebra os limites do Public Understanding of Science (PUS) e do modelo dominante da divulgação: "trata-se não só de compartilhar o saber, mas talvez, primeiramente, de dividir o poder" (LÉVY-LEBLOND, 2008, p. 8, tradução nossa).

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