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3 PERCURSO METODOLÓGICO

3.2 COLETA E ANÁLISE DOS DADOS

3.2.1 As entrevistas

As entrevistas foram realizadas individualmente, sempre antecedidas de uma apresentação dos objetivos da pesquisa e da aceitação do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE). A duração das entrevistas foi bastante variável, transcorrendo entre 20 minutos até 1h18 minutos. As entrevistas foram realizadas a partir das preferências dos professores: dia, hora e local, e foram aplicadas de 01 de outubro de 2016 a 20 de dezembro de 2016. Procuramos estabelecer um clima de confiança e de descontração tomando, no entanto, o cuidado de manter o distanciamento com relação às opiniões expressas pelo entrevistado.

Para facilitar a orientação das entrevistas, foi elaborado, e utilizado, um roteiro (APÊNDICE C) formado por blocos temáticos, inspirado naquele usado por Rocha (2010; 2012). O uso do roteiro em blocos temáticos permitiu responder a cada objetivo específico deste trabalho. Os blocos 1 e 2, discriminados no Quadro 4, permitiram conhecer e traçar o perfil dos professores, e, ao mesmo tempo, relacionar sua trajetória acadêmica à trajetória profissional, o que, de certa forma, contribuiu para compreender as condições subjetivas do trabalho docente, as quais influenciam as práticas pedagógicas dos professores. A organização das questões no bloco 3 permitiu responder aos nossos objetivos específicos: identificar, a partir dos relatos dos professores, as práticas pedagógicas e o uso que fazem dos Textos de Divulgação Científica; Analisar os sentidos atribuídos pelos professores às práticas pedagógicas que

envolvem o uso de Textos de Divulgação Científica. No quadro seguinte encontra-se resumido o roteiro com a lista dos blocos temáticos:

Quadro 3 - Blocos temáticos do roteiro da entrevista

Bloco temático Descrição

1. Origem social e trajetória de formação

- trajetória escolar

- trajetória de formação acadêmica e profissional - nível de formação dos pais

- acesso aos livros e revistas durante a infância 2. Trajetória

profissional

- escolha da profissão e inserção

- perspectiva e expectativas profissionais 3. O uso de TDC - Hábitos de leitura

- Planejamento (modo e material utilizado) - Uso ou não de TDC

- Conceito de TDC pelo entrevistado - RDC conhecidas pelo entrevistado - Critérios utilizados na seleção de TDC

- Estratégias didáticas desenvolvidas para usar os TDC em sala de aula - Vantagens do uso de TDC em sala de aula

- Dificuldades do uso de TDC em sala de aula

-Papel da formação inicial e continuada do entrevistado no seu uso de TDC. Fonte: Elaborado pelo pesquisador baseado em Rocha, 2010 e 2012.

Mesmo sendo definido um roteiro, as entrevistas não podem ser resumidas às respostas dos professores às questões a esse roteiro. Foi respeitada a sequência do pensamento do pesquisado, procurando obter uma narrativa natural do entrevistado. Para tanto, eles tiveram liberdade de discorrer sobre as temáticas, relatar suas experiências, suas próprias interrogações, seu sentido em relação ao uso dos TDC, mas, também, de discorrer sobre sua vida, suas condições de trabalho. Isso proporcionou ao entrevistado um espaço de reflexão e de expressão sobre a sua prática educativa, sobre sua concepção da ciência e da educação, e de seu olhar do mundo.

3.2.2 Análise temática de conteúdo

As entrevistas semiestruturadas realizadas foram gravadas em áudio e depois foram transcritas na íntegra, respeitando-se a fala dos entrevistados, tomando-se cuidado de não trocar uma palavra por outra, ou a ordem das perguntas. Para preservar seu anonimato, os entrevistados foram identificados por um número entre 1 e 14, e as escolas estaduais onde eles lecionam foram identificadas por uma letra de A até L. Quando na fala de um entrevistado foi

mencionado o nome de uma pessoa (colega de trabalho, professor, aluno), trocamos esse nome por outro, respeitando-se o gênero.

A análise dos discursos produzidos pelos entrevistados e pelo pesquisador no transcurso das entrevistas foi empreendida sobre o conjunto dos textos escritos, o corpus, e não sobre as gravações. Essa análise tem o objetivo de estabilizar o modo de extração do sentido e produzir os resultados que respondem aos objetivos da pesquisa. O sentido do discurso não é dado, ele é uma produção, fruto de uma leitura orientada de um material, que mesmo que pareça espontâneo, já é modelado pelas hipóteses e pelas interações entre entrevistado e pesquisador. A análise contribui para esculpir a mensagem e o sentido que vai ser extraído dela. Assim, para Blanchet e Gotman (2010, p. 90), depois de fazer falar o entrevistado, o pesquisador faz falar o texto. Para a análise de conteúdo, utilizamos Bardin (2009, p.42), que define como:

Um conjunto de técnicas de análise das comunicações visando obter, por procedimentos, sistemáticos e objetivos de descrição do conteúdo das mensagens, indicadores (quantitativos ou não) que permitam a inferência de conhecimentos relativos às conduções de produção/recepção (variáveis inferidas) destas mensagens.

A análise de conteúdo é uma leitura exógena cujo resultado depende dos objetivos do analista e de suas hipóteses. Escolhemos, como tipo de análise de conteúdo, a análise temática por sua coerência com a elaboração de modelos explicativos de práticas ou de representações (BLANCHET; GOTMAN, 2010). A análise temática não se atém à coerência interna de cada entrevista, mas busca uma coerência temática entre as entrevistas. Em outras palavras, trata-se de descontextualizar as falas para que elas possam funcionar como texto:

[…] é preciso descontextualizar o objeto para que ele possa funcionar como texto. O colecionador- historiador ou pesquisador- descontextualiza o objeto, fazendo que cada pesquisador, ao interagir com o objeto (cada fala), atribua a ele um dos seus inúmeros sentidos. Falas postas de lado a lado pelo tema, ênfase ou afinidade de significado, ainda que pronunciadas em diferentes contextos, produzem um efeito de coleção. Reunidos pelo que têm em comum, os enunciados permitem compreender discursos e identificar significados escondidos ou pouco visíveis, na integra das entrevistas (KRAMER; NUNES, 2007, p.431- 432).

Esse tipo de análise pode ser qualificado de horizontal, imaginando as entrevistas de lado a lado, buscando semelhanças e divergências a partir de cada tema. Ao contrário, uma análise entrevista por entrevista, separadamente, é qualificada de vertical e consiste em contemplar, por uma única entrevista, os temas abordados pelo entrevistado para buscar uma coerência interna. Assim, a análise temática consiste em um:

[...] recortar transversalmente de todo o corpus. A unidade de recorte elementar é um tema que representa um fragmento de discurso. Cada tema é definido por uma grade de análise elaborada empiricamente23. O Modo de recorte é estável de uma entrevista a outra (BLANCHET; GOTMAN, 2010, p. 93, tradução nossa).

O tema funciona, portanto, como a unidade de significação que se liberta do texto analisado em função dos critérios relativos à teoria que servem de guia para a leitura. Assim, a análise consiste em descobrir esses ―núcleos de sentidos‖ (BARDIN, 2009, p. 105).

Após a transcrição de todas as entrevistas, elas foram lidas uma a uma com o objetivo de conhecer o contexto, sem preocupação com sua análise. Posteriormente, houve a identificação dos temas e a construção da grade de análise a partir da leitura do corpus. A grade de análise, como o roteiro da entrevista, foi hierarquizada em temas principais e temas secundários (especificação).

Depois da identificação dos temas, a grade de análise construída funcionou como quadro estável para a análise das entrevistas. De cada entrevista, foram cortados enunciados correspondentes aos temas e foram classificados na rubrica ad hoc. Estes enunciados, que funcionam como unidade de significação, podem possuir o comprimento variável (parte de frase, frase, parágrafo).

A análise prosseguiu com o processo de seleção dos temas, assinalando as variações (semelhanças ou divergências) localizadas em cada texto e procurou elementos que explicassem essas variações. Para facilitar esse processo, foi elaborado, para cada tema, um ―quadro resumo‖, onde foram agrupados os enunciados de todos os entrevistados em relação a este tema24. Assim, foram elaborados quadros resumos intitulados ―hábito de leitura‖, ―conceito de TDC segundo os entrevistados‖, ―fontes e critérios de seleção dos TDC‖, ―objetivos para usar os TDC‖, ―sentido atribuído à leitura‖, ―estratégias didáticas‖, ―vantagens do uso de TDC‖, ―dificuldades para usar os TDC‖, ―uso de TDC e formação‖. No decorrer da análise, houve casos em que apareceu um mesmo enunciado em vários quadros resumos.

23

Empiricamente, pois os temas foram identificados a partir da leitura do corpus e não a priori mesmo se essa leitura é direcionada pela teoria que orienta a investigação.

24

Para facilitar leituras ulteriores das entrevistas, cada enunciado foi codificado com o número do entrevistado e com a posição do enunciado na entrevista.

Vale ressaltar que se a análise temática nos levou a descontextualizar os enunciados, ela nos permitiu entender melhor o contexto, por exemplo, as condições objetivas e subjetivas de trabalho. Por sua vez, numa relação dialética, uma melhor compreensão do contexto permitiu entender melhor o que era dito pelos entrevistados e que será debatido a seguir, no próximo capítulo.