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Avaliação das tecnologias inovadoras na produção do hábitat popular no Uruguai: Cooperativas de vivenda por ajuda mútua e produção de vivenda popular pelo mercado.

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Dissertação

Avaliação das tecnologias inovadoras na produção do hábitat

popular no Uruguai:

Cooperativas de vivenda por ajuda mútua e produção de vivenda popular pelo mercado

Donald Martins Fuentes

(2)

Donald Martins Fuentes

Avaliação das tecnologias inovadoras na produção do hábitat popular no Uruguai:

Cooperativas de vivenda por ajuda mútua e produção de vivenda popular pelo mercado

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Arquitetura e Urbanismo da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal de Pelotas, como requisito parcial à obtenção do título de Mestre em Arquitetura e Urbanismo.

Orientadora: Prof.ª Dr.ª Nirce Saffer Medvedovski

(3)

Donald Martins Fuentes

Avaliação das tecnologias inovadoras na produção do hábitat popular no Uruguai:

Cooperativas de vivenda por ajuda mútua e produção de vivenda popular pelo mercado

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Arquitetura e Urbanismo da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal de Pelotas, como requisito parcial à obtenção do título de Mestre em Arquitetura e Urbanismo.

Banca examinadora:

... Prof.ª Dr.ª Nirce Saffer Medvedovski (Orientadora)

Universidade Federal de Pelotas

... Prof. Dr. Paulo Afonso Rheingantz

Universidade Federal do Rio de Janeiro

... Prof.ª Dr.ª Célia Castro Gonsales

Universidade Federal de Pelotas

... Prof.ª Dr.ª Rosilaine André Isoldi

Universidade Federal de Pelotas

(4)

No sé si soy una persona triste con vocación de alegre, o viceversa, o al revés. Lo que sí sé es que siempre hay algo de tristeza en mis momentos más felices, al igual que siempre hay un poco de alegría en mis peores días. La tregua, Mario Benedetti

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Resumo

FUENTES, Donald Martins. Avaliação das tecnologias inovadoras na produção do hábitat popular no Uruguai: Cooperativas de vivenda por ajuda mútua e produção de vivenda popular pelo mercado. 2014. 138fls. Dissertação. Programa de Pós-Graduação em Arquitetura e Urbanismo. Faculdade de Arquitetura e Urbanismo. Universidade Federal de Pelotas, 2014.

Esta pesquisa pretende ser uma contribuição ao debate sobre a melhor forma de investir os recursos públicos na produção de vivenda social no Uruguai. As condições de acesso à vivenda e a forma como o Estado utiliza o dinheiro tem sido motivo de debate e envolve diversos setores da sociedade: Sindicatos de Trabalhadores (PIT-CNT), Universidad de la República (UdelaR), Sociedad de Arquitectos del Uruguay (SAU), Cámaras Empresariales de la Construcción, Federación Uruguaya de Cooperativas de Vivienda por Ayuda Mútua (FUCVAM), entre outros. Propomos uma análise das duas formas mais utilizadas pelo Estado para a construção do hábitat popular: Cooperativas de Vivendas e Produção de Vivendas pelo Mercado. Estudamos as técnicas construtivas inovadoras e como elas podem ser articuladas com os processos participativos na gestão social do hábitat. Os resultados poderão contribuir para o desenho das políticas públicas de vivenda no Uruguai.

Palavras-chave: déficit habitacional; cooperativas de vivendas; sistemas construtivos não tradicionais; plenário inter-sindical de trabalhadores; convenção nacional de trabalhadores.

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Resumen

FUENTES, Donald Martins. Avaliação das tecnologias inovadoras na produção do hábitat popular no Uruguai: Cooperativas de vivenda por ajuda mútua e produção de vivenda popular pelo mercado. 2014. 138fls. Dissertação. Programa de Pós-Graduação em Arquitetura e Urbanismo. Faculdade de Arquitetura e Urbanismo. Universidade Federal de Pelotas, 2014.

Esta investigación pretende ser una contribución al debate sobre la mejor forma de invertir los recursos públicos en la producción de la vivienda social en el Uruguay. El debate sobre el acceso a la vivienda es fermental en el Uruguay de hoy, e involucra a amplios sectores de la sociedad: Sindicatos de Trabajadores (PIT-CNT), Universidad de la República, Sociedad de Arquitectos del Uruguay, Cámaras Empresariales de la Construcción, FUCVAM, entre otros. Nos propusimos en esta investigación estudiar las dos formas más utilizadas por el Estado para la construcción del hábitat social en el Uruguay: Cooperativas de Viviendas y la Producción de Viviendas por el Mercado. Estudiamos las técnicas constructivas innovadoras y analizamos como estas nuevas técnicas pueden articularse en un proceso participativo de Gestión Social del Hábitat. Las conclusiones podrán contribuir para el diseño de las políticas públicas de vivienda en Uruguay.

Palavras-claves: déficit habitacional; cooperativas de viviendas; sistemas constructivos no tradicionales; plenario inter-sindical de trabajadores; convención nacional de trabajadores; federación uruguaya de cooperativas de viviendas por ayuda mutua.

(7)

Lista de Figuras

Figuras 1 e 2: Programas de Vivenda Social com a participação do autor deste trabalho. 13

Figura 3: Conjunto Habitacional de Marsella. 24

Figura 4: San Antonio III – Maldonado, Uruguai. A vulnerabilidade social e as

carências dos setores mais excluídos da sociedade.

27

Figuras 5 e 6: Bairro San Antonio III – Maldonado, Uruguai. A arquitetura da pobreza. 27

Figura 7: Esquema ilustrativo do Sistema Público de Vivenda do Uruguai. 29

Figura 8: Mostra como os objetivos se retroalimentam uns aos outros. 30

Figura 9: Esquema conceitual de Tecnologia Inovadora. 35

Figura 10: Mostra os elementos indispensáveis que deve cumprir uma tecnologia para

ser considerada sustentável desde nosso ponto de vista.

36

Figura 11: Tecnologias inovadoras. 37

Figura 12: Sistemas Construtivos mais usados no Uruguai segundo seus

componentes.

38

Figura 13: Composição dos sistemas construtivos alterna ativos ao tradicional. 39

Figuras 14 e 15: Pavilhão de exposições de Turim, 1958. Eng. Pier Luigi Nervi. Exemplo de pré-fabricação.

41

Figuras 16 e 17: Painéis pré-fabricados de concreto armado. 43

Figuras 18 e 19: Montagem dos painéis pré-fabricados de concreto armado no Uruguai –

Flasur SA.

43

Figuras 20 a 22: Fachadas do entorno do Conjunto Habitacional Euskal Erría. 44

Figura 23: Localização do Conjunto Habitacional CH20 - Rambla e Cuarem 44

Figura 24: Conjunto Habitacional CH20 - Localização: Rambla e Cuarem, Montevidéu,

Uruguai.

45

Figura 25: Conjunto Habitacional CH20: as patologias são verificadas a simples vista. 45

Figura 26: Espaço exterior - Conjunto Habitacional Parque Posada. 46

Figuras 27 e 28: Conjunto Habitacional Parque Posada – As fotos ilustram a densidade

habitacional do conjunto e a baixa densidade do entorno.

46

Figura 29: Mostra o tamanho das bolhas que caracterizam o concreto celular. 48

Figura 30: Estrutura, isolamento e acabamento no Steel Framing. 49

Figura 31: Mostra a montagem dos painéis com perfis galvanizados. 50

Figura 32: Mostra as características dos perfis galvanizados C e U. 50

Figura 33: Mostra a montagem dos montantes para os painéis com perfis de aço

galvanizado.

51

Figura 34: Mostra os perfis de parede e teto e os dois tipos de contravento mais

comuns: Cruz de Santo André e placas de OSB.

52

Figura 35: Montagem da estrutura do Sistema Construtivo Steel Framing. Mostra os

perfis que compõem a estrutura dos painéis de parede fixados a um radier de concreto armado.

52

Figura 36: Mostra o primeiro fechamento exterior com placas de fibra orientada (OSB). 53

Figura 37: Mostra um radier com calçada perimetral. Observam-se as esperas para

instalações de água e esgoto.

54

Figura 38: Conjunto de vivendas “Los Caracoles” – Sistema Construtivo Misto – Steel

Framing + Tradicional, em Maldonado – Uruguai.

54

(8)

Figura 40: Mostra dois operários colocando revoque a jato em painéis construídos com perfis de aço galvanizado.

55

Figura 41: Detalhe dos painéis e da primeira camada de reboco nas paredes. 56

Figura 42: Mostra toras de Eucaliptus grandis, uma das madeiras mais utilizadas para

a construção de vivendas no Uruguai.

58 Figuras 43 e 44: Mostram os dois principais microorganismos que atacam a madeira:

insetos e fungos.

58

Figura 45: Mostra o caráter isotrópico da madeira. 59

Figura 46: Evolução da produção florestal no Uruguai. Produção de milhes de

toneladas ao ano.

60

Figuras 47 a 49: Mostram diferentes etapas da montagem com Wood Framing. 62

Figuras 50 a 56: Mostram diferentes etapas da montagem do protótipo desenvolvido com o Sistema Wood Framing.

63

Figura 57: Vivenda social em madeira, fachadas – Sistema Construtivo Wood

Framing.

64

Figura 58: Mostra as diferentes etapas de montagem do Sistema Wood Framing. 66

Figuras 59 e 60: Mostra o sistema de fundações elevadas em base a pilotis de concreto. 67

Figuras 61 e 62: Exemplos de fundações elevadas em base a pilotis de madeira. 67

Figuras 63 e 64: Mostram fundações tipo “T” invertida e a impermeabilização da soleira

inferior numa fundação para Wood Framing.

68

Figuras 65 e 66: Colocação das placas de OSB sobre estrutura de piso. 68

Figura 67 e 68: Mostram a estrutura, o filme de poliestireno, as instalações elétricas e

hidrossanitárias no radier.

69

Figura 69: Diagrama de esforços de um painel no Sistema Wood Framing. 70

Figuras 70: Contravento, Cruz de Santo André. Contravento Diafragma OSB. 71

Figura 71: Mostra a marcação das paredes sobre o radier. 71

Figuras 72 e 73: Mostram a estrutura dos painéis de parede com o respectivo corta-fogo. 72

Figura 74 e 75: Mostram a construção de um protótipo de vivenda construído pelos

Arquitetos que participaram do “Curso Construção em Madeira”, na Faculdade de Arquitetura de UdelaR.

72

Figuras 76 e 77: Montagem dos pavimentos superiores. Sistema Wood Framing. 73

Figura 78: Mostra os detalhes de diferentes tipos de engaste entre os painéis. 73

Figura 79 e 80: Armado de painéis/parede, no atelier. 74

Figuras 81 e 82: Exemplo de armado de paredes no atelier. 74

Figura 83: Transporte vertical de um painel/parede. 75

Figura 84: Exemplo de transporte de uma parede construída em fábrica. 75

Figura 85: Exemplo de um corte vertical de um painel no sistema Wood Framing. 76

Figura 86: Corte horizontal de uma parede construída com Wood Framing. 77

Figura 87: Detalhe construtivo de uma cobertura no Sistema Wood Framing. 77

Figura 88: Colocação da barreira de vapor, nylon 200 micros. 79

Figura 89: Colocação do revestimento de gesso cartonado. Acabamento interior. 80

Figura 90: Mostra a colocação dos azulejos sobre uma parede de gesso impermeável

em um banheiro.

81

Figura 91: Conjunto Habitacional em Holanda, arquitetura em madeira – Sistema

Wood Framing.

81

Figura 92: Acabamento exterior com placas de cimento imitação tijolo (e=2 cm). 82

(9)

Figura 94: Montagem dos painéis e conectores. 83

Figura 95: Mostra a leveza dos conectores. 84

Figura 96: Mostra o painel visto de cima. 84

Figura 97: Mostra dois painéis de esquina com as esperas de aço para fixação ao

radier.

85

Figura 98: Corte horizontal de um painel – RBS. 85

Figura 99: Fundação tipo radier para o sistema construtivo RBS. 86

Figuras 100 e 101:

Detalhe da viga perimetral e marcação das paredes no RBS. 86

Figura 102: Marcação das paredes. 87

Figura 103: Detalhe das esperas para ancoragem dos painéis. Marcação das paredes. 87

Figura 104: Detalhes das situações possíveis de ancoragem entre os painéis e o radier. 88

Figuras 105 e 106:

A ancoragem entre a fundação e o painel e instalação elétrica no painel. 88

Figura 107: Aprumado dos painéis antes da concretagem. 89

Figuras 108 a 111:

Mostram o armado das paredes e a colocação dos conectores. 89

Figura 112: Detalhes do processo de aprumado dos painéis antes da concretagem. 90

Figuras 113 e 114:

Detalhes de conectores e painéis. 90

Figuras 115 e 116:

Obras do Conjunto Habitacional Mandubí. Programa de Integración de Asentamientos Irregulares (PIAI), 2002. Licitação Pública Internacional.

91 Figuras 117 a

121:

Conjunto Habitacional Mandubí. Programa de Integración de

Asentamientos Irregulares, 2002. Licitación Pública Internacional - Sistema Construtivo: Royal Building System.

92

Figuras 122 e 123:

Conjunto RBS - Fachada e detalhes das instalações RBS. 93

Figura 124: Instalação hidrossanitária na cozinha. Sistema construtivo RBS. 93

Figuras 125 e 126:

Solidariedade na construção do hábitat coletivo. 99

Figuras 127 e 128:

O IAT prepara a cooperativa para o trabalho solidário. 102

Figuras: 129 e 130:

Ilustram o trabalho horizontal do IAT com a comunidade envolvida. 103

Figura 131: Ilustra a aspiração inicial de um cooperativista, um programa de

necessidades e aspirações cuja síntese será coletiva.

103

Figura 132: Ilustra um organograma das comissões no período prévio a obra. 105

Figura 133: Organograma das comissões no período da obra. 106

Figura 134: A solidariedade expressa num grafite no muro de uma cooperativa. 109

Figura 135: Paredes duplas com câmara de ar. Sistema Construtivo Tradicional. 111

Figura 136: Mostra as diferentes capas de uma parede da envolvente opaca de 26,5cm

de largura.

112

Figura 137: Mostra dois cortes em parede dupla com câmara de ar, com e sem

isolamento térmico.

113

Figura 138: Orçamento para uma unidade habitacional de 50m2. Não inclui terreno

nem infraestrutura exterior. Os valores estão expressos em dólares americanos.

(10)

Figura 139: Orçamento de uma unidade habitacional construída com Royal Building System de 52m2. Não inclui terreno nem infraestrutura exterior. Os valores estão expressos em dólares americanos.

121

Figura 140: Sistema Construtivo Tradicional de 50m2. 122

Figura 141: Diagrama de Gantt. Cronograma físico da obra. Vivenda construída com

Royal Building System de 52m2.

(11)

Sumário

1 Introdução ... 12

2 Contextualização ... 17

2.1 A história do homem é a história do hábitat ... 17

2.1.1 Hábitat popular, antecedentes imediatos ... 19

2.2 O Hábitat Popular no Uruguai ... 25

2.2.1 Situação dos setores mais vulneráveis da população... 25

2.2.2 A produção do hábitat popular no Uruguai ... 27

2.2.3 Estrutura do Sistema Público de Vivenda no Uruguai ... 28

2.2.4 Lei 13728 - Lei Nacional de Vivenda ... 29

2.2.5 Plano Quinquenal de Vivenda: estratégia e objetivos ... 30

3 Produção Social do hábitat pelo Mercado ... 34

3.1 Sistemas construtivos não tradicionais ... 34

3.1.2 Pré-fabricação: antecedentes ... 40

3.2 A pré-fabricação no Uruguai ... 42

3.2.1 Sistema de grandes painéis de concreto armado no Uruguai ... 42

3.2.2 Sistema Construtivo STEEL FRAMING ... 49

3.2.3 Sistema Construtivo Wood Framing... 57

3.2.4 Sistema construtivo Royal Building System (RBS)... 82

4 O Movimento Cooperativo ... 94

4.1 Objetivos ... 94

4.2 Antecedente do Cooperativismo no Uruguai ... 95

4.3 Que é uma Cooperativa de Vivenda? ... 96

4.4 Tipos de Cooperativas de Vivenda ... 97

4.5 Cooperativas de Vivenda por Ajuda Mútua ... 98

(12)

4.5.2 Os Institutos de Assistência Técnica – IAT ... 101

4.5.3 O financiamento dos IATs ... 104

4.5.4 Como funcionam as comissões? ... 105

4.5.5 Por que aderir a uma cooperativa de vivenda? ... 107

5 Comparações entre o Sistema Construtivo Tradicional (SCT) e quatro Sistemas Construtivos não Tradicionais (SCNT) ... 110

5.1 Sistema Construtivo Tradicional ... 110

5.2 Grandes Painéis pré-fabricados de Concreto Armado (SCGP) ... 114

5.3 Sistema Construtivo Steel Framing (SCSF) ... 115

5.4 Sistema Construtivo Wood Framing (SCWF) ... 116

5.5 Sistema construtivo Royal Building System ... 117

5.6 Sistemas Construtivos: enfoque orçamentário ... 119

6 Considerações finais ... 124

Referências ... 126

(13)

1 Introdução

Nosso ponto de partida

O ponto de partida desta investigação é o nosso particular modo de ver a arquitetura, o lugar que nos damos dentro dela e o compromisso que, como cidadãos e arquitetos, fomos construindo ao longo da vida. Por isso, esta pesquisa parte da experiência do vivido. Procuramos ser objetivos e rigorosos na análise dos modelos, mas esta pesquisa não é neutra, tem a carga da fidelidade e do compromisso com o tipo de Arquitetura que acreditamos.

É fácil acumular páginas sobre o hábitat a partir do que outros muito mais ilustres já viram e mediram, e somá-lo ao conjunto de conhecimentos admitidos. Mas, nesse conhecimento acumulado teve pouca cabida “os outros”, os que se afastam dos cânones. Pode-se afirmar em que a representação intelectual “dos outros” tem sido fiel com o que eles pensam? Cada vez parece mais evidente a parcialidade do que nos chega como se fosse o “todo”. Por isso tem-se que valorizar mais as experiências pessoais, a aproximação fenomenológica frente às medições externas. O problema radica em que as duas tradições principais das Ciências Sociais, positivista e fenomenológica falam línguas dificilmente compatíveis. As medições são necessárias e apreciáveis e sua contribuição como fontes estadísticas, mas por si mesmas não são grande coisa se não vão acompanhadas de uma reflexão profunda sobre o significado das cifras. Devemos deixar fluir as experiências pessoais e não silenciá-las. (DURÁN, 2008, p. 21)

Durán afirma que, quando um arquiteto projeta, subordina sua obra a sua particular forma de ver a sociedade, o desenho estampa uma ideia geratriz, a qual deve servir ao espaço projetado, às vezes impera o desconcerto e não se sabe a quem serve o espaço, para quem se constrói, qual é a ordem moral que transcende o desenho.

Fiori (2002) também alerta para o compromisso profissional e salienta que:

os arquitetos que atuam nas periferias ao lado dos movimentos populares, e que em diálogo com os trabalhadores ensaiam soluções para os seus problemas mais elementares, ao mesmo tempo em que mobilizam a imaginação aguda para pensar uma nova sociedade e outra cidade, são possuidores de um conhecimento prático digno de reproduzir. Essa aliança entre uma fração minoritária dos arquitetos e grupos de trabalhadores é bastante recente, data dos anos 1960, pois historicamente estes

(14)

profissionais sempre ofereceram seus serviços aos donos do poder e do dinheiro. Atuar ao lado das organizações dos trabalhadores é, por isso, uma ruptura com os pressupostos elitistas (e também subalternos) da profissão, cujas consequências ainda precisam ser bem compreendidas. (FIORI, 2002, p.256)

O alto grau de complexidade que rodeia a gestão do Hábitat Popular na América Latina leva Pelli a formular a seguinte reflexão:

Construir a abordagem adequada para a gestão da produção Social do Hábitat passa por reconhecer a natureza complexa do hábitat enquanto sistema de situações em interação com outros sistemas. Passam por assumir a complexidade de seus processos de produção, fortemente determinados em sua concepção, desenvolvimento e resultados e pela maior ou menor presença de cada um dos grupos de atores afetados e seus respectivos paradigmas culturais. Neste contexto, a questão da formação dos arquitetos surge como vetor fundamental de cara ao acerto no enfoque na produção do hábitat social. (PELLI, 2008, p.43)

Todas as reflexões anteriores estão em convergência com nossa forma de ver a Arquitetura e fazem parte da base teórica sobre a qual estruturamos esta pesquisa.

Questões que pautam a Pesquisa

Partindo de nossa experiência empírica em numerosos projetos, com e sem a participação dos usuários nos processos de produção do hábitat popular, propomo-nos a produzir novos conhecimentos que ajudem a compreender como o uso de novas tecnologias no processo de gestão participativa do hábitat popular pode incidir no resultado físico da vivenda e na mais rápida satisfação da demanda habitacional da comunidade involucrada.

Figuras 1 e 2: Programas de Vivenda Social com a participação do autor deste trabalho. Fonte: Acervo particular do autor.

(15)

Consideramos que aprofundar no conhecimento sobre a gestão e produção do hábitat popular é um aporte significativo para desenhar programas que evoluam do assistencialismo compensatório (que caracteriza as políticas públicas de vivenda hoje), para um modelo inclusivo e participativo onde a incorporação de tecnologias inovadoras possa interatuar com as tradicionais num processo de autogestão assistida.

Por que é necessária esta mudança?

O debate surge, pois a autogestão coletiva, produzida pelas cooperativas de vivenda com Sistema Construtivo Tradicional (SCT) e a construção por empreiteiras, produzida pelo Mercado usando tecnologias inovadoras, disputam território e financiamento estatal, mas nenhuma destas duas formas de gestão do hábitat popular tem sido – por si mesma – capaz de dar resposta a crescente demanda habitacional do país.

O fracasso das Políticas Públicas de Habitação Popular para combater o déficit habitacional, apesar do grande volume de recursos econômicos investidos1, obriga-nos a repensar os modelos que tem sido os mais promovidos nas políticas públicas de vivenda nos últimos vinte e cinco anos. Para tanto, é importante saber: Quais são as fortalezas e quais as debilidades de cada modelo? Será possível estender pontes entre eles?

O que é necessário mudar em cada um, para que os modelos se ajustem a uma realidade que demanda cada vez mais vivendas, sem rebaixar os padrões de qualidade construtiva?

O corpo teórico que desenvolvemos está ancorado na práxis. Analisamos técnicas construtivas com diferentes graus de inovação tecnológicas, que convivem com o sistema tradicional no mercado da construção no Uruguai, e estudamos como estas novas técnicas poderão articular a eficiência econômica e a qualidade construtiva com a participação dos involucrados no processo de construção do hábitat popular.

1

Lei orçamentária para o quinquênio 2010-2015. O orçamento do Ministério de Vivenda passou nos últimos cinco anos de 400 milhões de dólares a 800 milhões de dólares. Disponível em:

(16)

Estrutura da pesquisa

Dividimos o trabalho em cinco partes. A Introdução é uma aproximação ao objeto de nossa investigação, nela centralizamos os eixos do trabalho, esclarecemos seus objetivos, localizamos o ponto de partida, enunciamos nosso modo de ver a arquitetura e narramos os fundamentos que sustentam esse compromisso com o hábitat popular.

No capítulo 2, Contextualização, percorremos os antecedentes do hábitat humano visto de uma perspectiva antropológica. Vemos como a evolução tecnológica e os ciclos econômicos que surgem a partir dos novos inventos terminam influindo no atual conceito de hábitat. A passagem pelos ciclos históricos e econômicos é superficial e breve, tem um propósito meramente ilustrativo, mas serve de base para a compreensão de conceitos que explicam a emergência habitacional atual: valor do solo urbano e a vivenda como mercadoria.

Analisamos os antecedentes imediatos do hábitat popular. O Congresso Internacional da Arquitetura Moderna (CIAM) por sua importância na determinação do ponto de inflexão na historia do tratamento do hábitat dos setores sócias mais vulneráveis, até então, ausentes na agenda dos Arquitetos.

Logo nos instalamos no Uruguai. Analisamos a política pública de habitação popular no País com destaque para os últimos cinco anos. Apoiamo-nos em dados do “Ministerio de Vivenda Ordenamiento Territorial y Médio Ambiente” (MVOTMA), e incluímos na análise, dados do Censo 2012 fornecido pela “Dirección Nacional Estadísticas” (DNE). Analisamos a Estrutura do Sistema Público de Vivenda, a Lei Nacional de Vivenda (Lei 13728) e o marco Jurídico que lê servem de base.

Analisamos os mecanismos que utiliza o estado para por em pratica o Plano Quinquenal de Vivenda.

Na terceira parte deste estudo, Produção Social do hábitat pelo Mercado, estudamos as tecnologias industriais mais utilizadas na produção do hábitat social. Analisamos os sistemas construtivos não tradicionais empregados pelas empreiteiras: Grandes painéis de concreto armado, Steel Framing, Wood Framing e

Royal Building System. Estudamos debilidades e fortalezas dos sistemas

construtivos não tradicionais na perspectiva de sua utilização num processo de participação coletiva como as cooperativas de vivenda por ajuda mútua.

(17)

das Cooperativas de Vivenda. Analisamos em profundidade o Sistema Cooperativo de Vivenda por Ajuda Mútua: O que é ajuda mútua? As chaves do sistema: como se organizam as cooperativas? O rol que cumprem os Institutos de Assistência Técnica (IAT); a capacitação social dos cooperativistas para o trabalho comunitário; o empréstimo financeiro do Estado, os subsídios ao parcelamento e o subsídio à permanência no sistema cooperativo; fortalezas, debilidades e desafios do sistema cooperativo.

(18)

2 Contextualização

2.1 A história do homem é a história do hábitat

É possível que a afirmação marxista: “A historia do homem é a historia da luta de classe” (MARX; ENGELS, 1997, p. 10) seja verdadeira. Porém, salientamos que esta afirmação é pelo menos incompleta, pois a necessidade de comer para manter-se vivo e de proteger-manter-se do meio exterior para colocar-manter-se a salvo das inclemências da natureza é a luta mais importante – de todos os dias – para a grande maioria dos habitantes do planeta, ontem e hoje. Alinhado com esta reflexão inicial, é possível afirmar que a história do Homem é a historia da luta: pela alimentação e pelo hábitat. O hábitat humano é fortemente condicionado pelos ciclos econômicos e apesar de que a história do hábitat e os ciclos econômicos não configurem o tema central desta pesquisa, é imprescindível que levemos em conta algumas passagens deste processo. Isto irá nos ajudar a separar as suas causas das consequências e a compreender que o modelo de produção capitalista do hábitat contemporâneo, (que tem apenas 150 anos), ser uma prática recente frente aos milhões de anos de aplicação dos modelos que o antecederam.

Logo, passado o período inicial e no transcurso dos milhões de anos que antecederam a sociedade mesopotâmica, o homem foi nômade2, e gregário3, seu hábitat, foi um refúgio ocasional e temporário. Assim, o progresso tecnológico – desde uma perspectiva contemporânea – foi lento.

Todos os esforços e a energia estiveram destinados a desenvolver estratégias de sobrevivência frente às hostilidades e ataques da natureza.

De Masi4, afirma que:

2

Comunidades ou povos que se transferem de um lugar a outro, em lugar de estabelecer-se permanentemente em um só lugar.

3

Relativo a quem segue uma tendência a agrupar-se em grupos sociais.

4

Doménico De Masi nasceu na Itália em 1938. É professor titular de Sociologia do Trabalho na Universidade de Roma.

(19)

Foi a partir de Neandertal e depois de Cro-magnon que o homem conseguiu desenvolver sistemas culturais mais elaborados, que o fizeram capaz de enfrentar com melhores ferramentas, a insegurança e o medo ao desconhecido. Com a capacidade de abstração surge o culto aos mortos, a magia, o gozo estético, o erotismo desvinculado da procriação, a gastronomia, a arte, etc. Dominou o fogo, aperfeiçoou a capacidade de abstração, depurou a criatividade, explorou a sensibilidade estética com a música, a pintura, a escultura. (DE MASI, 2000, p. 56)

Ao final desta longa viagem, afirma De Masi, o homem aprendeu a caminhar em posição ereta, produziu ferramentas, descobriu que para ter filhos não é suficiente apenas a mulher, mas que é imprescindível a participação genética do homem.

Com a Revolução Neolítica, aprendeu a cultivar a terra e inventou a agricultura, dando um passo gigante na história – passou de caçar, colher e pescar ao cultivo programado. Este acontecimento tem uma importante consequência: a agricultura gerou dependência territorial entre o homem e seu sustento.

Esta dependência foi importante para o desenvolvimento futuro do hábitat: por um lado, determinou o surgimento de assentamentos humanos permanentes, os quais deram origem às primeiras cidades; por outro lado, a agricultura constituiu-se no primeiro ataque violento à natureza e representou a primeira ruptura de um ecossistema. Estes dois aspectos, assentamentos humanos e ruptura do equilíbrio natural, acompanham a evolução do hábitat até nossos dias.

O arquiteto Esteban de Manuel Jerez5(2012) salienta que:

A Agricultura e o surgimento das cidades representam o primeiro salto significativo e de impacto do Hábitat Humano sobre o meio ambiente e a natureza. A Cidade é o berço da urbe, da Civita e da polis. A civilização Agrícola nos aporta os fundamentos do Urbanismo, o desenho das cidades, da civilização sustentada na escrita e a transmissão por esse meio de conhecimentos em todas as direções, proporcionou uma primeira rede de cidades relacionadas a roteiros comerciais, marítimos e militares. Neste cenário o Hábitat começa a produzir um impacto sobre o território que o faz cada vez mais complexo. A organização política passa a expressar-se através das Cidades-Estados, nos Impérios e nos Estados Nacionais. As atividades residenciais, artesanais e simbólicas compartem espaços. O palácio do nobre e o rico Comerciante convivem com a vivenda das classes Populares. (JEREZ, 2012, p. 23)

Ao longo destes anos, o homem demonstrou extraordinária sensibilidade

5

(20)

artística, trabalhando a cerâmica para fabricar objetos utilitários ou religiosos, mas, foi quando queimou o barro para produzir tijolos (acerca de 5000 a.C.) que fabricou o primeiro produto industrial da história. Com esse descobrimento mostrou o domínio simultâneo dos quatro elementos da Natureza: terra, água, vento e fogo. “Descobriu que o giro de um corpo redondo na volta de um eixo oferecia grande vantagem para o deslocamento; criou as Cidades e inventou a escrita, a matemática, a astronomia, etc.” (DE MASI, 2000, p. 27). Morou em comunidades, as quais foram transformando-se em organizações maiores e mais complexas à medida que foi passando o tempo. Esta reflexão serve para destacar que o sistema comunitário, com forte espírito solidário, foi à primeira forma de organização social que o homem escolheu e, a autoconstrução, o mecanismo mais utilizado para resolver o problema da vivenda.

O arquiteto argentino Rodolfo Livingston (1995)6 relata que ao longo da história da humanidade, o homem sempre construiu sua casa, desde o iglu dos Esquimós, às choças africanas, às aldeias de pescadores do Mediterrâneo ou à vivenda Islâmica. Assim, os povos levantaram sua vivenda com respeito pelo clima e pela natureza, utilizando os materiais próprios de cada lugar, atingindo um alto nível estético.

Livingston (1995) também afirma que a casa, assim como a comida, permaneceu sempre no âmbito da tradição popular e tanto a vivenda, como a gastronomia inspiraram-se nas possibilidades que cada lugar e cada território ofereciam.

2.1.1 Hábitat popular, antecedentes imediatos

Será somente a partir do século XVIII, que a longa e lenta evolução humana7 experimentará um forte abalo. É o início da PrimeiraRevolução Industrial8.

6 Rodolfo Livingstón (1931) é um arquiteto argentino, criador da especialidade “Arquitetos de Família”,

um sistema de desenho participativo que recebeu dois prêmios internacionais (“Best Practices”, Estambul, 1996 e “World Habitat Awards”, Bruselas, 2002).

7

Na perspectiva temporal dos humanos.

8

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Nascida da acumulação primária da economia colonial inglesa, da utilização da energia a vapor e da eletricidade, das conquistas burguesas, das liberdades parlamentares e da confiança iluminista no racionalismo, a organização científica estava destinada a evoluir por todo o século XIX, até encontrar seu apogeu nas grandes fábricas metalúrgicas e automobilísticas dos EEUU. (DE MASI, 2000, p. 126)

Desse modo, quando a Segunda Revolução Industrial9explodiu na Europa, as consequências sociais de tanto tecnicismo começaram a aparecer. Assim, por um lado a Primeira Guerra Mundial e, por outro, a crise econômica global de 1929, aniquilaram a Europa. Este fato é de fundamental importância para entender a nova Arquitetura e a nova consciência que nasce das cinzas da Europa destruída.

Na verdade, nenhum país da Europa escapou da crise. Cidades inteiras foram devastadas pela destruição produzida por armas nunca vistas antes, famílias de operários desempregados movimentando-se de um lugar a outro, fugindo das pestes e da fome, em procura de um refúgio onde pudessem passar a noite. Esse foi o cenário deflagrado ante os olhos dos arquitetos europeus do começo do século XX. As imagens da destruição foram de tal magnitude que conseguiram sensibilizar ao Movimento Moderno.

De acordo com Segre10(2009), até a Revolução Industrial, a população do planeta não tinha atingido um bilhão de habitantes e nenhuma cidade (excetuando a Roma Imperial) tinha atingido um milhão. Com a Revolução Industrial, a aceleração do processo fez surgir um fato novo nunca visto antes na história da humanidade: a população urbana do mundo superou a população rural.

Este fato implica a criação de espaços artificiais para sete bilhões de pessoas, das quais apenas quinhentos milhões (14%) vivem em condições de decorosa dignidade e fazem usufruto da vantagem originado na eclosão tecnológica das últimas décadas. O restante da população, perto de 86%, vive na pobreza, concentrada majoritariamente nas treze maiores mega cidades do mundo, das quais quatro são Latino-americanas: Cidade de México, São Paulo, Rio de Janeiro e Buenos Aires (SEGRE, 2009).

América do Norte e América Latina converteram-se em territórios de emigrantes. Ao sul do Rio Bravo a emigração teve duas vertentes: por um lado a

9

Segunda Revolução Industrial: petróleo, aço e eletricidade.

10

Roberto Segre (Itália, 1934 - Brasil, 2013) foi um arquiteto, historiador, professor e crítico de Arquitetura. Trabalhou na Argentina, em Cuba e no Brasil. Desde 1994, atuou como pesquisador e professor do curso de pós-graduação em Arquitetura da Universidade Nacional do Rio de Janeiro.

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proveniente da Europa; por outro lado, a migração do campo para a cidade.

Assim, todos os dias o vasto e fértil território latino-americano expulsa de sua área rural um enorme contingente de camponeses pobres, vítimas da marginalização tecnológica e do bombardeio mediático do consumismo. E, então, cansados de lutar pela sustentabilidade produtiva e pela viabilidade econômica, famílias inteiras se transladam à periferia das cidades, ansiosas por receber alguma migalha do progresso e dispostas a transformar-se em protagonistas da história global. A chegada do trator, a mecanização das colheitas, a máquina de esquilar e o cercado dos campos com arame, ajudaram a expulsar aos peões pobres do meio rural sem dar-lhes um lugar seguro no meio urbano. São camponeses agora convertidos em proletários urbanos, trabalhadores fortes, muito deles analfabetos; antes sem terra rural, agora sem terra urbana.

É neste contexto que celebra-se em 1928 o primeiro Congresso Internacional da Arquitetura Moderna e constitui-se um ponto de inflexão no tratamento do hábitat popular. Com o CIAM, a arquitetura, pela primeira vez na história, (ainda que por breve tempo), decide tomar posição a favor dos setores populares, pensando soluções para o espaço da pobreza. E, assim, desce do pedestal elitista, no qual se posicionou durante milhares de anos, e põe na agenda dos arquitetos e no currículo escolar da academia, a casa do operário, do trabalhador, do artesão, do pequeno e médio comerciante, do pequeno e médio industrial, do estudante, do professor, dos aposentados. Dito de outra forma, os arquitetos colocaram pela primeira vez na agenda da Arquitetura, a imensa maioria da população mundial.

Foi a partir da Revolução Industrial que os países capitalistas lograram criar aquilo que Fiori Arantes (2002), referindo-se a industrialização das cidades, reputa “uma das obras institucionais mais complexas e impressionantes que a humanidade conseguiu montar”, mas, apesar das transformações radicais que aconteceram na estrutura social e de convivência, a solidariedade comunitária, a autoconstrução e a ajuda mútua, continuam sendo os mecanismos mais usados na hora de resolver o hábitat popular.

Durante séculos, a Arquitetura foi o braço oculto do poder hegemônico, nobre, militar ou religioso. Palácios, Castelos, Fortalezas e Igrejas foram seus monumentos. A Modernidade, com a Revolução Industrial, descobriu novos monumentos da burguesia e do proletariado. Aparecem em cena os arranha-céus e os conjuntos habitacionais de Interesse Social. O CIAM foi a resposta à nova realidade. (ARANTES, 2002, p. 87)

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Do nosso ponto de vista, a grande contribuição social do CIAM, foi o fato do mesmo ter chamado à atenção de vastos setores da população, bem como ter colocado a arquitetura a serviço de uma causa, a dos setores populares, cuja projeção internacional, ainda antes da Primeira Guerra Mundial, já era evidente.

Quando recrudesciam os efeitos residuais da industrialização capitalista na Europa (século XIX), com exclusão social massiva de operários e os “grandes exércitos de reserva de mão de obra, estavam disponíveis”, antropólogos, filósofos e sociólogos, chamaram a atenção para este fato. Marx e Engels, em 1848, escreveram o primeiro chamado à globalização da história. A globalização dos operários: “Proletários de todos os países, uni-vos”.

Os cataclismos do começo do século XX aprofundaram a crise do Capitalismo em sua expressão econômica e social. A dramática situação do hábitat social terminou sensibilizando os arquitetos mais influentes de todo o mundo e a vivenda social foi – pela primeira vez – tema de estudo nas Academias.

Walter Gropius, primeiro diretor da Bauhaus, abordou o tema da vivenda e vinculou seu processo de construção ao processo de produção industrial afirmando que, “a vivenda é um organismo técnico-industrial, nele a unidade se compõe organicamente de várias partes” (apud WOUDE, s/d, p. 6).

Para Hannes Meyer (1972, p. 96-97), seu sucessor em 1928, “construir é um processo biológico, não é um processo estético [...] construir não é outra coisa que organização: social, técnica, econômica e psicológica”.

Vamos nos deter nesta afirmação de Meyer, por considerá-la um ponto de inflexão no tratamento do hábitat popular por parte dos arquitetos. Dizer que “construir, não é um processo estético” é atribuir à organização social um caráter relevante, é dizer algo totalmente novo e absolutamente diferente de tudo o que historicamente propôs a arquitetura, para quem a forma subordinou a função nos últimos cinco séculos.

Na mesma linha, Mies Van der Rohe (apud WOUDE, s/d, p. 6) salienta que, “os problemas da nova vivenda tem suas raízes nas mudanças da estrutura material, social e espiritual de nosso tempo; só daqui é possível chegar a compreender o problema”. Além disso, o autor afirma que o problema da nova vivenda – na realidade – é um problema espiritual, e a luta pela nova vivenda é parte da luta por uma nova forma de vida.

(24)

No Brasil, os arquitetos vinculados ao Movimento Moderno também fizeram sentir sua voz. Assim, Vilanova Artigas, destaca:

Sou dessa geração de arquitetos modernos que, pela primeira vez, foram até o conhecimento do fazer operário, ou do subempreiteiro, para dizer-lhes, em desenho, em projeto, o que era preciso fazer […]. Nós rompemos com os resquícios medievais que ainda prevaleciam […]. Por que você poderia projetar no papel, desenhar no papel, não a escada que o escadeiro ia fazer, mas aquela que você queria que fosse realizada, dentro do espaço que lhe servia. Aí há uma passagem, um ponto histórico diferente, totalmente diferente. (ARTIGAS, 2002, p. 256)

Apesar dessa convicção dos jovens arquitetos brasileiros, verdadeiramente preocupados em buscar soluções para o hábitat popular, de acordo com Pedro Fiori Arantes (2002), o espaço proletário formou-se no Brasil na ilegalidade, em geral autoconstruído, com precariedade de meios e técnicas, sem ter passado pelo traço do arquiteto. As massas, excluídas dos direitos da cidadania, também o foram do desenho. Portanto, ao contrário da vocação democrática que alegava possuir, aqui o design funcionou como uma espécie de marca registrada do privilégio. Refletindo sobre este período de eclosão do Movimento Moderno, Ermínia Maricatto (2002) nos diz que,

Em resposta ao crescente movimento operário e à demanda por vivenda, os arquitetos responderam com inovadoras propostas de mudança no design das unidades habitacionais, na tipologia dos blocos, nos novos padrões dos serviços, na hierarquia da circulação, buscando diminuir custos e garantir um padrão mínimo de qualidade. A busca do mínimo não significou redução de padrões vigentes, ao contrário, significou dar um padrão aceitável para todos, considerando a grande dimensão da carência. (MARICATTO, 2002)

No entanto, foi no 2° ClAM– desenvolvido sob o lema da “Habitação para o mínimo nível de vida” – que essas questões foram mais debatidas, sob a liderança de Ernst May. Assim, a célula residencial, ponto de partida desta nova proposta, previa um novo desenho para a cozinha, o qual considerava a mudança do papel da mulher na sociedade, os novos produtos industriais domésticos (aparelhos e alimentos) e as novas instalações prediais. Dessa forma, ainda vinculada a essa evolução da família e da sociedade, parte das funções domésticas foram transferidas para o equipamento social, acarretando a mudança da relação público/privado na configuração das cidades.

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O 2° CIAM foi o auge do engajamento do movimento internacional de arquitetos na questão da qualidade de vida dos trabalhadores. A partir de então, o movimento fez uma inflexão, ganhando peso numa orientação mais formalista e mais engajada ao processo de acumulação capitalista (MARICATTO, 2002).

O debate no 2° CIAM teve uma consequência imediata no atelier dos Arquitetos da Europa com efeitos quase simultâneos no continente Americano. A análise, o estudo e o desenvolvimento de propostas habitacionais com técnicas construtivas alternativas ao sistema construtivo que tradicionalmente foi utilizado para construir vivendas.

Figura 3: Conjunto Habitacional de Marsella. Fonte: Via Rosario

Logo estes sistemas construtivos e os postulados do Modernismo se espalharam por todo o mundo. As capitais Latino-americanas se europeizaram e as novas tendências substituíram a cultura construtiva local. Ainda hoje, quando os princípios defendidos pelo modernismo declinaram e são levados em conta cada vez menos pelos Arquitetos, um paradigma persiste: a globalização estética da forma que se superpõe as que vêm das classes populares e aos valores das culturas locais. O que interessa ao nosso trabalho é como esses paradigmas influíram – e influem ainda hoje – na realidade construtiva do Uruguai.

(26)

2.2 O Hábitat Popular no Uruguai

2.2.1 Situação dos setores mais vulneráveis da população

O Uruguai acumula há mais de um século um déficit habitacional endêmico, cujo crescimento geométrico projeta um futuro pouco alentador. Contudo, o país tem realizado grandes esforços e experimentado diversos programas de habitação popular para mitigar a segregação social. Alguns programas priorizaram os processos inclusivos, com participação dos usuários nos modelos de gestão, outros promoveram programas de estímulo à iniciativa privada e chamaram as empreiteiras para desenvolvê-los. Tanto um como outro fracassaram estrepitosamente no intento de atingir o objetivo procurado.

O certo é que nem os programas com forte participação dos usuários, como as Cooperativas de Vivenda, nem os programas onde os usuários não participam das decisões, como os promovidos pelo Mercado (financiados pelo Estado), têm sido eficientes, (como pode ser evidenciado pela realidade11, de um déficit de cem mil vivendas para uma população de três milhões de habitantes.) Emergência social essa gerada pelo enorme contingente de homens e mulheres que nos últimos cem anos foram expulsos do campo pela Revolução Industrial e não têm um lugar “à sombra”, na cidade pós-industrial do século XXI.

A Sociedade Uruguaia gasta, através do Ministerio de Vivenda Ordenamiento Territorial y Medio Ambiente12, grandes quantidades de recursos econômicos para contemplar programas de vivenda destinados a minimizar o déficit habitacional dos setores sociais mais desfavorecidos. Estes recursos muitas vezes não são bem utilizados e terminam financiando projetos que em pouco tempo, transformam-se em verdadeiros problemas para os moradores.

A arquiteta Felicia Gilboa (1999), no livro La vivenda social: evaluación de programas y tecnologías afirma que os problemas mais comuns detectados são:

11

Cf. FUCVAN, o déficit habitacional do Uruguay é de aproximadamente 100 mil vivendas. Disponível em: <http://www.fucvam.org.uy/>. Acesso em: 29 jun. 2014.

12

O Orçamento do MVOTMA duplicou nos últimos cinco anos. Passou de U$ 400 Milhões a U$ 800 Milhões de dólares. Fonte: <http://www.mvotma.gub.uy/el-ministerio/transparencia/presupuestoqui nquenal-2010-2014.html> Acesso em: 13 abr. 2014.

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má qualidade construtiva dos conjuntos, umidades, rachaduras, maus acabamentos, fechamentos exteriores deficientes, problemas nas instalações hidrossanitárias, elétricas, etc; a inadaptação social dos usuários por falta de preparação e treinamento para o convívio com distribuição de responsabilidades; a inadaptação cultural e urbana. Muitas vezes os conjuntos são construídos em prédios isolados do tecido urbano e localizados em lugares distantes dos serviços e do trabalho dos moradores ou o projeto do conjunto é inadequado às aspirações e costumes dos moradores.

Os fatores acima mencionados, separados somente para facilitar um estudo organizado, muitas vezes aparecem combinados entre eles e agravam mais o problema. Uma vez que os conjuntos habitacionais são ocupados por seus moradores, considera-se como resolvida a demanda habitacional de determinado número de famílias, mas na realidade o problema da vivenda não foi resolvido. Estas são retiradas oficialmente da lista de famílias com necessidades habitacionais insatisfeitas, porém, estas famílias não foram beneficiadas com uma solução habitacional e, sim, com um problema habitacional que em muitos casos lhes acompanhará durante toda a vida. Se a finalidade das políticas públicas de caráter social, particularmente das políticas habitacionais, é contribuir para a melhora da qualidade de vida daqueles setores da sociedade, que por si mesmos não têm condições de resolver seus problemas de vivenda, então, a rigorosa análise do destino dos recursos econômicos que a sociedade põe em mãos do Estado para socorrer aos setores mais vulneráveis passa a ser um imperativo ético irrenunciável, que nos inclui como cidadãos e arquitetos.

(28)

Figura 4: San Antonio III – Maldonado, Uruguai. A vulnerabilidade social e as carências dos setores mais excluídos da sociedade. Fonte: Acervo particular do autor, 2010.

Figuras 5 e 6: Bairro San Antonio III – Maldonado, Uruguai. A arquitetura da pobreza. Fonte: Acervo particular do autor, 2010.

2.2.2 A produção do hábitat popular no Uruguai

A produção do hábitat popular no Uruguai se faz por uma destas três vias: a) o mercado;

b) a gestão social;

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Nas três vias, o Estado atua como agente financiador do hábitat popular, mas não destina a mesma quantidade de recursos econômicos em cada uma das alternativas descritas. O modo de construção feito pelo mercado e com a participação de empreiteiras tem sido até agora a forma preferida pelo Estado para abordar o déficit habitacional13.

Com a chegada da esquerda ao governo, começaram a aparecer novos elementos nas políticas públicas de vivenda popular que alentaram um futuro mais promissor. O último Plano Quinquenal de Vivenda (2010-2014)propõe potencializar alternativas que recolham a tradição de autogestão da produção popular. O Ministerio de Vivienda Ordenamiento Territorial y médio Ambiente se propõe, através do Plano Quinquenal de Vivenda, a gerar um forte impulso ao processo de Gestão dos usuários na construção de suas vivendas, animado pelo princípio de que aqueles que hoje são parte do problema passem a ser parte da solução.

O que em grandes linhas identifica as políticas públicas de vivenda no Uruguai, desde a chegada da esquerda ao governo do país em 2005, é sua intenção de mudar o paradigma dominante na produção do hábitat popular. O novo paradigma que se promove apoia-se no desenho de uma política pública de vivenda e hábitat popular com forte impressão socioterritorial, concebida desde a sustentabilidade ambiental, socioeconômica e financeira.

2.2.3 Estrutura do Sistema Público de Vivenda no Uruguai

Quando se instala um novo governo no Uruguai, (fato que ocorre a cada cinco anos), o Poder Executivo tem um prazo de 180 dias para enviar ao Parlamento o “Plano Quinquenal de Vivenda”. Este Plano – que deverá ser aprovado pelo Parlamento – estabelece as pautas e o planejamento de toda a política pública de Vivenda do Uruguai pelos próximos cinco anos, a isto chamamos Plano Quinquenal, e será conduzido pelo Sistema Público de Vivenda (SPV).

O Sistema Público de Vivenda é o encarregado de avaliar, programar e

13 60% do Orçamento do MVOTMA destinado à vivenda são Licitações Públicas. Fonte: “Rendición

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administrar os recursos do orçamento nacional dirigido à promoção do hábitat popular. Está integrado por: Ministerio de Vivienda, Ordenamiento Territorial y Médio del Uruguay (BHU), Movimiento de Erradicación de la Vivienda Insalubre Rural (MEVIR) e Programa de Integración de Asentamientos Irregulares (PIAI).

Ministerio de Vivienda Ordenamiento Territorial y Medio Ambiente – MVOTMA

Agencia Nacional de Vivienda – ANV

Banco Hipotecario del Uruguay BHU

Movimiento de Erradicación de la Vivienda Insalubre Rural

MEVIR

Programa de integración de Asentamientos Irregulares

PIAI Figura 7: Esquema ilustrativo do Sistema Público de Vivenda do Uruguai.

Fonte: Elaborado pelo autor, 2014.

2.2.4 Lei 13728 - Lei Nacional de Vivenda

A lei fundamental para desenvolvimento das políticas públicas de vivenda social no Uruguai é a Lei n.o 13.728, de 17 de Janeiro de 1968, conhecida como Lei Nacional de Vivenda ou Lei Juan Paulo Terra, em homenagem ao Arquiteto redator da lei. As leis complementares são a Lei n.o 16.112, de 1990, que cria o Plano Quinquenal de Vivenda e obriga o Ministério de Vivenda Ordenamento Territorial e Meio Ambiente a definir e programar as políticas públicas de Vivenda por um período de cinco anos; e a Lei n.o 13. 728, a qual prevê que a definição do Plano Quinquenal seja ouvida uma Comissão de amplo espectro, formada por atores relevantes dos setores envolvidos no tema vivenda. Tal Comissão tem o rol de assessorar o Ministério, mas sua opinião não é vinculante.

2012>. Acesso em: 16 jul. 2014.

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O Plano Quinquenal 2010-201414 é o quinto plano formulado pelo Ministerio de Vivenda, Ordenamiento Territorial y Medio Ambiente desde sua criação em 1990 até agora. Paralelamente ao Plano Quinquenal, o Presidente da República, José Mujica, assinou um decreto que declara como prioridade nacional atender a emergência da população que se encontra em situação de precariedade sócio habitacional, pela via dos fatos, este decreto cria o Plano de Integração Sócio Habitacional, conhecido como “Plan Juntos”.

2.2.5 Plano Quinquenal de Vivenda: estratégia e objetivos

Os objetivos das Políticas Públicas de vivenda poderiam ser representados num gráfico como este, e ilustram o espírito da Lei Nacional de Vivenda do ano 1968.

Figura 8: Mostra como os objetivos se retroalimentam uns aos outros. Fonte: Elaborado pelo autor, 2014.

14 Fonte: Ministerio de Vivienda, Ordenamiento Territorial y Medio Ambiente – Plano Quinquenal de

Vivienda 2010-2014: “Mi lugar entre todos”. Disponível em: <www.mvotma.gub.uy> Acesso em: 21 mar. 2014.

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Entre os objetivos do Plano Quinquenal de Vivendas encontramos:

a) desenhar e estruturar ações e programas tendentes a reverter os processos de segregação social e fragmentação territorial;

b) ajustar a oferta habitacional às necessidades reais da população através de diversas ferramentas e programas que atendam tanto para regularização do estoque existente como para a geração de novas unidades que aumentem a oferta habitacional;

c) obter e administrar os recursos públicos que efetivem estas políticas e orientar a poupança privada num sentido convergente com este objetivo; d) desenvolver mecanismos de gestão com outros organismos do Estado

para o desenvolvimento de políticas de hábitat à escala nacional, departamental e local;

e) articular as ações do Estado com os agentes privados e organizações sociais com incidência na problemática habitacional.

Como podemos ver, os objetivos a que se propõe o Plano Quinquenal para transformar as condições habitacionais da população estabelecem uma meta extremadamente ambiciosa. Supõem, em primeiro lugar, que a política de vivenda atue sincronizada com o conjunto de transformações sociais, culturais, econômicas e institucionais, coordenadas de tal forma, que sua implementação permita aproximar-se a um país com prosperidade econômica e justiça social.

Nos aspetos socioculturais, o Plano Quinquenal da Esquerda Uruguaia propõe “mudanças que favoreçam as formas de convívio e a tolerância entre setores sociais heterogêneos – recompor a consciência pública, social regimentada pela ética da solidariedade, que contribua a reconstituir o tecido social”.15

Para logra-lo, são necessárias mudanças nas pautas culturais e de consumo. O Plano propôs-se a promover a poupança e o pagamento pela vivenda em todos os casos. Coloca o cuidado com a vivenda e seu entorno como parte das responsabilidades coletivas, e considera esta uma obrigação imprescindível para ascender a uma solução habitacional.

Isto significou a promoção e o desenho de novos instrumentos de política habitacional, construídos na base da trilogia: esforço próprio (ajuda mútua ou

15 MVOTMA. Plano Quinquenal de Vivenda 2010-2014 – Fundamentos para o debate no Congresso.

“Mi lugar entre todos”. Disponível em: <www.parlamento.gub.uy/indexdb/.../ListarDistribuido.asp?.../ camara/>. Acesso em: 7 maio 2013.

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poupança), subsídio e crédito.

Os instrumentos adotados têm como principal objetivo assegurar o direito constitucional dos uruguaios de ascender a uma vivenda digna, possibilitar o acesso à vivenda àqueles setores da sociedade que – por si mesmos – não tem condições de resolver o seu problema de vivenda, mas fundamentalmente garantir a permanência das famílias em sua nova vivenda. Isto é uma novidade a que atribuímos uma importância relevante já que a permanência na vivenda tem sido um grande desafio dos programas de habitação social.

A questão mais difícil de responder para os atores que desenham as políticas públicas de vivenda no Uruguai é como garantir o direito a vivenda e ao hábitat16,tal como o determina a Constituição da República17, para todos os seus cidadãos. Como fazê-lo e garantir este direito em condições de sustentabilidade para aquelas famílias que nas atuais condições do mercado imobiliário não podem exercê-lo por seus próprios meios? A resposta não é simples, implica a utilização de recursos econômicos e instrumentos de política pública que estejam na mesma linha dos objetivos propostos.

O Plano Quinquenal de Vivenda (2010-2014), responde a esta pergunta através de três instrumentos básicos: o empréstimo, o esforço próprio dos destinatários e o subsídio total ou parcial.

 Empréstimo: o destinatário do financiamento habitacional paga o empréstimo em 25 anos com um juro de 5% ao ano;

 Subsídio: é a quantidade que não se devolve. É aportado pelo Estado através do Fundo Nacional de Vivenda e beneficia aquelas famílias que não podem pagar total ou parcialmente o parcelamento do empréstimo. O subsídio pode ser de três tipos: de capital, de juro ou de parcelamento. No caso específico das Cooperativas de Vivenda, estas o recebem do Estado e repassam o benefício aos sócios;

 Esforço próprio: é um recurso econômico porque substitui parte importante da mão de obra contratada pela mão de obra dos próprios interessados, diminuindo os custos da construção e facilitando o acesso a este direito a vastos setores da população;

16

Conceito expresso no Art. 45 da Constituição da República do Uruguai.

17

O Art. 45 da Constituição da República vai além do enunciado e atribui ao Estado à responsabilidade de cumprir com esta determinação.

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O subsídio como instrumento de distribuição da riqueza, o crédito hipotecário aos sectores economicamente mais carentes, como forma de democratizar o acesso à vivenda, e a poupança (seja em forma de trabalho, gestão ou capital) como contribuição do esforço individual ao projeto coletivo.

O crédito estatal, para a construção de habitação popular, contempla as condições socioeconômicas das famílias, e o parcelamento pode ser individual ou coletivo como nas cooperativas de vivenda. O valor a pagar em cada prestação não pode superar os 20% dos ingressos econômicos mensais do grupo familiar. Se a parcela for superior aos 20 % dos ingressos do grupo familiar, (coisa que acontece na maioria dos casos), o excedente é pago pelo Estado. Isto se chama subsídio de acesso à vivenda.

O subsídio ao parcelamento é um instrumento democrático de acesso à vivenda. Permite à família ou ao grupo de famílias, através da contribuição econômica complementar do Estado, acessar ao crédito hipotecário e assegurar que o valor do parcelamento esteja de acordo com a capacidade de contribuição financeira do grupo de famílias. Por esta via, o destinatário da vivenda pagará o parcelamento de acordo com seus ingressos econômicos do grupo familiar.

Retomaremos para aprofundar o tema dos subsídios no capitulo quatro, referido ao financiamento das Cooperativas de Vivendas por Ajuda Mútua (item 4.6).

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3 Produção Social do hábitat pelo Mercado

3.1 Sistemas construtivos não tradicionais

Aos efeitos deste trabalho, entendemos por tecnologia a um conjunto de conhecimentos metodologicamente organizados que proveem de áreas científicas ou empíricas e constituem um método de aplicação, desenvolvimento, adaptação, experimentação e observação. Segundo o dicionário Michaelis, entre outras definições, a tecnologia é o conjunto dos processos especiais relativos a uma determinada arte ou indústria.

Por Sistema construtivo não tradicional entendemos o manejo de tecnologias que fazem possível a obtenção de um resultado através de um processo planejado e permanente no qual predomina a produção em série. Por produção artesanal da vivenda entendemos aquele processo de produção que cada vez que se executa é necessária à participação de operários especializados e que a operação de produção requer de esforço físico e mental. Os conceitos acima mencionados são a síntese de varias definições expressas na ficha 4 do caderno de Construcción 3 – tecnologías para la vivenda de interés social.18

A partir das definições apresentadas acima, nos surgem as seguintes reflexões:

a) que o Sistema Construtivo Tradicional apresenta um forte componente artesanal que exige especialização e que esta característica o posiciona como o sistema construtivo que mais mão de obra demanda para a execução das tarefas;

b) que através dos Sistemas Construtivos não Tradicionais tenta-se diminuir a participação do artesão e que para isso são desenhadas ferramentas que podem ser manejadas por operários não especializados.

18

AMÁNDOLA, Dulio e outros. Construcción Tres. Polígrafo mimeografado, UdelaR. Montevidéu, 2000. Caderno realizado pela cátedra de Construção da Faculdade de Arquitetura de UdelaR.

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3.1.1 A que chamamos inovação tecnológica?

O que chamamos tecnologia inovadora para a vivenda social é a combinação inter-relacionada e indivisível de três componentes fundamentais do processo de gestão social do hábitat.

Figura 9: Esquema conceitual de Tecnologia Inovadora.

Fonte: Curso Arquitetura em Madeira. Prof. Hector Scerbo, Rosário-Argentina, 2013.

A inovação é um processo composto por três elementos: materiais, gestão e desenho. Para definir se um sistema construtivo é inovador ou não, é necessário avaliar integralmente o processo e constatar que a inovação está presente em cada um dos elementos que compõem o processo descrito. Não podemos pensá-los em separado, pois estes possuem inter-relações e se modificam mutuamente.

É comum ver como o conceito de inovação tecnológica se associa exclusivamente ao uso de materiais novos. Como consequência aplicam-se os novos materiais sobre projetos concebidos por desenhos estruturados tradicionalmente e são geradas obras com metodologia e gestão construtiva idêntica aos Sistemas Tradicionais. Materiais novos aplicados sobre um Sistema Construtivo Tradicional têm como consequência inexorável uma gestão de obra inadequada. Este erro recorrente faz com que o resultado não seja o esperado e comprometa os objetivos inicialmente traçados de:

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b) redução significativa da mão de obra especializada; c) redução à mínima expressão do trabalho artesanal; d) economia com redução dos custos de construção.

Deste modo, atingir padrões de conforto do espaço construído iguais ou superiores aos que oferecem as construções feitas por um sistema tradicional. Todos estes itens constituem objetivos fundamentais que definem o caráter inovador da obra de Arquitetura e justificam a utilização de sistemas com processo de fabricação industrial. Mas estes objetivos não seriam completos se não os associássemos a um conceito que ganhou espaço e passou a formar parte do discurso de intelectuais e acadêmicos nos últimos anos: a arquitetura sustentável e ecológica.

No esquema abaixo representamos os elementos imprescindíveis e necessários desde nosso ponto de vista, para que uma tecnologia dirigida ao hábitat popular seja inovadora. Será inovadora quando a tecnologia proposta, além dos pré-requisitos descritos acima for ecologicamente sustentável, economicamente viável e socialmente equitativa. Podemos concluir que uma tecnologia é inovadora quando os materiais, além de novos, também são econômicos e sua aplicação inclui compromisso com o meio ambiente e responsabilidade social no processo de execução da obra.

Figura 10: Mostra os elementos indispensáveis que deve cumprir uma tecnologia para ser considerada sustentável desde nosso ponto de vista.

Fonte: Curso Arquitetura em Madeira. Prof. Hector Scerbo, Rosário-Argentina, 2013.

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O quadro mostra o nosso modo de avaliar a inovação tecnológica para o hábitat popular e destaca um conceito conclusivo: ou a inovação tecnológica se faz com responsabilidade social ou não é inovação tecnológica.

Quando projetamos, transmitimos através do desenho, da tipologia escolhida e dos materiais propostos, nossa forma de ver o mundo. Se para a arquitetura da primeira metade do século XX, a forma estava subordinada à função (Modernismo), e para a arquitetura da segunda metade do século XX (pós-modernismo) a função estava subordinada à forma, todas as evidencias nos levam a pensar que na arquitetura do século XXI, a forma ficará subordinada à energia. Neste caso, o caráter sustentável da arquitetura bioclimática tem um valor determinante na hora de definir se o sistema construtivo que propomos é sustentável. Para orientar-nos e oferecer elementos que ponham em sintonia o projeto com o nosso discurso ecologista, no quadro abaixo mostramos uma relação entre os materiais mais utilizados na construção do hábitat contemporâneo e o grau de agressão ambiental que acarreta produzi-los. O quadro nos ajudará a fazer uma primeira qualificação dos sistemas construtivos inovadores em relação aos materiais empregados e aos danos ambientais que alguns deles produzem.

Figura 11: Tecnologias inovadoras.

Fonte: Curso Arquitetura em Madeira. Prof. Hector Scerbo, Rosário-Argentina, 2013.

Se associarmos o quadro acima aos Sistemas Construtivos mais utilizados no Uruguai, e analisarmos a composição dos materiais básicos que os compõem, poderemos estabelecer com precisão quais são os sistemas amigáveis à natureza e quais – pelo contrário – produzem fortes agressões ao ecossistema humano.

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Figura 12: Sistemas Construtivos mais usados no Uruguai segundo seus componentes.

Fonte: Curso Arquitetura em Madeira. Prof. Hector Scerbo, Rosário-Argentina, 2013.

O quadro acima mostra esquematicamente as características mais destacadas dos sistemas construtivos mais utilizados. Muitas vezes esses sistemas se apresentam combinados entre eles e o resultado pode ser completamente diferente aos sistemas que lhe deram origem.

Uma simples inspeção ocular é suficiente para perceber que o procedimento construtivo mais utilizado é o sistema que chamamos tradicional, em suas duas versões: tijolo e madeira.

O domínio do processo construtivo por parte da população, cuja técnica transmitiu-se de geração em geração, faz com que o sistema seja o escolhido para a autoconstrução e autogestão por parte da população de menores recursos econômicos.

Historicamente, a construção em madeira foi anterior à construção com tijolos cerâmicos, mas desde a fundação das primeiras cidades 5000 a.C., a madeira e o tijolo compartilharam o cenário da arquitetura chamada tradicional.

Paredes de pedra, barro ou tijolo e cobertura com estrutura de madeira revestida com telhas cerâmicas monopolizaram a imagem das cidades até bem entrado o século XIX, momento no qual aparecem os primeiros arranha-céus. Os novos materiais provenientes da Revolução Industrial abriram as portas para novas tecnologias construtivas derivadas da produção de aço e concreto.

Referências

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