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4 – A IMAGEM FOTOGRÁFICA JORNALÍSTICA

4.7 Ética e ideologia no jornalismo

Antes de começar a tratar de ética e jornalismo ou de ética e fotojornalismo, é necessário esclarecer o conceito de ética.

Para o filósofo Adolfo Sanchez Vasquez, qualquer discurso deve partir primeiramente dos problemas práticos,

Isto é, de problemas que se apresentam nas relações efetivas, reais, entre indivíduos ou quando se julgam certas decisões e ações dos mesmos. Trata-se de um problema cuja solução não concerne somente à pessoa que o propõe, mas também a outras pessoas que sofrerão as conseqüências de sua decisão ou ação (1987, p. 6).

Conforme Vazquez, toda conduta humana é regida por normas julgadas mais apropriadas ou dignas nas inúmeras situações que possam vir a existir. Ao serem aceitas, tais normas são reconhecidas como obrigatórias e passam a determinar todas as ações, visto que os homens têm o dever de agir desta ou daquela forma. Por isso, é costumeiro ouvir dizer que o ser humano age moralmente. Neste comportamento, podem ser ressaltados traços específicos que o diferenciam de outras formas de conduta.

O homem também, além de agir moralmente, considera esta conduta como uma forma de pensamento e reflexão. Saber distinguir o que é bom, e que tais atos são bons, é a conduta que o indivíduo passa a considerar em situações particulares que se apresentam. Neste caminho, então, é que a ética interfere no comportamento moral-prático do indivíduo.

Conclui Vazquez que a ética é, senão, “uma investigação ou explicação de um tipo de experiência humana ou forma de comportamento dos homens, o da moral considerado, porém, a sua totalidade, diversidade e variedade” (1987, p. 11).

Quando se faz referência à linguagem fotojornalística, percebe-se que ela também se codifica sobre uma conduta moral. Considera-se, então, a linguagem como mediadora entre a realidade e a moral em forma de um parâmetro para as ações da profissão.

No Brasil, existe o Código de Ética do Jornalista, assim como há em tantas outras profissões. Segundo Vazquez (1987), é um Código de conduta ou deontológico profissional,

mas que para o fotojornalismo não existe um específico ao desempenho da função, sendo usado, nesses casos, o do jornalista propriamente dito.

Mesmo antes de desenvolver uma teoria da ética e da moral no fotojornalismo, novas questões apareceram com o desenvolvimento das tecnologias digitais envolvendo mais uma vez a credibilidade da profissão.

A linguagem é a ferramenta usada pelo homem na tentativa de buscar a verdade, característica essa que sempre está codificada à fotografia por ser considerada uma aparente representação da realidade, esta uma de suas principais analogias.

Barros Filho define a relação da imagem com o real como sendo

imagem informativa, por mais que se argumente em contrário ainda guarda íntima e estreita ligação com o real. Por ser hoje principal instrumento mediático da informação, a imagem permite aos seus receptores, de forma ritualizada, conhecer um real inacessível. Embora não-coincidentes, imagem informativa e real tendem à coincidência. Tal como uma assíntola, a imagem se aproxima progressivamente da realidade (nunca tocando-a), sendo dela sempre dependente (2003, p. 85).

Desde a invenção da escrita de Gutenberg, todo o aparato tecnológico veio sendo desenvolvido para viabilizar a reprodução da realidade automaticamente, e “essa tecnologia goza de prestígio da objetividade essencial ou ontológica para usar o termo com que seus próprios apologistas a tem caracterizado” (MACHADO, 1984, p. 10).

Já na época dos retratistas à fotografia sempre foi conferida uma imagem de credibilidade. Agora, na era do virtual, em que há os traços de uma intervenção mais imediata, a fotografia chega sutil, com apenas poucos indícios de alterações, e o perigo desse pensamento aumenta.

Através dessas novas tecnologias de representação não é mais um inconsciente ótico que emerge- como anunciava Benjamin em relação à fotografia – mas uma espécie de consciência ótica como possibilidade de manipular o espaço e os homens oticamente, isto é, através da visão (PARENTE, 2004, p. 166).

O jornalismo é uma forma de serviço prestado ao público, que também, por isso, reclama a criação de um sistema de regras editoriais que esteja, ao mesmo tempo, do lado de leitor e do profissional. Neste contexto, o fotojornalismo tem papel de testemunha da verdade

que legitima o conteúdo do texto, quando em seu núcleo o que se necessita é questionar sua representação como verdade.

“Quem detém a tecnologia detém o poder de representar, melhor dizendo, neste mundo eletrônico da simultaneidade, quem detém o poder de “representar” detém o poder”. Parente completa dizendo:

Com vistas a ampliar e aprisionar a audiência, o segundo vetor do processo de aceleração , o trabalho do jornalista passa a ser concebido de um modo particular: para atender a uma demanda cada vez mais inflada e premente, sua prioridade deixa de ser a informação, e passa a ser, antes de tudo, o espetáculo – melhor dizendo: a própria informação se torna espetáculo (2004, p. 164).

Os meios de comunicação impressos, assim como os demais veículos, encontram- se inseridos em um sistema sócio-político-econômico que norteia o mundo capitalista, regido pelo lucro como um dos itens que direcionam os objetivos das empresas midiáticas. Sendo assim, um jornal deve, obrigatoriamente, ter para a sua existência patrocinadores e, conseqüentemente, ser economicamente viável para que possa vir a circular.

A imagem fotográfica, cuja importância é indiscutível num jornal, tem, portanto, dentro das regras tecidas pela necessidade econômica, também de obedecer às fronteiras impostas pela vontade dos mantenedores da empresa.

No entanto, a produção de veículos de massa significa ao proprietário ou grupo editorial, de acordo com diretrizes ou engajamentos a determinados blocos na esfera política, que esses podem influenciar no poder, não obrigatoriamente econômico, mas nas decisões e indicações relevantes para os interesses dos meios de comunicação. Da mesma forma, textos e fotografias jornalísticas são selecionados pelo editor, e seguem características propostas de acordo com o grupo empresarial, isto é, as ideologias do grupo. Atualmente, as questões da ideologia, entretanto, não são as mesmas divulgadas no tempo de Karl Marx, que eram claramente expressas entre a classe dos trabalhadores e a classe dos proprietários. Era uma luta que não correspondia somente a confrontos físicos, mas também a uma divisão de idéias, uma relação de extremos (MARCONDES FILHO, 1997, p.20).

Segundo Marcondes Filho, a ideologia pertence sempre a um grupo de indivíduos, nunca a uma pessoa separadamente.

Quando pretendemos alguma coisa, quando defendemos uma idéia, um interesse, uma aspiração, uma vontade, um desejo, normalmente não sabemos, não temos consciência de que isso ocorre dentro de um esquema maior, de um plano, de um projeto maior, do qual somos apenas representantes – repetimos conceitos e vontades, que já existiam anteriormente (1997, p. 20).

Mas a ideologia não é uma fala direta. Sua presença é feita de forma simbólica. Marcondes Filho acrescenta que os símbolos têm a função de se expressar indiretamente, de forma indireta, de comentar sobre fatos e coisas ou se referir a eles de maneira não-clara. Logo, levam os indivíduos a pensar do mesmo modo (1997, p. 21).

Uma formação ideológica deve ser compreendida como uma visão de mundo, visão esta que é determinada pela forma de relação que o indivíduo tem com os objetos, com as outras pessoas, com a natureza, mas sempre entendida como um conjunto de representações, de idéias que demonstram a ligação que dada classe tem do mundo (1997, p. 22).

De acordo com Fiorin, numa formação social há tantas visões de mundo quantas forem as classes sociais. “A ideologia dominante é a ideologia da classe dominante. No modo de produção capitalista, a ideologia dominante é a ideologia burguesa” (2005, p. 31).

Contudo, para que o jornal continue ou seja impresso, a satisfação do leitor passa a ser a grande prioridade. Conforme Juarez Bahia (1990, p. 18), o jornalismo aspira a ser o porta-voz da cidadania, forjando uma relação de segurança que, embora sensível, não se renova a cada vez que os cidadãos exprimem a sua preferência. Sendo assim, a credibilidade de determinado veículo não depende de seu tamanho e da sua área de atuação, e sim será maior ou menor quanto maior ou menor for sua capacidade de publicar informações mais ou menos confiáveis.

No universo consumidor, faz-se de fundamental importância salientar a existência de fenômenos sociais. Segundo Carraher (1983, p.7),

é precisamente o invisível dos fenômenos sociais que torna sua compreensão tão difícil, seja este invisível constituído pelos mecanismos de defesa, motivos, etc, pelas normas, os papéis sociais, ideologias e funções latentes da sociologia, pelos símbolos de classificação da antropologia ou pela estrutura profunda e registro lingüístico.

Fazendo-se uma análise superficial da realidade cultural da sociedade, permite-se observá-la como sua existência é carente de conhecimento básico para a interpretação das informações divulgadas pelos meios de comunicação. Essa análise remete às falas de Carraher sobre o invisível nos termos implícitos.

Para Vasquez (1987, p. 202),

O indivíiduo forma-se gradualmente de acordo com uma moral já estabelecida que lhe é proposta e justificada. Diante desta moral, os indivíduos reagem de maneira diferente, ou deixando que ela os impregne totalmente, ou enriquecendo-a ou desenvolvendo-a sob o impacto do seu meio social (...) ou ainda pela confrontação com as experiências que a sua própria vida pessoal lhes proporciona.

A moral, que é compreendida espontânea e calmamente pelo consumidor da informação dos produtos de massa, não se apresenta como qualidade das limitações do conhecimento humano, mas de um sujeito que se deixa alienar e, nesse sentido, a sua influência ética corre o risco de se tornar negativa (VASQUEZ, 1987, p. 203).

A imagem fotojornalística, então, também pode contribuir para a formação de uma sociedade fraca em nível de conhecimento. Benjamin já mencionara em seus escritos que deve focar que focar nas transformações tecnológicas, visto que será exigido ao homem cada vez ler as imagens. “A grande mutação do mundo contemporâneo transforma o espaço num lugar de vestígios, de indícios a serem decifrados” (PARENTE, 2004, p. 165).