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3 CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE NO ORDENAMENTO JURÍDICO

3.2 CONTROLE CONCENTRADO

3.2.1 Ação direta de inconstitucionalidade genérica (ADI ou ADIn) interventiva (AD

A primeira ação que integra o sistema de controle abstrato de normas no Brasil é a ação direta de inconstitucionalidade (ADI ou ADIn), a qual, segundo José Afonso da Silva (2014), foi uma inovação trazida por meio da Emenda Constitucional n. 16 de 1965 (BRASIL, 1965), ou seja, a ADI de caráter genérico advém da ação direta de inconstitucionalidade interventiva (ADI interventiva), esta conhecida como representação interventiva, segundo a análise de Gilmar Ferreira Mendes (2012).

Cabe mencionar que a ADI interventiva, prevista na Constituição Federal de 1934 e renovada na Constituição de 1946 pela aludida Emenda n. 16 de 1965, ainda é preservada pela CRFB/88 para aferição da compatibilidade de direito estadual com os chamados princípios sensíveis11, dispostos no inciso VII, artigo 34, da CRFB/88 (BRASIL, 1988), constituindo pressuposto da intervenção federal a ser executada pelo Presidente da República (MENDES, 2012).

Quanto à ação direta de inconstitucionalidade genérica, pode-se afirmar que a CRFB/88 também recepcionou esta modalidade de ação, conforme se verifica pela redação da alínea a, inciso I, artigo 10212. Além da Constituição Cidadã, a Lei n. 9.868 de 10 de

11 Os princípios sensíveis estão elencados no inciso VII, artigo 34, da CRFB/88, quais sejam: a forma

republicana, o sistema representativo e o regime democrático; os direitos da pessoa humana; a autonomia municipal; a prestação de contas da administração pública, direta e indireta; e a aplicação do mínimo exigido da receita resultante de impostos estaduais, compreendida a proveniente de transferências, na manutenção e desenvolvimento do ensino e nas ações e serviços públicos de saúde (BRASIL, 1988). De acordo com Alexandre de Moraes (2006), os princípios sensíveis são assim chamados no intuito de expressar sua importância para o Estado Federal, uma vez que sua inobservância pode levar à intervenção da autonomia política dos entes federativos.

12 O artigo em comento assim estabelece: “Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da

Constituição, cabendo-lhe: I - processar e julgar, originariamente: a) a ação direta de inconstitucionalidade de lei ou ato normativo federal ou estadual e a ação declaratória de constitucionalidade de lei ou ato normativo federal; [...].” (BRASIL, 1 88).

novembro de 1999 também regulamenta o processamento e o julgamento da ADI, tanto por ação quanto por omissão legislativa (MEIRELLES; WALD; MENDES, 2012).

No que diz respeito à possibilidade de se declarar inconstitucional a omissão de medida para tornar efetiva norma constitucional, a chamada ação direta de inconstitucionalidade por omissão (ADO), cuja previsão constitucional se encontra no parágrafo 2º do artigo 103 (BRASIL, 1988), tem por objetivo conceder plena eficácia às normas constitucionais que dependem de complementação infraconstitucional. Assim, é cabível tal ação no intuito de atacar a omissão inconstitucional decorrente do descumprimento do Poder Público quanto ao dever de legislar (MORAES, 2006).

No entanto, ainda que a sentença declaratória de inconstitucionalidade por omissão seja dirigida ao Poder competente, no sentido de exigir-lhe a adoção das providências necess rias ao suprimento da lacuna legislati a, “[...] n o como obrigar o legislador a legislar” (SILVA, 2014, p. 58). ntão, além de não ter o efeito contra todos (erga omnes), a ADO também não tem o condão de impor ao Poder Legislativo ou ao Poder Executivo a imediata edição da norma regulamentadora para suprir a referida omissão. Somente no caso de se tratar de órgão administrativo pode o STF determinar sua manifestação no prazo de 30 dias, podendo atribuir-lhe pena de responsabilidade, caso não a faça (DANTAS, 2015).

A partir da conjugação da CRFB/88 e da Lei n. 9.868/1999, apresentam-se, a seguir, os requisitos de legitimidade para propositura da ADI genérica, seu objeto, o parâmetro de verificação, seus pressupostos de admissibilidade e efeitos da decisão, bem como a possibilidade de modulação de tais efeitos, uma vez que, em sentido amplo, sua estrutura não se distancia da ADI interventiva, nem da ADO (MEIRELLES; WALD; MENDES, 2012).

De acordo com o entendimento de Calil Simão (2014), pelo seu car ter abstrato e objetivo, a lei estabelece legitimidade reservada ou restrita para a propositura da ADI, uma vez que esta não envolve a proteção direta de interesse subjetivo, sendo estabelecido rol taxativo no artigo 103 da CRFB/88 (BRASIL, 1988)13.

No tocante aos legitimados, cabe ressaltar ainda que, embora o artigo 103 da Constituição Cidadã lhes permita ajuizar a ação direta de inconstitucionalidade, segundo Hely Lopes Meirelles, Arnoldo Wald e Gilmar Ferreira Mendes (2012, p. 87), “[...] com exceção

13 Podem propor a ação direta de inconstitucionalidade e a ação declaratória de constitucionalidade: o Presidente

da República; a Mesa do Senado Federal; a Mesa da Câmara dos Deputados; a Mesa de Assembleia Legislativa ou da Câmara Legislativa do Distrito Federal; o Governador de Estado ou do Distrito Federal; o Procurador- Geral da República; o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil; partido político com representação no Congresso Nacional; e confederação sindical ou entidade de classe de âmbito nacional (BRASIL, 1988).

das confederações sindicais e entidades de classe de âmbito nacional e dos partidos políticos (CF, art. 103, VIII e IX), todos os demais legitimados para a ação direta de inconstitucionalidade dispõem de capacidade postulatória especial”, desta forma, estes ficam dispensados de serem representados por advogado.

Em que pese o disposto no referido artigo 103 da Lei Maior, esclarece Walber Moura de Agra (2014) acerca da restrição imposta à Mesa da Assembleia Legislativa, ao Governador de Estado ou do Distrito Federal e à confederação sindical ou entidade de classe de âmbito nacional quando ajuizar a ADI: “eles somente podem impetrar a ação se houver pertinência temática, ou seja, se o impetrante tiver interesse na lei que está sendo objeto de impugnação. É o que a doutrina chama de legitimidade especial” (AGRA, 2014).

Enquanto os mencionados nos incisos II, III e IX do artigo 103 da Carta Magna se veem compelidos a demonstrar seu interesse no objeto da ADI, os demais elencados na CRFB/88 dispõem da denominada legitimidade universal, podendo, independente da matéria, propor ação de inconstitucionalidade acerca de qualquer tema, havendo ou não pertinência temática (AGRA, 2014).

O objeto da ADI consiste no ataque à lei ou ato normativo federal ou estadual, então, conforme explica Paulo Roberto de Figueiredo Dantas (2015, p. 203-204), deve-se:

[...] entender por lei, no caso espec fico da a o direta de inconstitucionalidade gen rica, os preceitos escritos, emanados do poder competente da Uni o, dos stados, e, em alguns casos, do Distrito Federal (quando e erce compet ncia estadual), dotados de imperati idade e coer o estatal, e que, para fins de controle de constitucionalidade, de em ter por caracter sticas a abstra o, a generalidade e a autonomia. Atos normati os, por sua ez, s o todos os demais atos editados por aquelas pessoas pol ticas, re estidos de indiscut el conte do normati o, e com as mesmas caracter sticas anteriormente citadas, ou se a, abstra o, generalidade e autonomia.

Não compete, contudo, à ADI atacar qualquer lei ou ato normativo federal ou estadual, devendo ser respeitados os seguintes pressupostos concomitantes apontados por Hely Lopes Meirelles, Arnoldo Wald e Gilmar Ferreira Mendes (2012): o ato normativo ou a lei sob exame precisa ser primário14, vigente (ou que entre em vigor durante a propositura da ação) e posterior à promulgação da CRFB/88, pois esta é o parâmetro de proteção estabelecido.

14 O ato normativo primário deriva diretamente da Constituição Federal, sem estar subordinado a qualquer outra

espécie normativa. Como exemplo, Paulo Roberto de Figueiredo Dantas (2015) indica o decreto legislativo previsto no artigo 59 da Carta Magna (BRASIL, 1988), de competência exclusiva do Congresso Nacional, utilizado na regulamentação de matérias específicas, como a solução definitiva sobre tratados ou acordos internacionais.

Assim, não constituem objeto de ADI: as normas constitucionais editadas pelo constituinte originário (em razão do princípio da unidade da Constituição); normas infraconstitucionais promulgadas antes de 5 de outubro de 1988 (direito pré-constitucional); leis municipais; leis estaduais no exercício da competência municipal; normas secundárias (normas sem qualquer subordinação a outra lei ou diploma, exceto à Constituição), súmulas dos tribunais e seus enunciados; atos estatais não revestidos de abstração e generalidade; leis revogadas; e lei do Distrito Federal derivada da sua competência legislativa municipal, conforme Súmula 642 do Supremo Tribunal Federal (DANTAS, 2015).

Após o trâmite da ação direta de inconstitucionalidade, segundo a previsão dos artigos 22 e 23 da Lei n. 9.868/1999, o Supremo Tribunal Federal somente profere decisão se estiverem presentes, ao menos, oito Ministros na sessão de julgamento, exigindo-se ainda que ao menos seis deles se manifestem pelo acolhimento do pedido. Ademais, em razão do disposto no artigo 24 da mencionada lei (BRASIL, 1999a), independente do resultado da ADI, pode-se afirmar que esta ação tem natureza dúplice, pois, se acolhido o pedido do autor, a norma impugnada é considerada inconstitucional; se houver a improcedência, a norma é declarada constitucional (NEVES, 2013).

Os efeitos decorrentes da decisão que declarar a inconstitucionalidade têm eficácia contra todos (erga omnes) e efeito vinculante em relação aos órgãos do Poder Judiciário e à Administração Pública federal, estadual e municipal, conforme estabelece o parágrafo único do artigo 28 da Lei n. 9.868/1999 (BRASIL, 1999a). Além disso, Alexandre de Moraes (2006, p. 687) destaca que, uma ez “declarada a inconstitucionalidade da lei ou ato normativo federal ou estadual, a decisão terá efeito retroativo (ex tunc) [...], desfazendo, desde sua origem, o ato declarado inconstitucional [...].”

Diante do exposto, cabe destacar que, em regra, a declaração definitiva de inconstitucionalidade de uma lei ou ato normativo, por meio de ADI, configura como nulo o questionado ato (ou a lei) desde o seu nascimento, não devendo, por isso, produzir qualquer efeito (CHIMENTI, et al., 2008). Contudo, há uma exceção para esta alegação, a qual consiste na chamada modulação dos efeitos da decisão, prevista no artigo 27 da Lei n. 9.868/199915 (MEDINA, 2012).

15 De acordo com o artigo 27 da Lei n. 9.868/1999, ao declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo,

tendo em vista razões de segurança jurídica ou de excepcional interesse social, pode o Supremo Tribunal Federal, por maioria de dois terços de seus membros, restringir os efeitos da declaração ou decidir que ela só tenha eficácia a partir de seu trânsito em julgado ou de outro momento que venha a ser fixado (BRASIL, 1999a).

A modulação dos efeitos da norma declarada inconstitucional busca preservar a segurança das relações jurídicas formadas sob sua vigência, não se podendo confundir, entretanto, a preservação dos efeitos com a validade da lei ou ato impugnado: a norma inconstitucional não é considerada temporariamente válida, mas seus efeitos podem ser modulados para respeitar determinada limitação temporal de retroatividade; iniciarem a partir do trânsito em julgado da decisão; ou terem eficácia projetada para o futuro, mediante um condicionamento temporal escolhido pelo Tribunal (NEVES, 2013; SIMÃO, 2014).

Uma vez abordados os aspectos da ADI, o estudo da ação declaratória de constitucionalidade (ADC ou ADECON) se torna breve em razão das semelhanças em vários aspectos destas duas ações do controle concentrado.

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