• Nenhum resultado encontrado

4 A SUCESSÃO DO CÔNJUGE E DO COMPANHEIRO E A

4.2 POSICIONAMENTO DOS TRIBUNAIS ESTADUAIS SOBRE A

INCONSTITUCIONALIDADE DO INCISO III, ARTIGO 1.790, DO CC/2002

No intuito de verificar se há divergência de posicionamento entre os Tribunais estaduais pátrios acerca da inconstitucionalidade do inciso III do artigo 1.790 do CC/2002, apresentam-se neste momento somente as decisões proferidas pelos órgãos especiais e, no caso da sua inexistência, dos tribunais plenos entre o ano de 2002 até 2017. Cabe ressaltar que não constitui objeto desta pesquisa a análise dos julgados das Cortes estaduais ou da aplicação do artigo 1.790 do CC/2002 pelos Tribunais, mas tão somente confirmar a existência de manifestação dos órgãos especiais ou dos tribunais plenos.

O desenvolvimento desta pesquisa conta com as informações disponíveis no site do Conselho Nacional de Justiça, onde é possível localizar as páginas eletrônicas de todos os vinte e sete Tribunais estaduais do país, dentre os quais se encontram os Tribunais dos Estados e o do Distrito Federal e Territórios (CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA, 2017).

A partir dos sítios eletrônicos dos Tribunais, verifica-se, como ponto de partida, a quantidade de membros de cada uma das Cortes estaduais por meio do regimento interno de cada uma ou de outra norma de organização judiciária, nos casos em que o regimento interno se mostrar incompleto, desatualizado ou fizer menção à outra fonte de obtenção da informação desejada (como os próprios portais eletrônicos dos Tribunais). O conhecimento do número de membros é necessário para se demonstrar a possibilidade de existência ou não de órgão especial nos Tribunais, uma vez que somente nas Cortes com número superior a vinte e cinco julgadores poderá este ser constituído, conforme o já citado inciso XI, artigo 93, da CRFB/88 (BRASIL, 1988).

Depois de constatada a presença ou não do órgão especial, conforme especificado no Apêndice A, a busca continua a partir da jurisprudência em cada um dos sites dos Tribunais, tendo como palavras-chave de pesquisa os seguintes termos, utilizados em conjunto, um seguido do outro e sem o emprego das aspas: 1790 e inconstitucionalidade; ou 1.790 e inconstitucionalidade. Efetua-se, então, a busca duas vezes observando-se, na primeira tentativa, as expressões 1790 e inconstitucionalidade (concomitantemente); e na

segunda, 1.790 (acrescido do ponto) e inconstitucionalidade (também em concomitância), para obtenção de resultados positivos.

A escolha destas palavras-chave baseia-se na própria pergunta de pesquisa do presente estudo, evitando, assim, a diversidade de resultados que podem advir caso os termos de busca sejam muito específicos (como a expressão inciso III) ou muito genéricos (como a palavra sucessão). Para facilitar a visualização dos dados coletados durante a pesquisa, apresenta-se no Quadro 1 o compilado de todas as informações obtidas.

Quadro 1 - Posicionamento dos tribunais sobre a inconstitucionalidade do inciso III, artigo 1.790, do CC/2002 Tribunal de Justiça Quantidade de julgadores do Tribunal Possui órgão especial Existência de manifestação do tribunal pleno ou do órgão especial quanto à

(in)constitucionalidade

Decisão do tribunal pleno ou do órgão especial quanto à (in)constitucionalidade Aplicação do inc. III do art. 1.790 do CC/2002

Acre 12 NÃO NÃO SEM DECISÃO SIM

Alagoas 15 NÃO NÃO SEM DECISÃO SIM

Amapá 9 NÃO NÃO SEM DECISÃO SIM

Amazonas 23 NÃO NÃO SEM DECISÃO SIM

Bahia 57 NÃO NÃO SEM DECISÃO SIM

Ceará 43 SIM NÃO SEM DECISÃO SIM

Distrito Federal e Territórios

48 SIM SIM CONSTITUCIONAL SIM

Espírito

Santo 30 NÃO SIM CONSTITUCIONAL SIM

Goiás 36 SIM SIM INCONSTITUCIONAL NÃO

Maranhão 27 NÃO NÃO SEM DECISÃO SIM

Mato Grosso 30 NÃO NÃO SEM DECISÃO SIM

Mato Grosso

do Sul 32 SIM NÃO SEM DECISÃO SIM

Minas

Gerais 140 SIM SIM CONSTITUCIONAL SIM

Pará 30 NÃO NÃO SEM DECISÃO SIM

Paraíba 19 NÃO NÃO SEM DECISÃO SIM

Paraná 120 SIM SIM INCONSTITUCIONAL NÃO

Pernambuco 52 SIM NÃO SEM DECISÃO SIM

Piauí 19 NÃO NÃO SEM DECISÃO SIM

Rio de

Janeiro 180 SIM SIM INCONSTITUCIONAL NÃO

Rio Grande

do Norte 15 NÃO NÃO SEM DECISÃO SIM

Rio Grande

do Sul 170 SIM SIM CONSTITUCIONAL SIM

Rondônia 21 NÃO NÃO SEM DECISÃO SIM

Roraima 10 NÃO NÃO SEM DECISÃO SIM

Santa

Catarina 93 SIM SIM INCONSTITUCIONAL NÃO

São Paulo 359 SIM SIM CONSTITUCIONAL SIM

Sergipe 13 NÃO SIM INCONSTITUCIONAL NÃO

Fonte: Elaboração da autora, 2017.

Uma vez averiguada a quantidade de membros e a inexistência de órgão especial nos Tribunais de Justiça do Acre, Alagoas, Amapá, Amazonas, Bahia, Espírito Santo, Maranhão, Mato Grosso, Pará, Paraíba, Piauí, Rio Grande do Norte, Rondônia, Roraima, Sergipe e Tocantins, com base nos dados descritos no Quadro 1 e no Apêndice A; percebe-se que nestas Cortes compete aos seus tribunais plenos examinar a matéria considerada inconstitucional pelos respectivos órgãos fracionários e decidir a arguição de inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do Poder Público nos processos incidentes, ou seja, quando utilizada a via de exceção.

Além disso, por meio da pesquisa realizada nos sites dos referidos Tribunais sem órgão especial, utilizando-se os já referidos parâmetros de busca, verifica-se a inexistência de decisão dos seus tribunais plenos quanto à inconstitucionalidade do artigo 1.790 (ou de seu inciso III) do CC/2002, exceto no Tribunal de Justiça de Sergipe, no qual o artigo foi considerado integralmente inconstitucional em 30 de março de 2011:

Constitucional e Civil - Incidente de Inconstitucionalidade - União Estável - Direito Sucessório do Companheiro - Art. 1.790 do Código Civil de 2002 - Ofensa aos Princípios da Isonomia e da Dignidade da Pessoa Humana - Art. 226, § 3º da CF/1988 - Equiparação entre Companheiro e Cônjuge - Violação - Inconstitucionalidade Declarada. I - A questão relativa à sucessão na união estável e a consequente distribuição dos bens deixados pelo companheiro falecido, conforme previsão do art. 1.790 do Código Civil de 2002, reclama a análise da inconstitucionalidade do referido dispositivo legal, pois este, ao dispor sobre o direito sucessório da companheira sobrevivente, ignorou a equiparação da união estável ao casamento prevista no art. 226, § 3º da CF, configurando ofensa aos princípios constitucionais da isonomia e da dignidade humana; II - Incidente conhecido, para declarar a inconstitucionalidade do art. 1.790 do Código Civil de 2002 (SERGIPE, 2011).

Desta forma, presume-se ser aplicado o dispositivo questionado pelos colegiados dos demais Estados cujos Tribunais de Justiça não dispõem de órgão especial21. Então, com base nos dados elencados no Quadro 1, dos vinte e sete Tribunais estaduais brasileiros, dezesseis deles não apresentam em sua composição um órgão especial, apesar de as Cortes da Bahia, Espírito Santo, Maranhão e Pará contarem com o número de membros necessário para

21 Cabe ressalvar o Tribunal de Justiça do Espírito Santo, o qual já possui decisão proferida pelo tribunal pleno,

declarando a constitucionalidade do artigo 1.790 do CC/2002. Todavia, a existência desta manifestação não é localizada no site do TJES empregando as palavras-chave de busca determinadas para esta pesquisa. O incidente de inconstitucionalidade n. 0916597-11.2009.8.08.0000, julgado em 15 de setembro de 2011 pelo tribunal pleno do TJES é mencionado por Flávio Tartuce (2017) ao analisar julgados acerca de posições já existentes nas Cortes Estaduais. O resultado encontrado por Flávio Tartuce, entretanto, é computado no Quadro 1.

a criação do órgão especial. Além disso, de todos estes Tribunais sem órgão especial, apenas dois deles (TJES e TJSE) se manifestaram acerca da discussão de constitucionalidade do artigo 1.790 do CC/2002, como já destacado.

Os Tribunais de Justiça dos Estados do Ceará (TJCE), do Distrito Federal e dos Territórios (TJDF), Goiás (TJGO), Mato Grosso do Sul (TJMS), Minas Gerais (TJMG), Paraná (TJPR), Pernambuco (TJPE), Rio de Janeiro (TJRJ), Rio Grande do Sul (TJRS), Santa Catarina (TJSC) e São Paulo (TJSP), por outro lado, apresentam em sua composição o órgão especial, notando-se que todos possuem mais de vinte e cinco julgadores em seu quadro de membros.

Destes onze Tribunais, que possuem órgão especial, somente em três deles não se encontra manifestação, utilizando-se os já referidos parâmetros de busca, quanto à (in)constitucionalidade do artigo 1.790 do CC/2002, no todo ou em apenas parte do dispositivo indicado, quais sejam: TJCE, TJMS e TJPE.

No caso do TJDF, por outro lado, empregando-se as já mencionadas palavras- chave para a investigação, verifica-se a existência de posicionamento de seu Conselho Especial (nomenclatura conferida ao órgão especial pela alínea b, inciso I, artigo 2º do regimento interno da Corte) a partir de decisão proferida no dia 1º de junho de 2010, ao declarar a constitucionalidade do artigo 1.790 do CC/2002 e afirmar que o reconhecimento da união estável como entidade familiar não a equiparava ao casamento, tendo em vista a redação final do parágrafo 3º, artigo 226, da CRFB/88 quanto à facilitação da conversão em casamento:

CONSTITUCIONAL E CIVIL. ARGUIÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE. ARTIGO 1.790, INCISO III, DO CÓDIGO CIVIL. DIREITO SUCESSÓRIO DO COMPANHEIRO DIFERENCIADO EM RELAÇÃO AO CÔNJUGE SUPÉRSTITE. UNIÃO ESTÁVEL NÃO EQUIPARADA AO CASAMENTO PELA CONSTITUIÇÃO. ARTIGO 226, §3º, DA CF. ARGUIÇÃO REJEITADA. Embora o legislador constituinte tenha reconhecido a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, não a equiparou ao casamento de modo a atrair a unificação do regime legal acerca do direito sucessório, haja vista a observação final no texto constitucional da necessidade de lei para a facilitação de sua conversão em casamento - artigo 226, §3º, da CF. Não incide em inconstitucionalidade o tratamento diferenciado conferido pelo artigo 1790, inciso III, do Código Civil, acerca do direito sucessório do companheiro sobrevivente em relação ao cônjuge supérstite quanto à concorrência daquele com outros parentes sucessíveis do de

cujus. Arguição rejeitada. Unânime (DISTRITO FEDERAL, 2010).

No mesmo sentido, o julgamento de incidente de inconstitucionalidade n. 1.0512.06.032213-2/002, proferido pelo órgão especial do TJMG, em 9 de novembro de 2011, consolidou o precedente da Corte Mineira quanto à prevalência da aplicação do inciso

III, artigo 1.790, do CC/2002, tendo considerado constitucional o dispositivo em face da diferenciação das situações jurídicas do casamento e da união estável prevista na própria CRFB/88, conforme a ementa a seguir transcrita:

Incidente de Inconstitucionalidade: Direito de Família - União Estável - Sucessão - Companheiro sobrevivente - Artigo 1.790, inciso III do Código Civil. O tratamento diferenciado entre cônjuge e companheiro encontra guarida na própria Constituição Federal, que distinguiu entre as duas situações jurídicas. Não é inconstitucional o artigo 1.790, III, do Código Civil, que garante ao companheiro sobrevivente, em concurso com outros parentes sucessíveis, o direito a 1/3 da herança dos bens comuns (MINAS GERAIS, 2011).

O TJRS apresenta mais de um incidente de inconstitucionalidade suscitado pelo órgão fracionário em face do artigo 1.790 do CC/2002, mas, pare efeitos desta pesquisa, leva- se em consideração apenas aquele que trata especificamente do inciso III do dispositivo em comento, qual seja, o incidente n. 70029390374, julgado pelo órgão especial22 em 9 de novembro de 2009 (RIO GRANDE DO SUL, 2009). Observa-se a partir da ementa desta arguição como a Corte Gaúcha decidiu, por maioria de votos, declarar a constitucionalidade do inciso questionado, fundamentando-se na distinção constitucional e, portanto, na dispensa do Código Civil em tratar de forma igualitária o casamento e a união estável:

INCIDENTE DE INCONSTITUCIONALIDADE. FAMÍLIA. UNIÃO ESTÁVEL. SUCESSÃO. A Constituição da República não equiparou a união estável ao casamento. Atento à distinção constitucional, o Código Civil dispensou tratamento diverso ao casamento e à união estável. Segundo o Código Civil, o companheiro não é herdeiro necessário. Aliás, nem todo cônjuge sobrevivente é herdeiro. O direito sucessório do companheiro está disciplinado no art. 1790 do CC, cujo inciso III não é inconstitucional. Trata-se de regra criada pelo legislador ordinário no exercício do poder constitucional de disciplina das relações jurídicas patrimoniais decorrentes de união estável. Eventual antinomia com o art. 1725 do Código Civil não leva a sua inconstitucionalidade, devendo ser solvida à luz dos critérios de interpretação do conjunto das normas que regulam a união estável. INCIDENTE DE INCONSTITUCIONALIDADE JULGADO IMPROCEDENTE, POR MAIORIA (RIO GRANDE DO SUL, 2009).

Quanto ao TJSP, Tribunal com maior número de membros julgadores do país, ao empregar as palavras-chave 1790 e inconstitucionalidade, mais de um incidente de inconstitucionalidade é localizado na investigação. Entretanto, uma vez que a presente pesquisa se limita à manifestação do órgão especial quanto aos parâmetros estabelecidos, constata-se que somente a arguição de inconstitucionalidade n. 0434423-72.2010.8.26.0000,

22 Apesar de constar informação no site do Tribunal como tendo sido o tribunal pleno o responsável pelo

julgamento do incidente n. 70029390374, verifica-se como sendo de autoria do órgão especial do TJRS o acórdão proferido nesta arguição de inconstitucionalidade (RIO GRANDE DO SUL, 2009).

julgada em 14 de setembro de 2011, assegura o posicionamento da Corte Paulista pela constitucionalidade do artigo 1.790 do CC/2002 como um todo, respaldando-se na falta de violação aos princípios e preceitos constitucionais por parte do dispositivo questionado:

União estável. Direito sucessório. Sucessão do companheiro. Inconstitucionalidade do art. 1.790 do CC/02. Disparidade de tratamento entre união estável e casamento e ou das distintas entidades familiares. Inocorrência de violação a preceitos e princípios constitucionais. Incidente desprovido (SÃO PAULO, 2011).

Diferente é o posicionamento do TJPR, cujo órgão especial considera inconstitucional o inciso III, artigo 1.790, do CC/2002, desde o julgamento do incidente de declaração de inconstitucionalidade n. 536.589-9/01, em 4 de dezembro de 2009 (PARANÁ, 2009). Conforme se observa na ementa deste incidente, a Corte do Paraná considera a distinção dos direitos do companheiro no regime sucessório uma afronta ao princípio da igualdade conferido pelo § 3º, artigo 226, da CRFB; argumentando que, independente da forma de composição, tanto no casamento quanto na união estável as relações são pautadas no afeto e companheirismo para o desenvolvimento da entidade familiar:

INCIDENTE DE INCONSTITUCIONALIDADE. SUCESSÃO DA COMPANHEIRA. ARTIGO 1.790, III, DO CÓDIGO CIVIL. INQUINADA AFRONTA AO ARTIGO 226, § 3º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL, QUE CONFERE TRATAMENTO PARITÁRIO AO INSTITUTO DA UNIÃO ESTÁVEL EM RELAÇÃO AO CASAMENTO. NECESSIDADE DE MANIFESTAÇÃO DO COLENDO ÓRGÃO ESPECIAL. IMPOSSIBILIDADE DE LEI INFRACONSTITUCIONAL DISCIPLINAR DE FORMA DIVERSA O DIREITO SUCESSÓRIO DO CÔNJUGE E DO COMPANHEIRO. OBSERVÂNCIA DO PRINCÍPIO DA IGUALDADE. ELEVAÇÃO DA UNIÃO ESTÁVEL AO "STATUS" DE ENTIDADE FAMILIAR. INCONSTITUCIONALIDADE RECONHECIDA. CONHECIMENTO DO INCIDENTE, DECLARADO PROCEDENTE. 1. Inconstitucionalidade do artigo 1.790, III, do Código Civil por afronta ao princípio da igualdade, já que o artigo 226, § 3º, da Constituição Federal conferiu tratamento similar aos institutos da união estável e do casamento, ambos abrangidos pelo conceito de entidade familiar e ensejadores de proteção estatal. 2. A distinção relativa aos direitos sucessórios dos companheiros viola frontalmente o princípio da igualdade material, uma vez que confere tratamento desigual àqueles que, casados ou não, mantiveram relação de afeto e companheirismo durante certo período de tempo, tendo contribuído diretamente para o desenvolvimento econômico da entidade familiar (PARANÁ, 2009).

Quanto ao TJRJ, cabe destacar que, utilizando-se os já referidos critérios de busca, a pesquisa aponta para duas ementas proferidas pelo órgão especial no tocante à arguição de inconstitucionalidade do inciso III, artigo 1.790, do CC/2002, ambas de relatoria do Desembargador Bernardo Moreira Garcez Neto, sendo a primeira, de n.º 0032655- 40.2011.8.19.0000, julgada em 11 de junho de 2012, transcrita a seguir:

SUCESSÃO DO COMPANHEIRO. CONCORRÊNCIA COM PARENTE SUCESSÍVEL. C.CIVIL DE 2002. INCONSTITUCIONALIDADE DE DISPOSITIVO. VIOLAÇÃO DO PRINCÍPIO DA ISONOMIA. PROCEDÊNCIA DO PEDIDO. Arguição de inconstitucionalidade. Art. 1.790, inciso III, do Código Civil. Sucessão do companheiro. Concorrência com parentes sucessíveis. Violação à isonomia estabelecida pela Constituição Federal entre cônjuges e companheiros (art. 226 §3°). Enunciado da IV Jornada de Direito Civil do Conselho da Justiça Federal. Incabível o retrocesso dos direitos reconhecidos à união estável. Inconstitucionalidade reconhecida. Procedência do incidente. STJ AI no REsp 1135354/PB, Rel. Min. Luiz Felipe Salomão, julgado em 27/05/ 2011 (RIO DE JANEIRO, 2012b).

Na segunda arguição, de n. 0019097-98.2011.8.19.0000, julgada em 6 de agosto de 2012, não se verifica, entretanto, a quantidade de votos exigidos pelo regimento interno da Corte Carioca para a produção de efeito vinculante:

Família. União estável. Sucessão do companheiro. Restrição contida no artigo 1.790, inciso III, do novo Código Civil. Norma que faz prevalecer as relações de parentesco sobre aquelas da afetividade. Dispositivo que contraria a dignidade da pessoa humana, a isonomia e a consagração constitucional da união estável. Restrição que é rejeitada pela doutrina dominante, bem como se afasta da jurisprudência da Suprema Corte sobre a "nova família". Arguição de inconstitucionalidade julgada procedente por maioria de votos. Inaplicável o efeito vinculante do art. 103 do Regimento Interno, por não ter sido atingido o quórum necessário (RIO DE JANEIRO, 2012a). Observa-se, então, que tanto o julgamento de agosto quanto o de junho declararam incidentalmente a inconstitucionalidade do inciso III por considerarem-no violador da isonomia estabelecida constitucionalmente aos cônjuges e aos companheiros, apontando-se, inclusive, o posicionamento da doutrina como fator de peso nas duas decisões (RIO DE JANEIRO, 2012a; RIO DE JANEIRO, 2012b).

O órgão especial do TJSC também se manifesta pela inconstitucionalidade do inciso III do artigo 1.790 do CC/2002, como evidencia a leitura da ementa da arguição de inconstitucionalidade em agravo de instrumento n. 2008.064395-2, julgada em 17 de dezembro de 2014 (SANTA CATARINA, 2014). Para a Corte Catarinense, o comando civilista se afasta da prioridade constitucional de proteção estatal às entidades familiares ao prejudicar a sucessão dos conviventes, limitando-a aos bens adquiridos onerosamente na constância da convivência, em disputa com outros parentes sucessíveis; cabendo, então, o reconhecimento da inconstitucionalidade do mencionado inciso:

ARGUIÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. DIREITO SUCESSÓRIO NA UNIÃO ESTÁVEL. TRATAMENTO DIFERENCIADO EM RELAÇÃO ÀQUELE DISPENSADO AO CASAMENTO. INADMISSIBILIDADE. INCISO III DO ARTIGO 1.790 DO

CÓDIGO CIVIL. COMPANHEIRO OU COMPANHEIRA QUE, NA SUCESSÃO, AO CONCORRER COM OUTROS PARENTES SUCESSÍVEIS FAZ JUS A APENAS UM TERÇO DA HERANÇA. DISCIPLINA DESALINHADA COM O DISPOSTO NO ARTIGO 226 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. INCONSTITUCIONALIDADE. Na condição de núcleo familiar constitucionalmente albergado, tanto a união estável, quanto o casamento - quanto, ainda, o arranjo monoparental -, ostentam idêntica natureza (art. 226 da Carta da República), substanciando-se na comunhão de vidas alicerçada em valores como afetividade, conforto emocional e solidariedade. Nesse sentido, a facilitação, prevista na Constituição Federal para convolar-se a união estável em casamento (§ 3º, do art. 226/CF), não implica um minus da primeira em comparação com o segundo, nem que seja aquela um rito de passagem ou um degrau inferior em relação a este, senão que avulta como instrumento para dar mais segurança jurídica aos próprios companheiros e a terceiros, haja vista as formalidades cartoriais intrínsecas a este último, devendo, porém, ser reverenciada, antes e acima de tudo, a enunciação igualitária de que "a família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado" (caput do art. 226/CF). Afinal, mais relevante do que o modelo pelo qual a família é constituída, é o modo pelo qual se a protege juridicamente. Como corolário, tem-se que o inc. III do art. 1.790 do Código Civil afastou-se do primado da proteção estatal assegurado à entidade familiar, ao conferir tratamento diferenciado e detrimentoso ao convivente em união estável, no caso de sucessão do outro, quanto aos bens adquiridos onerosamente na constância da convivência, na disputa com outros parentes sucessíveis, em desalinho, portanto, com a regra protetiva ditada pela Constituição da República. Impende, por isso, reconhecer a inconstitucionalidade desse preceptivo (inc. III do art. 1.790 do Código Civil) (SANTA CATARINA, 2014).

Respaldando-se nas decisões proferidas pelos Tribunais de Justiça do Paraná, Santa Catarina, Rio de Janeiro e Sergipe, a corte especial do TJGO firma seu posicionamento na arguição nº 342562-37 no sentido de declarar a inconstitucionalidade material do inciso III do artigo 1.790 do CC/2002 (GOIÁS, 2015). Além das manifestações das mencionadas Cortes, o Tribunal Goiano alicerça seu pronunciamento nos princípios da dignidade da pessoa humana e da isonomia, bem como na impossibilidade de se compreender restritivamente os direitos fundamentais assegurados a todas as entidades familiares pela CRFB/88; motivando, assim, o veredito denegatório referente à aplicação da norma sucessória imposta aos companheiros pelo CC/2002:

ARGUIÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE EM APELAÇÃO CÍVEL. ART. 1.790, INCISO III, DO CÓDIGO CIVIL. DIREITO SUCESSÓRIO DO COMPANHEIRO DIFERENCIADO EM RELAÇÃO AO CÔNJUGE SUPÉRSTITE. UNIÃO ESTÁVEL EQUIPARADA AO CASAMENTO PELA CONSTITUIÇÃO. OFENSA AO ART. 226, § 3º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. 1. O tratamento conferido aos companheiros e aos cônjuges deve seguir os ditames sociais da Constituição de 1988 e respeitar, efetivamente, todos os direitos fundamentais nela previstos pois, sendo todas as formas de entidade familiar entendidas no conceito de família, não há como se estabelecer qualquer compreensão restritiva de direitos fundamentais a qualquer uma delas. 2. Tendo a Constituição Federal, em seu artigo 226, § 3º, equiparado a UNIÃO ESTÁVEL AO CASAMENTO, O DISPOSTO DO ARTIGO 1.790, inciso III, do Código Civil vigente colide com a norma constitucional prevista, afrontando os princípios da igualdade e da dignidade da pessoa humana, resguardados na Carta Constitucional, razão pela qual há de ser negada vigência ao dispositivo legal mencionado.

INCIDENTE JULGADO PROCEDENTE. RECONHECIDA A INCONSTITUCIONALIDADE DO INCISO III, DO ARTIGO 1.790 DO CÓDIGO CIVIL/02 (GOIÁS, 2015).

Diante das informações obtidas nos endereços eletrônicos das instâncias de segundo grau pesquisadas, pode-se partir para a abordagem do processamento do recurso extraordinário n. 878.694, contemplando desde a propositura da ação no primeiro grau até sua análise pela Suprema Corte, culminando no fim do debate acerca da diferenciação entre os

Documentos relacionados