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5. A redenção da Ação Católica Brasileira

5.2. A Ação Católica Brasileira a caminho da cruz

Notícias sobre o avanço do comunismo na América Latina deixavam os bispos atentos. Em 1959 Cuba tornava-se um Estado comunista. Em 1961 o Brasil sofria com a renúncia de seu presidente Jânio Quadros, que havia condecorado Ernesto Che Guevara (guerrilheiro revolucionário) e restabelecido políticas com a URSS. Por sua vez, a posse de João Goulart não era aceita por militares e pelas classes dominantes. A exemplo do que aconteceu na Europa, diante destes sinais, a Igreja brasileira refugiava-se no seu discurso anticomunista (BEOZZO, 1994. p.19-22; DUSSEL, 1989.p.39-40).

O núncio Dom Armando Lombardi, na Assembleia da CNBB no Rio de Janeiro, de 2 a 5 de abril de 1962, expressava que, de modo geral, os países da América Latina tinham as mesmas condições políticas, econômicas, morais e religiosas que existiram em Cuba; portanto, haveria de se recobrar o cuidado para que o movimento comunista não se tornasse um obstáculo para a Igreja brasileira (BEOZZO, 1994.p.22).

As encíclicas sociais Mater et Magistra (1961) e Pacem in Terris (1963) eram utilizadas como mecanismos para frear os ideários comunistas, com “a aplicação prática da doutrina social da Igreja será possível opor um dique sólido ao perigoso avanço do marxismo ateu” (BEOZZO, 1994.p.39). Para praticar tal doutrina, o episcopado brasileiro deveria implantar um plano no campo pastoral e outro no campo econômico social, os quais seriam apoiados pela Ação Católica.

Não obstante, esta tendência não era unânime. A publicação da Mater et Magistra, por exemplo, que falava sobretudo da questão agrária, fez crescer um debate ideológico no interior da Igreja. Dois bispos, Dom Castro Mayer, de Campos (RJ), e Dom Proença Sigaud, de Diamantina (MG), com a colaboração de leigos, como Plínio Correa de Oliveira e Luiz Eduardo Mendonça de Freitas, criticaram a orientação esquerdista de setores da igreja no livro “Reforma Agrária, questão de consciência” (BANDEIRA, 2000.p.233; BEOZZO, 1994.p.50; SOUZA, 1984. p.66).

A Igreja brasileira vivia uma divisão ideológica e ao mesmo tempo um avanço na sua estruturação. Os movimentos especializados da ACB estavam

também articulados nacionalmente. Havia uma convocação dos fiéis para uma tarefa no campo social e os setores da ACB a cumpriam. Evitava-se “dar azo aos inimigos da Igreja para acusá-la de não se preocupar com as necessidades materiais dos homens” (Carta de João XXIII à CNBB apud BEOZZO, 1994.p.40).

Era sensível o protagonismo dos movimentos especializados da ACB. Isto levou a que definitivamente o Secretariado Nacional da ACB exercesse o papel de articulador entre os movimentos, principalmente os de Juventude, e a Comissão Episcopal. Exercia também a função de dialogar com os Secretariados Arquidiocesanos da ACB – poucos bem estabelecidos, como em São Paulo, Porto Alegre, Salvador, Belo Horizonte e Rio de Janeiro –, de manter contatos internacionais e representar o movimento quando necessário. Este cenário já vinha se configurando nos anos 1950.

Na década 1960, somava-se ainda a todas essas funções o auxílio dado à implantação de políticas da CNBB para a reorganização da Igreja e do apostolado leigo. Dessa forma, o Secretariado da ACB trabalhava a partir de demandas da Comissão Episcopal da ACB, do Secretariado Nacional de Apostolado Leigo e da própria Conferência Nacional dos Bispos. Para atingir tais fins propostos, o Secretariado pautava-se no desenvolvimento de eventos e na elaboração de documentos circulares que buscavam firmar compromissos entre os leigos e o episcopado.

Havia se solidificado a internacionalização do movimento de Ação Católica Brasileira. Na virada dos anos 1950 para os 1960, o Secretariado Nacional da ACB realizava contatos com diferentes Ações Católicas pela América Latina e Central (Argentina, Chile, Paraguay, Cuba e México) e pela Europa (Itália e Portugal). A perspectiva era a de se familiarizar com os estatutos, regimentos e publicações dessas outras associações católicas, tanto quanto participar de eventos no estrangeiro. Eram também articulados dentro de organismos mais amplos como o Movimento Internacional de Juventude Agrária Católica (MIJARC), Juventude Estudantil Católica Internacional (JECI), Federação Internacional de Intelectuais Católicos Pax Romana, Conselho Episcopal Latino Americano (CELAM), além de agências de cooperação e auxílio financeiro como Misereor e Adveniat.

Na produção e execução de suas tarefas, o Secretariado da ACB acentuava sempre que possível as notas essenciais da Ação Católica. Eram

expressões: “a Ação Católica é uma organização de leigos com funções e responsabilidades executivas”, “nítida a distinção entre a AC e as outras associações religiosas e civis”, “possui funções religiosa e apostólica”, “é instituída pelo certificado oficial do mandato” que liga o movimento à Igreja hierárquica, derivando seus direitos e garantias. As notas eram relembradas para sugerir o equilíbrio entre o engajamento pessoal do militante e a sua posição dentro do movimento de Ação Católica Brasileira, que na “qualidade de movimento mandatário pela Igreja segue nisto a posição própria da Igreja”. Assim, enquanto militante da ACB deveria continuar agindo à luz do evangelho e em união estreita com os bispos173. Ou seja, a ACB reproduzia ainda o sentido de ligação estreita com a Hierarquia, ainda que os movimentos especializados se opusessem a essa conformação.

Na intermediação dos conflitos entre bispos, assistentes eclesiásticos e leigos, que nesses idos de 1960 eram mais acirrados, o Secretariado Nacional foi aquilo que o assistente geral eclesiástico, Dom Hélder Câmara, tinha como política de mediação. Ao presidente leigo da ACB, mesmo que opinasse, cabia- lhe mais executar as tarefas propostas pelo então assistente geral da ACB e por outros bispos. Com isso não se quer minimizar o papel do leigo no Secretariado Nacional, mas sim demonstrar que parte das disputas que existiram ao longo da Ação Católica era por divergências dentro da própria Hierarquia, portanto era natural que as negociações sobre essas mesmas partes se circunscrevessem no âmbito dos sacerdotes envolvidos com a ACB.

Como exemplo disto, na VII Semana Nacional da Ação Católica Brasileira, ocorrida no Rio de Janeiro, de 15 a 20 de maio de 1961, basicamente refletiu-se sobre o papel político e social dos movimentos da Ação Católica Especializada. Isto porque o Secretariado Nacional da ACB174 esperava que nesse encontro os assistentes nacionais dessem um depoimento sobre o que tinham sido os seus trabalhos, “seus condicionamentos, e o que se esperava para sempre melhor desempenho de sua missão junto aos Movimentos de AC”. Para a preparação

173 Mensagem da Comissão Episcopal da ACB. Rio de Janeiro, 21 de maio de 1961 apud Dale,

p.131-2; Reflexões sobre a Ação Católica, no Encontro de AEIOU, Alto da Boa Vista, em 07 de abril de 1962.

174 Carta de 24 de março de 1961, assinada por padre José Lamartine, vice-assistente geral de

do evento foi perguntado aos assistentes: “o que gostaria cada um de levar de conhecimento e submeter à deliberação da Comissão Episcopal”.

O resultado do tal inquérito feito entre os assistentes eclesiásticos do Brasil175 foi apresentado pelo padre José Lamartine Soares à Comissão Episcopal da ACB. O relatório demonstrava que os assistentes desejavam discutir o tema sobre a realidade brasileira, sendo os subtemas educação integral, educação de base, reforma universitária e reforma agrária. A respeito destes assuntos, era nítida a sobreposição dos problemas da realidade sobre os de evangelização, preocupação que caracterizava o perfil de Dom Hélder Câmara e dos movimentos da ACB desde os idos de 1950. Portanto, os assistentes eclesiásticos queriam ter mais subsídios políticos e sociais para dar orientações aos movimentos especializados que lhes eram submetidos.

Diante disso, Dom Jaime Câmara, Dom José Vicente Távora (arcebispo de Aracaju), Dom João Claudio Colling (bispo de Passo Fundo), Dom Manuel Pereira da Costa (bispo de Nazaré da Mata) chegaram à conclusão que

ACB atua em plano de evangelização e sob a dependência da Hierarquia, nos meios estudantil secundário e universitário, no meio independente, no mundo operário e rural, tendo em movimentos de juventude, em pleno desenvolvimento, como em movimentos de adultos, que já apresentam resultados apreciáveis. [...]. Mesmo que atuem diretamente no temporal, mas colocados em contextos de plano divino. (Mensagem da Comissão Episcopal da ACB. Rio de Janeiro, 21 de maio de 1961 apud DALE, 1985. p.131-2) (grifos nossos)

Isto significava que havia cautela da Comissão Episcopal para com o senso de ação dos movimentos especializados estimulado pelo Secretariado

175 Pe José Lamartine Soares (vice-assistente geral de ACB) despachou uma série de inquéritos,

pedindo aos assistentes eclesiásticos dos vários setores de ACB o seu depoimento. As respostas vieram de São Paulo: Presidente Prudente, SP, Ribeirão Preto, assistentes paroquial da JAC, JEC-F, JUC; Minas Gerais: Belo Horizonte, Teófilo Ottoni, assistente de JEC-F; Rio Grande do Sul: Porto Alegre, São João, Caxias do Sul, assistente diocesano de ACE, JOC-F e JEC-F, JIC e JOC-F; Bahia: Livramento, Ilhéus, Conceição de Almeida, Sete Lagoas, assistente de JEC-F assistentes de JIC, JOCF e MFC; Rio Grande do Norte: Caicó, Caraúbas, respondeu antes de ser assistente, pretende ser da JAC-F, Pré-JAC, MFCRural; assistente de JEC; Ceará: Sobral, assistente de JOCF; Pará: Montenegro, assistente de JEC; Paraíba: João Pessoa, Campina Grande, assistentes de JICF JOCF; Maranhão: São Luiz, assistente de JUC; Rio de Janeiro: Rio, diretor geral das Ligas Católicas, foi JOC e ACB; JIC, Piauí: Teresina, assistente de JIC; Bahia:; Santa Catarina: Florianópolis, diretor de Congregação Mariana e Legião de Maria; Pernambuco: Recife, assistente regional de JUC.

Nacional da ACB, tanto que se reforçou o sentido de dependência e o contexto do plano divino da missão apostólica.

Por outro lado, esse laço estreito entre os bispos e os leigos que era tão enfatizado pela Igreja, como se ressentisse da não efetiva vinculação do leigo à Hierarquia, não era entendido somente por esta via. Os leigos também ressentiam a falta da presença de párocos e de assistentes eclesiásticos próximos de si, que sustentassem o movimento, bem como de uma formação mais apropriada para eles, para tanto o Secretariado Nacional da ACB solicitava uma solução em nome dos movimentos especializados.

O Senhor é o assistente geral da AC na diocese. É ‘vice-bispo’ para os movimentos apostólicos. E os movimentos apostólicos devem ser também da Igreja (desculpe...). Devem ser, ainda, dos padres. Pronto! – E, muitas vezes, os padres precisam ser conquistados, precisam ser educados, treinados para serem assistentes. Precisam, não raro, ser convertidos [...] O Senhor está no seminário; pode influir muito na formação dos futuros padres. Com os atuais, talvez muitos seus colegas e amigos, não valeria pensar em um grupo de estudos, em reuniões periódicas, para ver a situação da diocese, para pensar no apostolado dos leigos? (Carta de Osmar Fávero para padre José Armando, 28/01/1962)

Em outras circunstâncias as equipes nacionais acentuavam para o Secretariado Nacional da ACB uma crise nas organizações especializadas de AC quando da troca de assistentes de maneira contínua. Eram citadas várias situações desta natureza, “em que padre Manuel Barreto entregou a coordenação da AC ao senhor bispo Silke”; “padre Sena se afastou do cargo de assistente de AEIOU” e “padre Brasil não comentou mais sobre a situação no Rio Grande do Norte”. Isso era preocupante, pois os assistentes tinham um papel fundamental no interior das organizações.

Segundo Souza (1984.p.204), a partir de 1962 os contatos entre os assistentes nacionais de JUC, por exemplo, e bispos eram esporádicos. Noutras circunstâncias eram as dificuldades de se encontrarem nomes para continuarem a coordenação do Nordeste, onde eram mais expressivas as contradições da Hierarquia. Portanto, se era conhecida a ação mais proeminente no campo temporal dos assistentes e de alguns bispos nos Estados nordestinos e se os mesmos não foram poupados, era possível que a Comissão Episcopal os tivesse

demovidos de seus cargos. Porque não seria de interesse do Secretariado Nacional da ACB, nem do seu então assistente geral Dom Hélder Câmara, tão menos dos movimentos especializados que encontravam força nestes sacerdotes. Porém, as percepções não eram as mesmas, havia quem se desculpasse que os sacerdotes se afastavam dos movimentos porque “como dizem os bispos do Norte e do Sul, em que faltam responsabilidades nos dirigentes (leigos)”176.

Apesar do sucesso que a VII Semana Nacional representou em termos do envolvimento dos sacerdotes para com os movimentos especializados177, via-se que os mesmos iam deixando os seus cargos dentro da Ação Católica Especializada. Essa situação era em parte então pelo descompasso que passava a se acentuar entre a Comissão Episcopal da ACB, presidida por Dom Jaime Câmara, conhecido pela sua linha mais conservadora, entre os assistentes e bispos, de modo geral, e o Secretariado Nacional da ACB.

Além da situação contraditória entre os assistentes eclesiásticos, que mesmo elogiados por sua qualidade de atuação eram demovidos de seus cargos, a crise também se deflagrou no próprio Secretariado Nacional da ACB, com a saída de Dom Hélder Câmara, que já era citada nos meios em 1962, contudo, concretizada em 1963. Em nota, Luiz Eduardo Wanderley, secretário geral da ACB, dizia que havia uma expectativa que com o bispo pudessem ser sanadas as dificuldades que “sempre tivemos com a Comissão Episcopal da Ação Católica Brasileira”. No lugar de Dom Hélder, os assistentes, dirigentes e militantes dos movimentos especializados da ACB eram informados quanto à

176 Respectivamente informações dos documentos: carta manuscrita a Osmar Fávero, Secretário

da Ação Católica, em 1962; escritos da conversa de Osmar, padre Lamartine e padre Sena sobre o Secretariado Regional do Nordeste, 08/03/1962; e, Carta de Osmar Fávero, em 15/03/1962.

177 Contudo, o cenário apresentado pela VII Semana Nacional não era uniforme. Exemplo disso

era a situação relatada pelo Cônego de Gravatá (PE), que enviou uma carta ao Secretariado Nacional que dizia que “acreditava que aplicava os moldes ainda de uma Ação Católica Geral e não de uma Especializada”. Portanto, alguns bispos, em consideração ao que os estatutos previam, podiam adotar ainda o modelo antigo de AC geral (Carta de 11 de julho 1962).

nomeação de Dom Cândido Padim178, como assistente geral, de maneira positiva179.

O Secretariado Nacional da ACB representava naquele momento o legado deixado por Dom Hélder Câmara, que havia adotado uma linha de atuação católica envolvida com as questões temporais. As diferenças com a Comissão Episcopal, que era mais cautelosa quanto à ação militante no temporal, resvalaram no próprio assistente, que foi demovido do cargo. Ainda assim, como os leigos sabiam que a submissão à Hierarquia era uma das notas essenciais da ACB, o Secretariado Nacional desejava a presença de outro assistente eclesiástico no lugar para assim cumprir esse elo para com o bispado. Sabia-se que sem a presença de um sacerdote assistindo a ACB corria-se o risco de com isso cessarem as atividades da associação.

A falta de presença de clero assistindo a Ação Católica começava a ser cada vez mais acentuada e atividades eram programadas para firmar a presença do assistente eclesiástico. Em 1963, relatava-se a importância do papel do assistente na formação e sustentação do militante, jovem e adulto, e que cada setor devia ser acompanhado por um sacerdote devidamente informado das decisões180. Pedia-se apoio aos cardeais, arcebispos e bispos, dizendo que “[...] os militantes, no entanto, não encontram padres preparados para lhes dar essa formação e esse apoio de que necessita”; com isso, “a AC não poderá também se desenvolver e formar líderes cristãos sem a presença animadora de um assistente”. Do mesmo modo, mesmo que não totalmente preparado, a presença do sacerdote era justificada também para colocar os “movimentos no caminho originalmente traçado” – o de ação apostólica.

Mesmo que não se vislumbrassem os possíveis problemas que poderiam decorrer da presença de qualquer sacerdote como assistente eclesiástico, o qual

178 Bispo titular de Tremitonte (Chipre) foi sagrado no dia 05/08/1962, em São Paulo, transferido

para o Rio de Janeiro. Dom Cândido tinha experiência pastoral, tendo sido ex-assistente da Ação Católica em São Paulo. O Cônego José Lamartine então era o vice-assistente nacional. (Carta, 22 de agosto de 1962, Secretariado Nacional de ACB).

179 Na carta de 1º de agosto de 1962, Rio de Janeiro, da ACB, assinada por Osmar Fávero (então

Presidente Nacional) e por Conego José Lamartine Soares (vice-assistente nacional) e enviada a Dom Carlos Carmelo (SP) e Dom Augusto Silva (Salvador), membros da Comissão Episcopal de AC e do Apostolado Leigo, dizia que “[...] agradecemos o Presidente da Comissão Episcopal da AC e do Apostolado dos Leigos, a escolha de Dom Cândido Padim OSB, recentemente eleito Bispo Auxiliar de V. Excia.”

180 Carta dirigida a Luiz Eduardo Wanderley, presidente da ACB, 13 de janeiro de 1963; carta de

poderia ser de uma linha política ou dogmática contrária à ACB, o Secretariado Nacional não deixava de exprimir e desejar um sacerdote no interior dos movimentos especializados. Por outro lado, esperava-se que a formação do assistente eclesiástico sobre as particularidades da ACB o convertesse para o que se compreendia de ação apostólica social e política.

Somando à desistência de sacerdotes do papel de assistentes eclesiásticos, ocorreu a própria desestruturação do Secretariado Nacional da ACB em decorrência da saída de outros membros.

[Carlos Libânio – atualmente conhecido por frei Betto] está passando por um momento difícil de opção vocacional – pediu dispensa imediata da AC, Jane também pediu afastamento para resolver problemas financeiros, Osmar, alegando uma série de motivos ponderáveis, prefere ficar numa espécie de assessoria às equipes nacionais”; “quanto a mim, nem precisaria dizer que a minha presença, em termos de Hierarquia, se deve à boa vontade do Senhor, mas minha permanência daqui para frente só lhe traria incômodo e desgostos com a maioria dos bispos. (Carta de Luiz Eduardo Wanderley para Dom Cândido Padim, Rio de Janeiro, novembro de 1964)

Em especial, o ano de 1964 foi marcado na ACB pela presença do Secretariado Nacional do Apostolado Leigo da CNBB, sob a direção de Dom Vicente Scherer, mais próximo da uma linha conservadora como a de Dom Jaime de Barros Câmara, presidente da Comissão Episcopal da ACB. Era sobre esta Hierarquia que se referia Luiz Eduardo Wanderley e mesmo assim pensava em ficar na ACB até fins de dezembro de 1964. Para substituí-lo posteriormente, sugeriu o nome de Tibor Sulik para o cargo, pois este “sem desgastes [com a Hierarquia] e com boa representação para Adultos”.

[...] quanto às eleições da CNBB, apesar de todas as justificações e otimismos, foi um choque violento no que diz respeito à Diretoria escolhida. Quanto ao bispo liberado para o Apostolado dos Leigos, nada feito. Agora, apesar da observação do Senhor e de Dom Hélder, nas cartas, ficamos rezando para que permaneça como Assistente Geral da AC (mas todo mundo está com a pulga atrás da orelha). Enviamos uma carta de saudação a Dom Vicente Scherer, por ter sido escolhido, assinada pelos coordenadores e assistentes [...] O próprio Dom Scherer, conversando com Padre Pretto aqui no Rio, disse que não entendia porque não se arrumava dinheiro para a AC; mesmo sabendo que ele critica a AC foi procurá-lo quase

sempre para pedir dinheiro... Jair parece que enviou a Roma, ao lado do pedido da CNBB, um orçamento base para a AC; sobre os assistentes que deixaram as Juventudes. Há uma preocupação com o esquema de apostolado dos leigos... Qual a posição do Brasil? (Carta de Luiz Eduardo Waldemarin Wanderley a Cândido Padim, Rio de Janeiro, 13 de outubro de 1964.)

Concomitantemente, forjava-se uma crise financeira em torno do movimento, desarticulando mais o grupo, pois a CNBB não mais transferia valores significativos para a manutenção da ACB. Eram comuns as solicitações de apoios financeiros para entidades de ajuda mútua católica da Europa. A Pax Romana, o MIEC e o Adveniat foram contatados nos momentos de crise. Os aportes, quando aprovados, serviam para a manutenção dos movimentos de juventude especializada, como o pagamento de locação de imóveis (sede das equipes nacionais e moradia dos militantes permanentes).

As disputas entre os leigos participantes do Secretariado Nacional da ACB e os dirigentes das equipes nacionais dos movimentos especializados não eram comentadas no Secretariado em questão. O que se perfilava ainda em 1964 era que o Secretariado Nacional da ACB cumpria o papel de interlocutor entre os leigos e a Comissão Episcopal181, representando as diretrizes da Hierarquia e divulgando-as por meio de circulares expedidas periodicamente. Mesmo que, paradoxalmente, opiniões e divergências como apontadas pelo presidente leigo do Secretariado Nacional e a Hierarquia fossem públicas.