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CAPÍTULO 1 A ABRANGÊNCIA DA BASE DE CÁLCULO DAS CONTRIBUIÇÕES

1.4 A abrangência da base de cálculo das contribuições previdenciárias

Passa-se, então, a efetiva análise da amplitude da base de cálculo das contribuições previdenciárias do empregador, da empresa e da entidade a ela equiparada na forma da lei, incidentes sobre a “folha de salários e demais rendimentos do trabalho pagos ou creditados, a qualquer título, à pessoa física que preste serviço, mesmo sem vínculo empregatício”.

Para tanto, inicialmente, será realizada uma análise da abrangência dos conceitos de “salário” e de “remuneração”, conforme postos pela legislação e pela doutrina trabalhista, justamente por serem institutos derivados do Direito do Trabalho. A doutrina trabalhista tem conferido pelo menos três sentidos diferenciados para as palavras remuneração e salário.72

A primeira acepção considera remuneração e salário como expressões equivalentes, sinônimas. No cotidiano trabalhista utiliza-se a expressão remuneração com o mesmo significado de salário. A jurisprudência e a doutrina sempre que querem reconhecer a natureza salarial de determinadas parcelas percebidas pelos empregados, comumente, referem-se ao caráter remuneratório destas verbas.

A segunda dessas acepções considera que a remuneração é gênero, do qual o salário é espécie, ou seja, considera que remuneração é o conjunto de parcelas contraprestativas em virtude da relação de emprego e que o salário é a principal destas parcelas contraprestativas no contexto do contrato de trabalho.

Dentro deste contexto, Amauri Mascaro Nascimento identifica o salário como sendo a contraprestação fixa percebida pelo empregado:

Que é salário? Trata-se de saber qual é a composição do salário.

Três conceitos são inconfundíveis, salário, complementos salariais e atribuições não salariais; o primeiro é o parâmetro dos cálculos nos contratos de trabalho, o segundo reúne pagamentos acessórios e não contínuos e por tal motivo não se incluem no salário, o terceiro refere-se a vantagens, bens ou serviços desvinculados dos salários.

Salário é a contraprestação fixa paga pelo empregador pelo tempo de trabalho prestado ou disponibilizado pelo empregado, calculada com base no tempo, na produção ou em ambos os critérios, periodicamente e de modo a caracterizar-se como o ganho habitual do trabalhador. Os complementos

podem refletir sobre o salário ou não, dependendo da habitualidade, da frequência com que são pagos, não importando, para esse fim, a variabilidade dos seus valores, pois este não é o aspecto principal, mas sim a constância do pagamento em intervalos curtos.73

Por fim, a terceira acepção é a que estabelece uma maior diferença conceitual entre salário e remuneração, parte da premissa de que salário é o conjunto de parcelas contraprestativas do serviço pagas diretamente pelo empregador e de que remuneração compreende tanto as parcelas contraprestativas do serviço pagas pelo empregador como as gorjetas, que são pagas, como se sabe, por terceiros, baseado no modelo preconizado no art. 457 da CLT:

Art. 457 - Compreendem-se na remuneração do empregado, para todos os efeitos legais, além do salário devido e pago diretamente pelo empregador, como contraprestação do serviço, as gorjetas que receber.

§ 1º Integram o salário, não só a importância fixa estipulada, como também as comissões, percentagens, gratificações ajustadas, diárias para viagem e abonos pagos pelo empregador.

§ 2° Não se incluem nos salários as ajudas de custo, assim como as diárias para viagem que não excedam de cinqüenta por cento do salário percebido pelo empregado

§ 3° Considera-se gorjeta não só a importância espontaneamente dada pelo cliente ao empregado, como também aquela que for cobrada pela empresa ao cliente, como adicional nas contas, a qualquer título, e destinada à distribuição aos empregados.

Esta última acepção é a adotada por Gustavo Filipi Barbosa Garcia:

O art. 457, caput, apresenta o conceito de salário, possibilitando a diferenciação da remuneração propriamente.

Assim, perante o sistema jurídico em vigor, a remuneração é termo mais amplo, ou seja, o gênero que engloba como espécies o salário e a gorjeta, pois “compreendem-se na remuneração [...] além do salário [...] as gorjetas”.74

Ainda de acordo com a legislação trabalhista, o salário in natura, ou ganho habitual sob a forma de utilidade, é elemento integrativo do salário e consiste na retribuição do seu trabalho, em bem útil e de valor econômico diferente da moeda, nos termos do art. 458 da CLT:

Art. 458 - Além do pagamento em dinheiro, compreende-se no salário, para todos os efeitos legais, a alimentação, habitação, vestuário ou outras prestações “in natura” que a empresa, por força do contrato ou do costume, fornecer habitualmente ao empregado. Em caso algum será permitido o

73 NASCIMENTO, Amauri Mascaro, Curso de Direito do Trabalho. 26 ed. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 815. 74 GARCIA, Gustavo Filipe Barbosa. Curso de Direito do Trabalho. 8 ed., rev., atual. e ampl. Rio de Janeiro:

pagamento com bebidas alcoólicas ou drogas nocivas. (Redação dada pela Lei nº pelo Decreto-lei nº 229, de 28.2.67)

Sérgio Pinto Martins adota, também, o posicionamento no sentido de que, de acordo com a redação da CLT, a remuneração é igual ao salário mais as gorjetas e acrescenta, ainda, que essa remuneração tanto pode ser em dinheiro como em utilidades:

O art. 457 da CLT não define remuneração ou salário, apenas enuncia os elementos que o integram, pois utiliza a expressão “compreendem-se na remuneração do empregado...”.

Remuneração é o conjunto de prestações recebidas habitualmente pelo empregado pela prestação de serviços, seja em dinheiro ou em utilidades, provenientes do empregador ou de terceiros, mas decorrentes do contrato de trabalho, de modo a satisfazer suas necessidades básicas e de sua família. Caracteriza-se a remuneração como uma prestação obrigacional de dar. Não se trata de obrigação de fazer, mas de dar, em retribuição pelos serviços prestados pelo empregado ao empregador, revelando a existência do sinalagma que e encontrado no contrato de trabalho. Essa remuneração tanto pode ser em dinheiro como em utilidades, de maneira que o empregado não necessite compra-las, fornecendo o empregador tais coisas. O art. 458 da CLT admite o pagamento do salário em utilidades.75

Dentro deste contexto, adotamos as lições de Sérgio Pinto Martins, pois também consideramos que a legislação trabalhista, ao utilizar os termos salário e remuneração, diferencia as verbas pagas diretamente pelo empregador – quer sejam em dinheiro quer sejam em utilidades - daquelas que não são desembolsadas por ele (gorjetas), embora sejam resultado do trabalho realizado pelo empregado, no âmbito da relação contratual. Que pode assim ser sintetizada:

Conforme já adiantado, em sua redação original, o permissivo constitucional pertinente às contribuições previdenciárias dizia respeito exclusivamente à contribuição “do empregador” incidente sobre a “folha de salários”.

Diferentemente da matriz constitucional atualmente adotada, em que a contribuição “do empregador, da empresa e da entidade a ela equiparada na forma da lei” incidirá sobre a “folha de salários e demais rendimentos do trabalho pagos ou creditados, a qualquer título, à pessoa física que lhe preste serviço, mesmo sem vínculo empregatício”.

75 MARTINS, Sérgio Pinto. Direito do Trabalho. 26 ed. São Paulo: Atlas, 2010, p. 226-227. Remuneração = salário (em dinheiro ou em utilidades) + gorjetas

Não obstante a norma constitucional tributária seja incapaz de gerar efeitos concretos nas relações jurídicas tributárias, tem evidente parcela de eficácia, uma vez que traça efetivos limites formais e materiais ao legislador. Portanto, neste momento torna-se necessário o conhecimento dos limites sintáticos, semânticos e pragmáticos da expressão: “contribuição do empregador, da empresa e da entidade a ela equiparada na forma da lei, incidentes sobre a folha de salários e demais rendimentos do trabalho pagos ou creditados, a qualquer título, à pessoa física que lhe preste serviço, mesmo sem vínculo empregatício”.

Para tanto, será utilizado o modelo jurídico ofertado por Paulo de Barros Carvalho, em sua obra Direito Tributário: Linguagem e Método, denominado de regra matriz de incidência.76

Antes, entretanto, merece destaque a lição de Geraldo Ataliba sobre hipótese de incidência: “pode haver – e tal é o caso mais raro – uma lei que os enumere e especifique a todos, mas, normalmente, os aspectos integrativos da hipótese de incidência estão esparsos na lei, ou em diversas leis, sendo que muitos são implicados no sistema jurídico”. E define os aspectos da hipótese de incidência em:77

a) Aspecto pessoal ou subjetivo, “é a qualidade – inerente à hipótese de incidência – que determina os sujeitos da obrigação tributária que o fato imponível fará nascer”.

b) Aspecto temporal é “a propriedade que esta tem de designar (explícita ou implicitamente) o momento em que se deve reputar consumado (acontecido, realizado) um fato imponível”.

c) Aspecto material é aquele que “contém a designação de todos os dados de ordem objetiva, configuradores do arquétipo em que ela (h.i.) consiste; é a própria consistência material do fato ou estado de fato descrito pela h.i.” [...] “é a imagem abstrata de um fato jurídico”.

d) Aspecto espacial: “a indicação de circunstâncias de lugar, contidas explícita ou implicitamente na hipótese de incidência, relevantes para a configuração do fato imponível”.

Há de se fazer uma efetiva distinção entre norma tributária em sentido estrito, que é a que define o núcleo do tributo, isto é, a regra matriz de incidência, das normas tributárias em sentido amplo, que são as demais normas tributárias. Apesar de serem numerosos os postulados

76 CARVALHO, Paulo de Barros. Direito Tributário: linguagem e método. 5 ed. São Paulo: Noeses, 2013. 77 ATALIBA, Geraldo. Hipótese de Incidência Tributária. 6 ed. São Paulo: Malheiros, 2003, p. 76, 80, 94, 104,

regem a atividade tributária estatal, são poucas as que definem as regras matrizes de incidência, já que a princípio, somente há uma para cada figura tributária, acompanhada de infinidade de outras normas que tratam de questões operativas ou funcionais, como o lançamento, recolhimento, deveres instrumentais, prazos, fiscalização etc.78

A regra matriz de incidência em sua estrutura lógica apresenta: i) hipótese, suposto ou antecedente; e ii) consequência. Dentro desse arcabouço a hipótese trará a previsão de um fato (exemplo: ser proprietário de bem imóvel), enquanto a consequência prescreverá a relação jurídica (obrigação tributária) que se instaurará onde e quando ocorrer o fato cogitado no suposto (exemplo: aquele alguém deverá pagar à Fazenda Municipal 1% do valor venal do imóvel).

Assim sendo, conforme leciona o professor Paulo de Barros, a hipótese alude a um fato e a consequência prescreve os efeitos jurídicos que o acontecimento irá propagar, razão pela qual se fala em descritor e prescritor, o primeiro para designar o antecedente normativo e o segundo para indicar seu consequente, mencionando expressamente que:

Os modernos cientistas do Direito Tributário têm insistido na circunstância de que, tanto no descritor (hipótese) quanto no prescritor (consequência) existem referências a critérios, aspectos, elementos ou dados identificativos. Na hipótese (descritor), haveremos de encontrar um critério material (comportamento de uma pessoa), condicionado no tempo (critério temporal) e no espaço (critério espacial). Já na consequência (prescritor), depararemos com um critério pessoal (sujeito ativo e sujeito passivo) e um critério quantitativo (base de cálculo e alíquota). A conjunção desses dados indicativos nos oferece a possibilidade de exibir, na sua plenitude, o núcleo lógico-estrutural da norma-padrão de incidência tributária.79

O tipo tributário é definido pela integração lógico-semântica de dois fatores: hipótese de incidência e base de cálculo. O critério material é o núcleo da hipótese de incidência, composto de verbo e complemento, que descrevem abstratamente um fato do particular (como ocorre com as contribuições previdenciárias) ou uma atuação estatal (como ocorre com as taxas).80

Ou seja, na junção dessas duas partes (verbo e complemento) é que se torna possível a descrição da hipótese de incidência constitucional das contribuições previdenciárias: 1ª) pagar ou creditar; e 2ª) salário e rendimentos do trabalho, mesmo sem vínculo empregatício.

78 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. 25 ed. São Paulo: Saraiva, 2013, p. 238-239. 79 Ibidem, p. 239.

E mais, a base de cálculo, deve ter uma correlação lógica e direta com a hipótese de incidência do tributo, uma vez que no bojo do critério quantitativo, mensura a intensidade da conduta praticada pelo sujeito passivo, ou ainda, pela Administração, como ocorre com as taxas. A base de cálculo como verdadeira e autêntica expressão econômica da hipótese de incidência adquire, ainda, uma função comparativa, confirmando, infirmando ou afirmando o verdadeiro critério material da hipótese tributária: i) confirmando sempre que houver total sintonia entre o padrão da medida e o núcleo do fato dimensionado; ii) infirmando, quando houver manifesta incompatibilidade entre a grandeza eleita e o acontecimento que o legislador declara como a medula da previsão fática; e iii) afirmando, na eventualidade de ser obscura a formulação legal.81

Assim sendo, no caso específico das contribuições previdenciárias a cargo do empregador, da empresa e da entidade a ela equiparada na forma da lei, incidentes sobre a folha de salários e demais rendimentos do trabalho pagos ou creditados, a qualquer título, à pessoa física que lhe preste serviço, mesmo sem vínculo empregatício, Paulo de Barros de Carvalho, ao adotar o modelo da regra matriz de incidência, apresenta o quadro que se segue:82

81 Idem. Curso de Direito Tributário. 25 ed. São Paulo: Saraiva, 2013, p. 318-321.

82 Idem. Direito Tributário: linguagem e método. 5 ed. São Paulo: Noeses, 2013, p. 805-806.

1. critério material: pagar ou creditar salário e demais rendimentos do trabalho

HIPÓTESE (descritor)

2. critério espacial: território nacional

3. critério temporal: momento do pagamento ou creditamento do salário e demais rendimentos do trabalho

A regra matriz constitucionalmente estabelecida é que deve nortear a atividade do legislador ordinário, que no exercício de sua competência tributária não pode distanciar-se dos termos estabelecidos na Constituição, quer no que diz respeito ao sujeito passivo, quer no tocante à hipótese de incidência ou à base de cálculo.

Ao Fazer uma comparação da redação atual da Constituição, com a redação original, que previa a instituição de contribuições do empregador incidentes sobre a “folha de salários”, no que diz respeito a regra matriz de incidência constitucional das contribuições previdenciárias, vê-se que, anteriormente, havia uma menor abrangência, tanto no que diz respeito ao sujeito passivo (critério pessoal), como no que se refere à base de cálculo (critério quantitativo), conforme demonstra o seguinte quadro:

redação original redação atual critério pessoal

(sujeito passivo)

Empregador empregador, empresa e entidade a ela equiparada na forma da lei

critério quantitativo (base de cálculo)

valor da folha de salários

valor da folha de salário e demais rendimentos pagos ou creditados

a) sujeito ativo: União

CONSEQUENCIA (prescritor)

1. critério pessoal: b) sujeito passivo: empregador, empresa e entidade a ela equiparada na forma da lei

2. critério quantitativo:

a) base de cálculo: valor da folha de salário e demais rendimentos pagos ou creditados

Ocorre que, ainda sob a égide da redação original da Constituição foram instituídas contribuições previdenciárias sobre o total das remunerações dos segurados tanto dos segurados empregados, como dos trabalhadores avulsos, autônomos e administradores.83 84

Nesse diapasão, o STF ao apreciar a validade destas normas, concluiu pela inconstitucionalidade, por considerar que a relação jurídica mantida entre o tomador de serviços e os administradores e autônomos não resultam de contrato de trabalho, formalizado à luz da CLT, impossibilitando de se dizer que o tomador dos serviços destas pessoas físicas qualifica- se como empregador e que a satisfação do que devido ocorra via folha de salários. Afastado, portanto, o enquadramento no inciso I do art. 195 da CF. Naquela ocasião, o STF manifestou, também, entendimento no sentido de que outras contribuições que não estivessem enquadradas no conceito de folha de salários decorrentes de uma relação de trabalho conforme disciplinado pela CLT deveriam ser instituídas por lei complementar, conforme previsto no art. 195, § 4º, da Constituição, em acórdão assim ementado:

CONTRIBUIÇÃO SOCIAL - TOMADOR DE SERVIÇOS - PAGAMENTOS A ADMINISTRADORES E AUTÔNOMOS - REGÊNCIA. A relação jurídica mantida com administradores e autônomos não resulta de contrato de trabalho e, portanto, de ajuste formalizado à luz da Consolidação das Leis do Trabalho. Daí a impossibilidade de se dizer que o tomador dos serviços qualifica-se como empregador e que a satisfação do que devido ocorra via folha de salários. Afastado o enquadramento no inciso I do artigo 195 da Constituição Federal, exsurge a desvalia constitucional da norma ordinária disciplinadora da matéria. A referência contida no § 4º do artigo 195 da Constituição Federal ao inciso I do artigo 154 nela insculpido, impõe a observância de veículo próprio - a lei complementar. Inconstitucionalidade do inciso I do artigo 3º da Lei nº 7.787/89, no que abrangido o que pago a administradores e autônomos. Declaração de inconstitucionalidade limitada pela controvérsia dos autos, no que não envolvidos pagamentos a avulsos.85

Por certo, na sua redação originária, a Constituição somente viabilizava a imposição de contribuições previdenciárias incidentes sobre a folha de salários, pois a redação do seu art. 195, I, possuía formulação estreita. Sob este modelo, não havia espaço para que fossem tributadas, por via de legislação ordinária, as importâncias pagas por empresas a trabalhadores sem vínculo de emprego, tais como sócios dirigentes e autônomos. Essa a razão que levou o Supremo Tribunal Federal a declarar a inconstitucionalidade das expressões “administradores” e “autônomos”, contidas no inciso I do art. 22 da Lei nº 8.212, de 1991, em aresto assim ementado:

83 Art. 3º, I, da Lei nº 7.787, de 1989.

84 Art. 22, I, da Lei nº 8.212, de 1991, na sua redação original.

EMENTA: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. CUSTEIO DA SEGURIDADE SOCIAL: EXPRESSÕES "EMPRESARIOS" E "AUTONOMOS" CONTIDAS NO INC.I DO ART. 22 DA LEI N. 8.212/91. PEDIDO PREJUDICADO QUANTO AS EXPRESSÕES "AUTONOMOS E ADMINISTRADORES" CONTIDAS NO INC. I DO ART. 3. DA LEI N. 7.787/89.

1. O inciso I do art. 22 da Lei n. 8.212, de 25.07.91, derrogou o inciso I do art. 3. da Lei n. 7.787, de 30.06.89, porque regulou inteiramente a mesma matéria (art. 2., par. 1., da Lei de Introdução ao Cod. Civil). Malgrado esta revogação, o Senado Federal suspendeu a execução das expressões "avulsos, autônomos e administradores" contidas no inc. I do art. 3. da Lei n. 7.787, pela Resolução n. 15, de 19.04.95 (DOU 28.04.95), tendo em vista a decisão desta Corte no RE n. 177.296-4.

2. A contribuição previdenciária incidente sobre a "folha de salários" (CF, art. 195, I) não alcança os "autônomos" e "administradores", sem vínculo empregatício; entretanto, poderiam ser alcançados por contribuição criada por lei complementar (CF, arts. 195, par. 4., e 154, I). Precedentes.

3. Ressalva do Relator que, invocando política judicial de conveniência, concedia efeito prospectivo ou "ex-nunc" a decisão, a partir da concessão da liminar.

4. Ação direta conhecida e julgada procedente para declarar a inconstitucionalidade das expressões "empresários" e "autônomos" contidas no inciso I do art. 22 da Lei n. 8.212, de 25.07.91. 86

Então, há de se concluir que a norma inscrita no art. 195, I, da Constituição, na sua redação original, por referir-se à contribuição social incidente sobre a folha de salários – expressão esta que apenas alcança a remuneração paga pela empresa em virtude da execução de trabalho subordinado, com vínculo empregatício – não abrange os valores pagos aos autônomos, aos avulsos e aos administradores, que constituem categorias de profissionais não empregados. A União, para instituir validamente nova contribuição previdenciária incidente sobre a remuneração de trabalhadores sem vínculo empregatício, deveria valer-se, não de lei ordinária, mas, necessariamente, de espécie normativa juridicamente mais qualificada: a lei complementar.

Naquela ocasião, ante as sucessivas declarações de inconstitucionalidade e visando recompor a tributação a cargo das empresas e pessoas jurídicas, inclusive cooperativas, incidentes sobre o pagamento a autônomos, avulsos, administradores e demais pessoas físicas que, de algum modo prestassem serviços sem vínculo empregatício, o legislador editou então a Lei complementar nº 84, de 1996. Desta feita o STF reconheceu a constitucionalidade da exação, justamente porque instituída por lei complementar:

EMENTA: CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO. PREVIDENCIÁRIO. CONTRIBUIÇÕES SOCIAIS: EMPRESÁRIOS. AUTÔNOMOS e AVULSOS. Lei Complementar nº 84, de 18.01.96: CONSTITUCIONALIDADE. I. - Contribuição social instituída pela Lei Complementar nº 84, de 1996: constitucionalidade. II. - R.E. não conhecido.87

Neste ponto já é possível traçar conclusão acerca da abrangência da expressão folha de

salários, que é um dos componentes do campo de incidência das contribuições previdenciárias:

alberga tão-somente as contraprestações decorrentes da execução de trabalho subordinado, ou seja, com vínculo empregatício.

Então há de se concluir que, sob a égide da redação original, o texto constitucional não previa a possibilidade de fazer incidir contribuições previdenciárias sobre os valores pagos aos profissionais não empregados, isto é, sem vínculo empregatício, como é o caso dos trabalhadores avulsos, dos autônomos e dos administradores.

Entretanto, com a promulgação da EC nº 20, 1998, o atual texto constitucional que trata destas contribuições menciona que sua incidência dar-se-á “sobre a folha de salários e demais rendimentos do trabalho pagos ou creditados, a qualquer título, pelo empregador, pela empresa ou pela entidade a ela equiparada, à pessoa física que lhe preste serviço, mesmo sem vínculo empregatício”, o que tornou possível a lei ordinária fazer incidir contribuições sociais