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4. Adolescência, sustentabilidade e mudanças climáticas

4.1. A adolescência

Discutir o significado da adolescência não é simples, pois o conceito de adolescer não tem margens bem delimitadas nem definições claras. A adolescência, na sociedade ocidental contemporânea, refere-se a um período de transição no desenvolvimento entre a infância e a idade adulta que envolve grandes mudanças físicas, cognitivas e psicossociais (Papalia et al., 2006). Entretanto, esse período de transição não possui limites exatos de início e término.

Para alguns autores (Clark & Uzzell, 2005; Papalia et al., 2006), a adolescência dura em torno de 10 anos, iniciando-se por volta dos 11, 12 anos, e terminando por volta dos 19, 20. E,

em geral, se considera que o início da adolescência ocorre concomitantemente ao início da puberdade – sendo esta definida como o processo que conduz à maturidade sexual (Cole & Cole, 2003) – e seu fim se dá com a entrada no mundo adulto, representada pela maturação física ou pelo aprendizado vocacional.

Esse término da adolescência também é questionando e discutido. Existem vários marcos e definições que correspondem à entrada na vida adulta. Existem definições psicológicas, como criação dos próprios sistemas de valores e de relacionamentos, independência em relação aos pais e descoberta de uma identidade própria; existem definições sociológicas como casamento, independência financeira; e existem as definições legais, como a “maioridade” (Papalia et al., 2006).

Todavia, não se deveria discutir marcos iniciais e finais da adolescência sem frisar que essa fase, assim como a “invenção da infância”, representa um ideal social, cultural, que divide e organiza os indivíduos de acordo com aquilo que lhes foi reservado pela estrutura social vigente (Calligaris, 2000). Nessa mesma direção, Nurmi (2005) ressalta que cada fase, ou estágio de vida, possui requisitos sociais a serem cumpridos pelo indivíduo e que são específicos para etapa em que se encontra.

Diante desse quadro de distinções conceituais, e para os propósitos deste trabalho, recorro a definições legais, às leis brasileiras, para tomar como base o período considerado como adolescência por este estudo. Nesse sentido, recorro ao Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei Federal nº 8.069/1990), que considera adolescentes as pessoas que possuem entre doze e dezoito anos de idade (art. 2º); sendo esta, portanto, a perspectiva conceitual adotada. Vale ressaltar, que se basear nessa definição política, significa fornecer uma delimitação prática ao período da adolescência, superando a problemática conceitual que reside na delimitação do início e término desta. Logo, isso não implica em prejuízos conceituais ou metodológicos, tendo em vista que essa faixa etária, definida pelo Estatuto (12 a 18 anos de

idade), ou corresponde exatamente ou está dentro das faixas etárias designadas por autores já citados da área de desenvolvimento humano, que demarcam a adolescência entre os onze e vinte anos de idade (Clark & Uzzell, 2005).

É indispensável, ao abordar o posicionamento dos adolescentes diante das mudanças climáticas globais, que se discuta possíveis formas de o adolescente pensar e agir. Na adolescência, ocorrem mudanças cognitivas, ocorrem transformações no pensamento, sendo os adolescentes, capazes de fazer julgamentos morais sofisticados, além de poderem se projetar e planejar um futuro de maneira mais realista (Nurmi, 2005; Papalia et al., 2006; Wray-Lake et al., 2010), tornando interessante saber o que os adolescentes pensam a respeito das MCs, e se eles consideram, ou não, as consequências do problema, que ocorrerão de forma mais intensa apenas futuramente.

De acordo com a teoria de Piaget (1972), a adolescência também compreende o estágio das operações formais, correspondendo ao período de aquisição de certas habilidades, como a capacidade de pensar em termos do que poderia ser, e não apenas do que é. Os adolescentes já são capazes de refletir sobre possibilidades, gerar e testar hipóteses, considerar diversas causas distintas para um problema. Essas capacidades cognitivas fazem com que suas percepções sobre a realidade se tornem mais complexas. O adolescente compreende sentimentos e os fornece não só a figuras concretas, como pais e amigos, mas também a entidades abstratas, como aos conceitos de liberdade, exploração, violação (Papalia et al., 2006). Sendo assim, porque não supor e estimular afetos também pelo planeta e por temáticas relativas à proteção ecológica? Esses são temas que são, sim, foco de interesse de adolescentes (Nurmi, 2005).

Os autores que compilam teorias sobre desenvolvimento humano em seus manuais, apontam para o consenso (Bee & Boyd, 2011; Cole & Cole, 2003; Papalia, et al., 2006;) de que o pensamento dos adolescentes já possui capacidade de ser hipotético, dedutivo, sistemático e metacognitivo (refletir sobre os próprios pensamentos). Esses adolescentes também podem

planejar e se projetar no futuro, fazendo uso de suas capacidades cognitivas para pensarem sobre política, religião, moralidade e (porque não?) meio ambiente (Cole & Cole, 2003).

Pensar a respeito desses temas também pode se atrelar ao desenvolvimento da capacidade de tecer julgamentos morais. Teorias como a de Lawrence Kohlberg (Cole & Cole, 2003; Levine, Kohlberg, & Hewer, 1985), por exemplo, afirmam que na adolescência já se pode adquirir formas de moralidade, pós-convencionais, em que o raciocínio moral é mais complexo, não no sentido somente de obedecer a leis postas por outrem – o que seria um estilo de moralidade heterônomo (Bataglia, Morais, & Lepre, 2010) – mas também ir além das convenções, considerando diversas possibilidades. É uma moralidade autônoma (Bataglia et al, 2010), que reconhece ou julga de acordo com a relatividade das situações, em termos de imparcialidade e justiça, mesmo que destoem do que é convencionalmente estabelecido.

É possível pressupor que se os adolescentes acham que é correto cuidar do meio ambiente, pode haver a possibilidade de adoção de comportamentos condizentes. Todavia, não necessariamente o discurso do jovem irá condizer com suas ações. Isso nem sempre acontece, por exemplo, pela existência da chamada hipocrisia aparente, característica do pensamento do adolescente descrita por David Elkind (1978). O adolescente pode achar correto ter práticas de cuidado ambiental, porém, não necessariamente tê-las. Essa hipocrisia é no sentido de que, muitas vezes, eles não reconhecem a diferença entre expressar um ideal e fazer os sacrifícios necessários para viver de acordo com esse ideal, ou nem ter independência para isso (Ojala, 2015). Mesmo assim, promover um ideal de compromisso e respeito com o meio ambiente é, sem dúvida, um primeiro passo à ação a ser estimulada.

Estar atento a esses aspectos, como, por exemplo, ao raciocínio moral, é no sentido de estar atento também a questões como a da chamada “desejabilidade social”, discutida por Kaiser, Oerke e Bogner (2007); que a apontam como uma possível explicação para os resultados encontrados por seu estudo, ao investigar atitudes ambientais com adolescentes por meio de

auto-relato. Essa desejabilidade corresponde ao fato de que os adolescentes podem relatar possuir ações de cuidado simplesmente porque consideram como o correto a ser dito, ou acham que é o que a sociedade espera como moralmente aceitável, dando respostas que concluem serem as esperadas por quem lhes pergunta, porém não necessariamente condizentes com suas práticas.

Discutir sobre isso permite a identificação de possíveis vieses no processo de pesquisa, evitando confundir o que os adolescentes consideram realmente sobre as MCs com o que eles acham que deve ser dito, ou respondido, a partir de uma perspectiva social do que é bom, certo, desejado. Essa questão corresponde a uma problemática até comum em estudos de meio ambiente, já que “cuidar do entorno e da natureza” ganhou uma conotação social de “bom mocismo”, de ação correta. O contexto, as relações sociais que se desenvolvem nos lugares, e estes lugares em si, possuem contribuição na forma com que o adolescente se desenvolverá, e desenvolverá seu interesse por temas relativos à sustentabilidade (Heft & Chawla, 2005).