Até 2005, foram relatados em Florianópolis 3078 casos de aids, tendo os três
primeiros casos sido notificados em 1986. Entre 1995 e 2001 ocorreram pequenas
oscilações de decréscimo/aumento relativamente ao(s) ano(s) anterior(es). De 2002
a 2005, o número de casos notificados tem apresentado declínio (com exceção do
ano 2003) (SANTA CATARINA, 2006).
Os impactos da aids sentiram-se mais, segundo Finckler (1998) e Bastos et
al. (1994), nos serviços de saúde que assumiram o seu tratamento. Estes sofreram
inúmeras modificações para poder tratar a nova doença e os profissionais de saúde
viram o seu dia-a-dia transformar-se.
Segundo Miranda (2003), no início da epidemia, a internação das pessoas
que viviam com HIV no HNR, causou grande perplexidade e espanto para a
sociedade, imprensa, funcionários e até mesmo para os médicos do Hospital.
Desta forma, o HNR viu-se perante a necessidade urgente de criar e
estruturar serviços especializados para a assistência às pessoas acometidas pela
aids, que trouxe, em muitos casos, mais um desafio no trabalho e desempenho dos
profissionais de saúde (MAIA, 1999).
Segundo Meirelles (1998, p. 33)
[…] onde se atendia doenças infecciosas conhecidas e categorizadas, passou-se a conviver com o desafio de pacientes com infecções múltiplas; o que era curável [...] passou a ser incurável; o que era raro [...] passou a ser comum; o que era conhecido e diagnosticável [...] passou a ser de difícil diagnóstico [...]; o que antes aparecia como efeito da pobreza e falta de condições sanitárias passou a aparecer em todos os setores da população […].
De forma a atender às necessidades e desafios colocados pela epidemia da
aids e para poder atender a crescente demanda de pessoas que viviam com HIV e
que procuravam a instituição, o HNR sofreu inúmeras reestruturações em sua planta
física e organização. Segundo Finckler (1998), grande parte dessas mudanças foi
ocorrendo de forma não planejada, respondendo às necessidades, exigências e
desafios colocados pela doença.
Na época do surgimento da aids na instituição, o atendimento ambulatorial e
internamento hospitalar eram realizados pela seguinte equipe de saúde: Doutor
Osvaldo Vitorino Oliveira; Doutor Antônio Fernando Barreto Miranda; Enfermeira
Maria Helena Bittencourt Westrupp; Enfermeira Betina Hörner Schlindwein Meirelles;
Psicóloga Marisa Salgado; Assistente Social Sônia Regina Botelho Galvão; e
Assistente Social Lurdes S. Tiago da Silva Sarda (MIRANDA, 2003).
Em maio de 2006, o HNR implantou o seu Núcleo Hospitalar de
Epidemiologia (NHE), que vem se instrumentalizando para atender as demandas de
ações de vigilância em âmbito hospitalar. Neste sentido, em 2007, o NHE publicou o
primeiro boletim com dados sobre o número de casos de aids na instituição, no
período compreendido entre julho e dezembro de 2006 (SANTA CATARINA, 2007).
Dos dados obtidos pelo NHE nesse período de tempo, verifica-se que do total
dos agravos notificados, houve um aumento no número de notificações perfazendo
uma média 47,8 notificações/mês, contra a média 9,95 notificações/mês registradas
anteriormente à implantação do HNE. O predomínio da aids sobre os outros agravos
é inegável, dentre os agravos de notificação compulsório, 44,64% pertencem à aids.
O HNR atende pessoas que vivem com Hiv de todo o Estado de Santa
Catarina, contudo a maioria dessas pessoas é proveniente da cidade de
Florianópolis, ocupando 47,2% dos casos de aids atendidos pela instituição, seguida
por São José (15,32%), Palhoça (8,06%) e Biguaçu (6,45%).
No que diz respeito à categoria de exposição, existe um predomínio da
transmissão por sexo (71,43%) e de usuários de drogas injetáveis (19,20%). Dos
71,43% referentes à transmissão por via sexual, 41,60% diz respeito a
heterossexuais com parceiros de risco indefinido. A maioria dos pacientes internados
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é do sexo masculino, sendo que a razão de sexo é de 1,97 homens que vivem com
HIV por cada mulher.
Independentemente da categoria de exposição, a maioria dos casos de aids
notificados encontra-se na faixa dos adultos masculinos entre os 30 e os 59 anos de
idade (faixa etária mais sexualmente ativa) e dos adultos femininos entre os 30 e os
49 anos de idade (SANTA CATARINA, 2007).
Como referido anteriormente, ao consultar a bibliografia existente sobre a
temática em foco neste trabalho, verifiquei que existem alguns estudos que já foram
realizados no HNR, e que procuraram avaliar os impactos da aids na instituição,
como os estudos desenvolvidos por Cunha (1997) e Finckler (1998). Pela
importância e relevância destes trabalhos, resumirei neste ponto as suas
contribuições.
No seu trabalho, Cunha (1997) procurou identificar os impactos da aids nas
relações sociais dos profissionais de saúde que trabalham com as pessoas que
vivem com HIV, dando enfoque ao estigma, sentimento de impotência e medo da
morte. A autora concluiu que esse impacto se deu nas relações entre profissionais
de saúde e paciente, nas relações entre profissionais de saúde com as pessoas que
vivem com HIV e outros profissionais de saúde e nas relações entre profissionais de
saúde, família e amigos.
Finckler (1998), ao analisar a influência da aids na organização do trabalho de
enfermagem na Unidade DST/aids (doenças sexualmente transmissíveis/aids) do
HNR, concluiu que o impacto ocorreu essencialmente na complexidade, na
centralização e na formalização da organização do trabalho de enfermagem.
Os profissionais que lidam diariamente com pessoas que vivem com HIV são
afetados pelo convívio com estas, o que gera mudanças interiores em relação aos
seus valores, princípios, crenças e formas de enfrentar a vida. A convivência com o
estigma, o preconceito, a dor, a doença e a morte na Unidade DST/aids é
considerada difícil para a maioria dos profissionais de saúde, e é carregada de forte
conteúdo emocional, pois interfere nas suas vidas, causando sentimentos de
frustração, tristeza e desequilíbrio (CUNHA, 1997; FINCKLER, 1998).
Posto isto, constato que a aids exerceu e continua exercendo grande
influência na vida e no trabalho dos profissionais de saúde, mais concretamente, dos
profissionais de enfermagem. Segundo Cunha (1997), a aids, com todo seu
conteúdo social e econômico, trouxe consigo a necessidade de uma nova postura do
profissional de saúde. Desta forma, a equipe de enfermagem, que é quem mais
sofre as influências e os impactos que advêm do constante contato com a doença,
vive diante da necessidade de enfrentar os seus próprios limites e os problemas que
carregam consigo.
No documento
Memórias dos profissionais de enfermagem do Hospital Nereu Ramos em época de aids (1986 - 1996)
(páginas 38-42)