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PARTE I: REPOSICIONAMENTO TEÓRICO-PRÁTICO

1. A CORREÇÃO SOCIALISTA DA SOCIOLOGIA

1.3 A ANÁLISE ESTRUTURAL-HISTÓRICA E A HISTÓRIA EM PROCESSO

Se tomarmos a concepção florestaniana de revolução burguesa temos uma ideia de como o autor compreende o que denomina conceitos estruturais; uma vez que, para Florestan, “o conceito de revolução burguesa não é um conceito particular, ele é um conceito estrutural (ou, como se diria em sentido marxista: uma categoria histórica), que tem de ser aplicado de forma mais ou menos generalizada”.103 Ou seja, um conceito estrutural é uma categoria histórica nos moldes marxistas, como o modo de produção capitalista, segundo o próprio Florestan exemplifica. Tais conceitos estão intrinsecamente relacionados com o desenrolar histórico, mas, analiticamente, história e estrutura são consideradas de forma diversa como fica claro ao acompanharmos sua análise do caso cubano.

Para nosso corte interpretativo, o que se impõe em primeiro plano é a peculiaridade de Cuba (uma peculiaridade que tem duas faces, uma histórica e outra estrutural; a histórica “não se repete” fora de Cuba, mas a outra é universal entre os países da América Latina que permaneceram na situação neocolonial até meados do século 20, dotados ou não de um Estado Nacional).104

Da mesma forma, em suas análises sobre o Brasil, o sociólogo paulista pauta-se pela articulação entre estas duas faces da realidade social: a face particular (ou histórica) e a face universal (ou estrutural). Para ele as faces possuem “dinâmicas”105 distintas, mas correlacionadas: na face histórica se concentram principalmente os fatores “mais dinâmicos”

103 Ibid., p. 99. Grifos do autor.

104 FERNANDES, Florestan. Da guerrilha ao socialismo: a revolução cubana. São Paulo: Expressão Popular, 2007, p. 40.

Grifos nossoss.

105 Para Gabriel Cohn: “A referência à dinâmica (que também é imensamente importante por si mesma, e aparece ao longo da

obra [A Revolução Burguesa no Brasil] em contraste com a dimensão ‘estrutural’) pode ser entendida como designando a presença, ou o desencadeamento, de uma força; o que, em termos sociológicos, se traduz por uma conduta social

compartilhada, dotada de intenção e objetivo próprio segundo a percepção mais ou menos inteligente que seus agentes (vale dizer, figuras capazes de definir opções) têm da sua situação e dos seus objetivos”. COHN, Gabriel. Florestan Fernandes – A revolução burguesa no Brasil. In: MOTA, Lourenço Dantas (Org.) Op. Cit., p. 401.

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– sendo da essência destes fatores serem mais flexíveis que os fatores de estrutura. O que não significa que, para Florestan, a face estrutural não seja também histórica, ela é necessariamente um produto histórico:

Sem dúvida, as alterações estruturais também são história (história em profundidade e de longa duração); e as transformações históricas, quando afetam o comportamento coletivo e o “destino” de uma sociedade nacional, também são estruturais (as estruturas em emergência e em formação, que, no caso cubano, revelam uma guinada por causa da “revolução na revolução”: o salto do capitalismo ao socialismo). 106

Junto a estas caracterizações de história e estrutura, observamos também a utilização da expressão “longa duração” e, muitas vezes, como no caso acima, relacionando-a a ideia de profundidade histórica e a elementos estruturais. Esta forma de utilização aparenta-se, em um primeiro momento, a concepção muito conhecida do historiador francês Fernand Braudel,107 que se vale em sua teoria da história tanto do conceito de estrutura como o de longa duração e de história em profundidade.108

No entanto, na concepção de Florestan é, justamente por ser histórica, que a face estrutural é passível de mudanças que são influenciadas pelas “tormentas” que se dão em nível histórico, se adaptando “ao presente e ao futuro (isto é, se atualizam em sentido geral, e se historicizam, em sentido particular)”. Em contrapartida, os elementos estruturais podem determinar, com menor ou maior influência, a face mais dinâmica do processo histórico global:

Se certos condicionamentos estruturais se repetem no plano dinâmico, isso significa que as mesmas forças sociais, empenhadas na “conservação da ordem”, também controlam os processos de funcionamento, que implicam mudança social gradual, e os

106 FERNANDES, Florestan. Da guerrilha ao socialismo: a revolução cubana. São Paulo: Expressão Popular, 2007,

pp. 97-98.

107 Fernand Braudel é um dos mais importantes historiadores da Escola do Annales e que nos anos 30 colabora na

organização da Universidade de São Paulo. Florestan, em 1964, chega a citar uma influência de Braudel, mas de forma muito genérica em uma carta para Bárbara Freitag onde escreve: “A respeito das influências intelectuais, é preciso não esquecer que em São Paulo houve uma tríplice influência nas ciências sociais (pelos professores que lecionavam aqui): Roger Bastide, Levi

Strauss, Arbousse Bastide, Monbeig, Braudel, Gurvitch, Hugon, Maugué, e tantos outros, acentuaram a influência francesa na sociologia, na política, na economia e na filosofia”. FREITAG, Bárbara. Florestan por ele mesmo. Estudos Avançados -

IEA-USP, São Paulo, n. 26, 1996, p. 137.

108 Para Braudel esta longa duração trata-se de uma “articulação, arquitetura, porém mais ainda uma realidade que o tempo

utiliza mal e veicula mui longamente”. Estas estruturas são também sustentáculos e obstáculos para os indivíduos e suas experiências. Como, por exemplo, a coerção geográfica ou “quadros mentais” que persistente por um longo período histórico: “certas estruturas, por viverem muito tempo, tornam-se elementos estáveis de uma infinidade de gerações: atravancam a história, incomodam-na, portanto, comandam-lhe o escoamento. Outras estão mais prontas à se esfarelar”. Ou ainda: “É em relação a essas extensões de histórica lenta que a totalidade da história pode se pensar, como a partir de uma infra-estrutura. Todas as faixas, todos os milhares de estouros do tempo da história se compreendem a partir dessa profundidade, dessa semi- imobilidade; tudo gravita em torno dela”. BRAUDEL, Fernand. Escritos sobre história. São Paulo: Perspectiva, 2009, p. 49 e p. 53.

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processos de inovação, diferenciação e estratificação, que implicam mudança social evolutiva.109

Ou seja, a interpretação de Florestan mantém apenas uma relação semântica com a concepção de Braudel – principalmente na imagem de “longa duração” – já que apesar de utilizar termos iguais aos do historiador, não toma vários outros elementos centrais de sua teoria histórica e mesmo no que diz respeito aos termos equivalentes, como a “longa duração” e “história em profundidade”, não há um tratamento idêntico em ambos os autores.110

As estruturas de longa duração, em Braudel, atravessam vários séculos – e mesmo milênios –, enquanto que Florestan chega a afirmar que “ao contrário do primeiro mundo, na periferia (no terceiro e quarto mundos), os processos envolvidos são de longa duração, seculares ou semiseculares”.111 Mas este não é o ponto que mais afasta a posição dos dois autores. O historiador francês engessa a atividade humana; em sua teoria, “o homem perdeu todo o domínio sobre a sua própria historicidade”112 e, neste sentido, lutar por uma revolução, por exemplo, torna-se uma atividade de “delinqüência assassina”. Para ele, os processos revolucionários vividos historicamente abalaram apenas a superfície histórica, enquanto a sociedade e o poder permaneceram intactos.113

De fato, a concentração de poder na concepção de Florestan também atravessa as várias eras históricas do Brasil com uma estrutura profunda de longa duração; mas em momento algum, esta estrutura torna-se um elemento intransponível pela atividade humana, pelo contrário, é acessível à luta que se desenvolve de forma mais epidêmica na história em processo. Florestan compartilha menos ainda da ideia de que “as sociedades só são válidas quando são dirigidas por uma elite”,114 posição impensável em qualquer momento da obra florestaniana.

Em alguns momentos Florestan contrapõe a história de longa duração a uma história de conjuntura ou de superfície; mas estas duas dimensões mantêm, em seu pensamento, um diálogo constante, em que os elementos estruturais refletem e reproduzem a ordem estabelecida – o que os torna, de fato, menos maleáveis, adquirindo uma rigidez que por vezes

109 FERNANDES, Florestan. Classes sociais na América Latina (1971). In: Ib., Capitalismo dependente e classes sociais na América latina. Rio de Janeiro: Zahar, 1973, pp. 76-77.

110 Vale lembrarmos que Braudel desenvolveu sua teoria histórica meio a um debate com a sociologia, que ganhava, pós

Segunda Guerra, grande expressividade e ao mesmo tempo ofuscava a história. A duração braudeliana visava “recuperar a globalidade dos fenômenos humanos” condicionando todas as ciências sociais e conferindo um papel central à história. DOSSE, François. História em migalhas: dos Annales à Nova história. Bauru: Edusc, 2003, p. 166.

111 FERNANDES, Florestan. Missão Impossível (1990). In: Ib., Brasil: em compasso de espera. São Paulo: Hucitec, 1980,

p. 64.

112 “‘o que eu faço, é contra a liberdade humana’, afirma Fernand Braudel. O homem nada pode contra as forças seculares

que o condicionam e contra os ciclos econômicos da longa duração”. DOSSE, François. Op. Cit., p. 176.

113 Ibid., pp. 180-181.

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nos lembra o posicionamento de Braudel –, enquanto os elementos históricos refletem a luta de classes in flux:

É doloroso – mas é sabido – que as personagens guindadas a certos papéis históricos, tenham ou não imaginação para desempenhá-los e sejam ou não personalidades históricas, não desfrutam da liberdade de realizar o que querem. A História de longa duração não consulta a sua vontade. A História de conjuntura e de superfície só nas aparências parece levar em conta os seus alvos e objetivos. Por isso, é tão difícil ser um Cesar, um Napoleão, um Bismarck, um Lincoln ou um Getúlio Vargas, estadistas que entendem as limitações do seu espaço e buscam o esteio de grupos de personagens, de grandes massas humanas e de processos históricos que conferem realidade às políticas que precisam ser postas em prática. Eles fazem menos História do que gostariam, mas não a atrapalham e, por sua intuição, capacidade imaginativa e vontade de poder, por vezes a ajudam e se tornam instrumentais para as transformações que mudam a face e a organização das nações ou do mundo.115

Mas, apesar desta rigidez das estruturas, há uma constatação recorrente de que o resultado da luta de classes, em fluxo, tanto influencia a reorganização estrutural, como, por sua vez, a organização estrutural influencia a própria luta, fazendo com que nesta dinâmica da luta de classes estejam presentes tanto elementos estruturais, quanto elementos históricos, o que torna as classes e a luta de classes um importante referencial analítico em sua concepção.

A classe não é um pé-de-chumbo; ela é o elemento central, que condiciona e regula o vigor do movimento e do partido. É por isso que as pessoas que partem da reflexão localizando-se no partido não possuem um ponto de referência correto. Porque elas perdem o elemento estrutural e histórico, que serve de baliza para que se entenda não só o presente mas o fluir desse presente na direção do futuro. Os processos se abrem para a frente, não para trás. Para trás está alguma coisa que nós pretendemos morta, que nós queremos destruída.116

Para além de um referencial analítico, a luta de classes surge como ponto fundamental para o analista que visa não apenas resgatar elementos estruturais e históricos que expliquem a realidade social, ela também traz a consciência de como intervir no processo de mudança social. Assim, junto às estruturas, com seus fluxos mais lentos, corre a história em processo que é passível de intervenção por ser

a história dos homens, o modo como eles produzem socialmente a sua vida, ligando-se ou opondo-se uns aos outros, de acordo com sua posição nas relações de produção, na sociedade e no Estado, e gerando, assim, os eventos e processos históricos que evidenciam

115 FERNANDES, Florestan. Nem ditador nem Kerensky (1987). In: Ib., A constituição Inacabada: Vias Históricas e

Significado Político. São Paulo: Estação Liberdade, 1989, p. 37.

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como a produção, a sociedade e o Estado se preservam ou se alteram ao longo do tempo.117

Florestan distingue também dois momentos dentro do que passou a chamar de história em processo. Por um lado, temos a história em processo em um momento distante, da qual se resgatam acontecimentos de um momento já passado; e, por outro, temos a história do presente in flux (ou história em processo aberto para o futuro). Ambas são passíveis de análise e interpretação e é justamente a segunda que deve coordenar o direcionamento analítico do pesquisador, já que o resgate histórico dentro do marxismo visa à transformação da organização social. Destarte, o papel do pesquisador permite compreender melhor tais processos históricos em suas oscilações no plano das estruturas, instituições, funções sociais e dinamismos, porém, “o sociólogo fica preso ao fluxo do presente e não encontra na sociologia uma fonte de engajamento nas práticas diretas das classes prejudicadas”:

Aí, cabe ao militante socialista e comunista ir mais longe. Recorrer à ótica proletária, mesmo que ela ainda esteja adaptando-se a uma abertura de foco máxima, e olhar a partir dela as exigências do presente. Compreender (e ajudar os operários a compreender) que luta de classes é violência recíproca e que as classes trabalhadoras só podem liberar-se, em qualquer sentido e em qualquer direção, através do emprego maduro de sua capacidade política de usar construtivamente a violência revolucionária.118

Em suma, cabe ao pesquisador, em sua dupla condição, compreender a história in flux, através de uma leitura que fuja de uma “visão mecanicista da ‘evolução do socialismo’ e das ‘lutas sociais’”, já que “o condicionamento estrutural e os ritmos históricos exigem que se abra o quadro, para apanhar o concreto como ‘síntese de muitas determinações, isto é, unidade do diverso’”.119

É no nível do processo histórico – ou seja, particular – que o pesquisador e o militante devem identificar as saídas para uma perspectiva de superação da sociedade de classes, que cumpram funções próximas as que a guerrilha cumpriu em Cuba: que levou “a história ao plano das estruturas e, inversamente, elevou as estruturas ao plano da história (ou seja, acelerou a desagregação da velha ordem social e permitiu a rápida acumulação de condições favoráveis a construção da nova ordem social)”.120

Parece-nos aqui conveniente apontarmos algumas possíveis influências do conceito de estrutura em Florestan, isto devido à própria ambigüidade que o termo ganha em várias vertentes e mesmo na polarização do pensamento florestaniano.

117 Ib., (org.) Marx/Engels: história. São Paulo: Ática, 1983, p. 47. Grifos do autor. 118 Ib., A ditadura em questão. São Paulo: T. A. Queiroz, 1982, p. 162.

119 FERNANDES, Florestan. Apontamentos sobre a “teoria do autoritarismo”. São Paulo: Hucitec, 1979, p. 72. Grifos do

autor.

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A primeira nos é apresentada por Antonio Candido dentro de uma concepção global de método em Florestan. Segundo o autor de Os Parceiros do Rio Bonito a questão da estrutura em Florestan está ligada a procedimentos de cunho funcionalista. Assim pontua Candido:

Primeiro, a clarividência e a coragem com que Florestan define a sua posição metodológica, mostrando a diferença de requisitos entre a análise sincrônica e a análise diacrônica, para desta forma demonstrar a legitimidade dos procedimentos de cunho funcionalista, desde que associados ao senso dinâmico da estrutura (conceito cuja descoberta, através de Radcliffe-Brown, foi um dos impactos em nossa geração). Ao mesmo tempo, mostra o papel e os limites do método dialético, que se recusa a encarar como panacéia ou pé-de-cabra.121

Esta análise de Candido prefacia uma longa entrevista de 1978 onde Florestan apresenta, entre outras, as análises que realizou em seu período de formação – ou seja, de seu mestrado (A Organização Social dos Tupinambá; defendida em 1947) e doutorado (A Função Social da Guerra na sociedade Tupinambá de 1952) – e na qual responde a uma questão que lhe foi feita sobre a relação entre a análise funcionalista e a análise dialética.

Como vemos na entrevista, Florestan compatibiliza ambos os métodos, lançando mãos, para tanto, de uma diferenciação do foco de cada análise: especificando se o que está em análise envolve relações diacrônicas ou sincrônicas.

[...] hoje se condena de maneira preconceituosa e dogmática toda espécie de análise funcional. Todavia, eu duvido que alguém possa tratar as relações sincrônicas de uma perspectiva dialética. Ou falsifica a dialética, ou falsifica as relações sincrônicas. Não há talento que resista a essa prova. Ou, então, a análise dialética não é uma tentativa de explicar a transformação da sociedade; é uma tentativa de mistificar.122

O interesse de Florestan ao tratar dos Tupinambá, por exemplo, não era o de analisar as transformações da sociedade, mas sim “tentava descobrir como a sociedade tupi recuperava o passado de maneira incessante” realizando uma reprodução estática da ordem:

A história projeta o homem em um passado que se faz presente ou um presente que recupera o passado – não existe a negação do passado pelo futuro mediante um presente que coloca o homem em tensão com a sua época. Em conseqüência, a tradição fornece, objetivamente, o padrão pelo qual se avalia a inovação.123

Segundo o sociólogo, as análises desenvolvidas em seu mestrado e doutorado tiveram uma importância principalmente para a sua formação e apenas como produto do acaso para a sociologia no Brasil, pois se tornaram “um marco nas investigações das sociedades primitivas

121 CANDIDO, Antonio apud FERNANDES, Florestan. A condição de sociólogo. São Paulo: Hucitec, 1978, p. XII. 122 FERNANDES, Florestan. A condição de sociólogo. São Paulo: Hucitec, 1978, p. 87.

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no Brasil”, justamente “no momento em que Radcliffe-Brown condenava a reconstrução histórica como técnica de observação, análise e interpretação, e no qual pretendíamos construir uma antropologia social rigorosa”.124 Por tanto, Radcliffe-Brown acabava por se opor aos trabalhos realizados por Florestan que recuperava historicamente a sociedade Tupinambá:

Penso que mostrei que se pode explorar a reconstrução histórica com o mesmo rigor que a pesquisa de campo e que demonstrei que éramos capazes de estudar as sociedades tribais, por nossa conta e com os nossos meios, segundo os requisitos descritivos e interpretativos da ciência moderna. [...] Contudo, nem a investigação nem os seus resultados, como eles aparecem nos dois livros [mestrado e doutorado], devem ficar sujeitos às oscilações da moda, às implicações da substituição da análise estrutural-funcional por não sei que tipo de “estruturalismo”.125

Florestan diferencia sua análise estrutural-funcional em relação ao funcionalismo da sociologia sistemática: “trata-se da análise estrutural-funcional que pode ser – e deve ser – explorada pela sociologia descritiva, pela sociologia comparada e pela sociologia diferencial”. É dizer, a análise estrutural-funcional é a análise adequada para estas vertentes da sociologia descritiva, comparada e diferencial, pois as conexões procuradas neste tipo de análise não são conexões que exijam a análise dialética:

Ou a gente falsifica a análise dialética, no sentido vulgar da palavra falsificar – para converter a análise dialética em uma espécie de cafiaspirina – ou então a gente procura a especificidade da análise dialética, descobrindo que a análise dialética só é válida para determinados tipos de problemas e, principalmente, para os problemas que aparecem nos povos que têm um determinado tipo de história, a qual nasce da estrutura antagônica do modo de produção e de organização estratificada da sociedade, e se caracteriza pelo fato do presente negar o passado, como um elo com um futuro que não repete as “estruturas existentes”, porque no processo de se objetivarem e se reproduzirem elas se transformam. 126

De forma que a análise dialética é “compatível com os problemas que surgem dentro do campo da sociologia diferencial ou histórica” e a “a análise funcional aparece mais ao nível dos problemas com que se defronta o sociólogo na sociologia descritiva e na sociologia comparada”; na análise diferencial ou histórica o pesquisador, “opera com uniformidades de seqüência”, buscando explicar “a transformação de estruturas dentro do tempo histórico contínuo”, enquanto, na análise estrutural-funcional “quando envolve um modelo lógico completo, opera só com uniformidades de coexistência”:

124 Ibid., pp. 88-89. 125 Ibid., p. 89.

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Portanto, ela toma correlações em lapsos de tempo muito curtos e, às vezes, até no tempo físico e psicológico de duração dos contatos e das interações entre pessoas ou grupos e do funcionamento das instituições. De outro lado, quando ela é aplicada na sociologia comparada, com freqüência, o que interessa, teoricamente, ao investigador é a persistência das causas; o que se busca saber é se certas estruturas se mantêm e se repetem ou se as mesmas causas se mantêm presentes. Nesse caso, a análise funcional procura descobrir e explicar como se processa a persistência das causas.127 Ao comparar a análise estrutural-funcional que praticou nos trabalhos sobre os Tupinambá com a análise dialética que, segundo ele, Marx praticou, o autor acaba por compatibilizá-las – ao ponto de entender que o próprio Marx e outros autores marxistas como