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A arte, fundamental para a sobrevivência humana

2 CAPÍTULO 1 Por que pensar a educação desde a comunicação mediada pela Teoria

2.3 A arte, fundamental para a sobrevivência humana

Todas as artes contribuem para a maior de todas as artes: A arte de viver.

Bertold Brecht

Ao estudar a teoria do corpomídia, pode-se refletir sobre o corpo como espaço político e como espaço de disputa política. Conforme apontam Greiner e Katz, o corpo é o lugar por onde tudo passa, não existe uma hierarquia de dentro para fora, nem de fora para dentro, e o que acontece entre corpo e ambiente é uma rede sem centro. Neste caso, pode-se entender que tudo acontece ao mesmo tempo, disputas, ganhos e perdas, que nada conquista a plenitude, tudo gerado no trânsito do ―entre‖ o corpo e ambiente. Portanto, apesar das aparentes conquistas do poder soberano sobre o corpo do homem simples, têm-se também, mas pouco reveladas, as conquistas do popular sobre o soberano. O que aponta que, mesmo com tantos dispositivos de controle impostos pelo poder da hegemonia comunicacional, existe espaço de inserção de ações que desativam dispositivos que alimentam o pensamento único como orientador da ordenação da vida sociocultural no ocidente.

Um espaço de intervenção aliado da educação escolar é a arte, pois esta atua no ―entre‖, na ―crise‖, na ―disputa‖. Por terem em sua base a relação com o caos e com o imaginário responsável pela ordenação da subjetividade no mundo, algumas formas de arte têm sido consideradas espaços democráticos na relação corpo e ambiente. Como apontam os estudos das autoras:

No caso da experiência artística, haveria ainda uma ativação do sistema límbico [responsável pela emoção], o centro da vida [...], a atividade estética representaria, em nosso processo evolutivo, uma ignição para a vida. Uma espécie de atualização de um estado corporal sempre latente e fundamentalmente necessário para a nossa sobrevivência. (GREINER, 2005, p. 111).

Para o autor Jorge de Albuquerque Vieira (2006), alguns filósofos propõem que existem limites na capacidade corpórea de colocar em forma discursiva certos conhecimentos e que, sob a forma de conhecimento tácito, existem desde aspectos perceptuais até processos inconscientes e julgamentos de questões de valores. O conhecimento intuitivo possui, portanto, sua dimensão tácita.

Tanto as autoras Greiner e Katz como Vieira validam a frase em epígrafe de Brecht (1898-1956) e fundamentam este estudo, que entende que a arte é uma desativadora de dispositivo de poder e construtora de conhecimento. Neste caso, áreas artísticas são de suma

importância na vida escolar para a construção do corpo mídia de si mesmo, pautado na ética e na alteridade pertinente à democracia participativa e humanizadora.

A arte, ao atuar com o desejo de significar, atua também como circuitos de ativação. O desejo de significar, segundo Martín-Barbero (2009), surge num momento de mudança de estrutura social. O universo da indústria possibilitou a integração do homem no fazer artístico, ou seja, este não só como espectador, mas também como autor. Neste processo, o conceito de beleza na obra de arte é substituído pelo desejo de significar. As classes populares passam a expressar seus desejos e a questionar o conceito de arte acabada que exclui o popular da cultura. Portanto, a transformação da beleza em desejo de significar marca um momento político em que a arte se encontra diante da disputa de poder entre classes. Mas o que representa este desejo de significar no corpo?

Greiner explica que, para o estudioso Mark Johnson (1999), pouco se sabe sobre o que seja um significado, mas o que se pode afirmar é que ele é sempre corporal. Este emerge da experiência corporal referente a novos pensamentos e sentimentos.

A autora entende que, quando Johnson desloca a estética para o ponto central do significado do homem, sustenta dois aspectos importantes para esta discussão. Um é que a estética não pode ser entendida simplesmente como uma teoria da arte, pois esta precisa ser vista de maneira mais ampla, como uma relevante possibilidade de se estudar como o homem cria e experiencia significados. O outro ponto é que, pelo fato de a arte utilizar o mesmo processo que a definição linguística utiliza para incorporar seus significados, não necessariamente precisa estar subordinada a ele. Portanto, a arte tem autonomia para construir conhecimento sobre o desejo de significar do ser humano.

O desejo de significar surge das crises (quando o corpo percebe que seu conhecimento prévio não dá conta de resolver o problema em questão), que são estabelecidas quando acontece a negociação de uma ideia que chega com a que já está no corpo, e a sua reorganização emerge da percepção que atua direto no conhecimento prévio, ou seja, atua direto na memória no corpo.

Pode-se entender que a arte, por meio de contaminação que acontece na relação corpo e objeto (mundo), passa a ser uma forma de cortar caminho para a intervenção na negociação das ideias que chegam com as ideias já existentes no corpo. Possibilita que cada corpo se organize, diante do seu conhecimento prévio (subjetividade) e do conhecimento novo (ambiente), pela percepção, sensação (conhecimento tácito). Este processo dificulta que o pensamento único atue no resultado, e fortalece o conjunto (composto pelo diálogo presencial

– corpo a corpo) de ajustes destas informações com a necessidade do ―aqui‖ e do ―agora‖ do corpo, tanto consigo mesmo como em sua relação em grupo.

A arte possibilita que o cognitivo seja validado no momento da construção do conhecimento coletivo e, desta forma, faz com que as relações sejam mais amigáveis e confiáveis, criando um ambiente muito mais de pertencimento para os envolvidos. E, assim, totalmente de forma política, abre espaço para um respiro e para que os corpos possam exercitar o processo de alteridade. Este exercício estimulado pela percepção, pela sensação, dialoga com a empatia, sentimentos. Estes diálogos são mediados pelo somatossensitivo, e juntos constroem as imagens internas que dão vida à imaginação. Portanto, a imaginação é o motor de engate para a desarticulação dos dispositivos hegemônicos que tendem a coordenar a ordenação da vida sociocultural da sociedade em movimento.

Arte, assim como a educação, é uma ação política no corpo e do corpo e, por isto, tanto uma como a outra são tão desvalorizadas nos regimes autoritários. Pois, como disse Antonin Artaud14 (1896-1948), ator francês do século passado: ―O homem é o instrumento mais perfeito que existe para a prática da arte. E esse instrumento é composto de um sopro e uma coluna vertebral. Você o projeta no espaço e ele recria a vida.‖.

14 Antonin Artaud. Dados bibliográficos disponíveis em: <http://www.imdb.com/name/nm0037625/>. Acesso

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