• Nenhum resultado encontrado

2.2 SOBRE DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

2.2.5 A assimilação tecnológica

Mas aonde nos levaria um processo de crescimento econômico que derivava seu dinamismo da reprodução indiscriminada de padrões de consumo imitados de sociedades que se beneficiam de níveis de produtividade e renda muitas vezes superiores aos nossos? (FURTADO, 1984, p. 29).

Em países subdesenvolvidos os empresários buscam seguir os padrões tecnológicos dos países mais avançados e que são exportadores de equipamentos ou de licenças para produzi- los. A indústria de bens de capital demonstrou ser um campo propício para a inovação. O rápido progresso tecnológico no setor de produção de bens de consumo e na agricultura gerou mudanças estruturais que levaram a absorção da mão-de-obra, ao mesmo tempo que elevaram o ritmo de acumulação. Assim, o progresso tecnológico constituiu não somente o fator básico do crescimento econômico, mas instrumento para a preservação do poder (FURTADO, 1978). A indústrialização é resultado da capacidade inventiva da técnica para abrir os caminhos à acumulação, o que explica a expansão da civilização. Porém, a expansão negligenciou as formações sociais: das malformações indústriais emergiu o subdesenvolvimento. Em relação aos problemas de desenvolvimento dos países de terceiro mundo, os latino-americanos estão em situação particular, pois, os países subdesenvolvidos asiático e africanos conquistaram autonomia política e são marcados por presentes lutas revolucionárias, enquanto os latino- americanos têm a consciência de que a autodeterminação para enfrentar os problemas do

subdesenvolvimento restringe-se aos imperativos de segurança dos Estados Unidos (FURTADO, 1974).

A orientação do desenvolvimento tecnológico é resultado de um processo histórico particular e desempenhou papel fundamental na preservação de certo esquema de poder das minorias dominantes nos países de desenvolvimento tecnológico endógeno. Para os países em que o desenvolvimento é um fator exógeno, a simples assimilação tecnológica engedra problemas de ampla repercussão. Ter acesso a tecnologias já testadas pode constituir vantagens, porém não se pode desconsiderar o caráter especifico que um processo de desenvolvimento carrega consigo (FURTADO, 1978).

Os países periféricos, que não passaram pelo processo de criação técnica endógena, ao ter acesso a produtos finais que são correspondentes a necessidades históricas de outras culturas, tornaram-se tecnologicamente dependentes. Assim, com a substituição da importação de produtos primários por produtos finais, os países periféricos ficam presos aos hábitos de consumo dos países centro (FURTADO, 1998).

A simples assimilação tecnologia - que é fruto de um processo histórico específico dos atuais países desenvolvidos - foi o fator que fortaleceu a dependência dos países subdesenvolvidos em relação aos irradiadores de inovação (FURTADO, 1978).

Seria a dependência tecnológica simples decorrência do processo de aculturação das elites dominantes nas economias periféricas? É possível ter acesso à tecnologia moderna sem submeter-se ao processo de mundialização dos valores impostos pela dinâmica dos mercados? Pode-se evitar que o sistema de incitação, requerido para alcançar os padrões de eficiência próprios da técnica moderna, engendre crescentes desigualdades sociais nos países de baixo nível de acumulação? (FURTADO, 1998, p. 48).

Para Furtado (1995), o processo de desenvolvimento preocupa-se em dotar o homem de instrumentos que facilitem, ou ainda, potencializem a ação. É uma característica da civilização indústrial o desenvolvimento técnico para aumentar as possibilidade de acumulação. Porém, o processo de desenvolvimento técnico, a fim de acompanhar a evolução social, deve ser um processo endógeno, visto que a simples assimilação de uma tecnologia impede que a sociedade passe pela transformação necessária para que o aumento de produção, proporcionado pela tecnologia, não leve a indiscriminada concentração de renda.

As inovações tecnológicas, até o terceiro quartel do século XIX foram aplicadas com intensidade para a criação de novas formas de produção, o que provocou uma desorganização nas atividades indústriais existentes no período. As consequências eram sentidas em muitos planos: concentração da atividade econômica, formação da classe operária, concentração de riqueza e o poder de decidir sobre as atividades produtivas. A indústria de bens de capital

demonstrou ser um campo propício à inovação tecnológica e criou condições favoráveis à redução progressiva dos preços relativos à equipamentos e a aplicação desses à um número crescente de atividades produtivas (FURTADO, 1974).

O quadro histórico das rápidas propagações tecnológicas de novas formas de produção, vinda de específicos polos irradiadores de inovação, foram os responsáveis - junto com a criação do sistema econômico mundial - pela situação de subdesenvolvimento e a relação de dependência entre países periféricos e desenvolvidos (FURTADO, 1980).

O conceito de dependência tecnológica permite perceber os elementos que estão na base do problema da posição de subdesenvolvimento. A dependência tecnológica leva a não imposição de limite a assimilação de novas técnicas e padrões de consumo, que possuem sofisticação que não são naturais em determinadas sociedades (FURTADO, 1995).

No Brasil é comum a simples assimilação de técnicas e produtos de vanguarda vindas do exterior, principalmente dos Estados Unidos. Nesse processo acontece a aculturação das elites econômicas dominantes e a submissão da população aos valores impostos pela globalização e pela dinâmica de mercado (FURTADO, 1995).

A indústrialização brasileira tomou impulso durante o longo período de depressão dos mercados de produtos primários, em 1929. Esta indústrialização constituiu um caso exemplar do que posteriormente seria chamado de desenvolvimento impulsionado pela substituição de importações. No caso das relações entre Brasil e Estados Unidos, as ações comerciais do primeiro eram voltadas aos interesses com fim ao estimulo da exportação do setor primário e o segundo do setor terciário (FURTADO, 1974).

A modernização dependente, obtida pela substituição da importação, abriu espaço também para as operações de empresas transnacionais no país. Neste sentido Furtado (1998) afirma:

Não se deve perder de vista que a lógica das transações internacionais sempre operou em detrimento dos países de economia dependente. As extraordinárias taxas de crescimento que conheceu a economia brasileira nos quatro decênios compreendidos entre os anos de 1930 e 1970 refletiram especificamente um dinamismo fundado na expansão do mercado interno. Nunca é demais recordar que os preços reais dos produtos primários exportados pelos países de Terceiro Mundo apresentam historicamente tendência declinante (FURTADO, 1998, p. 41).

Quando as empresas transnacionais servem para a industrialização de uma economia subdesenvolvida, são utilizados técnicas e equipamentos que já foram amortizados nos países de origem. A importação de produtos tecnológicos de países desenvolvidos por países subdesenvolvidos, afirma Celso Furtado (1980), constitui uma fonte de conflitos, pois a assimilação do progresso tecnológicos por países dependentes caracteriza o avanço do

capitalismo nas nações indústrializadas. A importação de produtos tecnológicos constitui uma das causas básicas da expansão indústrial dos países desenvolvidos, enquanto os países subdesenvolvidos historicamente apenas assimilam a tecnologia.

Os recursos tecnológicos modernos, seja para produção, seja para comunicação, carregam consigo valores substantivos de sua origem. Com a globalização dos meios de comunicação, todos os povos passaram a ter acesso a cultura comum da humanidade. Porém, alguns países ocuparam o posicionamento passivo de simples consumidores, enquanto outros, se firmaram na posição de propagador cultural e aumentaram seu potencial econômico (FURTADO, 1984).

Quando novas técnicas são criadas, elas são facilmente assimiladas em contextos culturais distintos de sua origem, mesmo que tenham considerável impacto. A técnica apresenta um falso neutralismo, que oculta a dimensão do desenvolvimento e formação de valores substantivos. O desenvolvimento de uma técnica, quando endógeno em uma comunidade humana, tem a faculdade de ordenar o processo acumulativo em função de prioridades que são por ela definidas, ou seja, é um processo com vistas a responder às necessidades da sociedade que a criou (FURTADO,1984).

O modelo de desenvolvimento adotado pelas economias periféricas, para Furtado (1991), foi um equívoco, pois se realizou conforme o modelo de países que já encontravam-se em estágios avançados de desenvolvimento. A tecnologia disponível em países economicamente avançados responde às necessidades econômicas de elevados níveis de produtividade, então, os padrões de consumo que foram adotados correspondem a classes sociais com altos níveis de renda. A simples assimilação tecnológica, por parte dos países periféricos, tende a frear o desenvolvimento, pois não é fruto do progresso criativo com base nas necessidades sociais (FURTADO, 1991).

Abrir os mercados para ter acesso às tecnologias modernas foi uma medida necessária aos países periféricos, explica Furtado (1998). Contudo, as economias dependentes depararam- se com outro problema: como modular quadros que são antagônicos - o fortalecimento do mercado interno e abertura para o mercado externo. Esta reflexão leva à conclusão de que o problema de desenvolvimento é principalmente de natureza política.

O maior acesso a bens culturais melhora a qualidade de vida em uma sociedade, mas quando feita de maneira desordenada pode frustrar as formas de criatividade e descaracterizar a cultura de um povo. Uma política cultural que se limita a fomentar o consumo de bens culturais tende a impor barreiras à inovação (FURTADO, 1984).

Os ajustamentos estruturais e econômicos resultantes da ampliação das relações internacionais tornaram difíceis a preservação da identidade cultural e unidade política em um mundo dominado por grupos transnacionais que fundem seu poder no controle da tecnologia, informação e capital financeiro. Com a emergência da globalização e a integração política dos países, a autonomia dos estados nacionais foi reduzida e a atividade produtiva passou a ser planejada em escala planetária. Por consequência, nos países de economia dependente ocorreu o aumento do desemprego, exclusão social e intensificação da concentração de renda por todas as partes (FURTADO, 1998).

Refletir a respeito da dependência tecnológica, para Furtado (1998), permite melhorar a compreensão do subdesenvolvimento, pois leva a investigação de aspectos considerados importantes: o processo de mundialização imposto pela lógica dos mercados, que está na base da difusão da civilização indústrial; as necessidades tecnológicas que são frutos das economias centrais, que acentuam as tendências a limitar a criação de empregos por questões burocráticas (acordos de direitos e patentes); e as especificidades das formas sociais aptas a operar com as tecnologias, que limita24 aos sistemas de decisão e as possibilidade de recursos.