• Nenhum resultado encontrado

2.2 SOBRE DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

2.2.4 Os oligopólios

As grandes empresas com sua avançada tecnologia e elevada capitalização, ao penetrarem em uma economia subdesenvolvida, particularmente quando apoiada em muitos privilégios, tem efeitos semelhantes aos de certas árvores exóticas que são introduzidas em determinadas áreas: drenam toda a água e dessecam o terreno, provocando um desequilíbrio na flora e na fauna. Com efeito, a penetração indiscriminada em uma estrutura econômica frágil de grandes consórcios, os quais se caracterizam pela inflexibilidade administrativa e grande poder financeiro, tende a provocar desequilíbrios estruturais de difícil correção (FURTADO, 1978, pág. 41). As corporações surgem no século XVIII, nos países baixos e na Inglaterra, sob forma de concessão pública, beneficiada por algum privilégio (franchise). A existência de uma corporação, neste período, estava condicionada a um favor concedido pelo Estado. Em algumas situações o favor era de explorar como monopólio algum serviço público. Desta forma, as corporações em sua origem estão vinculadas ao Estado. Portanto, corporação, em sua origem, era expressão de um contrato entre o Estado e um grupo de pessoas com algum benefício concedido pelo poder público. Ainda que privadas, no sentido de que não são propriedades, nem operadas por agências do governo, as corporações também são públicas, no sentido de que suas ações estão relacionadas com o poder público. “É essa qualidade de ser pública que coloca a Corporation à parte da noção tradicional de empresa privada” (FURTADO, 1991, p. 88).

No Brasil, o senso de 1899 mostra que duas partes da atividade manufatureira provinham dos Estado Unidos de organizações do tipo Corporation neste período. Em 1919, 87% dos bens consumidos no país eram produzidos por sociedades anônimas e no final dos

anos 20 este número aumentou para 90%. Para Furtado, (1991) esse crescimento fundou-se nas exigências de novas tecnologias através da adaptação do gosto do consumidor.

As grandes sociedades anônimas norte americanas, afirma Furtado (1978), são poderosas burocracias privadas, que exercem funções públicas ou semi públicas, cuja integração na sociedade política dos Estados Unidos é indefinida. A grande sociedade anônima não deriva seu poder de ninguém, senão dela mesma: “é uma oligarquia que se auto perpetua” (FURTADO, 1978, pág. 40).

Com a expansão do sistema capitalista ao longo da história, ao adquirirem maturidade, as grandes corporações passaram a desenvolver regras que asseguraram para si certa coordenação nas decisões de mercados. “Esta evolução se fez inicialmente nos Estados Unidos, onde a grande riqueza de experiência permitiu explorar múltiplas possibilidades” (FURTADO, 1974, p. 26). Porém, o Estado norte americano - ao perceber a grande concentração de renda e o desequilíbrio de mercado, que eram resultado do domínio dos monopólios21 em certos segmentos, sancionou a Lei Antitruste, com a finalidade de tornar a concorrência mercadológica mais equilibrada.

Todavia, com o bloqueio dos monopólios (pela Lei Antitruste) desenvolveram-se formas de coordenação mais sutis, os oligopólios. O oligopólio foi o modelo adotado pelas grandes corporações para obter o controle de determinados segmentos do mercado: este modelo permite que um pequeno grupo de grandes empresas criem barreiras à entrada de outras em específicos setores e ainda administrem o conjunto de preços, conservando autonomia financeira, tecnológica e administrativa. Ao administrarem os preços, empresas inovadoras - seja em processos, seja na introdução de novos produtos - criam vantagens de mercado (FURTADO, 1974).

A Segunda Guerra Mundial foi um momento marcante na evolução do sistema capitalista, pois é o periodo em que os países subdesenvolvidos passaram por uma rápida indústrialização. Durante a Segunda Guerra, se acentuam as relações comerciais e sociais entre os países que formam o centro do sistema econômico. “Da formulação da Carta de Havana e criação do Gatt ao Kennedy Round, passando pela formação do Mercado Comum Europeu”, estes foram alguns dos passos para estruturar um espaço econômico unificado (FURTADO, 1974, p. 24).

21 Chama-se de concorrência monopolista às estruturas de mercado onde o poder se funda na introdução

permanente de novos modelos e na divisão dos consumidores. Neste tipo de mercado o custo de entrada de uma empresa é relativamente baixo, o que, via de regra ocorre na penetração de empresas transnacionais (FURTADO, 1984).

O movimento de capitais dentro de espaços unificados22 permitiu que grandes empresas participassem de subsistemas econômicos nacionais e também que as estruturas oligopolistas viessem a abranger o conjunto desses subsistemas. A década de 60 foi o período de coroamento do mercado internacional de capitais, onde as grandes empresas libertaram-se das limitações criadas pelas sistemas monetários e financeiros nacionais. Os empresários dos centros hegemônicos se sentiam livres para localizar suas atividades em vários pontos do mundo (FURTADO, 1974).

A forma oligopolista de coordenação de decisões, graças a sua enorme flexibilidade, pôde ser transplantada para o espaço semi-unificado que se está constituído no centro do sistema capitalista. Favorecido por todas as formas de inovação, o oligopólio constitui poderoso instrumento de expansão econômica. Graças à liberdade de ação de que vêm gozando as firmas oligopólicas, o comércio de produtos manufaturados entre os país cêntricos cresceu com extraordinária rapidez no correr dos últimos decênios. Por outro lado, a enorme capacidade financeira que essas firmas tendem a acumular leva-as a buscar a diversificação, dando origem ao conglomerado internacional, que é a forma mais avançada da empresa moderna (FURTADO, 1974, p.28).

Na tentativa de proteger as indústrias latino americanas, ainda na década de 60 foi assinado um tratado de livre comércio, para criar zonas comerciais entre as economias subdesenvolvidas. Porém, criar zonas de livre comércio entre países economicamente dependentes não proporciona resultados efetivos, tão pouco é duradouro, e ainda há o risco das atividades produtivas concentrem-se geograficamente em detrimento de outras (FURTADO, 1974).

Em 1960, os interesse econômicos e financeiros vinham operando no sentido de internacionalizar a economia norte-americana, através de grandes firmas que se estabeleciam no exterior - onde a mão de obra era mais barata e os mercados encontravam-se em rápida expansão. “A transnacionalização era vista, de preferência, como contribuindo para aumentar o poder econômico dos Estados Unidos, sendo pouco os que percebiam que em realidade esse poder se estava dissolvendo” (FURTADO, 1991, p. 123).

A orientação do progresso tecnológico imprimiu o caráter de oligopólio à indústria que se instalou no Brasil. Os mercados passaram a ser controlados por um pequeno número de empresas: essa estrutura estabeleceu o sistema de decisão econômica “chamado capitalismo concorrencial” (FURTADO, 1978, p. 42), que impõe às empresas continuidade em inovação de produtos e também condiciona o comportamento dos consumidores, diferente do que acontecia no capitalismo tradicional, onde a concorrência era por preços.

22 Espaços unificados, refere-se Furtado (1974), são as zonas de comércio originadas dos acordos de comércio

A medida que os oligopólios internacionais evoluem, são ampliadas as capacidades de controlar os preços e coordenar todas as formas de produção envolvidas e, até certo ponto, os produtos substitutos que concorrem no mercado. Os oligopólios expandem os conjuntos de ações verticais e horizontais e tendem a controlar atividades econômicas aparentemente desconectadas umas das outras (FURTADO, 1991).

“As grandes empresas enfeixam um considerável poder no plano social, pois controlam as formas de invenção mais poderosas, que são aquelas fundadas na técnica e no controle do aparelho de produção” (FURTADO, 1974, p. 61). Com a internacionalização, as grandes corporações conseguem fugir das ações corretivas do Estado e embora ocorram tensões de interesses entre a sociedade civil e o capital privado – tensões que podem provocar mudanças estruturais – o Estado, através de órgãos de poder coercitivo, tende a estabelecer o consenso entre a sociedade civil e as ambições das grandes corporações.

As empresas de produção em escala planejam com antecedência de meses, às vezes até anos, sua produção e a forma como irão se expandir. As vultosas quantidades de capital investido não permitem a flexibilidade da concorrência por preços, por isso, estas grandes indústrias acabam por controlar os preços23 dos produtos nos mercados em que estão inseridas. Furtado (1978) explica que a deliberação de preço é um problema ao desenvolvimento econômico dos países de terceiro mundo, pois coloca em questão a autonomia e coerência das decisões econômicas. Se poucas empresas estrangeiras, através de suas filiais, controlam a atividade econômica do país, qual a autonomia dos Centros nacionais? Afinal, as empresas estrangeiras estão inseridas em um sistema de poder em que prevalecem as deliberações das matrizes no país de origem (FURTADO, 1978).

Prevaleceram, na verdade, maior concentração geográfica das atividades indústriais em benefício dos países do Centro e uma repartição de renda mais igualitária nesses mesmos países – os quais comandavam a vanguarda tecnológica (FURTADO, 1998, p. 28).

Outro problema oriundo da expansão dos oligopólios é a perda de flexibilidade de atuação que ficam as empresas nacionais que, no fim das contas, perdem mercado e passam, parcialmente ou totalmente, ao o controle de alguma subsidiária. Quando o oligopólio cresce, seja horizontalmente - eliminando concorrentes, seja verticalmente - absorvendo fornecedores, necessariamente altera o mercado com o fim de reduzir os riscos (FURTADO, 1991)

23 Dada a situação errática cambial e monetária de muitos países periféricos, uma grande empresa que opera

internacionalmente pode preferir criar, ela mesma, os fluxos compensatórios, estabelecendo um sistema de preços interno que permita planejar suas atividades a longo prazo (FURTADO, 1974, p. 47).

Períodos da história em que acontecem concentração de poder favorecem as grandes empresas e a criação de tecnologias modernas estimulam essa concentração, porém, não se pode ignorar que foram forças políticas que moldaram os traços da economia. Colocar a competição internacional como objetivo estratégico é colocar o país em uma situação de dependência similar à época pré-indústrial. A globalização é um fenômeno financeiro com significativas projeções no sistema de produção, no qual as grandes empresas projetam sua localização e distribuição em escala mundial (FURTADO, 1998).

O progresso tecnológico e as modificações nas estruturas sociais são fatores diretamente ligados ao desenvolvimento e ao acúmulo monetário na sociedade capitalista. O progresso tecnológico remete ao avanço produtivo, modificações nas estruturas sociais e a expansão territorial. Esses aspectos levaram a mudanças no perfil do consumidor, favoreceu a indústrialização em escala global e maior acúmulo de capital (FURTADO, 1978).

A evolução da estrutura capitalista transformou as grandes empresas em importantes centros de tomadas de decisões, cuja capacidade de condicionar o comportamento das massas passa a ser um dos núcleos de atenção no planejamento, para que os preços estabelecidos sejam exercidos e os lucros e dividendos idealizados alcançados. Com o mercado baseado na livre concorrência e inovação de produtos, a massa consumidora passa a ser intoxicada por propagandas que determinam padrões de comportamentos favoráveis aos interesses das grandes indústrias dos países que são os centros hegemônicos, e eliminam, algumas vezes, qualquer resquício da cultura local (FURTADO, 1978).

Nos Estados Unidos a atividade indústrial é controlada por pequenos números de empresas multinacionais que apresentam contínuos investimentos em inovações tecnológicas, investimentos algumas vezes oriundos de capital privado e outras de capital público. Apesar da Lei Antitruste, a concentração de poder por um reduzido número de empresas multinacionais ainda pode ser caracterizado como monopolista. As grandes multinacionais controlam as formas de produção e, para ter maior segurança no planejamento de longo prazo, as fontes de matéria prima através de contratos, com clientes e fornecedores, que proporcionem condições de liderar o mercado (FURTADO, 1978).

Com o fortalecimento interno da economia dos países desenvolvidos e a expansão do mercado, a estrutura internacional evoluiu em grandes blocos de nações-sedes de empresas transnacionais, o que dificulta a preservação da cultura nacional e a unidade política dos países ocupados por estas organizações, pois, a lógica das empresas transnacionais é em detrimento dos países de economia dependente e fortalecimento econômico do país de origem. Contudo, mesmo com o aumento das disparidades econômicas e sociais, a grande maioria dos países

pobres que almejam a indústrialização tornam-se condicionados as migalhas do acesso “marginal ao mercado internacional como subcontratistas de empresas transnacionais” (FURTADO, 1998, p.42).

Onde as corporações coordenam a organização das atividades econômicas, a soberania do consumidor se diluiu, pois a produção organizada em grandes volumes de distribuição modifica as estruturas do mercado. São necessários planejamentos de longo prazo e a interferência (ou determinação) nas escolhas do consumidor. O princípio de maximização de lucros torna-se um aspecto de prioridade secundária, pois ocupar a posição de vanguarda do mercado, para as corporações, torna-se mais importante que as taxas anuais de lucros. “A autonomia do estamento gerencial na corporation é por todos reconhecida e tende a aumentar com a dispersão da propriedade” (FURTADO, 1991, p. 89).