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4. APRESENTAÇÃO E ANALISE DE DADOS

4.5 A DISTRIBUIÇÃO CINEMATOGRAFICA

4.5.3 A retomada do cinema brasileiro

O cinema brasileiro, depois de viver a maior crise de sua história no governo Collor, teve uma progressiva melhoria de desempenho a partir de 1995, ano em que se fizeram sentir os primeiros resultados da nova política de fomento indireto, com base na concessão de incentivos fiscais (MATTA, 2009).

A retomada pode ser considerada como um período de múltiplos aspectos do cinema brasileiro. Além da produção, houve a retomada no campo da distribuição, um setor historicamente dominado pelas grandes companhias norte-americanas. Surgiram às denominadas distribuidoras independentes: Rio Filmes, o Consórcio Severiano Ribeiro e Marcondes (CSR&M), Elimar/Copacabana, Paris, Lumière e a Pandora. Com projetos bem dimensionados, ocuparam posições e permanência em um mercado altamente competitivo. Merece destaque, em 1997, o início das atividades da Globo Filmes, cujo as operações pertencem a maior rede de televisão do país (SILVA, 2010).

O progresso da exibição de filmes nacionais deu-se de forma lenta e compulsória, através da Cota de Tela. Desde 2007 a Cota de Tela se restringe a 28 dias por ano para complexos com uma sala, aumentado um filme por sala adicional, sendo esse número significativamente inferior ao ano de 1980, onde a Cota de Tela era de 140 dias por ano (MELEIRO, 2010).

A Globo Filmes vem a alcançar uma posição de destaque entre as distribuidoras nacionais. Para Gatti (2005), esta posição é decorrente de várias razões: ter em suas produções atores de destaque na mídia; produções que são originariamente exibidas em TV aberta - no formato de minisséries; gestão e níveis de profissionalização bem superior à média das produtoras cinematográficas brasileiras tradicionais.

Na opinião de E12, se em um projeto de filme existe dinheiro, a melhor forma de atrair o público e colocar algum ator famoso. No caso das produções nacionais, E12 afirma que, quando possível, deve ser colocado algum ator da Globo. “Já fiz trabalhos alternativos e não

teve nenhum ator conhecido, então, não teve público. Infelizmente tem que ter alguém dos olhos das pessoas, para as pessoas quererem ver”.

A relevância da Globo Filmes ficou evidente no período de 2000 e 2003, quando percebeu-se que a empresa caminhava para uma fabricação de conteúdo em um ritmo que pode- se classificar como indústrial. Tal situação é resultado do fato de suas produções contarem com amplo esquema de divulgação - tanto para produções próprias como para coproduções - que envolve apoio do conglomerado global de comunicação, com diferentes veículos: revistas, rádios, televisão, jornais, internet, etc. (GATTI, 2005).

É identificado na atuação da Globo Filmes um forte esquema de distribuição associado às majors Columbia, Fox e Warner. Além das distribuidoras norte-americanas, a Globo Filmes, realiza ações em conjunto à Lumière, que pode ser considerada como uma major nacional.

Percebe-se o fato de que a união do poder de comunicação da TV Globo junto à distribuição praticada por aqueles agentes econômicos hegemônicos no mercado foi capaz de criar uma sinergia e que ela é a grande propulsora da condição privilegiada alcançada pelos filmes apoiados em tal esquema dito global (GATTI, 2005, p. 93).

No que tange a distribuição, existem dois fatores antagônicos presentes desde o início do processo: o primeiro é a presença do Estado no processo - representado pelo fim da Embrafilmes e o surgimento da Rio Filmes-; o segundo é de ordem externa, pois este foi um processo reorganizado no seio de empresas transnacionais, cujo os processos de fusão e incorporação aconteceram na década de 90. No Brasil, o reflexo das mudanças na distribuição podem ser vistos quando a Columbia Tri Star Buena Vista, passa a ser uma das principais empresas em atividade, cuja a liderança ficou dividida com outras duas majors (GATTI, 2005). A concentração do mercado em poucas distribuidoras levou a redução no lançamento de títulos. Para Gatti (2005), é prática comum da indústria cinematográfica hegemônica lançar cada vez menos títulos em um número maior de salas.

Devido às facilidades oferecidas pelo artigo 3° da Lei do Audiovisual que foram ampliadas na MP n° 2.288/01, as distribuidoras transnacionais ou as empresas aqui representantes destes interesses passaram a distribuir e a coproduzir filmes brasileiros com maior frequência junto às exibidoras de televisão por assinatura. O resultado dessa combinação de forças foi o fato que em 2003, o ano de melhor desempenho do mercado e do cinema brasileiro na retomada, as majors distribuíram cerca de 14 filmes, que representou 50% dos filmes lançados neste ano. “A ocupação do mercado local pelo filme aqui produzido encontra- se na mão das empresas estrangeiras. Esta é uma situação inédita na história da comercialização” (GATTI, 2005, p. 126).

A Riofilme é uma distribuidora importante em relação a aspectos quantitativos, pois se revelou como a empresa brasileira que mais títulos lançou entre os anos de 1992 e 2000. A empresa foi criada através da lei municipal n° 1.627/91, vinculada à secretaria Municipal de Cultura, Turismo e Esportes com o objetivo de estimular as atividades cinematográficas do município. Porém, o fato de a Rio Filme estar subordinada à secretaria da cultura reforça a ideia de que os produtos do cinema estão voltados apenas à cultura, ao invés de voltarem-se ao desenvolvimento econômico (GATTI, 2005).

Ainda na década de 90, algumas distribuidoras comercializavam o filme brasileiro de forma bastante esporádica, pois estavam mais voltadas a distribuição do filme importado no geral, a saber: Consórcio Severiano Ribeiro, Pandora, Paris, Lumière, Playarte, Art Filmes, entre outras. Dentre estas, a Lumière obteve projeções bastante superior às demais, principalmente em 1998, quando fechou um acordo com a companhia norte-americana Miramax. A partir desse momento a distribuidora passou a distribuir filmes de grande público, os blockbusters. Com o acordo entre Lumiére e Miramax, a distribuidora começa a disputar mercado junto as majors norte-americanas (GATTI, 2005).

O artigo 3º, segundo o site oficial da Ancine (2008), foi criado com o objetivo de estimular a associação entre cinema, televisão e produção independente no Brasil. Ele abre mais espaço para a veiculação de obras audiovisuais nacionais nas grades de programação brasileiras e também no exterior. O dispositivo foi introduzido na lei do Audiovisual pela lei nº 11.437 de 28 de dezembro de 2006 e regulamentado pelo Decreto nº6.304, de 12 de dezembro de 2007.

O artigo 3° autoriza empresas de TV´s abertas e programadoras de TV por assinatura, nacionais e internacionais a investirem parte dos impostos devidos sobre a remessa de recursos enviados ao exterior - derivados da aquisição dos direitos de transmissão - na coprodução de obras audiovisuais independentes. Também, o contribuinte estrangeiro pode investir até 70% dos impostos devidos no desenvolvimento de projetos de produção de obras cinematográficas: longa metragem brasileiro de produções independentes e na coprodução de curtas, médias e longas metragens de produção independente (ANCINE 2008).

Durante a retomada alguns filmes brasileiros são destaques nacionais e internacionais, no qual chama-se a atenção para “Cidade de Deus” e “Central do Brasil”. “Cidade de Deus” foi premiado pela Motion Picture of America e o Writers Guild of America, em 1999, no Concurso Anual de Roteiros Cinematográficos (GATTI, 2005).

“Central do Brasil” foi o filme que mais se sobressaiu em relação aos demais na retomada do cinema brasileiro. Esta produção foi distribuída pela Sony Pictures nos Estados Unidos, que investiu cerca de 1,5 milhão de dólares e levou 1,6 milhões de espectadores ao

cinema. Como resultado obteve em bilheteria US$ 6,5 milhões nos Estados Unidos, um fenômeno da cinematografia brasileira no exterior (GATTI, 2005).

Notada a dificuldade das produções nacionais em ocuparem as telas dos cinemas nacionais, quando distribuída por distribuidores independentes, foi apresentado no relatório final do 3° Congresso Brasileiro de Cinema (CBC), realizado em 2000, ações que o governo deveria ajustar para possibilitar o espaço do filme brasileiro nas telas. É descrito que os distribuidores independentes não possuem capital para fazer a comercialização das produções nacionais. Com a lei do Audiovisual foram investidos R$ 340 milhões em produção e apenas R$ 25 milhões na distribuição e é de responsabilidade do Estado garantir a isonomia competitiva dos mercados. Contudo, aumentar a isonomia competitiva não poderia ser através do aumento das taxas sobre o envio de royalties, porque feriria os acordos de comércio internacional do qual o Brasil é signatário (GATTI, 2005)

Na 3° CBC foi solicitado a criação de uma distribuidora no modelo da Riofilmes que, apesar da sua representatividade cultural, o desempenho econômico deixava muito a desejar. A deficiência da Riofilmes, segundo Gatti (2005), está centralizada na sua incapacidade de expandir os investimentos quando se trata de lançar filmes inéditos. Com efeito, tem-se a comercialização dos filmes realizados por empresas débeis e os títulos nacionais que podem vir a ter rentabilidade são jogados nos braços das distribuidoras hegemônicas. É demonstrado que os títulos nacionais mais rentáveis entre 1993-2003, foram distribuídos por um número limitado de empresas: Columbia (Sony), Warner, Fox, Lumière.

A Columbia, atual Sony Pictures, tem uma relação antiga com a distribuição de filmes brasileiros. Segundo Silva (2010), a distribuidora atua no Brasil desde 1950, graças a parcerias com as empresas Vera Cruz e Maristela.

No relatório da Ancine, segundo Giannasi (2008), é apresentado que, no ano de 2005, 110 filmes nacionais estavam prontos para exibição, mas apenas 30 foram lançados neste ano. Ou seja, 80 filmes nacionais ficaram sem exibição no ano que deveriam ser lançados.

A distribuição comercial de filmes no cinema durante a retomada mostra sua incapacidade histórica de promover os produtos cinematográficos brasileiros em níveis de verticalização que possam vir a ser considerados como satisfatórios. Com a efetiva desnacionalização da comercialização nacional e internacional dos filmes de maiores bilheterias, o cinema brasileiro se tornou uma espécie de subproduto rentável que os ocupantes do mercado vem se servindo sem a menor cerimônia (GATTI, 2005).

A utilidade do art. 3° mostra-se efetivo apenas a partir de 2003 quando a Globo Filmes e a Rede Globo engajam-se na produção, coprodução e/ou no patrocínio dos filmes (MATTA, 2009).

O fato observado é que as empresas estadunidenses se interessam pelo mercado brasileiro e tendem a se inserir a medida em que lhes são garantidos benefícios econômicos e/ou fiscais. A política praticada no país pelas empresas norte-americanas é relativamente diferente da média das ações aplicadas em outros países; isso deve-se, em grande parte, ao tamanho do mercado brasileiro, que encontra-se entre os dez maiores da MPA (GATTI, 2005). Segundo dados do Theatrical Market Statistics no ano de 2016, dos vinte mercados com maior faturamento da MPAA, o Brasil ainda ocupa a décima posição (MPAA, 2017).

A importância da distribuição comercial cinematográfica, consoante Gatti (2005) deve- se a sua posição estratégica e ideológica, considerando que a circulação efetiva das produções cinematográficas provocam transformações no núcleo da indústria e são através das distribuidoras que o filme chega ao público. Como já ocorrido em vários países, a indústria de filmes brasileiros tende a ser um apêndice do audiovisual internacional e ter os laços de dependência reforçados.