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CAPÍTULO 5 CAMINHOS PERCORRIDOS COMO PROFISSIONAL DO DIREITO E DA GEOGRAFIA

5.3 A ATUAÇÃO COMO PROFESSOR NO ENSINO SUPERIOR E PESQUISADOR

A atuação de Manuel Correia de Andrade no magistério superior e, como pesquisador ocorreu em 1952, a partir da sua nomeação como professor assistente do professor Gilberto Osório de Andrade, em disciplina da área da Geografia Física, na Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da então Universidade do Recife.

Na verdade, essa oportunidade que surgiu fez com que nos primeiros anos na Faculdade, ele viesse a trabalhar na mesma área em que o professor Gilberto Osório trabalhava, a Geografia Física. Contudo, a visão de geógrafo que Manuel Correia tinha e que se encontra presente em seus livros e artigos era a de que a Ciência Geográfica era uma só e, como tal não existia aquela dualidade tão discutida durante muito tempo na Geografia.

Andrade (1998b) afirmava em relação à dualidade Geografia Física e Geografia Humana:

Na verdade, esta dualidade – Geografia Física/ Geografia Humana – já se encontra ultrapassada, de vez que, em relação à produção do espaço geográfico, temos de estudar a ação do homem apropriando- se dos recursos existentes, de acordo com as estruturas econômicas, sociais e políticas como estão organizadas (ANDRADE, 1998b, p. 23).

Continuando esse raciocínio dizia ainda:

[...] Daí a influência do modo de produção e das formações econômicas e sociais dominantes no espaço e no tempo e concluirmos que existe apenas uma Geografia que é chamada de uma ou de outra maneira, conforme o enfoque que se dá à mesma nos estudos em realização Assim, quando se dá maior atenção às relações homem/meio e quando se analisa gêneros de vida faz-se Geografia Humana, mas quando se analisa a organização do espaço em função da apropriação dos recursos naturais e da transformação dos bens em mercadorias, em uma sociedade avançada, faz-se Geografia Econômica (ANDRADE, 1998b, p. 23).

Dessa maneira, permaneceu como assistente do professor Gilberto Osório, trabalhando a sua área durante vários anos. Essa visão, contudo, não anulou preferências que ele tinha em trabalhar algumas áreas dentro dessa Ciência. Isso foi visto na ocasião em que, tempos mais tarde, concedeu entrevista para os professores Zanotelli e Valverde, afirmando que: “Minha atenção maior voltava-se

para o campo da Geografia Humana, sobretudo a Econômica” (ANDRADE, 2002d, p. 13-14).

O gosto pela Geografia Econômica pode ser constatado pelo número de trabalhos escritos não só, especificamente nessa área, a exemplo da Geografia Econômica (1973) e da Geografia Econômica do Nordeste – O Espaço e a Economia Nordestina (1970), ambos publicados em várias edições, como também por outros, livros e artigos publicados que trazem nos contextos gerais das obras, o conteúdo da Geografia Econômica.

Chama-se atenção para o fato de que ao desempenhar a nova função no ensino superior, ele não abdicou de continuar lecionando no Estado, ocupando como professor interino, a Cátedra de Geografia Geral do Colégio Estadual de Pernambuco. Em 1961, se submeteu a Concurso para aquela Cátedra que vinha ocupando, momento em que após a prova escrita, a prova de títulos e defender uma tese sobre O Vale do Siriji, um Estudo de Geografia Regional (Figura 19) foi aprovado e ingressou no quadro de professores catedráticos daquela Instituição, onde permaneceu até o início da década de 1980.

Figura 19 - Tese apresentada em concurso para a Cátedra de Geografia Geral.

Foto: ANDRADE, Thais (2018).

Sobre o tema escolhido para essa Tese afirmou:

Vários fatores me levaram a esta escolha: o fato de ser o mesmo muito pouco estudado, apesar de sua importância geográfica e econômica, sempre reconhecida; o desejo de salientar certas características próprias à zona da mata do Norte do Estado que a

diferenciam bem da porção da mata meridional de Pernambuco; e o desejo de, fazendo o levantamento geográfico do vale em que nasci, contribuir para a solução de alguns dos seus problemas e facilitar futuros planejamentos, para um aproveitamento econômico racional da área estudada (ANDRADE, 1958, p. 7).

É necessário mencionar o Curso de Altos Estudos Geográficos que Manuel Correia realizou na Universidade do Brasil, hoje, Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), em 1956, no Rio de Janeiro, quando ainda era professor Assistente, dando continuidade a sua formação.

Em relação ao Curso afirmou em entrevista concedida à GEOSUL:

Este curso foi planejado e dirigido pelo Prof. Hilgard Stenberg, tendo como assistente a Professora Maria do Carmo Galvão e foi ministrado por sete mestres estrangeiros para quarenta estudantes brasileiros, todos professores universitários. Este curso foi ministrado pelos professores Orlando Ribeiro, da Universidade de Lisboa que deu um curso sobre a “Geografia da Expansão Portuguesa no Mundo”; por Karl Troll, da Universidade de Bonn que deu curso sobre “Biogeografia da América Latina”; por E. Rainz, que deu curso sobre Cartografia e pelos professores franceses, todos da Universidade de Paris, Pierre Monbeig com um curso de “Geografia Agrária do Mundo Tropical”, Pierre Deffontaines com “Geografia da Pecuária na América do Sul”, Pierre Birot com “Geomorfologia do Cristalino” e A. Cailleux com “Sedimentologia” (ANDRADE, 1991/1992 apud GEOSUL, 1991/1992, p. 132-133).

Chamou atenção, também, para a importância do Curso para a Geografia brasileira, dizendo:

Entre os colegas me aproximei muito de Bonifácio Fortes, de Sergipe, de Milton Santos, Dalmo Pontual, Nilda Guerra de Macedo (já falecida), e de Anna Carvalho, da Bahia, de Guiomar Goulart de Azevedo e Alisson Guimarães (já falecido), de Minas Gerais, de Araújo Filho e Blás Berlanda Martinez, de São Paulo e de Rafael Copstein e Alba Gomes, do Rio Grande do Sul. Admito que o Curso de Altos Estudos Geográficos, quer pela sua importância científica, quer pelo contato que abriu entre professores brasileiros que se iniciavam e dos mesmos com os mestres estrangeiros contribuiu enormemente para o desenvolvimento da Geografia brasileira (ANDRADE, 1991/1992 apud GEOSUL, 1991/1992, p. 132-133).

Ainda como professor Assistente teve a oportunidade de participar junto com o professor Gilberto Osório, de estudos e pesquisas de campo sobre A Serra Negra, em Pernambuco e, com o antropólogo Estevão Pinto sobre Águas Belas, também no

Estado. Pesquisa mais ampla foi realizada com o professor Gilberto Osório sobre os rios do açúcar do Nordeste Oriental, identificando a poluição dos cursos d’água do Nordeste, a exemplo do Ceará-Mirim, Mamanguape, Paraíba do Norte, São Miguel, Coruripe e Jiquiá pelo despejo da calda das usinas e as suas consequências. Esses estudos geraram livros que foram editados pela própria FUNDAJ, Instituto esse que fez a demanda da pesquisa, a exemplo de Os Rios do Açúcar no Nordeste Oriental: o rio Mamanguape (1957) e Os Rios do Açúcar no Nordeste Oriental: os rios Coruripe, Jiquiá e São Miguel (1959).

Para Manuel Correia de Andrade, a Geografia era uma ciência que pertencia ao mesmo tempo ao grupo das Ciências Naturais como das Ciências Sociais e, dessa forma, seu objeto de estudo, o espaço geográfico deveria ser visto em seu conjunto, como um todo, mesmo que em algum momento, algum elemento da Geografia Física ou da Geografia Humana se sobressaísse aos demais. Assim, dizia ele, quando Araújo, em entrevista realizada em 2002, se reportou a respeito das pesquisas que desenvolveu com o professor Gilberto Osório serem de Geografia Física, face a sua tendência de geógrafo humano. Para ele, as pesquisas eram “um pouco em torno de uma unidade da Geografia, mas com uma motivação muito Física” (ANDRADE, 2002c apud ARAUJO, 2002, p.106).

Um outro ponto levantado nessa ocasião pela entrevistadora foi aquele concernente à aplicação prática desses resultados, ao que ele respondeu que não havia, pois nem a instituição demandante da pesquisa tinha poderes para isso, como os usineiros não estavam interessados em alterar a sua dinâmica.

Por volta de 1960, no momento em que houve a vacância da cadeira de Geografia Econômica, na Faculdade de Ciências Econômicas da mesma Universidade, ele solicitou transferência para essa unidade, passando a lecionar Geografia Econômica, na condição de professor Adjunto, concorrendo, posteriormente, a Concurso Público de Cátedra com a Tese sobre A Pecuária no Agreste Pernambucano (Figura20), resultado da pesquisa que foi desenvolvida por conta própria. Esse Concurso contava com prova de títulos, prova escrita e defesa de Tese, após ser aprovado, foi nomeado para o cargo de professor Catedrático, permanecendo nesse Departamento durante o período 1966/1975.

Figura 20 - Tese apresentada em concurso para a Cátedra de Geografia Econômica.

Foto: ANDRADE, Thais (2018).

Salientava Manuel Correia de Andrade (2002d), ter sido um dos últimos catedráticos, pois a reforma universitária acabou com a cátedra. “Nós continuamos catedráticos por direito adquirido, mas os que vieram depois de nós entraram como professores titulares” (ANDRADE, 2002d apud ZANOTELLI; VALVERDE, 2002, p. 14).

Diferentemente do que ocorreu com a pesquisa sobre a poluição dos cursos d’água no Nordeste cujo trabalho foi solicitado pela FUNDAJ, muitas das pesquisas desenvolvidas por Manuel Correia de Andrade tinham seus temas escolhidos pelo próprio pesquisador, a exemplo de O Vale do Siriji: um estudo de Geografia Regional; A Pecuária no Agreste Pernambucano e, tantas outras, seja na Geografia ou na História e, uma vez concluídas davam origem a livros e artigos escritos por ele.

Além de se dedicar ao ensino da Geografia Econômica, às pesquisas, coordenou o Mestrado em Economia passando a lecionar, também, na Pós- Graduação. Afora esse curso, participou da criação do Mestrado em Geografia, em 1976, tendo sido o primeiro coordenador e da criação dos Mestrados em Sociologia e Desenvolvimento Urbano, na mesma Universidade.

Além da Universidade Federal de Pernambuco, ensinou e coordenou o Curso de Geografia da Universidade Católica de Pernambuco.

Como pesquisador teve a oportunidade de atuar na SUDENE, na época em que Celso Furtado foi o Superintendente e, de realizar estudos sobre Regionalização Agrária do Nordeste, trabalho esse que foi objeto de um Convênio celebrado entre

aquela Instituição, através do seu Departamento de Planejamento Sub-regional e Urbano e Universidades nordestinas, nas décadas de 1970 e 1980. Assim, com essa Regionalização feita, foram identificadas no Nordeste em função da ocupação e uso do solo agrário, diferentes áreas que foram estudadas por diversos professores e pesquisadores das Universidades do Nordeste que tiveram esses seus trabalhos publicados pela SUDENE, na série Estudos Regionais. Coube a Manuel Correia de Andrade iniciar essa série com o estudo sobre O Processo de Ocupação do Espaço Regional do Nordeste (1979, nº1), em seguida vieram Áreas de Domínio da Pecuária Extensiva e Semi-intensiva na Bahia e Norte de Minas (1982, nº7), Sertão Sul (1984, nº11) e Área do Sistema Canavieiro (1988, nº18).

Esses trabalhos por ele realizados, junto com outros, coordenados por também professores e pesquisadores, sobre as outras áreas em que foi regionalizado o Nordeste fizeram um verdadeiro mapeamento geosocioeconômico da região.

Sua profícua atividade intelectual levou-o a lecionar em importantes Universidades fora de Pernambuco, quando teve experiência acadêmica, como professor visitante, na Paraíba, em São Paulo, em Santa Catarina. No Exterior lecionou e desenvolveu pesquisas no Japão, em Tsukuba, em 1980 e, na Argentina.

A contribuição desse geógrafo, historiador e cientista social foi marcada, ainda, pela participação em conferências, palestras e debates no Brasil, Peru, Colômbia, México, Estados Unidos, Canadá, Cuba, França, Israel e, Japão.

Como reconhecimento ao trabalho que desenvolveu durante todos esses anos dedicados ao ensino, à pesquisa e à extensão é que Andrade foi homenageado por um número considerável de instituições de ensino superior e de fomento à pesquisa federais e estaduais.

Como destacaram Ribeiro e Soares (2009),

Pesquisador do CNPq, foi indicado Geógrafo da América Latina, pelo qual recebeu o prêmio Milton Santos, conferido por ocasião do IX Encontro de Geógrafos da América Latina, realizado na USP em 2005. Antes disso, em 1989, foi contemplado com o título de professor emérito da UFPE, instituição na qual se aposentou, em 1985 e, também, de Pesquisador Emérito, pela Fundação Joaquim Nabuco, em 1989, onde também atuou. Outras premiações relevantes, além das já citadas, foram a Medalha da Ordem Nacional do Mérito Científico, do Ministério da Ciência e Tecnologia, em 2003, e a Medalha Capes 50 anos, do então Ministério da Educação e Desporto, em 2001, além de outras distinções de Doutor Honoris

Causa nas seguintes Universidades Federais: de Sergipe (1996), do Rio Grande do Norte (1995), de Alagoas (1956); e da Universidade Católica de Pernambuco (1979) (RIBEIRO; SOARES, 2009, s/p.).

CAPÍTULO 6 - O ESTUDIOSO DA CIÊNCIA GEOGRÁFICA E A APLICAÇÃO