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O SONHO E A OPÇÃO PELAS CIÊNCIAS SOCIAIS: O DIREITO E A GEOGRAFIA E HISTÓRIA

CAPÍTULO 2 A VINDA PARA O RECIFE: A BUSCA PELA SUA FORMAÇÃO PROFISSIONAL

2.2 O SONHO E A OPÇÃO PELAS CIÊNCIAS SOCIAIS: O DIREITO E A GEOGRAFIA E HISTÓRIA

O desejo de enveredar pelas Ciências Sociais não pôde se concretizar de imediato, uma vez que só em 1939 foi criado no Recife, pelas Irmãs Dorotéias, uma Faculdade de Filosofia, a chamada Faculdade de Filosofia do Recife (FAFIRE). Mesmo assim, ele não teve condições de ingressar na mesma visto que os Cursos oferecidos se destinavam apenas a moças. Sua escolha recaiu então no Direito que estava mais próximo das Ciências Sociais.

Romanelli (2013), ao estudar a história da criação dos cursos superiores no Brasil mencionava que:

Embora o ensino superior tenha sido criado há mais de um século, durante a permanência da família Real portuguesa no Brasil, de 1808 a 1821, a primeira organização desse ensino em Universidade, por determinação do Governo Federal, só apareceu em 1920, com a criação da Universidade do Rio de Janeiro [...], durante o Governo de Epitácio Pessoa. Não passou, porém, essa primeira criação, da agregação de três escolas superiores existentes no Rio de Janeiro: a Faculdade de Direito, a Faculdade de Medicina e a Escola Politécnica (ROMANELLI, 2013, p. 132).

Em 1937, a Universidade do Rio de Janeiro passa a ser Universidade do Brasil, hoje, Universidade Federal do Rio de Janeiro.

Segundo Ribeiro (2018), em sua tese de doutorado intitulada Olhares Inexplorados sobre a Amazônia no Ensino de Física: uma abordagem da História da Ciência e da Tecnologia na Amazônia com ênfase nos Relatos dos Naturalistas, a primeira Universidade do Brasil foi a Escola Universitária Livre de Manáos criada em 17/01/1909 na cidade de Manaus, motivada pela riqueza do ciclo da borracha.

Com relação à criação da Universidade de São Paulo, salientava a autora que:

Apesar da reorganização da Universidade do Rio de Janeiro, a primeira Universidade a ser criada e organizada, segundo as normas dos Estatutos das Universidades, foi a Universidade de São Paulo, em 1934. [...] A Universidade apresentava a novidade de possuir uma Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras (ROMANELLI, 2013, p. 132).

Em trabalho realizado por Reis (1991), ao estudar a Universidade no Brasil e em Pernambuco, ele afirmou:

Em 1931, [...] o Governo Provisório, baixou o Decreto nº 19.851, o “Estatuto das Universidades Brasileiras”, consubstanciando a proposta do ministro de reforma do ensino superior, com a qual se favorece o nascimento de outras Universidades no território nacional (REIS, 1991, p. 389).

Em Pernambuco, mais precisamente, no Recife, uma Universidade foi criada em 1946. Segundo Reis (1991) “A Universidade do Recife partia da Faculdade de Direito, herdeira do Curso Jurídico de Olinda” (REIS, 1991, p. 392).

A ela se juntaram outras unidades de ensino superior: institutos, escolas, faculdades.

A história da Faculdade de Direito criada na então Província de Pernambuco levou à criação dos primeiros Cursos Jurídicos no Brasil pelo Imperador Dom Pedro I. Em um estudo realizado por Naspolini (2011) sobre a criação das primeiras faculdades de Direito, ele afirmou que:

As primeiras faculdades de Direito surgidas no Brasil foram institucionalizadas pela aprovação do projeto de 31 de agosto de 1826 – convertido em lei em 11 de agosto de 1827. Dessa forma,

São Paulo e Olinda foram as localidades escolhidas para abrigar esta nova vanguarda no ensino, devido principalmente à situação geográfica – uma para atender o sul e outra para suprir as necessidades dos habitantes do norte do Brasil (NASPOLINI, 2011, p. 1).

Antes de 1827, não existiam Universidades no país, as pessoas que desejassem ingressar em uma Universidade teriam que se deslocar para a Europa, para Portugal ou para a França, voltando para o Brasil já diplomado.

Segundo Naspolini (2011),

A ideia de instalar no país institutos de educação superior em Direito veio primordialmente da lógica que marcou a independência do Brasil junto a Portugal, em 1822, de autonomia nacional, de construção de uma identidade como tal, e de formar aqui uma “intelligentsia” própria. Em busca de nova lei e consciência, pretendia-se formar uma elite intelectual independente das escolas portuguesas e francesas (NASPOLINI, 2011, p. 1).

A mudança da Faculdade de Direito de Olinda para o Recife ocorreu em 1854.

Na escolha que fez pelo Curso de Direito, Andrade se reportou ao seu pai que também era advogado.

Andrade (2002), referindo-se ao seu pai, afirmou: “Meu pai era de uma família tradicional de produtores de açúcar e com intensa atividade política bastante conservadora” (ANDRADE, 2002c apud ARAÚJO, 2002, p. 8). O Dr. Quincas, como era conhecido, ansiava ter um filho que seguisse uma daquelas profissões: Direito, Engenharia ou Medicina que “o respeitável dono do engenho considerava dignas de menção” (GUSMÃO, 2016, p. 16). Assim, ele ansiou em relação ao seu filho Joaquim Correia Xavier de Andrade Filho, vê-lo médico, mas este seguiu a engenharia civil. No caso de Manuel Correia de Andrade, seu filho primogênito, ainda de acordo com Gusmão (2006),

[...] Mais diplomático precisou ser Manoel Correia de Andrade, o irmão nascido 12 anos antes, que até se formou em Direito para se encaixar no padrão estabelecido pelo pai – e manteve sua ligação com a Ordem dos Advogados do Brasil até falecer, em 22 de junho de 2007 – mas encontrou na Geografia e na História sua razão de viver (GUSMÃO, 2016, p. 16-17).

Há um fato que merece ser destacado nessa escolha pela Geografia e História no sentido de que, no momento em que decidiu ir até o Jundiá comunicar da sua decisão de deixar o Direito, através da Advocacia que já praticava seu pai ficou perplexo e a reação que teve foi lhe dizer: “quero ver você sustentar mulher e filho com Geografia e História”. Sentindo-se ofendido com a resposta, jurou que isso iria acontecer e que não iria precisar da sua ajuda. Dizia Manuel Correia de Andrade que aquele momento gerou um mal-estar, mas que foi logo resolvido, inclusive através da sua mãe, a matriarca da família a quem Joaquim Correia ouvia sempre. Apesar de Manuel Correia de Andrade falar sobre este acontecido, esse depoimento foi dado pelos seus irmãos, no momento de nossa pesquisa de campo.

Na Faculdade de Direito do Recife, onde permaneceu no período de 1941/1945 obtendo o grau de Bacharel em Direito, ele teve condições de desenvolver seus estudos, seu senso crítico e dar início à sua vida política, tanto estudantil, como de luta por causas nacionais.

Andrade, A. C. (1995) se reportando ao momento político que o Brasil e, consequentemente, Pernambuco vivia naquela ocasião em que Manuel Correia estava fazendo o seu curso, salientou que:

A Faculdade de Direito: um novo ambiente. A inquietação de toda uma geração. O país vivendo o Estado Novo. Pernambuco sob o domínio do Interventor Agamenon Magalhães, a defender em seu jornal, “A Folha da Manhã”, os princípios autoritários, [...]. Os métodos empregados contra os que dele discordavam eram os mesmos em quase todo o território nacional. Jornais censurados. Intelectuais impedidos de se expressarem livremente. Muitos, presos diversas vezes, como Gilberto Freyre, Nehemias Gueiros, Aníbal Fernandes e considerável número de estudantes [...] (ANDRADE, A. C., 1995, p. 79 apud ALVES FELIPE et al., 1995, p. 79).

Ele acrescentava, ainda, sobre as condições da Faculdade de Direito, naquela ocasião e a posição assumida por Manuel Correia,

Faculdade vivendo um certo marasmo e seria acordada pelos movimentos reivindicatórios democráticos. E, nesses movimentos, Manuel que, por influência familiar, não simpatizava com determinados líderes da Revolução de 1930, foi se engajando e, no engajar, sentiu que o seu mundo e as suas aspirações não se limitavam, apenas, a um regime liberal. Precisava de reformas, nos setores econômico e social. Foi se acentuando essa sua tendência para a esquerda, juntamente com outros colegas [...]. Não transigiu, porém, com o Estado Novo. Lutava pela sua queda, participando de

reuniões, de comícios [...] enfrentando prisões e a fiscalização do seu viver, por “tiras” que o acompanhavam (ANDRADE, A. C., 1995, p. 79-80 apud ALVES FELIPE et al., 1995, p. 79-80).

Lirbório, Cysneiros e Miranda (2008), falando sobre a atuação política de Andrade, ressaltaram:

Por sua atuação política, Manoel Correia de Andrade foi preso em duas ocasiões. A primeira em 1944, no Governo do interventor Etelvino Lins, por participar de manifestações de rua e de atos de oposição a Agamenon Magalhães, por ser integrante do grupo de estudantes que pisoteou e rasgou o retrato de Getúlio Vargas (no bar Lero – Lero), e por participar da luta política contra o Estado Novo (LIRBÓRIO; CYSNEIROS; MIRANDA, 2008, p. 103 apud CAVALVANTI et al., 2008, p. 103).

Atuou no Diretório Acadêmico como representante da sua turma, em duas ocasiões, esteve junto com Gilberto Freyre, na luta política contra o Estado Novo, em favor da redemocratização, fato que o levou à prisão e, ao seu indiciamento pelo Tribunal de Segurança Nacional. Participou de manifestações a favor dos Aliados, durante a Segunda Guerra Mundial, militou por algum tempo no Partido Comunista do Brasil e, depois, na Esquerda Democrática, Ala da União Democrática Nacional (UDN), liderada por Gilberto Freyre.

É importante mencionar que, na Faculdade, Manuel Correia de Andrade conheceu uma colega de Curso, Maria de Lourdes de Sales Menezes com quem veio a casar e teve cinco filhos.

O papel de Lourdinha, como ele assim a chamava, na sua vida profissional foi de grande importância em função da sua responsabilidade de ler e de corrigir os seus manuscritos. Ainda, como estudante de Direito, ela foi companheira dele no movimento estudantil, tendo estado na passeata em que o estudante Demócrito de Souza Filho veio a falecer, em função de ter sido atingido por um tiro.

Em outro depoimento, como aluno do Curso, afirmou:

[...] na Faculdade de Direito firmei as minhas convicções políticas, convencido – ainda hoje estou – de que o Brasil necessitava mudar a orientação que seguia desde a colonização, abrindo-se a sentimentos novos, mais liberais, socializantes (ANDRADE, 2006, p. 13 apud QUINTAS, 2006, p. 13).

Nessa época, 1945, Manuel Correia de Andrade dava início aos seus escritos para jornais e revistas universitárias, sobre temas que até os últimos momentos de vida continuavam objeto de suas preocupações: a questão regional; o problema da estrutura fundiária do país e a necessidade de uma política agrária; as desigualdades sociais existentes; o problema ambiental; as revoluções libertárias, ou algum outro assunto que fosse de seu interesse.

Quando da criação da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras Manuel da Nóbrega, pelos jesuítas, funcionando no Colégio Nóbrega, em 1943, atual Universidade Católica de Pernambuco, Manuel Correia de Andrade que se encontrava na metade do Curso de Direito, pode realizar o sonho de fazer a Licenciatura em Geografia e História. Naquela época, o Curso era um só. Houve um momento em que ele cursava as duas Faculdades, a de Direito e a de Filosofia, onde se formou em Geografia e História, em dezembro de 1945. As duas formaturas ocorreram, pois, no mesmo ano. Relatava ele:

Eu fiz parte da primeira turma do curso de Geografia e História. Formei-me nos dois cursos no mesmo ano [...]. Naquele tempo, o curso de Geografia e História era feito em quatro anos: três de Bacharelado e depois um ano de Didática, que habilitava para lecionar no ensino Médio (ANDRADE, 2002d apud ZANOTELLI; VALVERDE, 2002, p. 13).

Naquela ocasião, como a Faculdade havia sido criada recentemente, não possuía autorização para ofertar o curso de Didática. Este só veio a ser oferecido mais tarde, em 1947, oportunidade em que Manuel Correia de Andrade o realizou.

CAPÍTULO 3 - EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA INSTITUCIONALIZAÇÃO DA