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CAPÍTULO 5 CAMINHOS PERCORRIDOS COMO PROFISSIONAL DO DIREITO E DA GEOGRAFIA

5.2 O ENSINO SECUNDÁRIO DE GEOGRAFIA E HISTÓRIA E OS LIVROS DIDÁTICOS

No Ensino, como já se teve oportunidade de mencionar, sua experiência teveinício, quando ainda estudante foi convidado a lecionar Geografia e História em colégios particulares de Recife, atividade que praticou até 1952. A exemplo do que ocorre nos dias atuais em que o aluno sem ter ainda se formado leciona em escolas, o mesmo acontecia naquela época. É e era muito comum a escola que estava precisando de um docente, através de um professor conhecido, pedir indicação de um bom aluno que ele conhecesse para suprir a falta de professores. No caso de Manuel Correia de Andrade, como ele ingressou no magistério, ainda estudante, esse fato se deu por intermédio de seus dois professores: Sylvio Rabello e Dácio Rabello. Assim, foi indicado para lecionar Geografia no Colégio Joaquim Nabuco

que depois se tornou o Arquidiocesano e, no Leão XIII; Geografia e História nos colégios Padre Félix, Vera Cruz e Americano Baptista. Outras unidades de ensino também o tiveram como professor, a exemplo do Oswaldo Cruz, Ginásio Castro Alves, Escola Técnica do Comércio, Colégio Eucarístico, conforme fossem surgindo novas oportunidades. Na escola pública exerceu a docência na Escola Normal de Pernambuco e, no Ginásio Pernambucano (Figura 15), onde foi professor Catedrático.

Figura 15 - Ginásio Pernambucano – Recife – PE.

Foto: ANDRADE, Thais (2018).

O Ginásio Pernambucano quando foi fundado, em 1825, recebeu o nome de Liceu Provincial de Pernambuco, após passar por várias denominações, inclusive a de Colégio Estadual de Pernambuco, voltou em 1974, a ser o Ginásio Pernambucano, “o velho Ginásio” como chamavam vários de seus professores.

O Ginásio sempre foi uma instituição de ensino de renome que atravessou séculos, tendo um corpo de professores de alto nível, muitos deles, a partir da criação da Faculdade de Filosofia se tornaram professores, também, do ensino Superior. Por sua vez, por suas salas de aula passaram figuras ilustres,

representantes da política e da cultura pernambucanas, como: Agamenon Magalhães, Amaro Quintas, Ariano Suassuna, Celso Furtado, Clarice Lispector, Epitácio Pessoa, Joaquim Francisco Cavalcanti, José Lins do Rego, Waldemar de Oliveira e, tantos outros.

Contudo, esse “Velho Ginásio”, no final dos anos de 1990 passou por um período difícil, apresentando problemas no que dizia respeito à edificação, como também, do ponto de vista pedagógico, se tornando bem diferente daquele antigo Ginásio Pernambucano. Segundo entrevista concedida por Pontes (2011), à Globo,

[...] a antiga escola foi transferida para outro endereço de Pernambuco, e desde 2004 a nova proposta de Escola de Ensino Médio Integral começou a funcionar no prédio tradicional que faz parte da história do Recife (PONTES, 2011, s/p.).

Mais adiante na entrevista, ela colocou que:

[...] Sem condições de reforma pelo estado, em 1998 ela foi transferida para outro espaço onde permanece até hoje, com outra proposta pedagógica. Diante da importância histórica do prédio do antigo Ginásio Pernambucano, a iniciativa privada custeou a reforma de todo imóvel, contando com o apoio do Governo. Junto à reforma, uma nova proposta de ensino médio foi criada, a Escola de Referência em Ensino Médio Ginásio Pernambucano Integral que funciona na área [...] do edifício histórico (PONTES, 2011, s/p.).

Manuel Correia de Andrade ao deixar de lecionar nas escolas particulares, momento em que ingressou no ensino superior, não deixou, contudo, a escola pública, aí permanecendo até a década de 1980.

Ao lado da contribuição ao Ensino Secundário, como professor, Manuel Correia de Andrade no período 1952 a 1963 publicou uma série de livros didáticos, escritos em colaboração com o professor Hilton Sette, com quem começou a trabalhar nos anos 1940.

De acordo com Melo et al. (2006), em seu artigo História da Geografia Escolar Brasileira: continuando a discussão, eles fizeram uma abordagem sobre como se processava o ensino da Geografia ao longo do seu tempo histórico, salientando que:

Antes da institucionalização da Geografia como disciplina acadêmica e como ciência, com seus próprios pesquisadores (1934), quem

produzia e discutia Geografia eram os professores do Ensino Secundário. Por outro lado, foram os autores de livros didáticos, bons ou ruins, que popularizaram o Ensino da Geografia durante o século XIX e início do século XX (MELO et al., 2006, p. 2686).

Naquele momento, a Geografia tinha um cunho enciclopédico, mneumônico, o ensino que predominava era aquele que levava o aluno a decorar nomes de países com as suas respectivas capitais, nomes de rios, de serras, etc.

Melo et al (2006) afirmaram ainda que:

No século XX, manteve-se, de maneira geral, a mesma concepção quanto ao método de ensinar a Geografia. Como exemplo, temos o livro de Cláudio Thomas “Geografia: curso elementar”, editado em 1947, composto por 390 questões de perguntas e respostas “com conteúdo essencialmente decorativo” (MELO et al., 2006, p. 2686).

Costa (2010) ao falar sobre a origem do livro didático, disse:

O manual escolar, mais conhecido hoje como livro didático, apesar de ter sido vastamente utilizado durante todo o processo de educação, desde seus primórdios com os jesuítas, recebeu o seu primeiro conceito formal no Brasil, na década de 1930, através do Decreto-Lei nº 1.006 de 30/12/1938. Este Decreto, define pela primeira vez, o que deve ser entendido por livro didático (COSTA, 2010, p. 19).

Para Gatti Jr. (2005) ao escrever um artigo sobre a história do livro didático no Brasil assinalou:

No Brasil, até a década de 1920, a maior parte dos livros didáticos era de autores estrangeiros, editados e impressos no exterior, especialmente na França e em Portugal. A escola também se configurava como um local para poucos, especialmente para os filhos das pessoas mais abastadas. A partir da década de 1930, esta situação começou a mudar, pois se tornaram mais comuns as publicações de livros didáticos de autores brasileiros (GATTI JR, 2005, p. 382).

Naqueles anos 1950, segundo Andrade (2002c), a Editora do Brasil S/A, de São Paulo, resolveu adotar uma estratégia para enfrentar, ou melhor, concorrer com a Companhia Editora Nacional “que tinha o monopólio da edição de livros didáticos” (ANDRADE, 2002c apud ARAÚJO, 2002, p. 102). Na verdade, naquela época eram poucas as Editoras que se dedicavam a editar livros didáticos.

Andrade (2002c) ao comentar como surgiu o seu interesse em se inserir no campo da produção de livros didáticos, chegando até à Editora do Brasil S/A, empresa responsável pela tiragem dessas publicações, salientava o interesse da editora que, naquela época era organizada pelo professor Carlos Costa em aproveitar profissionais da terra. Assim,

[...] ele achava que, para fazer livros, em São Paulo e no Rio, os melhores autores já estavam comprometidos. Então, ele resolveu vir para o norte, pegar professores na Bahia e em Pernambuco, parece- me que no Pará, que escrevessem livros didáticos competitivos. [...] Aqui, ele contratou Hilton, que era um bom professor de Geografia, competente, mas era um pouco lento. E tinha de fazer, de uma carrada, sete livros: quatro para o curso ginasial e três para o curso colegial. Hilton me convidou para me associar a ele. Então, nós fizemos esses livros, que tiveram uma aceitação boa, no Brasil inteiro (ANDRADE, 2002c apud ARAÚJO, 2002, p. 102).

O autor dizia que, apesar da aceitação que os livros tinham, eles não estavam sós no mercado dos livros didáticos, esses livros concorriam com outros manuais produzidos pela mesma editora, como os de Aroldo de Azevedo e Moises Gicovate. Dessa forma, uma das condições básicas para que se mantivessem em um bom patamar era a questão de se manterem sempre atualizados.

Os livros didáticos de Geografia contemplavam a Geografia Geral e, a Geografia do Brasil, o que se justificava pelo fato de, na década em que foram escritos, anos 1950 e 1960 e, mesmo antes, nos anos 1940, o Currículo Escolar Oficial da disciplina dava ênfase a esses dois enfoques: a Geografia Geral e a Geografia do Brasil. O mesmo acontecia com a História.

Segundo Rigotti (2015), a partir da Lei de Diretriz e Base da Educação Nacional nº 5.692/71, o chamado Ciclo Ginasial passou junto com o antigo Ensino Primário a formar o Ensino de Primeiro Grau vindo a corresponder a partir da Lei de Diretriz e Base da Educação Nacional 9.394/96, ao Ensino Fundamental.

Andrade (2002c) chamou atenção para o fato de que, no Ginasial eram oferecidos dois anos de Geografia do Brasil e, dois anos de Geografia Geral. No caso do antigo Colegial, os alunos estudavam Geografia Física, Geografia Política e Geografia Humana, cursadas a cada ano a que correspondia esse nível de ensino. Utilizando-se, novamente Rigotti (2015), o Ciclo Colegial veio a corresponder pela Lei de 1971 ao Ensino de Segundo Grau e, posteriormente, Ensino Médio, na Lei de 1996.

Esses livros escritos por Manuel Correia de Andrade e Hilton Sette representavam uma grande tiragem e estavam voltados para os Cursos Ginasial, Colegial e Técnico de Comércio. Havia, também, um outro livro didático escrito por eles intitulado Geografia e História de Pernambuco destinado ao Curso Normal, ou seja, para o Curso Pedagógico, preparatório para professores que lecionavam no antigo Curso Primário.

Observa-se quando da análise da estrutura desses livros escritos nos anos 1950 que, em quase todos constavam antes do próprio índice, menção à Portaria nº 1.045 de 14/12/1951 que definia o Programa Oficial da disciplina para aquela determinada série. Por sua vez, eles apresentavam em cada Capítulo, um índice do conteúdo a ser estudado, o próprio conteúdo e, ao final, um Esquema ou Resumo do Capítulo, um Questionário com cerca de dez questões ou mais para que os alunos resolvessem e, uma Leitura relacionada ao tema que foi trabalhado, extraído de alguma Revista Científica, a exemplo da Revista Brasileira de Geografia ou mesmo escrita por algum autor relacionado à Geografia como, Pierre Deffontaines, Pierre George e tantos outros.

Nessa década de 1950, os livros didáticos (Figura 16) tinham algumas características básicas, como: conteúdos muito densos, muitas vezes com uma linguagem não apropriada para a idade e, consequentemente, à compreensão dos alunos; estimulavam a memorização, haja vista os Questionários contendo uma série de perguntas que continham ao final de cada Capítulo. Essa prática do Questionário fez com que muitas vezes o professor estimulasse os alunos a responderem as questões, procurando diretamente no texto sem estimular a leitura, a compreensão e a reflexão do que estavam lendo. Inclusive, ainda divulgavam que a “prova” seria realizada a partir da utilização dessas questões. Por sua vez, eles eram publicados em capas duras onde se lia os nomes dos autores e o título. A série a que se destinava e o nome da editora, nem sempre estavam presentes nas capas. Normalmente, na folha de rosto todas aquelas informações se faziam presentes, inclusive o ano da publicação. O corpo do livro, ou seja, os Capítulos eram muito ricos em figuras, representadas por gráficos, mapas, fotos e paisagens, mas todas em preto e branco. Na maioria das vezes os “mapas” possuíam a legenda, mas não continham as coordenadas geográficas nem a escala.

Figura 16 - Livros didáticos da década de 1950.

Foto: ANDRADE, Thais (2018).

Na década de 1960, Hilton Sette e Manuel Correia de Andrade escreveram uma nova série de livros para o Curso Ginasial levando em consideração as recomendações do Conselho Nacional de Educação. Esses livros foram organizados em três volumes: Iniciação à Geografia para a primeira série; Geografia do Brasil, para a segunda série; Geografia dos Continentes destinado à terceira série, sem falar em uma Geografia do Brasil - Nordeste, mais dirigida para o ensino na própria região, onde era maior a adoção dos seus livros (Figura 17). Estudando o Nordeste, o aluno da região teria uma noção do que lhe estava mais próximo, como se diz hoje em dia, seu espaço vivido, para poder compreender o que está mais distante dele. Os autores publicaram, também, uma Geografia Geral direcionada para o segundo grau. Esses livros, de imediato, apresentavam uma feição diferente daqueles da década anterior, com suas capas coloridas, portando ilustrações. No seu interior já começava a ser visto alguns tracejados a cores e a existência de algumas cores nas figuras. Eles não possuíam mais menção à Lei a qual estavam vinculados. Os conteúdos continuavam densos, mas com um número bem maior de ilustrações.

Figura 17 - Livros didáticos da década de 1960.

Foto: ANDRADE, Thais (2018).

A fim de facilitar a aprendizagem usamos uma linguagem simples evitando os termos técnicos, as palavras difíceis e o excesso de nomenclaturas, de vez que Geografia é descrição e interpretação de paisagens e não memorização de nomes. A fim de facilitar a compreensão dos alunos, juntamos ao texto farta documentação fotográfica, através da qual o estudante pode visualizar as paisagens descritas (SETTE; ANDRADE, 1973, p. 9).

Ainda comentando essa série publicada chamavam atenção para os exercícios colocados ao final de cada Capítulo.

Também fizemos acompanhar o texto de cada Capítulo de exercícios e questionários que esperamos sejam preenchidos pelos alunos sob a vigilância e a orientação dos professores. Nos questionários não esgotamos as perguntas que o texto sugere, a fim de que o professor, em cujas mãos está a formação do aluno, possa orientar melhor a aprendizagem dos mesmos [...] (SETTE; ANDRADE, 1973, p. 9).

Dois pontos ainda chamam atenção nessa coleção, primeiro o fato de, nos Capítulos, os assuntos abordados sempre que possível estavam relacionados com temas que já foram anteriormente trabalhados. Outro ponto foi o estímulo aos alunos para que eles trabalhassem com mapas, confeccionando-os, com o objetivo de se capacitarem na leitura dos fatos geográficos.

De acordo com Gaspar et al. (1996) “Cada um desses livros alcançou num espaço de tempo de duas décadas, ampla circulação na rede nacional de ensino médio, chegando, em alguns casos, a publicar 30 edições” (GASPAR et al., 1996, p. 26-29).

Para Oliveira (2008) reportando-se aos livros didáticos desses dois autores, salienta:

Em Vitória de Santo Antão, como em todas as áreas emersas do planeta, há rios, vales, vertentes, áreas planas e rebaixadas, rochas, solos, vegetação e gente. Esses elementos paisagísticos encontram- se numa interação dialética impressionante, que só depois, bem depois das aulas do 3 de Agosto, quando despertei para a Dialética Marxista, pude compreendê-la em sua plenitude. Os livros de M. C de Andrade faziam-me ver esses elementos paisagísticos não mais como um mero amontoado de coisas desconexas, mas como um cenário de uma grande peça, na qual todos os atores são importantes e se relacionam, em que todos têm um papel a desempenhar (OLIVEIRA, 2008, p. 112).

Em determinado momento da história dos livros didáticos desses dois autores, Hilton Sette e Manuel Correia de Andrade, eles desfizeram a sociedade e, este último geógrafo, em 1980 lançou uma nova coleção de livros didáticos com o título: Geografia Geral e do Brasil formada por três volumes direcionados para o 2º Grau e Preparação aos Vestibulares (Figura 18). Esses livros tinham uma linguagem mais simples, onde foram evitados o emprego de palavras difíceis, perderam a feição de compêndios, eram bastante ilustrados com capas que se assemelhavam a verdadeiros mosaicos de paisagens coloridas e no seu interior, cada Capítulo continha um grande número de ilustrações, representadas por mapas, gráficos, também com cores. Desapareceram os questionários sendo substituídos por exercícios de múltipla escolha que estimulavam o raciocínio do aluno.

Figura 18 - Livros didáticos da década de 1980.

Foto: ANDRADE, Thais (2018).

Costa (2010) falando sobre a importância dos livros didáticos para as pesquisas, salientou que:

A literatura específica de estudos que usam como fonte os livros didáticos aponta que estes são importantes instrumentos históricos para o conhecimento das disciplinas escolares e de suas práticas. Entre outras significativas contribuições, envolvem a história da educação e, em especial, o ensino de uma disciplina [...] (COSTA, 2010, p. 17).

Magda Soares e os pesquisadores da História das Disciplinas Escolares demonstram compartilhar da ideia de que os livros didáticos constituem fonte importante para a investigação, descrição e compreensão da história dos processos de ensino e das práticas escolares (GATTI JR., 2005, p. 380).

Andrade chamava atenção para o fato de haver se dedicado a esses livros didáticos por várias décadas, mas que em um determinado momento um conjunto de fatores vieram a contribuir para que ele se afastasse dessa atividade: a necessidade de uma atualização quase que constante desses livros o que demandava muito tempo; o seu interesse e envolvimento na pesquisa e no ensino superior.

Apesar de haver externado esse sentimento, ele não conseguiu fazer o que imaginava, pois foi procurado por um editor, dono da Editora Grafset Ltda. do Estado da Paraíba, demonstrando interesse na execução de um Atlas de Pernambuco, a exemplo do que estava pretendendo fazer para outros estados da região Nordeste e da região Norte e que gostaria que ele coordenasse uma equipe de professores e técnicos conhecedores da realidade do Estado. Ao aceitar, ele organizou uma equipe de trabalho multidisciplinar, composta por geógrafos, professores e técnicos das UFPE e UFRPE, economista do CONDEPE, hoje Agência CONDEPE/FIDEM, e do estudante de Cartografia, da UFPE hoje, cartógrafo do INCRA. A primeira edição desse Atlas foi lançada em 1994.

Esse Atlas direcionado para o ensino e, a pesquisa teve um diferencial uma vez que ao lado de mapas sobre o Estado, ele traz todo um conjunto de Tabelas, Gráficos, Figuras, Atividades e Leituras Complementares que, em seu conjunto com os textos mostram ao professor de Geografia, ao aluno, ao pesquisador, a realidade de Pernambuco, do ponto de vista histórico e geosocioeconômico, através de uma metodologia onde o espaço geográfico é apresentado em todo o seu dinamismo, produto das mudanças e transformações que passou e que passa ao longo de toda a sua história. Assim, ele congrega textos junto com as ilustrações, em um único documento.