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EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA INSTITUCIONALIZAÇÃO DA GEOGRAFIA BRASILEIRA E AS CONTRIBUIÇÕES AO DESENVOLVIMENTO DA

CIÊNCIA, NO BRASIL

Em alguns de seus livros, a exemplo da Geografia Econômica (1975), Geografia Ciência da Sociedade (1987), o estudioso Manuel Correia de Andrade ao fazer uma reflexão sobre a Geografia no Brasil, o seu surgimento e seu desenvolvimento, afirmou que:

A geografia científica foi iniciada no Brasil sob a influência da Escola Clássica de Ratzel e de La Blache, com os trabalhos de Delgado de Carvalho, nas primeiras décadas do Século XX, e continuada, após a fundação da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da Universidade de São Paulo, através dos ensinamentos de Pierre Monbeig e de Pierre Deffontaines e da Faculdade Nacional de Filosofia do Rio de Janeiro, com Francis Ruellan (ANDRADE, 1998b, p. 20).

Assim, esses mestres, em 1940, deram início, no país, à chamada Geografia Científica que recebeu nesse primeiro momento, a influência das Escolas Alemã e Francesa. Essas Escolas possuíam características distintas em função das ideias dos seus formadores. A Francesa dava uma grande importância à descrição das paisagens, deixando de lado as preocupações com as ênfases política, metodológica e filosófica que eram características da Escola Alemã.

Apesar do desenvolvimento dessa ciência, no Brasil, só ter ocorrido a partir das primeiras décadas do século XX, a Geografia se tornou uma ciência autônoma com o seu objeto de estudo e método próprios de investigação científica graças aos trabalhos de Alexander von Humboldt e de Karl Ritter, no século XIX.

A atuação de viajantes, cientistas e de exploradores aliado ao interesse dos Estados de conhecerem, explorarem e dominarem áreas pouco exploradas muito contribuíram para que a Geografia se tornasse uma disciplina científica.

Para Santos (2008),

Se queremos encontrar os fundamentos filosóficos da ciência geográfica no momento da sua construção entre o final do século passado e o início deste [século XX], temos que ir buscá-los em Descartes, Kant, Darwin, Comte e os positivistas, mas também em Hegel e em Marx. Isso para nos limitarmos a uns poucos nomes (SANTOS, 2008, p. 47-48).

Dizia, ainda, o estudioso sobre essas influências:

A influência de Hegel pode ser reconhecida na obra de Ratzel e mesmo nos trabalhos de Ritter. Marx teria igualmente influenciado em muitos pontos o trabalho de Ratzel, de Vidal de La Blache, de Jean Brunhes. Todavia, e por múltiplas razões, foi a herança idealista e positivista que, afinal de contas, acabou por se impor à geografia, isto é, à geografia oficial: o cartesianismo, o comtismo e o kantismo eram frequentemente apoiados e misturados aos princípios de Newton e também ao darwinismo e ao spencerismo (SANTOS, 2008, p. 48).

O desenvolvimento das Ciências Sociais e as suas sistematizações foi possibilitado, também, pelo desenvolvimento das Ciências Naturais, a exemplo da Física, da Astronomia, da Biologia, da Botânica, da Zoologia, da Química que ocorreu a partir da segunda metade do século XVIII, com rebatimentos para aquelas ciências, as sociais, inclusive na Geografia. As Ciências Naturais começaram a tomar forma nos séculos XVI, XVII e XVIII dentro dos conhecimentos gerais que foram surgindo durante aqueles períodos.

Andrade (1985), chamou atenção para a importância dos descobrimentos marítimos para o desenvolvimento da cartografia e para a difusão do conhecimento acerca das terras conhecidas.

Os descobrimentos marítimos, ampliando o horizonte territorial dos europeus, estimularam consideravelmente o desenvolvimento da cartografia – técnica de grande utilidade para os geógrafos – e de livros de viagem em que eram descritos, em geral com evidente fantasia, os costumes e as paisagens das terras descobertas e a serem exploradas (ANDRADE, 1985, p. 8).

Ele continuou o raciocínio, enfatizando que:

O capitalismo nascente, necessitando de matérias-primas e de mercados para colocar a sua produção, estimularia o comércio e a conquista de novos territórios. Disso decorreram a expansão comercial e o desenvolvimento das ciências naturais nos séculos XVI, XVII e XVIII, preparando as condições para o desenvolvimento das ciências sociais – uma delas a geografia – no século XIX (ANDRADE, 1985, p. 8).

Nascimento (2003), ao ter se reportado à evolução do conhecimento geográfico assinalou que:

[...] até o final do século XVIII, não havia conhecimento geográfico padronizado, sistematizado, reconhecido oficialmente como ciência. Inventários de terras e de povos, elaborados em forma de descrições e mapas, eram instrumentos de expansão e de dominação das potências europeias, com objetivos econômicos e colonialistas (NASCIMENTO, 2003, p. 6).

Não se pode deixar de mencionar a importância que teve Bernardo Varenius com seu livro Geografia Geral (1650) para a história do pensamento geográfico, no século XVII. E de Kant, no século XVIII. Eles deram um novo aporte ao conhecimento geográfico, quando passou a haver uma preocupação com a natureza, com a sociedade e, com as suas relações entre si.

Para Andrade (1985),

Kant [...] e Bernardo Varenius lançaram as bases de uma geografia científica que se consolidaria mais tarde. Ambos, porém, admitiam a geografia como uma ciência eminentemente descritiva, cujo conhecimento deveria ser feito a partir da observação. E essa linha de pensamento seria, em grande parte, seguida pelos fundadores da ciência geográfica (ANDRADE, 1985, p. 8).

Segundo Andrade (1998b), um outro fato a contribuir para o desenvolvimento das Ciências Sociais foi a facilidade de divulgação das ideias e do conhecimento científico naquela época.

Assim, a exemplo do que ocorreu com a Geografia, as outras ciências sociais também surgiram ou então passaram a ter autonomia no século XIX. A exceção ficou para a Economia Política que veio a se desenvolver antes, já no século XVIII, graças aos ensinamentos de Adam Smith. A Economia Política estava atrelada a questões relativas à produção, à circulação e à distribuição de riquezas, envolvendo nesse processo, a relação entre elas e a sociedade. Apesar de já vir sendo trabalhada desde o século XVIII, é Adam Smith o cientista considerado como o sistematizador daquela ciência.

Dessa forma, as influências de Humboldt e de Ritter vieram a contribuir para que a Geografia viesse a se tornar,

[...] um ramo autônomo do conhecimento, muito ligada a explicações de fenômenos físicos e muito comprometida com as posições políticas dos seus fundadores. Assim, os continuadores dos dois pioneiros, Ratzel e Élisée Reclus, que viveram nas últimas décadas do século XIX, tiveram a preocupação de defender posições políticas (ANDRADE, 2008. p. 19).

Essa defesa de posições políticas, por exemplo, se relacionava à visão que Ratzel tinha de defender uma política expansionista alemã uma vez que afirmava que a Alemanha se viu prejudicada quando da divisão do mundo pelas Metrópoles, no período de intensificação das conquistas coloniais. De acordo com Andrade (2008), Ratzel,

[...] estava ideologicamente ligado à “necessidade” da construção de um império colonial para a Alemanha, que chegara tarde na partilha do mundo, e em desenvolver estudos que levaram à Geografia Política e à Geopolítica, utilizados pelas oligarquias e pelos ditadores em favor de uma política expansionista, pan-germanista, como o princípio do “espaço vital” (ANDRADE, 2008, p. 19).

Apesar do saber geopolítico ter sido abordado por diversos autores, em vários períodos históricos, as bases modernas desse conhecimento se firmaram no pensamento de Ratzel quando esse deu uma grande importância à integração do Império Alemão, justificando essa expansão, como uma necessidade e uma fatalidade histórica (ANDRADE, 2001).

Quanto a Reclus que era anarquista, ao contrário de Ratzel se mostrava contra essa política pan-germanista e a própria política de expansão colonial como um todo, preocupava-se, com as questões sociais se mostrando favorável e defensor da luta de classes. Reclus possuía um elenco de preocupações que diferia do pensamento de outros geógrafos de seu tempo. Um outro geógrafo anarquista, da mesma época que Reclus foi Piotr Kropótkin.

Chenkman (2014) em matéria feita para a Gazeta Russa sobre Kropótkin e as suas ideias, salientou que:

Pai do anarquismo russo, o príncipe Piotr Kropótkin (1842-1921) sonhava com um mundo sem violência e sem o poder do Estado e concebia a sociedade como uma cooperação voluntária entre pessoas livres (CHENKMAN, 2014, s/p.).

Naquela mesma matéria, Chenkman (2014) chamava atenção para a atualidade das ideias de Kropótkin “Hoje, as suas ideias não são menos atuais do que no século 19” (CHENKMAN, 2014, s/p.).

Santos (2008), ao se reportar à expansão capitalista e à posição assumida pelos geógrafos dizia que:

Diante da marcha triunfante do imperialismo, os geógrafos dividiram seus pontos de vista. De um lado, aqueles que lutavam pelo advento de um mundo mais justo, onde o espaço seria organizado com o fim de oferecer ao homem mais igualdade e mais felicidade: são os casos de Élysée Reclus e Camille Vallaux. [...] Por outro lado, aqueles que preconizaram claramente o colonialismo e o império do capital e aqueles, mais numerosos, que se imaginando humanistas não chegaram a construir uma ciência geográfica conforme a seus generosos anelos (SANTOS, 2008, p. 30).

Para Dresch (1948), a Geografia,

[...] foi no início tanto uma filosofia como uma ciência, filosofia de que os geógrafos alemães, como os historiadores, se serviram com fins políticos. Ela foi muitas vezes utilizada como um meio de propaganda nacional ou internacional, uma arma de combate entre Estados e Impérios, talvez mais ainda que a História. Seja como for, ela ainda arca com as consequências de sua juventude e das condições econômicas, sociais e políticas nas quais se desenvolveu. Pelo fato de ter seus próprios métodos, a geografia mais que nenhuma outra ciência, sofreu as influências ideológicas em curso [...] (DRESCH, 1948, p. 88 apud SANTOS, 2008, p. 29).

Além de Alexander von Humboldt que também foi um grande incentivador na criação de sociedades de Geografia que tinham por objetivo dar o apoio a expedições científicas, e de Karl Ritter, contribuíram para o desenvolvimento científico daquela ciência, naquele século XIX, como já se teve oportunidade de mencionar, Frederico Ratzel, Élysée Reclus, além de Vidal de La Blache com os estudos regionais.

Segundo Andrade (2008), se reportando ao pensamento científico daquele século, o XIX, e nele situando o advento da Geografia Moderna, reiterava que naquela ocasião,

A preocupação com o controle da natureza provocou uma expansão das ciências da observação e da experimentação, do domínio da razão prática, como diria Kant. Os cientistas procuraram acumular

conhecimentos empíricos e fazer as suas formulações teóricas; os governos dos países mais comprometidos com a expansão colonial, como a Inglaterra, a França, a Prússia e, após 1871, a Alemanha, a Rússia etc., estimularam a formação de sociedades geográficas que patrocinavam expedições científicas ao interior da África, da Ásia e da América do Sul, à procura de recursos susceptíveis de exploração (ANDRADE, 2008, p. 76-77).

Ele ressaltava, ainda, que:

Mesmo no Brasil, nas primeiras décadas do século XIX, foram numerosos os cientistas europeus que percorreram trechos do nosso território, escrevendo livros a respeito das condições naturais e das suas formas de exploração. Livros em que analisavam as condições de vida da população, contribuindo para o desenvolvimento da Antropologia Cultural, ciência muito próxima da Geografia Humana (ANDRADE, 2008, p. 77).

Não se pode deixar de mencionar as contribuições dadas no século XIX por Charles Darwin com a sua teoria da evolução das espécies; Ernst Haeckel, discípulo de Darwin que cunhou o termo Ecologia que estudaria as relações e as inter- relações existentes entre o ser humano e seu meio e, Herbert Spencer.

Para Andrade (2008),

[...] Herbert Spencer desenvolveria o evolucionismo, que contribuía para trazer aos estudos sociais as idéias darwinistas. O evolucionismo levaria ao organicismo - comparação da sociedade a um organismo – e à crença no progresso contínuo e no aperfeiçoamento do homem, tão comum aos positivistas e aos anarquistas da segunda metade de século XIX (ANDRADE, 2008, p. 77-78).

Na opinião de Andrade (2008),

Se a seleção natural, como ensinava Darwin, se realizava através da luta entre as espécies, vencendo os mais capazes, transportado este axioma para as ciências sociais poderiam os capitalistas justificar a vitória dos bem-sucedidos como o resultado de sua capacidade superior e a derrota dos demais em face da sua incapacidade natural. Este pensamento, no plano individual, justificava os grandes desníveis sociais, a presença dos muito ricos ao lado dos miseráveis, e no plano coletivo justificava a dominação dos estados mais fortes, mais capazes sobre os mais fracos, os dominados e explorados. Justificavam assim, a um só tempo, as desigualdades sociais no plano interno e a dominação colonial no plano externo. Naturalmente, estas idéias não passariam despercebidas aos fundadores da Geografia (ANDRADE, 2008, p. 78).

Andrade (2008) chamou atenção, também, nesse século XIX, para as ideias trabalhadas por Friedrich Engels, destacando que em seus livros que abordam a natureza e a sociedade, ele “dá grande importância às relações entre o homem e o meio, mostrando dialeticamente como os dois agem e reagem” (ANDRADE, 2008, p. 79). Destacou ainda o autor que em Dialética da Natureza (1883), Engels analisou,

[...] as transformações dialéticas provocadas na natureza virgem, pela ação do homem, explicando como ela, ao se reconstituir, não o fazia de forma semelhante à primitiva, mas apresentando novas características (ANDRADE, 2008, p. 79).

Andrade (1998b) salientou, também, as ideias trabalhadas por Karl Marx no livro O Capital (1970) quando esse se reportando à expansão do sistema Capitalista, procurava explicar,

[...] as relações existentes entre o homem e a natureza, estabelecendo o processo de transformação das sociedades naturais, pré-capitalistas, para as sociedades industriais, capitalistas, em que o homem diminuía a influência do meio natural e o transformava em função de uma mais rápida acumulação de capitais, sem levar em conta os danos ecológicos e sociais dessa transformação (ANDRADE, 1998b, p. 19).

Desses cientistas citados alguns foram os responsáveis pela formulação do método geográfico, consolidado a partir da segunda metade do século XIX e início do século XX. Esse método está fundamentado em cinco princípios enunciados por Frederico Ratzel (extensão), Karl Ritter (analogia ou princípio da geografia geral), Alexander von Humboldt (causalidade) e, Jean Brunhes (princípios da conexidade e da atividade).

Para Gallero (2010), se reportando às origens do conhecimento geográfico com base no pensamento de Andrade, expressava que este autor,

Si bien considera a la Geografia como ciência autónoma desde los trabajos de Humboldt y Ritter no subestimaba los antecedentes de Herodoto, Estrabón, Ptolomeo y los viajeros de la Edad Media, Marco Polo, Ibn Batuta e Ibn Khaldun, considerando al último como uno de los predecesores de la geografia humana. A los científicos alemanes del Siglo XIX los relacionó claramente com el desarollo del capitalismo de aquel país, en el que no desapareceu los grandes

terratementes mientras se produce la aparición de uma industria pujante (GALLERO, 2010, p. 106).

De fato, Andrade sempre esteve a mencionar em seus trabalhos que tratam sobre a evolução do conhecimento geográfico que, antes mesmo da Geografia se tornar uma ciência, o conhecimento geográfico já era praticado desde a pré-história. Assim, a Geografia é inerente ao ser humano como prática de vida. Dizia ele:

Na pré-história, na Antiguidade e na Idade Média [...] a Geografia era utilizada apenas para desenhar roteiros a serem percorridos, para indicar os recursos a serem explorados, para analisar as relações meteorológicas etc., estando profundamente identificada com a Cartografia e com a Astronomia. Assim, os grandes geógrafos eram sobretudo cartógrafos e/ou astrônomos [...] (ANDRADE, 2008, p. 18).

Nascimento (2003), sobre esse assunto mencionava:

A história da Geografia está implicitamente associada à própria história da humanidade, à sua evolução. O instinto geográfico – ou seja, o sentido de orientação, localização, de deslocamento no espaço terrestre – integra, não somente a natureza humana, mas também a animal, já que os seres irracionais o possuem em graus diversos. No homem, todavia, essa faculdade é trabalhada pela razão (NASCIMENTO, 2003, p. 5).

A Geografia nos primeiros tempos já como ciência não teve uma aceitação, imediata, pelas Universidades. Dizia Andrade (2008), que apesar dos trabalhos que foram realizados pelos seus criadores e seguidores,

A sua preocupação principal, sobretudo no ensino secundário, continuou a ser a de informar a respeito das várias áreas do globo terrestre, catalogando nomes de montanhas, de rios, de mares, de cidades, de países e de recursos produzidos. Era, assim, um ramo do conhecimento meramente informativo, que não estimulava a reflexão mais profunda (ANDRADE, 2008, p. 19-20).

Na verdade, essa situação refletia o processo histórico dessa consolidação da Geografia como ciência, a sua época e os objetivos que eram pretendidos por parte daqueles cientistas, instituições científicas e, os próprios Estados, no sentido de conhecer as diferentes áreas, seu povo, a situação política e militar, bem como, o potencial existente para ser explorado. Era, na verdade, um trabalho de descrever

os recursos, descrever a Terra “como se a simples descrição constituísse uma atividade científica” (ANDRADE, 2008, p. 20).

A importância destas descrições, às vezes eivadas de fantasias ditadas pela imaginação dos autores, às vezes preocupadas com a explicação dos principais fenômenos descritos, iria dar origem, na primeira metade do século XX, a uma multiplicidade de enfoques geográficos. Havia uma Geografia dos exploradores, desenvolvida pelas sociedades exploradoras [...] uma Geografia vulgar, popular [...]; e uma terceira, a Geografia dita científica, cultivada nas Universidades [...] (ANDRADE, 2008, p. 20).

A diferença entre elas estava na forma como se trabalhava a ciência, os conteúdos identificados e, os fins a que a mesma se destinava. O primeiro enfoque estava relacionado a um inventário de dados que levassem ao conhecimento de determinadas áreas que ainda eram pouco conhecidas. O enfoque vulgar era representado pelo registro em mapas, de informações sobre elementos que eram de grande interesse para a época, a exemplo de acidentes geográficos, unidades político-administrativas, fronteiras entre unidades políticas, dados econômicos e outros. O terceiro enfoque correspondia à Geografia Científica “cultivada nas Universidades, em que havia disciplinas específicas de Geografia, que procuravam para esta ciência, o seu paradigma, a sua caracterização” (ANDRADE, 2008, p. 20).

Dada à dinamicidade que caracteriza o conhecimento científico que ao longo do tempo evolui em função das mudanças políticas, econômicas, sociais que vão ocorrendo, com reflexos sobre a formulação do pensamento científico, Andrade (1998b), chamava atenção para o fato de que “o objeto e os objetivos de uma ciência são relativos, diversificando-se no espaço e no tempo, conforme a estruturação das formações econômicas e sociais” (ANDRADE, 1998b, p. 17).

Assim, a Geografia no seu processo de evolução a partir do momento em que passa a ser uma ciência, teve o seu objeto de estudo e os seus objetivos modificados ao longo do tempo, face à dinamicidade que é própria do conhecimento científico.

Para Santos (2008),

Cada vez que as condições gerais de realização da vida sobre a terra se modificam, ou a interpretação de fatos particulares concernentes à existência do homem e das coisas conhece evolução importante, todas as disciplinas científicas ficam obrigadas a

realinhar-se para poder exprimir, em termos de presente e não mais de passado, aquela parcela de realidade total que lhes cabe explicar (SANTOS, 2008, p. 18).

No Brasil, como já se teve oportunidade de mencionar, no início desse Capítulo, a Geografia científica do século XIX chega ao país, no início do século XX, após a Revolução de Trinta, com as contribuições de Delgado de Carvalho.

Antes de se fazer uma reflexão sobre essa Geografia no Brasil, o seu surgimento e a sua prática faz-se necessário conhecer um pouco as narrativas, os trabalhos escritos pelos cronistas e missionários do Período Colonial, séculos XVI, XVII e XVIII e pelos viajantes e cientistas do século XIX, da época Imperial, como uma forma de se conhecer por intermédio de suas contribuições, o Brasil daquela época, os usos e costumes da população que ali habitava, as formas de ocupação, uso das terras e dos recursos dos seus habitantes, no caso, os indígenas, as questões relativas à religiosidade do povo, à diversidade da flora e da fauna brasileiras, etc. É importante se ter o conhecimento, de fato, daqueles povos que viviam no solo brasileiro e, que, muitas vezes a história omite, como se essa terra estivesse desabitada e a presença humana tivesse início a partir do processo de conquista e ocupação do território pelos europeus.

A respeito disso, Andrade em seu livro O Desafio Ecológico: Utopia e Realidade (1994b), no Capítulo Formação Territorial do Brasil: Geopolítica e Ecologia, ao se reportar à ocupação do território brasileiro, ressaltou:

Antes de se fazer uma análise do processo de ocupação do litoral, é preciso salientar que ela não foi feita em um território desocupado, mas em uma área povoada por povos indígenas que dispunham de uma certa organização político-social. Mas eram tribos e nações que lutavam entre si, o que tornou fácil a tarefa de conquista, onde os