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A atuação do Poder Judiciário no controle de constitucionalidade

3. O CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE NO BRASIL

3.2 AS FORMAS DE CONTROLE NA LEGISLAÇÃO BRASILEIRA

3.2.2 A atuação do Poder Judiciário no controle de constitucionalidade

A regra no Brasil é o controle de constitucionalidade exercido pelo Poder Judiciário, não se trata aqui de uma superioridade hierárquica, mas de uma superioridade de manifestação ou exercício. Pode-se, inclusive, afirmar que o controle jurisdicional no estado brasileiro é o mais democrático, amplo e efetivo. Democrático porque é o que melhor permite a participação do cidadão na defesa de seus direitos, principalmente se realizado pela forma difusa. Amplo porque atualmente se dispõe de uma gama de medidas tendentes a averiguação da constitucionalidade ou não dos atos normativos. E efetivo porque é o controle jurisdicional o mais eficaz contra os abusos cometidos pelo Legislativo e o Executivo, estando a serviço da concretização dos direitos fundamentais estabelecidos pela constituição quando violados ou ameaçados por aqueles.

A Constituição Federal de 1988 manteve o controle jurisdicional híbrido ou misto, combinando o controle difuso ou incidental (sistema americano) com o controle concentrado (sistema continental europeu). O controle difuso é exercido por qualquer órgão do Poder Judiciário, e o controle concentrado ou por via de ação é exercido com exclusividade pelo Supremo Tribunal Federal.

O controle difuso está no ordenamento desde a Constituição Federal de 1891, e o controle concentrado foi introduzido no Brasil pela Emenda Constitucional nº16/65 com a adoção da representação de inconstitucionalidade. Embora, como já mencionado alhures, alguns não considerarem este instituto como uma forma de controle de constitucionalidade, mas de resolução de conflito político.

Desde sua introdução, o controle jurisdicional somente veio sofrer significativas mudanças com a Constituição Federal de 1988, que introduziu vários

mecanismos de atuação ao controle concentrado. Entre as novidades introduzidas pelo constituinte de 1988, podem-se citar:

a) A ampliação do rol de legitimados a proporem a ação direta de inconstitucionalidade (art. 103), antes restrita apenas ao Procurador-Geral da República;

b) A previsão do controle de inconstitucionalidade por omissão, com a introdução da ação direta de inconstitucionalidade por omissão (art. 103, §2º) e o mandado de injunção (art. 5º, LXXI);

c) A adoção da arguição de descumprimento de preceito fundamental (art. 102, § 1º);

d) A representação de inconstitucionalidade de leis ou atos normativos estaduais ou municipais em face da Constituição Estadual, cuja competência é do Tribunal de Justiça do Estado.

Assim, verifica-se que como o controle concentrado foi sendo gradativamente fortalecido dentro do ordenamento constitucional, primeiro pela ampliação do rol dos legitimados a proporem a ação de inconstitucionalidade, que até então se restringia ao Procurador Geral da República, e posteriormente pela adoção de outros procedimentos de controle, além da ação direita de inconstitucionalidade, como a ação declaratória de constitucionalidade, a argüição de descumprimento de preceito fundamental55, a ação declaratória de inconstitucionalidade por omissão e o mandado de injunção. Percebe-se que o próprio Supremo Tribunal Federal foi ganhando força na concretização de sua principal função que é a guarda da Constituição Federal.

Aliado ao fortalecimento do controle concentrado encontra-se também o fato de que o próprio Supremo Tribunal Federal foi se firmando como Corte Constitucional ao longo da década de 1990, através do exercício constante da jurisdição constitucional

55 A ação declaratória de constitucionalidade e a arguição de descumprimento de preceito fundamental foram

e da criação dos mecanismos de proteção aos seus julgados. Entre estes mecanismos de proteção se pode citar o efeito vinculante das decisões definitivas de mérito nas ações declaratórias de constitucionalidade em relação ao Poder Judiciário e ao Executivo, através da EC nº 3, de 1993. O que, posteriormente, foi ampliado à ação direta de inconstitucionalidade, tendo como destinatários a administração pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal (EC nº 45/2004).

Por outro lado, no tocante ao controle difuso este permaneceu praticamente inalterado desde sua implantação no sistema jurídico, somente vindo sofrer transformações significativas com a adoção da repercussão geral e da súmula vinculante a partir de 2004 com a Emenda Constitucional n.º 45. Estes dois institutos, repercussão geral e súmula vinculante, serão tratados em capítulo próprio em consequência da importância dos dois institutos para a presente pesquisa.

Desta forma, percebe-se claramente que enquanto o controle de constitucionalidade do Executivo e do Legislativo pauta-se, na maioria das vezes, por questões de conveniência e oportunidade de caráter nitidamente político. O controle judicial é um controle eminentemente jurídico, e por este motivo deve ser pautado unicamente na verificação da conformação legislativa com a Constituição, objetivando garantir assim a tão desejada supremacia constitucional.

3.2.2.1 Controle Concentrado e Controle Difuso: a busca de harmonização do sistema híbrido

A opção por adotar um sistema misto de controle jurisdicional de constitucionalidade, onde convivem harmonicamente o controle difuso e o controle concentrado, parece não ser de todo equivocada, principalmente, para países como o Brasil, ainda em desenvolvimento e no resgate das promessas de modernidade.

Como bem lembra Streck, a opção por um Estado Democrático de Direito mais do que uma variante da forma de estado dentro de sua evolução social, trata-se de uma agregação das condições de possibilidades que foram suprimidas ou estiveram ausentes nas etapas anteriores, “representadas pela necessidade do resgate das promessas de modernidade, tais como igualdade, justiça social e a garantia dos direitos humanos fundamentais” 56.

A adoção de um controle jurisdicional misto permite uma maior participação do cidadão na defesa de direitos fundamentais. Haja vista que por mais que se tenha ampliado a legitimidade processual ativa das ações do controle concentrado, ficou de fora como legitimado o cidadão, o homem comum, aquele que também poderá ser vítima de atos normativos inconstitucionais.

A previsão de legitimados como o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, os partidos políticos com representação no Congresso Nacional e as confederações sindicais ou entidades de classe de âmbito nacional, não garante a participação cidadã do indivíduo quando violados seus direitos fundamentais.

Embora se acredite na superioridade do controle concentrado, em decorrência principalmente dos efeitos erga omnes de suas decisões, ambos os controles possuem suas limitações, o que impede a eficiência total de um em detrimento do outro.

Bastante pertinentes são as observações de Paula Arruda sobre as limitações de cada controle. Em seus ensinamentos, Arruda elenca os seguintes inconvenientes enfrentados pelos países que adotaram o controle concentrado como única forma de controle de constitucionalidade de suas normas:

a) o inconveniente dos juízes serem obrigados a aplicar a lei até que o Tribunal se manifeste, uma vez que não têm competência para conhecer da inconstitucionalidade;

b) a restrição, em alguns casos, da competência para argüição da

56STRECK, Lênio. Jurisdição Constitucional e Hermenêutica- uma nova crítica do direito. São Paulo: Forense,

inconstitucionalidade, que ficam limitadas às Supremas Cortes por ocasião de um processo ordinário;

c) a natureza essencialmente anulatória da decisão proferida no controle concentrado o que uma vez ocorrendo deixa um vácuo ou lacuna no ordenamento, em decorrência da retirada da lei do mundo jurídico 57.

Já quanto ao controle difuso, lembra Arruda que nos países onde não há a tradição dos precedentes judiciais, poderia se levar a divergências de decisões de tal forma que ocasionaria uma imensa insegurança jurídica, já que “a vinculação do juiz norte-americano às decisões da Suprema Corte não é simples conseqüência da probabilidade de que, resolvendo de outro modo, a sentença seja revogada, mas uma exigência essencial da função jurisdicional, pois se afastar dessas decisões é afastar-se do direito vigente” 58.

Entretanto, como bem conclui Paula Arruda, “o grande problema que precisamos enfrentar é: como adequar mecanismos de articulação entre os controles concentrado e difuso, buscando uniformização jurisprudencial no controle misto de constitucionalidade” 59.

Assim, como o controle híbrido ainda se apresenta de grande utilidade para países como o Brasil, a uniformização jurisprudencial seria necessária à harmonização do sistema misto, podendo tal uniformização ser facilmente alcançada desde que o Supremo Tribunal Federal assuma sua função de tribunal constitucional.

Porém, essa função para atingir seus objetivos deveria ser de tal forma que o exercício da jurisdição constitucional seria responsável pela interpretação e criação da dogmática constitucional no país, decidindo ou pronunciando-se em lides efetivamente

57ARRUDA, Paula. A articulação da jurisprudência no controle misto de constitucionalidade. Os casos de

Portugal e Brasil, in “Os atuais desafios da jurisdição constitucional, Paula Arruda (coord). Rio de Janeiro: Lumen Juris Editora. 2009. 45/52.

58

ARRUDA, Paula. A articulação da jurisprudência no controle misto de constitucionalidade. Os casos de Portugal e Brasil, in “Os atuais desafios da jurisdição constitucional, Paula Arruda (coord). Rio de Janeiro: Lumen Juris Editora. 2009. pg. 48/49

59 ARRUDA, Paula. Os atuais desafios da jurisdição constitucional, Paula Arruda (coord). Rio de Janeiro:

constitucionais, como acontece na Suprema Corte Norte-Americana e o Tribunal Federal Alemão.