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A avaliação de desempenho docente no contexto do processo de supervisão

PARTE I: QUADRO TEÓRICO-CONCETUAL

3.2 Supervisão pedagógica e melhoria

3.2.3 A avaliação de desempenho docente no contexto do processo de supervisão

Segundo Ana Passos (2008) os sistemas de avaliação de desempenho têm como objetivos: alinhar as atividades dos indivíduos pelos objetivos estratégicos da organização; melhorar o desempenho, a produtividade e a motivação; aumentar a sustentabilidade da organização; fornecer feedback e aconselhamento sobre desempenho e carreiras e decidir sobre recompensas.

113 Na organização – escola, a atividade do docente contextualiza-se na cultura da escola em que se insere, no Projeto Educativo da mesma, no Projeto de Trabalho do seu departamento ou área, no Plano Anual de Atividades da Escola e Projetos Curriculares das suas Turmas, bem como no currículo da(s) disciplina(s) que leciona.

Cada docente contribui, no âmbito do seu processo de desenvolvimento pessoal e profissional, para a consecução das metas fixadas no Projeto Educativo de Escola. Neste sentido a avaliação enquanto prática pedagógica, deve ser vista como estando ao serviço do seu desenvolvimento profissional e, consequentemente, da escola e dos seus alunos. Exige-se, hoje, aos professores um elevado grau de qualificações, solicitando-se-lhes que desempenhem tarefas de grande complexidade técnica e científica. É neste contexto que, desde 2001, se procura estabelecer um perfil de professor e, consequentemente, uma avaliação do desempenho do mesmo. O seu quadro legal sustenta-se nos seguintes normativos: Decreto-lei nº 240/01, de 30 de agosto, que estabelece o perfil do desempenho profissional do docente com base nos seguintes referenciais: dimensão profissional, social e ética; dimensão de desenvolvimento do ensino e da aprendizagem; dimensão de participação na escola e da relação com a comunidade e dimensão de desenvolvimento profissional ao longo da vida.

Considerando que avaliar o desempenho de um professor implica conhecer as suas práticas, observar, avaliar e interpretar a sua atividade profissional numa perspetiva construtiva e que conduza a melhorias efetivas, o Conselho Científico para a Avaliação de Professores (2010), ao incluir na “definição” do “ perfil profissional” de um docente as dimensões “profissional, social e ética”, de “desenvolvimento do ensino e da aprendizagem”, de “participação na escola e relação com a comunidade educativa” e de “desenvolvimento e formação profissional ao longo da vida” reforçou a essência dos princípios estruturantes que norteiam a ação de ensinar de todo o profissional de ensino: desenvolver a sua ação educativa no âmbito do aluno, da turma, da escola e da comunidade; desenvolvê-la num contexto de pluralismo cultural, de inclusão, de heteronímia e de transversalidade de saberes e assumir uma atitude de persistente abertura e adaptação à mudança, perdendo a nostalgia do “seu” tempo de aprendente, construindo elos interpares e buscando o que ainda há a saber.

114 Nesse sentido a avaliação de desempenho docente opera-se dentro do âmbito e da responsabilidade da instituição em que cada docente trabalha e centra-se no que constitui a dimensão fundamental da sua atividade enquanto profissional do ensino: por um lado, nos aspetos externos da atividade letiva – assiduidade, pontualidade e realização das avaliações definidas em setor ou departamento curricular, entre outros – por outro, nos aspetos internos daquela atividade – nomeadamente, rigor científico, pedagógico e didático dos conteúdos lecionados, estratégias utilizadas, processos e instrumentos de avaliação aplicados, utilização do reforço e relação pedagógica desenvolvida. Também o envolvimento nas atividades de complemento curricular, o grau e nível de participação nas reuniões dos órgãos de que faz parte e a cooperação e partilha de planificações, de materiais didáticos, ou outros, com colegas, constituem aspetos importantes que testemunham o seu envolvimento na vida da escola, passíveis de apreciação. Mais do que controlar – assegurar a ausência de efeitos negativos – a avaliação desemboca na formulação de um juízo global sobre o nível de qualidade da ação do docente que, embora necessário à progressão na carreira, é fundamental na medida em que propicia a reflexão e o repensar da prática pedagógica do docente e um estímulo ao seu desenvolvimento profissional.

É, igualmente, importante, ter em conta que avaliar é dar valor e não simplesmente classificar, aspeto não despiciendo na apreciação do já referido Decreto-lei nº 15/2007, de 19 de janeiro, que consagra os deveres gerais do pessoal docente (art.º 10º), o conteúdo funcional da atividade profissional do docente (art.º 35º) e os itens de classificação (art.º 45º), estabelecendo os parâmetros classificativos e indicadores para apreciação da atividade docente. Define, assim, o papel da avaliação na carreira contemplando os seguintes aspetos: uma estrutura piramidal; um ingresso e progressão sujeitos a avaliação; diferenciações funcionais e estatutárias relacionadas com o desempenho e uma avaliação e promoção ordenadas a critérios e variáveis de base local e o Decreto-regulamentar nº 2/2008, de 10 de janeiro, que cria o modelo de avaliação do desempenho dos docentes e define como objetivos da avaliação: a melhoria dos resultados escolares e das aprendizagens dos alunos; a definição de orientações relativas ao desenvolvimento pessoal e profissional dos docentes; a identificação do potencial de

115 evolução e desenvolvimento profissional do docente e o diagnóstico das necessidades de formação dos docentes. Como assinala Roldão (2012), até à publicação deste normativo a avaliação de desempenho docente assentava na apresentação, aos órgãos de direção das escolas, de um documento de reflexão crítica, sem qualquer “observação ou supervisão de aula e produzia resultados (…) com quase nula discriminação de níveis de desempenho, a não ser residual quando referente a casos extremos” (p. 13).

Neste quadro, institucionalizou-se uma visão rotineira da avaliação de desempenho docente em que perdurava uma situação de nivelamento das apreciações relativas ao desempenho dos professores quer no que respeita à ação pedagógica quer no que toca à formação contínua, o que não incentivava os docentes a procurarem respostas adequadas às mudanças exigidas à escola.

Dada a dificuldade em conciliar uma avaliação ao serviço do desenvolvimento profissional com uma avaliação orientada para a certificação, tendo em vista a progressão na carreira, o que, aliás, ficou bem patente no desagrado e, nalguns casos, na rejeição manifestados pelos professores aquando da sua implementação, é de evidenciar que

como argumenta De Ketele (2010) (…) o que a avaliação supõe não é emitir um ‘juízo’ sobre a pessoa do professor e os seus comportamentos nem sobre as suas práticas, mas sobre os efeitos das práticas. Através do diálogo crítico, a avaliação como exercício colaborativo de superVisão incidirá nas justificações e consequências da acção profissional a diversos níveis (…) (Vieira e Moreira, 2011, p. 22).

Assim, tratando-se a avaliação de desempenho docente de uma avaliação interpares e, tendo em conta os estilos supervisivos propostos por Glickman e colaboradores (2004), aquelas autoras sublinham a importância de recorrer ao estilo não-diretivo, bem como ao interesse de se poder problematizar e questionar quer o discurso do professor quer o discurso do supervisor ao longo de todo o processo, pois, no âmbito da avaliação de desempenho docente, a supervisão constitui, essencialmente, “uma estratégia de (inter)compreensão com o objectivo de analisar e renovar práticas” (Vieira e Moreira, 2011, p. 17).

116 A avaliação de desempenho docente, apesar de decisiva para a progressão na carreira, não pode limitar-se a constituir um simples procedimento administrativo de controlo, nem uma forma de moldar e uniformizar práticas de ensino, mas um mecanismo de estímulo à melhoria das práticas, de incentivo às mudanças julgadas positivas e ao desenvolvimento profissional.

Todavia, as primeiras conclusões alcançadas por Machado, Costa e Alves (2013) no âmbito do Projeto de investigação “Avaliação de desempenho docente: compreender a sua complexidade para a tomada de decisões fundamentadas na investigação” apontam para uma realidade bem diferente. Embora o 3º ciclo de avaliação (iniciado em 2012) não esteja concebido numa lógica de supervisão, pois a observação de aulas passou a ser opcional e a ser realizada por um avaliador externo, nos dois primeiros ciclos de avaliação - 2007/2009 e 2009/2011 - os modelos tinham como objetivos o desenvolvimento profissional dos professores e a melhoria dos resultados dos alunos, com base numa prática de avaliação formativa. No entanto, os professores participantes nos estudos de caso foram de opinião que a avaliação de desempenho docente se tornou num instrumento de controlo, que subvalorizou aspetos como: a participação dos professores, a autonomia, a autoavaliação, o trabalho colaborativo, a dimensão formativa da avaliação e a aprendizagem e avaliação dos alunos, não se tendo traduzido em melhorias no modo como se ensina. O ambiente de conflitualidade, então, gerado em muitas escolas, assentou em fatores decorrentes dos projetos de escola não sustentarem um processo de integração, coordenação e articulação da avaliação de desempenho, das lideranças não terem sido legitimadas pela formação, do processo de avaliação não ter resultado de uma construção participada, da inexistência de uma “cultura” de avaliação e, ainda, do facto de na construção dos instrumentos de registo se ter procurado um rigor que se revelou incongruente com a eficácia desejada.

Em contrapartida, os mesmos professores evidenciaram as vantagens da autoavaliação no seu desenvolvimento profissional, pois, ao implicar uma postura reflexiva e de questionamento sobre as respetivas práticas, foram conduzidos a uma introspeção que lhes permitiu identificar os aspetos positivos e as debilidades da sua ação educativa, e a

117 procurar soluções para as superar, factos que propiciaram o seu crescimento e desenvolvimento profissionais.

Sendo consensual a importância da autoavaliação, esta não substitui, contudo, as potencialidades da interação e do trabalho colaborativo, da abertura à crítica, à argumentação e à inovação que estes fomentam.