• Nenhum resultado encontrado

PARTE I: QUADRO TEÓRICO-CONCETUAL

1.2 Projeto Educativo

Enquanto documento orientador da ação da escola, o Projeto Educativo é um produto, ou seja, um instrumento de planificação que define e formula estratégias de gestão, e do qual derivam os planos operacionais de médio e de curto prazo. Simultaneamente constitui um processo, pois, diagnostica, prospetiva e decide o conjunto agregador de princípios, valores e políticas que orientarão a organização e o funcionamento da escola com vista a alcançar as metas a que a mesma se propôs.

As primeiras referências normativas ao Projeto Educativo remontam à publicação do Estatuto do Ensino Particular e Cooperativo - Decreto-Lei nº 553/80, de 21 de novembro - cujo nº 1 do artigo 33º refere: “Cada escola particular pode ter um projeto educativo próprio, desde que proporcione, em cada nível de ensino, uma formação global de valor equivalente à dos correspondentes níveis de ensino a cargo do Estado”. A 14 de outubro, com a Lei nº 46/86 que, como já referido, estabelece a Lei de Bases do Sistema Educativo, atribui-se aos vários intervenientes no processo educativo, a possibilidade de participarem na educação e gestão das escolas, nomeadamente, através da definição de normativos internos que espelhem o seu caráter próprio, bem como as suas especificidades. Mas, será no Decreto-Lei 43/89 de 3 de fevereiro (Regime Jurídico da Autonomia da Escola) que se equaciona o alargamento da autonomia dos estabelecimentos de ensino com a existência de um Projeto Educativo. Esta expressão surge, também, no Decreto-Lei 26/89 de 21 de janeiro que institui as Escolas Profissionais e, de forma bastante difusa, nos Despachos 141/ME/90 e 142/ME/90 que regulamentam, respetivamente, as “atividades de complemento curricular” e a “concretização da área-escola”. A importância concedida ao Projeto Educativo nos diplomas supracitados consolida-se no conteúdo normativo do Decreto-Lei 172/91 de 10 de maio, que define o Novo Modelo de Direção, Administração e Gestão dos Estabelecimentos de Educação Pré-escolar e dos Ensinos Básico e Secundário. No Despacho 113/ME/93, de 23 de junho, define-se Projeto Educativo como sendo: “(…) um instrumento aglutinador e orientador da ação educativa que esclarece as finalidades e funções da escola, inventaria os problemas e os modos possíveis da sua resolução,

53 pensa os recursos disponíveis e aqueles que podem ser mobilizados”. O Decreto-Lei nº 115-A/98, de 4 de maio que institui o regime de autonomia, refere no seu preâmbulo que: “(…) o reforço da autonomia (…) pressupõe o reconhecimento de que, mediante certas condições, as escolas podem gerir melhor os recursos educativos de forma consistente com o seu projeto educativo”. Recentemente, o Decreto-Lei nº 75/2008, de 22 de abril, identifica o projeto educativo como:

(…) o documento que consagra a orientação educativa do agrupamento de escolas ou da escola não agrupada, elaborado e aprovado pelos seus órgãos de administração e gestão (…), no qual se explicitam os princípios, os valores, as metas e as estratégias segundo os quais o agrupamento de escolas ou escola não agrupada se propõe cumprir a sua função educativa (alínea a do nº 1 do artigo 9º).

Refletindo as escolas católicas, de modo particular, a presença da Igreja no meio escolar, elas possuem características próprias e, mesmo em relação às que não lhe são exclusivas, têm motivações e referências que as diferenciam das demais. Apresentam-se como um espaço educativo assente numa proposta de evidente matriz evangélica, e com um projeto educativo norteado pela “síntese entre cultura e fé e entre fé e vida” (SCEC, 1977, nº 37), e em que os valores de referência valorizam a promoção integral da pessoa e se radicam e se inspiram em Jesus Cristo e no Evangelho, como última instância de avaliação e de crítica (CEP, 1978, nº 8-17). Ao identificar, claramente, a matriz cultural da instituição e os quadros de valores estruturantes da mesma, o Projeto Educativo fornece consistência e sentido a todas as práticas desenvolvidas na instituição e permite que aqueles valores prevaleçam sobre o subjetivismo cultural de cada educador. Cada docente pode ser o testemunho desta escola católica na aula, na maneira como se relaciona com os seus aprendentes, como aborda as diferentes matérias da disciplina que leciona, como revela as possibilidades daquelas poderem manter “a criação ao serviço da felicidade do homem” (CEP, 1978, nº 9), como testemunha valores e lhes sugere atitudes do quotidiano, importantes na estruturação da sua personalidade. Uma das matrizes fundamentais é a ética do cuidado. O cuidado na instrução é o amor, fundamental nas escolas católicas.

54 Assim, os bispos portugueses baseados em documentos papais, documentos conciliares e notas pastorais que realçam o valor das escolas católicas apontam, também, para a importância destas disporem de um projeto educativo que, embora atendendo aos condicionalismos culturais dos nossos tempos, se inspire no Evangelho, que coloque Jesus Cristo no centro da ação educativa como fundamento, paradigma e exemplo de vida, e que contribua para tornar os jovens “cidadãos responsáveis e cristãos realizados e conscientes” (SNEC, 1983, p. 5). Nesse sentido, considera tratar-se o projeto educativo de um “projecto global, bem definido, que visa fins específicos e deve ser realizado com a colaboração de todos os intervenientes” (SCEC, 1989, nº 100).

A Igreja vê, pois, a Escola Católica como uma instituição assente num ideário e num projeto educativo específicos, absolutamente necessária em qualquer país com um passado histórico cristão. Considera-a o ambiente mais propício para o desenvolvimento harmonioso e integral da pessoa humana, isto porque, ter em conta a complexidade da pessoa humana implica privilegiar a sua educação integral, ou seja, preocupar-se com o desenvolvimento equilibrado de todas as dimensões do ser humano: física, intelectual, social, estética, ética, moral, afetiva, religiosa e espiritual. É importante que promova o cuidado com o corpo que conduz a uma vida sã. Lugar de aprendizagem por excelência - dos conhecimentos específicos das diferentes disciplinas, do património cultural e de experiências de vida – é uma escola orientada para a aprendizagem, que assegura a aquisição do mesmo conjunto de conhecimentos por parte de todos os alunos, que fomenta neles a aprendizagem do estudo e do trabalho (autónomo, em grupo e cooperativo) e que os consciencialize para a necessidade de sujeitarem as informações colhidas noutras fontes, nomeadamente, nos meios de comunicação social, a um “juízo crítico pessoal, a ordená-las em boas sínteses e a integrá-las na sua cultura humana e cristã” (SCEC, 1977, nº 48). Consciente de que, quando adultos, os seus alunos passarão a tomar parte das responsabilidades da sociedade a que pertencem, a escola católica procura não descurar o desenvolvimento das suas competências sociais, convocando-os a escutarem, a dialogarem, a argumentarem, a refletirem e a criticarem de forma construtiva. Pelo estímulo dos valores estéticos, abre caminho para a educação da sensibilidade refletida na delicadeza e respeito na utilização dos objetos, bem como no

55 relacionamento com os outros e com o meio ambiente. O despertar para os valores éticos e morais, tais como a responsabilidade, a tolerância, a justiça e a solidariedade, visa a formação de uma estrutura interior autónoma, quer pelo exercício da inteligência e pelo treino da vontade, quer pelo domínio dos impulsos. Pela afetividade procura desenvolver a prática da participação e da partilha, numa perspetiva de fraternidade e de comunhão. Com a dimensão religiosa procura conduzi-los à definição de um projeto de vida assente nos valores cristãos sobre os quais poderão alicerçar uma vida com sentido e com futuro. Pelos valores evangélicos, alicerces de um verdadeiro humanismo, os jovens, sujeitos principais do processo educativo, poderão evoluir enquanto pessoas e crescer no dom da fé que receberam no batismo, de modo a que ela ilumine o conhecimento que, gradualmente, vão adquirindo sobre o mundo, a vida e o homem e lhes desenvolva a capacidade de admirar, de intuir, de contemplar. Deseja-se que nas escolas católicas eles cresçam num contexto relacional e se tornem capazes de participar e partilhar numa perspetiva de fraternidade e de comunhão, na construção do mundo e no progresso da sociedade de acordo com o projeto de Deus. Por fim, e não menos importante que as já mencionadas, julga fundamental despertar e fazer crescer nos jovens a dimensão da espiritualidade, levando-os a questionarem-se como a vivem nestes tempos marcados pelo comodismo, pela relativização da verdade, pela sede da satisfação imediata, pela alienação do consumo e pela reação negativa a regras e a qualquer forma de autoridade. A Igreja encara, pois, a educação como

o percurso da personalização, e não apenas socialização e formação para a cidadania. A educação autêntica é a educação integral da pessoa. Isto exige promoção dos valores espirituais, estruturação hierárquica de saberes e de valores, integração do saber científico-tecnológico num saber cultural mais vasto, mais abrangente e mais englobante. Exige igualmente partilha dos bens culturais e democratização no acesso aos conhecimentos, aos saberes científicos e competências tecnológicas, que são património comum da humanidade. Exige ainda promoção do homem-pessoa em recusa do homem-objecto de mercado, rejeição de todas as formas de alienação do ser humano, defesa do primado da solidariedade e da fraternidade sobre o interesse egoísta e a competição desenfreada (CEP, 2008, nº5).

56