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A classificação do acervo do CESIMA

CAPÍTULO 3: CLASSIFICAÇÃO E CIÊNCIA

3.6 A classificação do acervo do CESIMA

A necessidade de classificar o acervo do CESIMA de uma forma adequada às suas características resultou numa série questionamentos teóricos, discutidos no capítulo anterior. A partir daí, chegou-se à conclusão de que nenhum dos sistemas disponíveis apresentava as condições necessárias para classificar o corpus de uma área interdisciplinar como a História da Ciência.

Assim, foi realizado um estudo para verificar se algum desses sistemas poderia ser adaptado às necessidades da História da Ciência. Dos sistemas elencados no presente capítulo, pretendia-se, em primeiro lugar, que o escolhido fosse de fácil compreensão para o amplo leque de áreas e, portanto, de interesses de pesquisa particulares e de tantos outros potenciais pesquisadores. Ao mesmo tempo, foi levada em conta a discussão contemporânea sobre o estatuto da multi- ou interdisciplinaridade nas principais agências de fomento (CAPES e CNPq).

Inicialmente, arriscou-se um exercício similar ao do sistema de classificação da Library of Congress, isto é, a tentativa de adaptar a CDU com o acréscimo de caracteres alfabéticos, a fim de, assim, cobrir as áreas da coleção nuclear do acervo do CESIMA. A realização desse exercício na prática, discutido com pesquisadores do IBICT, confirmou o total descontrole dimensional que essa proposta acarretaria.

Quanto à Colon Classification, os motivos para descartá-la foram a complexidade da composição da notação e a parca aplicação em bibliotecas nacionais e internacionais.

A adoção da CDU - com a apropriação da classe 4 para a área Multidisciplinar, e consequente atribuição 40 para a História da Ciência e combinações com extensões da tabela CDU para as subáreas que compõem a coleção nuclear do CESIMA - nos apresentou, em alguns casos, uma notação bastante extensa, o que podemos declarar ser uma inquietação. Como item a ser considerado para também agregar valor à nossa escolha, mencionamos a possibilidade de a área comportar, em sua proposta de sistema de classificação universal, as áreas e subáreas que “surgirem” no futuro na área multi- ou interdisciplinar.

Em síntese, optou-se pela adoção do Sistema de Classificação Decimal Universal (CDU) pelos seguintes motivos: 1) a classe 4 está disponível para futuras expansões da CDU; 2) flexibilidade, resultando em constante atualização; 3) modelo universal; 4) sistema numérico de fácil utilização tanto por especialistas quanto por leigos; 5) possibilidade de alocar estudos multi- ou interdisciplinares sem precisar de os subordinar a qualquer de suas áreas de interface nem emprestar a identidade delas.

Como mencionado acima, a primeira parte da presente pesquisa consistiu em definir a coleção nuclear (“core collection”) dos documentos que compõem o acervo do CESIMA, agrupando-os em áreas (Quadro 12).

Quadro 12. Divisão em áreas do acervo do CESIMA

1. Origens da ciência moderna

 Toda ciência gerada até o século XVII  Fontes

 Documentos  Iconografia  Ciência da matéria

 Naturalistas e relatos de viagens  História da Ciência e da técnica 2. Ciência colonial e primeira modernidade

 Iconografia  Ciência da matéria

 Naturalistas e relatos de viagem  Ciências da vida

 História da Ciência e da técnica 3. Institucionalização e ciência contemporânea  Corpos institucionais da ciência  Iconografia

 História da Ciência e técnica  Ciência da matéria

 Política científica e tecnológica  Ciência institucional

- Moderna e contemporânea (laboratório)

Para proceder à classificação dessa coleção nuclear, é necessário fazer uma leitura técnica específica: 1) a folha de rosto informa sobre título e subtítulo; 2) o prefácio e/ou a introdução, via de regra, informam sobre o objetivo e o assunto do livro; 3) segue uma análise de conteúdo tópico-específica, visando à compreensão do assunto em geral, vale dizer, uma visão de conjunto; 4) a bibliografia citada permite a correlação da obra em questão com outras

similares; 5) desse modo, é possível procurar pela classe que mais satisfaz as exigências do assunto, começando a classificação pelo assunto mais abrangente.

A esse respeito, deve-se enfatizar, mais uma vez, que o primeiro critério de classificação é o assunto, seguido pela forma ou local. Uma situação bem mais complexa aparece quando há vários assuntos, ou a partir das relações entre eles, devendo-se determinar em que consiste essa relação.

Sobre a base da coleção nuclear do acervo do CESIMA, foi, então, aplicado o sistema da CDU, conforme ilustrado nos seguintes exemplos:

 Origens da ciência moderna 40.001”712.3”+”654” ou 40.50”712.3”+”654

Em que: 4 Multidisciplinar 40 História da Ciência

001 Ciência e conhecimento em geral / 50 Ciências puras

“713.3” Início. Tempo de origem. Geração. Criação. Incipiente. Embrionário. Incipiente (Tabela auxiliar de tempo).

“654” Tempos modernos (Renascimento até a época contemporânea)  .001.32 Fontes Fonte, origem, procedência (Auxiliar de ponto de vista)

(093) Fonte histórica (093.3) Fonte literária

165.1 Condições, fontes, espécies de conhecimento (epistemologia)

 002 Documentos Documentação, livros, escritos, autoria

 7.04 Iconografia Temas de representação artística. Iconografia. Iconologia.

 Relatos de viagem e viajantes

(047.2) Relatórios de viagem (comerciais, de estudo, etc.) – auxiliar comum de forma -057.68 Turistas viajantes em geral, passageiros, pessoas que viajam por razões diferentes de trabalho – auxiliar comum de pessoas e características de pessoas

 História da Ciência e da técnica 40.956

Aonde, 4 Multidisciplinar 40 História da Ciência 9 História 50 Ciências puras 6 Tecnologia  Institucionalização da ciência 450.316.334 Em que: 4 Multidisciplinar 40 História da Ciência 316 Sociologia

316.334 Instituições sociológicas (subsistemas e instituições)

 Ciência colonial 40.50(=1-5) ou 40.325

40 História da Ciência 50 Ciências puras

(=1-5) Raças e povo colonizados (Auxiliar comum de raça, grupos étnicos, nacionalidade)

325.36 Impérios coloniais. Imperialismo colonial. Federalismo colonial 325 Abertura de territórios

O que ainda pode ser suplementado, à guisa de informação complementar, por 469 Portugal

81 Brasil

 Ciência na primeira modernidade 40.50”654” ou 40.50*1ªmodernidade.

Em que: 4 Multidisciplinar 40 História da Ciência 50 Ciência pura “654” Tempos modernos  Ciência imperial 40.50.342.36 Aonde, 4 Multidisciplinar 40 História da Ciência 50 Ciência pura

342 .36 Monarquia absoluta. Reinado. Império. Legitismo.

 Ciências da vida 40.612.013

40 História da Ciência

6 Ciências aplicadas. Medicina. Tecnologia. 612 Fisiologia. Fisiologia humana e comparada 612.013 Vida. Morte. Vitalismo.

Procedendo-se desse modo, foi possível classificar a coleção nuclear do acervo do CESIMA como descrito no Quadro 13.

Quadro 13. Classificação do acervo do CESIMA (com ocupação da classe 4)

4 MULTIDISCIPLINAR 40 História da Ciência Origens da ciência moderna

Toda ciência gerada até o século XVII Fontes

Documentos Iconografia Ciência da matéria

Naturalistas e relatos de viagens História da Ciência e da técnica

40.001.32.”654” 40.001.”7123+16” 40.165.1.”654” 40.002.”654” 40.27-526.62”654” 40.001.577.”654” 40.656.052.59.”654” 40.462.”654”

Ciência colonial e primeira modernidade Iconografia

Ciência da matéria

Naturalistas e relatos de viagem Ciências da vida

História da Ciência e da técnica

40.001.325.36*1ªModernidade 40.27‒26.623.325.36*1ªModernidade 40.001.557.325.36*1ªModernidade 40.656.052.59*1ªModernidade 40.001.573*1ªModernidade 40.462*1ªModernidade Institucionalização e ciência contemporânea

Corpos institucionais da ciência Iconografia

História da Ciência e técnica Ciência da matéria

Política científica e tecnológica

40.165.611+001.”19” 40.001.316.331.”19” 40.27-526.62,”19” 40.462.”19” 40.001.577.”19” 40.32-029:5/6.”19”

Ciência institucional

- Moderna e contemporânea (laboratório)

40.001.165.611.”19” 40.001.”654+19”

CONCLUSÃO

Nos últimos anos, a persistência de um discurso sobre a diluição das fronteiras entre as áreas do conhecimento – sua integração e consequente interface, ou ainda a geração de campos inéditos e independentes – tem despertado grandes dúvidas, relativas tanto à forma quanto ao futuro dessas novas pesquisas. Sem nenhuma pretensão de resolvê-las, a pequena reflexão que se segue levanta brevemente dois, entre os vários, problemas que incidiram, e incidem, sobre a pesquisa moderna e deverão continuar a incidir seja qual for o novo cenário.

Naturalmente, não se trata aqui de assumir, leviana e anacronicamente, o conceito de pesquisa fora de sua conotação moderna e, mais ainda, contemporânea – algo que nos levaria as nada recomendáveis consequências das histórias “pedigree” em que, erroneamente, são transportados padrões próprios ao contexto institucional e atual da ciência para épocas anteriores, cujas condições eram muito distintas130.

Portanto, falar em pesquisa moderna será, antes de tudo, verificar as condições (ou, mais precisamente, os parâmetros) que a definiram como tal, tornando-a diferente das formas de estudo e averiguação anteriores. Conforme já esperado, a segunda instância de problemas verificada por nós refere-se à evolução das áreas do conhecimento que, embora se manifeste agora de forma mais aguda, sempre esteve no horizonte da pesquisa moderna. Em ambos os casos, seguimos uma perspectiva histórica, através da qual foi possível delinear melhor o compasso da pesquisa, especialmente no Brasil.

Facilmente encontrados na maioria dos editais de fomento, os parâmetros que definem a pesquisa moderna quase nunca se restringem à boa qualidade de seus estudos. Não raro, espera-se que a pesquisa mantenha fortes vínculos institucionais, garantidores de seu pleno

130 A expressão história “pedigree” foi cunhada por E. Pérez Sedeño para definir uma das muitas formas de

discurso anacrônico em História da Ciência. Com frequência, esse tipo de discurso tem fins utilitaristas e, não raro, nacionalistas. Para mais detalhes, vide: E. Pérez Sedeño, “Ciência, Valores e Guerra na Perspectiva CTS”, 201-226.

desenvolvimento; ajude a estabelecer (isto é, estabelecida por) uma equipe, enquanto suporte e escola de seus trabalhos; multiplique e aprimore seus resultados, através de sua exposição externa (comunicação/compartilhamento/publicação).

Pensados para constituir um sistema estável e capaz de alimentar a crescente institucionalização da ciência, durante o século XIX, esses parâmetros rapidamente tornaram- se sinônimo do que se esperava de qualquer pesquisa de nível internacional. Embora originados em centros dedicados às ciências da vida ou aos estudos de física, matemática e química, num piscar de olhos, esses parâmetros foram assumidos nas mais diversas vertentes do conhecimento. E, uma vez que pressupunham a formação e a multiplicação de comunidades de pesquisadores, não demorou muito para que se tornassem basilares ao desenvolvimento do binômio fomento-avaliação131.

Nesse novo marco, setores que originalmente nasceram separados, como universidades, indústrias e sociedades científicas, passaram a formar interfaces. Sobretudo em lugares como o Reino Unido e a Alemanha – em seguida, acompanhados de perto pela França e os Estados Unidos – essas interfaces foram palpáveis. Lugares que, ao longo dos 1800s, tiveram em comum não só transformações e/ou expansões geopolíticas radicais, crescimento industrial acelerado e mudanças estruturais na educação, como também o desenvolvimento inédito das ciências num contexto institucional.132

Afora as páginas das utopias seiscentistas ou aquelas das histórias “pedigree” – que enxergam coisas onde elas ainda não existem – o processo de institucionalização das ciências apenas aconteceu quando foram criadas as condições próprias para sua manutenção e seu reconhecimento social. Seria muito longo e cansativo discorrermos aqui sobre como se deu a mobilização de diversos setores para obter tais condições em cada um dos lugares acima

131

Vide: OSIRIS. Philadelphia: Department of History and Sociology of Science, University of Pennsylvania 5 (1989) e 8 (1993); OSIRIS Washington: BMW Center for German & European Studies, 17 (2002).

132

Vide: Waisse-Priven, d & D: duplo Dilema. du Bois-Reymond e Driesch, ou a vitalidade do Vitalismo; Waisse-Priven, & Ana M. Alfonso-Goldfarb, “Mathematics Ab Ovo: Hans Driesch and Entwicklungsmechanik”.

mencionados. Grosso modo, é possível dizer que, com algumas variantes, essas condições se estabeleceram a partir da difícil combinação de quatro componentes. Conhecidos e reconhecidos até hoje, esses componentes seriam: ensino, pesquisa, divulgação e aplicação. Os dois primeiros, combinados entre si, formariam um corpo único e mais interno à ciência. Enquanto os dois últimos constituiriam uma combinação múltipla de setores distintos ou mesmo externos à ciência. Mas, em qualquer dos dois casos, deve existir um constante processo de retroalimentação, da forma já indicada acima, no caso específico da pesquisa133.

Se assim for (e tudo aponta para esta conclusão), o processo de institucionalização da ciência brasileira pode ser considerado um tanto tardio. Sem prelos ou escolas superiores até o início do século XIX, sem universidades e com magra industrialização até as primeiras décadas do século XX. Em nosso país, o binômio fomento/avaliação teve seu início oficial há pouco mais de meio século. Esse quadro histórico, nada luminoso, levou a historiografia tradicional sobre a ciência brasileira a considerá-la um mero esboço, ou simples cópia, da ciência internacional134.

Para sermos mais precisos, ainda há vinte anos, um grande periódico internacional dava voz às melancólicas reclamações de nossos pesquisadores sobre os excessos de burocracia e problemas de fomento e avaliação, causados por uma tradição científica mal-ajambrada e mal- adaptada às questões brasileiras. Infelizmente, essa triste matéria foi motivo de capa.135 Contraditoriamente, porém, muitos dos estudiosos responsáveis por essa historiografia derrotista e sem perspectivas foram também responsáveis pelo desenvolvimento de grandes centros e instituições em que nossa ciência adquire hoje destaque internacional.

Mais otimista que a maioria dos cientistas de sua geração, Mário Schenberg costumava dizer que a falta de condições, tradicional na história do progresso da pesquisa brasileira,

133 Vide: Ana M. Alfonso-Goldfarb, & Márcia H. M. Ferraz, “Raízes Históricas da Difícil Equação Institucional

da Ciência no Brasil”.

134 Um dos exemplos mais notáveis encontra-se em Azevedo, A Cultura Brasileira. 135 A. Anderson, “Science in Brazil”.

sempre foi suprida pelo excesso de talento de nossos pesquisadores. Se assim for (e assim parece ter sido), apesar da institucionalização um tanto recente de nossa pesquisa, por caminhos e roteiros muito especiais, nossos pesquisadores vêm se preparando para dar um novo rumo à velha história. Mesmo que a combinação dos componentes, necessários ao bom trabalho científico, ainda não tenha chegado a medidas ideais, a pesquisa brasileira tem dado mostras de pujança e originalidade, e tem recebido um crescente apoio institucional. Basta conferir a literatura nacional ou estrangeira para notar sensíveis mudanças no histórico da pesquisa brasileira.

No entanto, nossa experiência ainda recente em lidar com o binômio fomento/avaliação faz persistir a segunda questão levantada. Frente às múltiplas possibilidades geradas pelas novas divisões das áreas do conhecimento, como evitar a reprodução dos desvios e equívocos (cometidos até por equipes internacionais mais experientes) em sua avaliação?

Não restam dúvidas de que a compreensão do debate atual a respeito das áreas do saber, como discutido na presente tese, é fundamental para todos os interessados no mapeamento e avaliação de novas áreas. Se assim for (e assim parece ser), os estudiosos do nosso país – outra vez, como no caso da institucionalização – ingressam nesse debate com uma defasagem histórica. O motivo para que isso aconteça é simples: não houve qualquer participação brasileira no debate sobre o crescente emaranhado de divisões nas áreas do conhecimento até quase meados do século XX. Essa inexistência de manifestações é garantida pelo fato de não ter surgido até essa data qualquer projeto enciclopédico brasileiro.

Decorrência natural para quem estivesse a par desse debate e soubesse das necessidades e características de nosso país, o primeiro projeto desse tipo somente aconteceria quase no final dos anos 1930, realizado por, ninguém mais, ninguém menos que Mário de Andrade. Assumido por ele durante seu “exílio carioca”, entre os anos 1939 e 1940, esse projeto se baseava em cuidadosas observações feitas por ele de quais modelos enciclopédicos melhor

serviriam para uma adaptação brasileira. Essa escolha, largamente fundamentada em seu projeto, recaiu sobre duas enciclopédias de cunho bem diferente. Uma delas seria a britânica, devido a bem argumentada discussão filosófica ali existente, sobre quais fossem os objetos próprios a cada campo. Enquanto a segunda escolha seria a enciclopédia italiana, por combinar uma boa divisão temática, historicamente definida.

Exemplos de verbetes que fariam parte dessa enciclopédia permitem notar o bom conhecimento no manejo das divisões das áreas e temática internacionais, instrumentalizadas por ele para questões brasileiras. Publicado ainda em 1940, esse belo projeto de Mário de Andrade, infelizmente, nunca foi levado adiante.136

Outra enciclopédia planejada no Brasil (embora não exclusivamente com enfoque em temas brasileiros) foi a de Alarico Silveira. O autor teria dedicado anos de trabalho ao desenvolvimento do projeto, mas somente o primeiro volume dessa enciclopédia foi publicado em 1958. É preciso lembrar, ainda, dois projetos de cunho comercial e simples tradução de enciclopédias estrangeiras para o português. O primeiro foi o da Grande

Enciclopédia Portuguesa e Brasileira, que reproduz, de forma parcial, a montagem da

Britannica e levou 24 anos (de 1936 a 1960) para ser publicada. O segundo foi o projeto da

Enciclopédia Mirador Universal, cópia simplificada da Britannica, publicada em 1970. A partir desses precedentes históricos, não seria exagero concluir que nossa participação no difícil, mas indispensável, debate sobre as áreas do conhecimento foi esporádico e reduzido a poucos e esforçados indivíduos e, portanto, sem grandes resultados. Inclusive, as únicas consequências foram negativas.

Durante boa parte do século XX, a falta de uma inserção minimamente institucional no processo de transformações das áreas do conhecimento nos levou a assumir, sem nenhuma discussão, modelos externos, mal compreendidos e até mal adaptados às nossas necessidades.

Basta lembrar o que vimos há pouco: as únicas publicações de material enciclopédico que vingaram em nosso país, até pelo menos o último quartel do século XX, foram meras cópias simplificadas de edições estrangeiras. Ficaria, assim, patente a falta de condições para o desenvolvimento de parâmetros que nos levassem a entender, desde uma perspectiva própria, a constante e enorme evolução das fronteiras entre os conhecimentos. A falta de vivência histórica para lidar com esse processo, combinado a nossa, ainda recente, experiência institucional em pesquisa pode trazer resultados nada agradáveis.

De tal sorte que, embora os esforços conjuntos das agências de fomento e da comunidade científica para mapear as áreas do saber tenham sido enormes nos últimos anos, existem questões que ainda merecem muita atenção.

Observa-se, por exemplo, através de uma análise acurada das novas tabelas em ciência e técnica, que ainda ficam dúvidas sobre a divisão dos conhecimentos, quer seja em relação às grandes áreas e suas subáreas ou, sobretudo, àquelas constituídas por interfaces, como as multidisciplinares ou as nascidas nas “franjas” das grandes áreas.

Outro exemplo do problema atual, imposto pela constante e complexa evolução das áreas do conhecimento, reflete-se na dificuldade de estabelecer tabelas comuns às várias agências de fomento. Apesar de o constructo da Tabela de Áreas do Conhecimento se dar de forma conjunta, a aplicação deste é feita a partir de adaptações da versão acordada. A última tentativa de debater e concretizar essa proposta deu-se em 2004, promovida pelo CNPq, com o apoio da CAPES, das FAPs e das sociedades científicas, parece não ter trazido os resultados esperados. Assim, cada centro, órgão de apoio/avaliação/fomento continua a seguir sua própria tabela, criando muitas vezes situações contraditórias e imprevistas137.

Derivam, ainda, das questões classificatórias acima levantadas, várias outras questões, como o gerenciamento (a quem cabe/como será feito) de novas áreas ou a pertinência delas.

137Ver: http://www.capes.gov.br/avaliacao/tabela-de-areas-de-conhecimento;

E, da mesma forma, a questão da avaliação das interações entre campos do conhecimento ou reconhecimento daqueles que se fundiram ou dividem objetos comuns.

É visível, portanto, a necessidade de um grande debate em busca de definições (por mais complexas que elas sejam) que contemplem as necessidades regionais e nacionais, que se insiram no panorama nacional com critérios claramente estabelecidos. A discussão desses critérios poderia se tornar o centro definidor de novos campos.

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