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A cobertura de acontecimentos: alguns

No documento Elementos de jornalismo impresso (páginas 79-85)

1.6 Fontes de informação

1.6.4 A cobertura de acontecimentos: alguns

Vários acontecimentos são de cobertura comum. São os casos de acidentes, manifestações, conferências de imprensa, julgamentos importantes, etc. Tendo em conta que este manual se destina a candidatos a jornalistas, podem ser dados alguns conselhos sobre a cobertura rotineira desses acontecimentos. No entanto, é pre- ciso salientar que muitas vezes aquilo que interessa é encontrar um ângulo diferente de contar a história, precisamente para fu- gir às rotinas e encontrar formas mais eficazes de fazer passar a informação.

Acidentes, incêndios e acontecimentos simila-

res

A pesquisa sugere que os jornalistas tendem a elaborar as no- tícias sobre os acidentes, incêndios e acontecimentos semelhantes com base num elenco de detalhes que a maior parte das pessoas esquece. (Bird e Dardenne, 1988; Keeble, 1998: 131) Segundo Keeble (1998: 131), este tipo de cobertura contribui para dar uma imagem do mundo como sendo um local de sofrimento, tragédia e potencial heroísmo (dos bombeiros e outros salvadores). Há, portanto, que procurar ângulos alternativos de contar a história.

Quais são os conselhos que se podem, então, dar para a cober- tura de acidentes, incêndios e acontecimentos similares?

• Explorar o interesse humano da notícia, nomeadamente as consequências para as pessoas envolvidas e suas famílias: "dois operários morreram devido a uma explosão numa ofi- cina de pirotecnia"é melhor do que "uma explosão numa oficina de pirotecnia matou dois operários";

• Ser específico: "queimaduras"é diferente de "ferimentos"; "sete feridos"é diferente de "muitos feridos";

• Não esquecer de responder a "quem?", "quando?", "onde?", "como?"e "porquê?"; relatar causas e consequências é im- portante;

• Contactar fontes que possam fornecer informações: polí- cia, bombeiros, médicos do serviço de emergência, teste- munhas, sobreviventes, donos das propriedades atingidas, etc.; as citações dão vida à notícia e conferem-lhe credibili- dade;

• Actualizar as notícias, se necessário;

• Ponderar bem se é necessário identificar as vítimas e referir os locais onde residem ou residiam, nomeadamente quando

são menores de idade; por vezes, bastará dizer "dois jovens da Guarda"do que referenciar as suas identidades.

Manifestações, comícios e protestos

Na cobertura de uma manifestação, de um comício, de greves ou noutro tipo de protestos públicos há que:

• Dizer quantas pessoas estão envolvidas, ouvindo as par- tes interessadas (os números dos sindicatos, por exemplo, nunca coincidem com o número da entidade patronal); • Quando se trata da notícia de uma manifestação, referir o

percurso que esta fez ou vai fazer;

• Observar, com cautela, o grupo de manifestantes, tomando nota de cartazes com frases interessantes, cenas caricatas, gestos ameaçadores, afirmações provocatórias e de tudo o que possa servir para adicionar interesse e cor à notícia; • Nas grandes manifestações e comícios, identificar a prove-

niência dos diferentes grupos de manifestantes;

• Se nos comícios ou nas manifestações forem feitas inter- venções, anotar os aspectos mais significativos dos discur- sos (embora, geralmente, os discursos sejam distribuídos à imprensa);

• Anotar as respostas da audiência aos discursos;

• Na notícia, relembrar a conjuntura que levou ao protesto, ao comício ou à manifestação;

• Evitar estereótipos;

• Não é preciso citar todas as pessoas que discursam nem fazê-lo por ordem cronológica; é preciso, sim, referir o mais importante do que foi dito, preferencialmente por ordem de importância.

• Não é preciso enfatizar aquilo que os organizadores do evento enfatizam, mas sim aquilo a que o jornalista dá mais impor- tância, à luz de critérios de noticiabilidade claros e transpa- rentes;

• Ter cuidado para não fazer uma cobertura sensacionalista do evento, nomeadamente se a violência irromper; neste caso, ouvir sempre as partes que estiveram em confronto. •

Conferências de imprensa (entrevistas colecti-

vas) e discursos

As conferências de imprensa geralmente têm duas partes. Num primeiro tempo, os conferencistas falam e os jornalistas ouvem. Os conferencistas não devem ser interrompidos. Num segundo tempo, os conferencistas respondem às perguntas dos jornalistas. Nestas ocasiões, há que ter em mente que para se perguntar bem, há que dominar o assunto. Normalmente, as perguntas geram res- postas mais interessantes do que os discursos de abertura.

Uma conferência de imprensa pode ter apenas a primeira parte. Os conferencistas podem não permitir as perguntas dos jornalis- tas. Em casos ainda mais raros, poderá ter apenas a segunda parte, isto é, a sessão de perguntas e respostas, sem introdução inicial. Mas estas são as excepções que confirmam a regra.

Um jornalista deve procurar documentar-se sobre o tema da conferência de imprensa, ainda que tenha pouco tempo. Pelo me- nos, poderá tentar, se tiver tempo, interrogar as chefias e editores sobre as questões a colocar aos conferencistas.

O jornalista, numa conferência de imprensa, tanto pode apro- veitar as respostas que o conferencista dá às suas perguntas como as respostas dadas aos seus colegas.

Normalmente, depois da conferência de imprensa terminar ou antes de se iniciar, os discursos de abertura dos conferencistas são distribuídos à imprensa. Em todo o caso, é conveniente o jornalista anotar os excertos mais importantes e as frases mais significativas dos discursos enquanto os ouve. Pode acontecer que

a organização não forneça os discursos aos jornalistas. Também pode suceder que o discurso seja excessivamente longo, o que levaria o jornalista a perder demasiado tempo a ler e a encontrar as partes que lhe interessam para a notícia.

Tal como no caso de comícios, manifestações e similares, o jornalista não precisa de citar todas as pessoas que discursam numa conferência de imprensa nem fazê-lo por ordem cronoló- gica. É preciso, sim, referir o mais importante do que foi dito, preferencialmente por ordem de importância. Do mesmo modo, não é preciso enfatizar aquilo que os organizadores da conferên- cia de imprensa enfatizam, mas sim aquilo a que o jornalista dá mais importância, à luz de critérios de noticiabilidade claros e transparentes.

Quando os conferencistas são irónicos e provocam o riso, o jornalista deve estar atento para não perder o crucial da conferên- cia. Nestas circunstâncias, é fácil para um jornalista distrair-se com o discurso e esquecer a sua missão. Também tem de ter cui- dado para que a simpatia que possa sentir pelo conferencista não se imiscua na notícia.

O jornalista pode aproveitar a conferência de imprensa para fazer contactos, combinar entrevistas exclusivas, etc., de forma a conseguir informações que lhe permitam bater a concorrência e tratar a história com mais profundidade.

As conferências de imprensa são sempre eventos onde se pro- cura persuadir os jornalistas de alguma coisa. É preciso cuidado e usar a dúvida metódica. O jornalista deve interrogar-se sempre sobre "o que é que eles me querem vender?", porque aquilo que "venderem"ao jornalista também podem "vender"ao público.

Os discursos devem ser cobertos tendo em conta o que foi dito sobre a primeira parte das conferências de imprensa e sobre a cobertura de comícios e manifestações, especialmente no que respeita ao registo das partes mais importantes dos mesmos, das reacções da audiência e da "cor local".

Tribunais e polícia

Geralmente os jornalistas têm poucos contactos com os tri- bunais, embora tenham muitos com a polícia. Mas os tribunais podem ser excelentes locais para encontrar histórias de grande in- teresse humano (registem-se, por exemplo, as crónicas Levante-se

o Réu, do Público).

A linguagem técnica dos juristas costuma ser um dos princi- pais obstáculos que o jornalista tem de enfrentar nos tribunais. Convém, portanto, que o jornalista que cobre tribunais (ou polí- cia) tenha algumas luzes de direito.

Num julgamento, as partes mais importantes são a abertura e o encerramento. O encerramento é crucial, porque é aí que é conhecida a sentença.

Alguns conselhos que podem ser dados para a cobertura de julgamentos são os seguintes:

• Anotar todos os factos pertinentes, quer no que respeita ao julgamento, quer no que respeita aos factos que suscitaram o julgamento, nomeadamente nomes, lugares, horas, trajec- tos, etc.;

• Anotar os comentários mais importantes, para citação pos- terior na notícia;

• As alegações dos advogados e os comentários do juiz à sen- tença podem ser o coração da história;

• Evitar o jargão legal;

• Um suspeito só é criminoso depois de a sentença transitar em julgado; deve ser-se cuidadoso ao escrever-se a história, para se evitarem erros e até ilegalidades;

• Na cobertura de um julgamento que demore vários dias, deve ir-se actualizando a história;

• Contrastar as fontes e os argumentos de defesa e acusação: a peça deve ser balanceada.

No essencial, os conselhos que se dão para a cobertura jorna- lística em geral são aplicáveis a quase todas as diferentes situa- ções. Devem respeitar-se sempre os princípios basilares do jor- nalismo: rigor, honestidade, intenção de verdade, compromisso com a realidade. Deve procurar também contar-se bem o que há para contar, respeitando-se o estilo do órgão de informação onde a notícia será publicada. Devem respeitar-se os limites legais, éti- cos e deontológicos da profissão. Fora isto, o repórter tem alguma liberdade na escolha das suas opções.

No documento Elementos de jornalismo impresso (páginas 79-85)