• Nenhum resultado encontrado

A Competência de Comunicação Intercultural na aula de Espanhol Língua Estrangeira

No documento Ao Encontro das Línguas Ibéricas (páginas 105-113)

O desenvolvimento da competência de comunicação intercultural na aula de ELE

3. A Competência de Comunicação Intercultural na aula de Espanhol Língua Estrangeira

3.1. Da sala de aula à internacionalização

A urgência da diversidade no mundo moderno e a gestão dos processos de comunhão intercultural exigem do cidadão comum uma perícia incontorná- vel, para que a comunicação possa ser levada a cabo sem constrangimentos ou interferências externas ao conteúdo da mensagem. Nesse sentido, impõe- se também, e especialmente ao ensino superior, uma resposta cientificamente cimentada que possa funcionar de forma transversal relativamente aos curri- culade diferentes áreas do saber, promovendo espaços de desenvolvimento e de aprofundamento do diálogo intercultural.

Na medida em que este se encontra intimamente relacionado com o res- peito pela dignidade humana, cimentado nos valores fundamentais da socie- dade, reconhecendo a herança comum e a diversidade, verifica-se que o diá- logo intercultural carece de estratégias de ensino-aprendizagem específicas que facilitem o desenvolvimento da competência de comunicação intercultu- ral, para além da disponibilização de programas de internacionalização, dos quais se destaca claramente o programa ERASMUS +. Contudo, apesar de um número de fluxos crescente, os dados absolutos não ultrapassam os 6,4% de população estudantil móvel, de acordo com o veiculado pela própria Comissão Europeia, nas estatísticas que publicou relativas ao ano letivo de 2013/2014 e que apresentamos, de seguida, na figura 1:

Fig. 1. Crescimento de mobilidades desde o início do programa ERASMUS (http://ec.europa.eu/education/library/statistics/erasmus-plus-facts-figures_en.pdf)

Nesse sentido, e apesar do risco de incumprimento das metas de mobili- dades internacionais estudantis, e consequente diminuição da aprendizagem intercultural que os alunos deveriam adquirir para garantir maiores possibili- dades de empregabilidade num mundo globalizado, continua a ser expectável que as instituições de ensino superior promovam espaços de desenvolvimento e de aprofundamento de competências de comunicação intercultural. É, por- tanto, necessário encontrar alternativas para a mobilidade física, incentivando os alunos do ensino superior a estar em contacto com outras culturas, cons- truindo projetos juntos, obrigando-os a uma constante atualização e adaptação às necessidades e exigências culturais e comunicativas do outro.

Uma forma possível de contornar a questão passa por oferecer aos alu- nos a possibilidade de, em ambiente letivo, estar em contacto com alunos de outras nacionalidades, latitudes geográficas e contextos culturais, com o propósito de desenvolver, de forma colaborativa, um projeto comum sob a orientação de professores e facilitadores (Lewis & O’Dowd, 2016). É possí- vel, assim, envolver os alunos numa forma de mobilidade virtual, trabalhando

não apenas os conhecimentos científicos inerentes ao projeto em questão, mas também motivá-los para a aprendizagem intercultural, através de estratégias de negociação com os colegas internacionais, conhecendo-os e desmontando eventuais estereótipos, subentendidos e assunções culturais pela comparação e negociação.

Parece-nos, contudo, que deverá haver alguma atenção à forma como se organizam as tarefas de telecolaboração, por forma a evitar qualquer tipo de constrangimento ou falta de eficácia na consecução das mesmas. Devemos, assim, ter em atenção que o objetivo primordial deste intercâmbio de conhe- cimentos é o de desenvolver competências em termos de comunicação inter- cultural on-line, seja através de Facebook, Skype, correio eletrónico, pelo que o papel do mediador se reveste de grande importância, especialmente como garante da adequação e qualidade da comunicação efetuada entre os alunos, precavendo erros e evitando equívocos. É também importante destacar que uma tarefa adequada vai mais além do recurso à auto-apresentação e/ou troca de informação, permitindo ao aluno dar-se a conhecer a si próprio e à sua cultura, as suas rotinas e hábitos, para além de pressupor que os alunos farão algo juntos, em estrita dependência uns dos outros (Guth & Robin, 2015 cit por Lewis & O’Dowd, 2016).

Porquanto a atividade de telecolaboração poderá, maioritariamente, ser desenvolvida de forma autónoma pelos alunos que se comprometem a levá-la a cabo é, ainda relevante destacar que todos os passos que dela fazem parte integrante deverão ser explícitos, detalhados, organizados e oferecidos aos alunos de uma forma clara e simples, para evitar mal-entendidos e preocupa- ções desnecessárias. Deste modo, uma atividade de telecolaboração deverá, aquando do seu final, permitir que se leve a cabo uma reflexão e discussão aberta sobre os sentidos culturais gerados por palavras e frases que carecem de interpretação, decifração e conhecimento intercultural do que foi escrito e do que se pretendia comunicar (Chun, 2015:13), ou seja, caberá, num mo- mento posterior ao da conclusão da atividade, aos professores a análise das diferentes etapas do exercício telecolaborativo e aferir do grau de aquisição da competência intercultural alcançada pelos alunos através das tarefas dese- nhadas e realizadas com os companheiros internacionais.

3.2. Competência Comunicativa Intercultural e Telecolaboração

Um dos aspetos centrais, identificados pelos empregadores aquando das en- trevistas realizadas, passa pela necessidade, nomeadamente no que concerne à utilização de línguas estrangeiras, da mobilização, por parte dos recém- graduados pelas instituições de ensino superior, de toda uma série de conhe- cimentos e competências que lhes permitam comunicar de forma adequada e efetiva com interlocutores oriundos de outras culturas e com competências linguísticas diversas. Sendo as experiências de mobilidade internacional va- liosas para a construção destas competências, dados os números apresentados, há que encontrar estratégias de simulação da internacionalização em sala de aula.

Para que os alunos, enquanto aprendentes de uma língua estrangeira, ad- quiram e desenvolvam competências comunicativas interculturais, é impor- tante que se entenda que muitos alunos poderão já ter desenvolvido uma competência intercultural, ou não: esta é entendida como a utilização de uma mesma língua pelos interlocutores, em contextos culturais diversos (Gui- lherme, 2002; Byram, 2008; Bizarro and Braga, 2011; Teixeira, 2013; Sar- mento, 2015). No entanto, a competência comunicativa cultural ocorre e desenvolve-se quando a comunicação que se estabelece entre falantes de cul- turas diversas, quando os interlocutores não partilham nem a mesma língua mãe, nem o mesmo lastro cultural, pelo que devem recorrer a uma língua de comunicação que é alheia a ambos.

No contexto do ensino e aprendizagem da língua estrangeira, podem-se simular situações de aprendizagem e de prática que permitem o desenvolvi- mento da competência de comunicação intercultural, como forma de anteci- pação de cenários que os jovens encontrarão no ingresso no mercado de traba- lho. As unidades didáticas que em seguida se apresentam são dois exemplos, de um conjunto mais alargado de propostas desenvolvidas pelo projeto IC- CAGE – Intercultural Communicative Competence: an advantage for global employability, de materiais e abordagens, com recurso à telecolaboração, de simular cenários internacionais e convidar os alunos, em tempo real a comu- nicar com outros alunos no sentido de resolverem problemas em conjunto, de forma colaborativa.

3.3. A CCI na aula de ELE – uma unidade didática

No que diz respeito à unidade didática criada para alunos de espanhol língua estrangeira, a temática recaiu sobre a criação de um pacote turístico, em vir- tude da existência, em todas as instituições de ensino superior envolvidas no projeto ICCAGE – Intercultural Communicative Competence: an advantage for global employability, de cursos na área do turismo.

Assim, nesta unidade, decidiu-se simular a criação e venda de um pacote turístico nacional para clientes internacionais, em função dos gostos pessoais, expressos mediante o recurso à publicação de um vídeo, por parte do turista. Na sequência do vídeo apresentado, cliente e agente turístico deverão perma- necer em contacto estreito, no sentido de criar, melhorar e otimizar a proposta a realizar pelo agente turístico, por forma a cativar o cliente em todos os as- petos que ele próprio mais valorize. Após a realização dos contactos necessá- rios, e imediatamente antes do envio da proposta final do pacote turístico feito à medida das expectativas do cliente, o mesmo é apresentado e discutido em cada uma das salas de aula (que à falta de melhor termo, designaremos de) tradicionais, por forma a colher opiniões, correções e sugestões de melhoria, também dos próprios colegas.

Considerando que grande parte da criação do produto turístico se centra numa construção feita à medida, erigida sobre contactos diretos e pessoais, seja em forma de conversas skype ou mediante o recurso ao e-mail, a tele- colaboração está presente ao invocar esse mesmo aspeto de composição em função do outro, construindo algo – neste caso um pacote turístico – com o outro e para o outro. Paralelamente trabalham-se, ainda, questões relacio- nadas com a competência comunicativa intercultural, nomeadamente no que diz respeito ao conhecimento do outro através do contacto direto e não medi- ante pré-conceitos recolhidos de outra forma, por forma a melhor adaptar-se e colaborar, identificando necessidades, analisando problemas, negociando e criando compromissos com vista ao sucesso comercial, algo para que concorre a aplicação de aspetos associados à comunicação de negócios, em especial no que concerne às competências de interação intercultural associadas ao com- portamento, à situação, à interpretação efetuada ou à gestão de todo o processo de negociação de conteúdos e tipos de turismo a incluir no pacote turístico que se desenhará.

Não devemos, contudo, descurar que apesar de que o papel central de todo este processo acaba por estar colocado sobre os alunos, em cada um dos seus papéis – seja enquanto agente turístico, seja enquanto cliente internacio- nal – o professor desempenha uma posição essencial porquanto deve sempre controlar a forma como os alunos envolvidos interagem, e de que forma se vão cumprindo os preceitos relacionados com a competência comunicativa intercultural, elemento chave em todo este processo de ensino-aprendizagem. O professor funcionará, portanto, como um monitor, acompanhando, aconse- lhando e limando algumas arestas que permitam ao agente turístico uma venda incondicional do seu produto, isto é, sem qualquer tipo de objeções ou reti- cências, em virtude do cumprimento estrito e escrupuloso das necessidades pessoais e culturais do seu cliente.

Bibliografia

Bizarro, R. & Braga, F. (2011). Educação intercultural, competência pluri- lingue e competência pluricultural: novos desafios para a formação de professores de Línguas Estrangeira”. In Secção de Estudos Franceses, Departamento de Estudos Portugueses e Estudos Românicos (ed.), Estu- dos em homenagem ao Professor Doutor António Ferreira de Brito(pp. 57-69). Porto: Faculdade de Letras da U. Porto (FLUP).

Byram, M. (1997). Teaching and Assessing Intercultural Communicative Competence. Clevedon: Multilingual Matters.

Byram, M. (2008). From Foreign Language education to Education for Inter- cultural Citizenship. Clevedon: Multilingual Matters.

Byram, M. & Zarate, G. (1994). Définitions, objéctifs et évaluation de la com- pétence socio-culturelle. Strasbourg: Report for the Council of Europe (Document) – Projet Langues Vivantes.

Costa, A. F. (1999). Sociedade de Bairro. Oeiras: Celta Editora.

Chun, D. M. (2015). Language and culture learning in higher education via telecollaboration. Pedagogies: An International Journal, 10(1), 5-21.

Dooly, M. (2006). Integrating Intercultural Competence and Citizenship Edu- cation into Teacher Training: a Pilot Project. Citizenship Teaching and Learning, 2(1),18-30.

Glaser, E.; Guilherme, M.; García, M. C. M. & Mughan, T. (2007). Intercultu- ral competence for professional mobility. Graz: ECML. Recuperado em 11 novembro, 2015 de http://archive.ecml.at/mtp2/publications/B3_Icop romo_E_internet.pdf.

Gonzalez Piñero, M.; Díaz, C. G. & Vez, J. M. (2010). Didáctica de las lenguas modernas. Competencia plurilingue e intercultural. Madrid: Editorial Síntesis.

Guilherme, M. (2002). Critical Citizens for an Intercultural World. Foreign Languages Education as Cultural Politics. Clevedon: Multilingual Mat- ters.

Greenwood, E. (1965). Métodos de investigação empírica em sociologia. Análise Social, 3(11), 313-345.

Holliday, A.; Hyde, M. & Kullman, J. (2004). Intercultural Communication. An Advanced Resource Book. New York: Routledge.

Liddicoat, A. J. & Scarino, A. (2013). Intercultural Language Teaching and Learning. Chichester: Wiley-Blackwell.

Nikleva, D. G. (2012). La competencia intercultural y el tratamiento de conte- nidos culturales en manuales de español como lengua extranjera. Resla, 25, 165-187.

O’Dowd, R. & Lewis, T. (ed.) (2016). Online Intercultural Exchange: Policy, Pedagogy, Practice. NY: Routledge.

Sarmento, C. (2015). Estudos Interculturais Aplicados. Textos, Turismos e Tipologias. Porto: Vida Económica.

Teixeira, A. P. (2013). O desenvolvimento da competência comunicativa in- tercultural na aula de PLE: representações e práticas (inter)culturais. Um estudo de caso. Porto: FLUP. Recuperado em 11 novembro, 2015 de http://hdl.handle.net/10216/74779.

Utley, D. (2004). Intercultural Resource Pack 5. Intercultural Communication Resources for Language Teachers. Cambridge: Cambridge University Press.

Vilá Baños, R. (2005). La competencia comunicativa intercultural. Un estu- dio en primer ciclo de la ESO. Tese de Doutoramento, Universidad de Barcelona. Recuperado de: http://migraciones.ugr.es/cddi/images/tesis/ VilaBanos2005.pdf.

La agentividad en las construcciones absolutas del español

No documento Ao Encontro das Línguas Ibéricas (páginas 105-113)