• Nenhum resultado encontrado

A complexidade da informalidade urbana !

2.2 A LÓGICA DO MERCADO !

2.3.2 A complexidade da informalidade urbana !

sociais. Com isso, a noção do campo social está sempre presente, podendo caracterizar o dentro e o fora do campo.

Reforça o autor:

Efetivamente, o espaço social se retraduz no espaço físico, mas sempre de maneira mais ou menos confusa: o poder sobre o espaço que a posse do capital proporciona, sob as diferentes espécies, se manifesta no espaço físico apropriado sob a forma de uma certa relação entre a estrutura espacial da distribuição dos agentes e a estrutura especial da distribuição de bens ou de serviços, privados ou públicos (BOURDIEU, 1997, p. 160).

2DXWRUDLQGDFLWDRFRQFHLWRGH³VSDFHFRQVXPPLQJ´VHQGRque ³RFRQVXPRRVWHQWiWRrio do HVSDoRItVLFRpXPDGDVIRUPDVSRUH[FHOrQFLDGHRVWHQWDomRGRSRGHU´ (BOURDIEU, 1997, p. 161). Nesse sentido, e incorporando na discussão as leis urbanas, pode-se dizer que o espaço produzido dentro dos ditames dos parâmetros urbanísticos legais e que visam a GLVWLQomRVRFLDOVmRHVSDoRVGH³VSDFHFRQVXPPLQJ´O que está sendo consumido é o valor cultural e social que o espaço revela na distinção da prática social.

2.3.2 A complexidade da informalidade urbana !

É possível perceber que a aplicação das leis urbanas na cidade é mais do que uma mera aplicação de parâmetros urbanísticos, mas possui um significado importante no campo social, sobretudo no campo da indústria imobiliária, que é constituída por construtoras, empreendedores, proprietários de terras e agentes imobiliários, com a participação ativa do Estado e dos moradores da cidade.

A investigação sobre a aplicação da legislação urbanística na produção do espaço urbano é mais do que apenas a incorporação de parâmetros urbanísticos nas edificações e no uso do solo urbano; é carregada de referenciais simbólicos e revelam o funcionamento elitista e de exceção do modo capitalista. Nesse sentido, pode-se afirmar que grande parte da produção das cidades não atende às exigências legais e, com isso, corrobora para a criação de espaços legais de exceção nas cidades.

! ! *&!

Aprofundando a discussão sobre a aplicação das leis urbanas e suas consequentes formas de distinção social, Maricato (1997) aponta que existe um grande aparato regulatório que disciplina a produção do espaço urbano no Brasil, estruturado em leis rigorosas de parcelamentos do solo, leis de zoneamento e detalhados códigos de edificações, os quais são formulados por agentes distantes da condição da ilegalidade em que vive grande parte da população das cidades brasileiras. Segundo a autora, WDOIDWRGHPRQVWUDTXHD³H[FOXVmRVRFLDO SDVVDSHODOyJLFDGLVFULPLQDWyULDQDDSOLFDomRGDOHL´ (MARICATO, 1997, p. 123). É evidente que existe apenas uma aparência de ineficácia da lei, uma vez que ela é um instrumento chave para a aplicação arbitrária do poder. Neste sentido, a ocupação ilegal da terra urbana não é apenas permitida, mas estimulada e faz parte do modelo de desenvolvimento urbano no Brasil.

Declara Maricato:

A dimensão da ilegalidade urbana na provisão de moradias urbanas é funcional para a manutenção do baixo custo de reprodução da força de trabalho, como também para um mercado imobiliário especulativo (ao qual corresponde relações de trabalho atrasadas na construção), que se sustenta sobre a estrutura fundiária arcaica (MARICATO, 1997, p. 123).

O Estado, inserido na lógica do capital, legitima mecanismos de uso e ocupação do solo elitistas e para a própria sobrevivência dos processos de acumulação capitalista. Com isso, fomenta a informalidade do solo urbano. Santos (2008, p.  DILUPDTXH³DFLGDGHFDSLWDOLVWD é a expressão territorial da socialização contraditória das forças produtivas no modo de SURGXomRFDSLWDOLVWD´

O papel do Estado no processo da formação da informalidade urbana deve ser entendido para além de um problema de controle ou regulação, mas como, em muitos casos, um indutor da produção desta realidade. Kowarick (1979) utiliza o termo espoliação urbana e o conceitua:

somatório de extorsões que se opera através da inexistência ou precariedade de serviços de consumo coletivo que se apresentam como socialmente necessários em relação aos níveis de subsistência e que agudizam ainda mais DGLODSLGDomRTXHVHUHDOL]DQRkPELWRGDVUHODo}HVGHWUDEDOKR´ .RZDULFN 1979, p. 59).

! ! +(!

Em outras palavras, trata-se do processo de exclusão da classe trabalhadora das práticas das cidades reguladas pelo Poder Público.

É possível perceber como a lógica do Estado está presente na forma de articulação do morador e no modo como o mercado se apropria dessa falta de sinergia entre as lógicas. Assim, os espoliados são induzidos a produzir a sua própria habitação e espaço urbano de forma autônoma e alheia à ordenação da cidade. Tal fato favorece o sistema capitalista e de acumulação de capital por parte da sociedade. O Estado aparece neste contexto enquanto indutor da própria espoliação urbana, uma vez que permite as condições favoráveis ao processo de espoliação.

Jesus (2003), ampliando a discussão, afirma que o processo de globalização econômica tem contribuído para o aumento da exclusão de grande parte dos trabalhadores, fato que evidencia as desigualdades sociais e é retratado na segregação socioespacial das cidades. A autora afirma que o aumento da ilegalidade urbana nas grandes cidades brasileiras é consequência da ausência da atuação do Estado. Alinhando a lógica do Estado e a do mercado, pode-se afirmar que na dinâmica capitalista de produção das cidades o Poder Público não tem se mostrado capaz de normatizar e regular, por meio de políticas públicas, o bem-estar social, fato que é revelado pela sua ausência no controle da indústria imobiliária. O mercado imobiliário nas grandes cidades tem atuado nas decisões de locação de investimentos públicos, ditando as regras do jogo e excluindo deste processo grande parte da população. O Estado é parte integrante da lógica do capital, e por isso, com base em seu arcabouço jurídico, pouco tem feito para normatizar e inibir ações excludentes promovidas pela indústria imobiliária. Dentro deste contexto, Jesus (2003, p.  TXHVWLRQD³4ual a responsabilidade das leis diante do aumento da ilegalidade urbana?´ Ainda segundo Jesus (2003), a cidade é um organismo vivo e dinâmico, com mutações rápidas e complexas, e estas transformações não têm sido acomSDQKDGDV SHODV QRUPDV XUEDQtVWLFDV $ DXWRUD DILUPD TXH ³Ki XP YHUGDGHLUR GHVFRPSDVVRHQWUHDUHDOLGDGHXUEDQDHRVLQVWUXPHQWRVMXUtGLFRVHPYLJRU´ JESUS, p. 428), sendo possível afirmar que a consequência imediata deste descompasso é revelada pela informalidade e ilegalidade urbana.

Maricato (1997, p. 123) insere em sua discussão os planos e os projetos urbanísticos, apontando como perversas podHP VHU VXDV ERDV LQWHQo}HV ³D leitura das justificativas de

! ! +"!

planos ou projetos das leis urbanísticas, no Brasil, mostra quão ridículo pode ser o rol de boas LQWHQo}HV TXH DV DFRPSDQKDP 5LGtFXOR VLP SRUpP QmR LQRFHQWH´. A legislação quando é cumprida, atua em apenas parte da cidade, fazendo com que, despretensiosamente, grande parte da população se insira no mercado ilegal. Sobre essa questão, Smolka (2003, p. 258) afirma que o preço do solo urbanizado no mercado formal pode ser consequência da ³UHJXODomRH[FHVVLYDH[FOXGHQWHHOLWLVWDDQDFU{QLFDVDWXUDGDGHSUHRFXSDo}HVHVWpWLFDVHWF que impõe condições não razoáveis - impossíveis de cumprir pelos pobres - de ocupação do VRORXUEDQR´

Segundo Smolka (2003), a informalidade da cidade ilegal é causa e efeito da pobreza que está relacionada com a ocupação dessas áreas. Em outras palavras, para obter a certeza da constante presença da força de reprodução capitalista, a população que reside em áreas informais inicia sua ocupação por fatores relacionados com a pobreza e não consegue alterar a sua situação da informalidade também por fatores relacionados com a pobUH]D $VVLP ³D população que reside em áreas informais é capturada por muitos círculos viciosos que UHLWHUDP VXD FRQGLomR´ SMOLKA, 2003, p. 266). Tem-se que a informalidade não trata apenas da questão do uso do solo urbano, mas avança em questões cotidianas e resulta em processos informais de outra ordem, como a informalidade nas relações de trabalho.

2.3.3 O morador e a ilegalidade urbana !

Aprofundando a discussão acerca dos espaços legais produzidos pela aprovação dos parcelamentos e edificações no Poder Público e no foco da pesquisa na Prefeitura de Belo Horizonte (PBH). Este estudo procura evidenciar os reais motivos que levam o morador a enquadrar sua edificação ou lote nas normas da legislação urbanística. A busca pela legalidade pode estar na crença da qualidade espacial e ambiental garantida ao atender aos parâmetros urbanísticos das leis. No entanto, muitos moradores subvertem a legislação ao modificarem o projeto aprovado na Prefeitura. Assim, a própria crença na qualidade ambiental garantida pelos parâmetros urbanísticos está em xeque para aqueles que usufruem dos espaços legais da cidade. Acredita-se que com a aprovação dos projetos urbanos nos órgãos competentes, na verdade, o que se procura é estar legitimado pelo mercado formal da indústria imobiliária, pois é sabido que vários processos formais e legais só funcionam com certificados de propriedades formalmente legalizados e com o licenciamento urbano