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A comunicação mediatizada nos centros de ciência

3. As ciências naturais e o desenho curricular

3.4. A comunicação mediatizada nos centros de ciência

De acordo com alguns autores, os centros de ciência na actualidade terão de incluir estratégias de comunicação que desenvolvam uma mediação facilitadora entre os públicos e o saber. Não mais poderão ser como outrora “herméticas, pois somente especialistas podiam alcançar o sentido de tal lógica classificatória. Ao público restava um comportamento passivo diante do exposto, visto que desconhecia os códigos científicos que regiam tal lógica” (Cury, 2005:368).

A intervenção dos centros de ciência deverá permitir a apreensão das informações veiculadas nas exposições e, ao mesmo tempo, colaborar na sua interpretação. Esta dimensão comunicacional de massas passa pela interactividade, possuidora de características eminentemente lúdicas. Valente et al sugerem que a interactividade seja do tipo, “ao mesmo tempo que informa entretém” (2005:198). Mas também não pode ser reduzida à simples manipulação (apertar) de botões, como refere Van Praet (2005). Segundo este autor é necessário fazer tudo para desenvolver a “intermediação entre os funcionários do museu e os visitantes, mas também dos visitantes entre si” (2005:351). A este propósito Colinvaux (2005) considera importante a intencionalidade de analisar a experiência vivida no museu de ciência a partir da perspectiva do visitante. Tal abordagem é fundamentada a partir da noção de interactividade, que engloba as experiências passadas (background de conhecimentos) e vividas (no contexto específico de cada exposição) pelo visitante.

A interactividade como pedagogia não directiva desempenha um papel fulcral na aproximação do público, ao permitir que este experimente fenómenos e participe nos processos de demonstração ou mesmo na aquisição de informações de índole científica e técnica, com o propósito de ampliar os seus conhecimentos. O conceito de interactividade, segundo Colinvaux, remete-nos “não apenas para as interacções que ocorrem entre sujeitos (S/S), mas também entre sujeitos e objectos (S/O) e, ainda entre sujeitos e contextos (S/C)” (2005:81). A experimentação, como processo interrogativo dos fenómenos da natureza por meio de instrumentos, possibilita testar hipóteses. A acção do sujeito (aprende-se fazendo) surge como fundamental nos processos cognitivos, ou seja, para os processos de formação e apropriação de conhecimento.

As técnicas de comunicação, essencialmente, orientadas para este propósito são os computadores, os painéis animados ou robotizados, os módulos interactivos entre outros e não mais a leitura de texto ou o visionamento de audiovisuais, de forma passiva. O público de hoje, que vive a globalização, necessita de estar implicado nos processos de aquisição de conhecimentos numa perspectiva de valorização, actualização e auto-formação ao longo da vida.

O enfoque da acção do sujeito é sustentado pelas correntes construtivistas em educação. De acordo com esta corrente a aprendizagem é sinónimo de desenvolvimento uma vez que aprender não é sinónimo de copiar ou reproduzir a realidade, mas sim de interpretar um objecto da realidade ou um conteúdo que pretendemos aprender. Para isso é necessário uma aproximação ao objecto ou conteúdo com a finalidade de aprender, mas a aproximação não se processa no vazio, mas sim resulta das experiências, interesses e conhecimentos prévios que possam resolver a nova situação. Este processo conduz à implicação do sujeito na aprendizagem e só quando se verifica é que afirmamos que estamos a “aprender significativamente, a construir um significado próprio e pessoal para um objecto de conhecimento que existe objectivamente… não é um processo que leve à acumulação de novos conhecimentos mas antes à integração, modificação e estabelecimento de relações e coordenação entre esquemas de conhecimento que já possuímos, dotados de determinada estrutura e organização que varia, em vínculos e relações, em cada aprendizagem realizada” (Coll et al, 2001:19). Neste processo intervêm aspectos cognitivos, mas também aspectos emocionais que podem ser promotores ou não da construção do conceito que formamos de nós próprios (auto-estima) e que apresentam também alguma influência no modo como adquirimos e integramos novos conhecimentos.

É também significativamente relevante incorporar os aspectos históricos e sociais dos fenómenos científicos, numa dimensão interdisciplinar, não mais baseada no conhecimento de um grande número de acontecimentos e nomes descontextualizados, mas na interface do conhecimento científico, com a sua aplicação e consequências. Importa então incorporar a dimensão social, emocional e cognitiva para que se possa dissipar a iliteracia científica apostando na cultura científica.

No estudo PISA- Programme for International Student Assessment- que foi lançado pela OCDE, em 1997 o termo «literacia científica» é definida como a capacidade de cada indivíduo usar o conhecimento científico, de reconhecer questões científicas e de retirar

conclusões baseadas em evidência, de forma a compreender e a apoiar a tomada de decisões acerca do mundo natural e das mudanças nele efectuadas através da actividade humana. Um público mais esclarecido e detentor de saberes científicos estará em melhor posição para discutir, acompanhar e reivindicar políticas públicas referentes a questões actuais e controversas da ciência.

Interpretamos os centros de ciências como espaços de comunicação interactiva, onde a apropriação do real é uma permanente (re)construção realizada pelo público que os visita. Aqui retomamos o referencial teórico de Myers (1990) onde afirma que a comunicação é essencialmente um processo de estruturação da realidade, feita através da percepção e da simbolização e que a nossa visão do mundo pertence-nos, porque somos nós que a criamos e a construímos a partir de estímulos do exterior (centros de ciência, por exemplo) seleccionando, organizando e interpretando. O modo como nós seleccionamos, organizamos e interpretamos é, em parte, devido ao modo como efectuámos estas operações no passado, dado que somos o produto das nossas percepções anteriores. É com todo o nosso passado que nós percebemos e compreendemos o mundo. Daqui se infere que as experiências precoces por parte da criança pequena são recursos de aprendizagem autêntica e são estruturadas pelo sujeito através do que Watzlawick (1991) designa por dois níveis da realidade. A realidade de primeira ordem é aquela que é captada pela percepção através dos receptores sensoriais, resultando do conhecimento directo e sensual das coisas e a realidade de segunda ordem, (segundo nível) que diz respeito ao universo de significações que o homem atribuiu às coisas, ou seja, o conhecimento sobre o conhecimento das coisas. Também a concepção sistémica da pragmática da comunicação humana, na interpretação de Lopes (2004), é um processo onde a realidade não resulta de uma pré-determinação, mas de uma permanente reconstrução realizada pelos indivíduos nela envolvidos. Segundo esta autora, a ruptura epistemológica do conceito de realidade tem o seu referencial histórico na Teoria da Relatividade de Einstein, ao considerar a realidade como um processo sempre em mudança. Depois de Newton não mais a realidade é considerada como um fenómeno estático e absoluto. Também no contexto da microfísica, Heinsenberg, citado por Lopes, questiona a noção de realidade, ao “demonstrar que a posição e a velocidade de um electrão são impossíveis de determinar com exactidão, simultaneamente, pelo princípio da incerteza” (2004:23).