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A concepção de dissertação de mestrado na instituição de formação das informantes

A formação do pesquisador na universidade

2. A concepção de dissertação de mestrado na Universidade Brasileira

2.2 A concepção de dissertação de mestrado na instituição de formação das informantes

A concepção de dissertação de mestrado encontrada nos documentos atuais da Universidade onde as quatro informantes desta pesquisa se formaram é a mesma do regimento da pós-graduação entre os anos de 2005 a 2008, período que corresponde à época em que elas cursaram o mestrado. Assim, tomamos como referência o regimento vigente da pós-graduação, o qual (UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO, 201312), no artigo 6, do capítulo II, parágrafo primeiro, considera a dissertação de mestrado como o texto resultante de trabalho supervisionado que demonstre: 1) capacidade de sistematização crítica do conhecimento acumulado sobre o tema tratado; e 2) utilização de métodos e técnicas de investigação científica, tecnológica ou artística.

Observamos que esses dois requisitos, em sua formulação, condensam uma série de procedimentos relacionados ao modo específico de trabalho dentro do contexto universitário. Para nós, o primeiro deles versa a respeito do aprendizado de três movimentos por parte do pesquisador: a) fazer um levantamento do estado da arte do que já foi produzido a respeito do tema da sua pesquisa; b) apropriar-se desse conhecimento; e c) apresentá-lo e saber comunicá-lo de modo ordenado, a partir de uma lógica pessoal, calcada no projeto argumentativo do pesquisador.

Quanto ao segundo requisito, referem-se à utilização de métodos e técnicas de investigação científica, tecnológica ou artística, diz respeito à capacidade de apreensão técnica de um fenômeno analisado pelo pesquisador. Assim, para além de saber o que já foi produzido em sua área, ele precisa demonstrar que conseguiu se desvencilhar de seus preconceitos e generalizações calcadas no senso comum e buscou apropriar-se metodologicamente de como abordar um objeto ou fenômeno.

Considerando os dois requisitos colocados no documento, pode-se afirmar que, teoricamente, eles são de fácil entendimento. Contudo, o pesquisador que assume o compromisso de escrever uma dissertação, logo nas primeiras versões, certamente se dará conta da distância que há entre o que inicialmente imaginou como esforço

12 Observe-se que a redação desse artigo permanece inalterada nos textos dos três regimentos que tivemos

necessário para construir seu texto e o que de fato será preciso para levar a cabo essa tarefa.

Talvez seja por essa razão que, desde o início, o documento da instituição onde as mestrandas se formaram enfatiza que se trata de um trabalho supervisionado, no caso, por um orientador, que, justamente, tem o papel de ajudar o pós-graduando na lida com a escrita e com a pesquisa.

Assim, inicialmente cabe ao orientador o papel de avaliar em que medida o pesquisador, no texto que escreve, consegue demonstrar, nos termos do documento, a “capacidade de sistematização crítica do conhecimento acumulado” a respeito do tema de pesquisa e a “utilização de métodos e técnicas de investigação científica, tecnológica ou artística”.

Na continuidade do percurso de pesquisa, o trabalho passará por duas avaliações: uma por ocasião de uma banca qualificação e outra no exame de defesa pública do trabalho. Na instituição onde as informantes estudaram, a composição de “Comissão Julgadora de dissertação” é formada por três professores, sendo eles: 1) o professor orientador, o presidente da Comissão; 2) todos os membros com, no mínimo, o título de doutor; e 3) um membro, no mínimo, “ser estranho ao Programa de Pós- Graduação e à Unidade”.

Outra regra do Programa é o impedimento da “participação, na comissão julgadora de dissertação ou tese, de parentes até terceiro grau do aluno, do orientador e dos demais membros da referida comissão”. Assim, busca-se avaliar o trabalho unicamente por seu valor acadêmico e científico, sem influência de vínculos afetivos de parentesco entre os membros da banca e o pesquisador cujo trabalho estará sendo avaliado.

Tendo indicado como os regimentos da instituição referem-se à dissertação de mestrado, no que se segue, apresentaremos como essa concepção de dissertação foi materializada nos trabalhos defendidos desde a década de 1970 até 2004. Como o foco de nosso interesse é a escrita, buscamos trabalhos que, na redação de seu resumo ou na classificação feita pelo sistema de bibliotecas da Universidade, compartilham do mesmo tema. A nosso ver, delinear o que, dentro da instituição, aceita-se como uma dissertação de mestrado é essencial para ver em que medida as dissertações de mestrado produzidas por nossas informantes aproximam-se ou se afastam desse modelo.

2.2.1 A dissertação de mestrado materializada: uma amostra da produção nos

últimos quarenta anos

Como visto neste capítulo, o parecer de 1965 dispunha que o tempo de duração de um curso de mestrado variava, sendo estipulado o mínimo de um ano para sua conclusão. Essa indicação somente da duração mínima do curso pode ser encontrada, por exemplo, no estatuto da Universidade de São Paulo, aprovado pelo decreto n.º 52.326, de 16 de dezembro de 1969. Esse documento é o primeiro em que são dispostos artigos que caracterizam e instituem os cursos de pós-graduação da referida universidade.

Acerca do curso de mestrado, o capítulo VI, artigo 73, dispõe que “além de freqüência a cursos e do cumprimento das exigências correlatas, o candidato ao mestrado deverá ocupar-se do preparo de dissertação, ou outro tipo de trabalho, a critério do Departamento”. Escrever uma dissertação, à época, não era um requisito, ficando a cargo de cada departamento estabelecer a natureza do trabalho exigido.

Acompanhando os documentos legais a respeito da pós-graduação, vimos que a discussão acerca do tempo máximo dos cursos de pós-graduação passou a se acirrar a partir do início da década de 1990, quando as agências de fomento diminuíram o tempo de concessão de bolsas. Se antes era quatro anos o período de auxílio financeiro para o mestrando, esse tempo foi diminuído para dois. Ademais, a CAPES, responsável pelo sistema de avaliação dos cursos no Brasil, adotou o tempo de formação como quesito de indicação de desempenho e passou a penalizar os programas cuja duração do tempo exceda aos dois anos, no caso do mestrado.

Partindo do quesito tempo de duração do mestrado, fomos pesquisar dissertações produzidas a partir da década de 1970, para verificar, diacronicamente, se era possível detectar diferenças sensíveis quanto à concepção de dissertação de mestrado, tendo como referência o produto apresentado pelos pesquisadores. Para tanto, fizemos uma pequena amostra da produção nesse período. Antes de ter contato com esses trabalhos, nossa hipótese era a de que encontraríamos, principalmente nos trabalhos produzidos até a década de 1990, significativas diferenças quanto ao número de páginas dos trabalhos, ao investimento na análise dos dados e da discussão teórica.

O levantamento inicial não comprovou nossa hipótese. Para um primeiro contato com as dissertações mais antigas, selecionamos vinte que versavam a respeito da escrita,

leitura e seu ensino, disponíveis na Biblioteca da Faculdade de Educação da USP (doravante FEUSP), defendidas entre 1974 e 1990. Dessas vinte, selecionamos três para uma leitura mais acurada. Dentre as vinte dissertações, quatro são provenientes da Pontifícia Universidade Católica; seis da Universidade Estadual de Campinas e doze da FEUSP. Fazendo uma média do número de páginas dessas dissertações, temos cerca de 150 páginas, quase a mesma média das dissertações defendidas atualmente, que é de 140.

Cumpre salientar que o levantamento das outras dissertações aqui analisadas, que correspondem ao período de 1994-2004, é fruto de pesquisa anterior (ANDRADE; RIOLFI, 2006), na qual tomamos como objeto a escrita que se pratica em duas faculdades da Universidade de São Paulo, quais sejam: a Faculdade de Educação e a Faculdade de Filosofia Letras e Ciências Humanas (doravante FFLCH).

A constituição desse corpus deu-se através da consulta no sistema bibliográfico dedalus13, por meio da opção de busca por assunto (escrita / linguística textual) e por tipo de material (grau de dissertação e tese). É importante ressaltar que esse banco de dados, na opção por assunto, oferece como resultado de pesquisa as palavras-chave informadas nas dissertações e teses pelos próprios autores dos trabalhos.

Ressalte-se que nosso parâmetro de comparação com os trabalhos atuais se dará tendo como referência as quatro dissertações que compõem o nosso corpus, cuja data de defesa foram: duas em 2007; uma em 2008 e outra em 2010. Na sequência, apresentamos o Quadro 6, que sistematiza os dez trabalhos selecionados, que correspondem ao período de 1978 a 2004:

Data Título Orientador Autor (a) Unidade

1978 Estudo de algumas implicações do ritmo na facilitação da aprendizagem da leitura e

escrita JUSTO, Henrique LUCENA, Cleuza PUC/RS

1979 Alfabetização e Universo cultural FREITAS, Helena de

ARAGÃO, Rosália M. de

UNICAMP 1984 A escolarização do leitor: a didática da

destruição da leitura SILVA, Lilian Lopes Martin da ALMEIDA, Milton José de UNICAMP 1995 Longo caminho entre o pensar e o fazer VIEIRA, Alice MURRIE,

Zuleika de F.

FE/USP

13 Trata-se do banco de dados bibliográficos da USP, o qual é desenvolvido pelo Sistema Integrado de

Bibliotecas da Universidade de São Paulo, que integra a rede de serviços do SIBi/USP-SIBiNET. O banco contém a produção bibliográfica da Universidade e os registros bibliográficos dos acervos dispostos em base de dados, as quais podem ser consultadas de forma simultânea ou separadamente. O Programa contém os registros de dissertação e teses apresentadas à USP desde 1934.

1995 Reinventando Narrativas: Estudo sobre a produção coletiva de uma carta para

Penélope

DIETZCH, Mary Julia

STELLA, Paula FE/USP

1999 A construção de um espaço dialógico em sala de aula: imagens de um ambiente de

leitura e escrita DIETZSCH, Mary Julia AZEVEDO, Ana L. do V. de B. e FE/USP

1999 Da leitura à produção: a construção da heterogeneidade enunciativa em narrativas

produzidas em contexto escolar

MAURO, M. A. F. IVAMOTO, Regina M. F. E. FFLCH/ USP 2002 As prescrições para o ensino da caligrafia e

da escrita na escola pública primária paulistana (1909-1947)

VIDAL, Diana ESTEVES, Isabel de L.

FE/USP

2004 Perfil da Produção escrita e da trajetória escolar de alunos surdos de ensino médio

CÁRNIO, Maria S.

GONÇALO, S. F.

FE/USP 2004 Insistindo na redação: em busca da palavra

argumentativa ROCCO, Maria T. F LIMA, Monique de O. FE/USP

Quadro 6 – Composição dos trabalhos analisados (1978-2004)

Visando a sistematizar os dados coletados para dar contornos mais precisos ao que foi considerado como dissertação de mestrado, idealizamos uma grade (uma espécie de chave de leitura) para a confecção da sinopse individual de cada trabalho, atentando- nos para os seguintes tópicos: pergunta de pesquisa; hipótese de trabalho; objetivos; corpus analisado; metodologia utilizada; corpo teórico adotado; concepção de escrita que é possível inferir do trabalho; descrição sintética dos procedimentos analíticos adotados; conclusões alcançadas pelo estudo; e, finalmente, descrição sintética dos anexos apresentados.

A nosso ver, esses tópicos correspondem a elementos fundamentais para a composição de uma dissertação de mestrado na área das ciências de cunha interpretativo, pois abarcam pontos essenciais do que foi colocado como natureza de uma dissertação: a) a sistematização dos conhecimentos já elaborados na área; e b) a operacionalização de métodos e técnicas específicas na análise dos dados.

Vejamos, na sequência, a ficha individual que, a partir desses critérios, foi construída após a leitura de cada trabalho.

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