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A construção da alteridade através de corpos

O corpo está na esfera da percepção do outro, como diz Butler (2004, p. 26) “my body related me to others” e já fora do domínio do indivíduo, esses são investidos pelas relações de poder. No primeiro contato dos europeus com o “Novo Mundo”, esse acontecimento marca profundamente a percepção dos corpos dos “Outros” e condicionou (e ainda condiciona) as relações sociais entre os habitantes das colônias e das metrópoles. Hoje essas relações se ressignificaram com a emigração e imigração. A autopercepção dos colonizados – embora sempre tenha havido resistências levadas à consequências extremas, como suicídios de escravizados, infanticídios para evitar a reprodução dos corpos escravos, revoltas e movimentos – também foi alterada por essa relação hierárquica de humanidades e corporeidades (FANON, 1979; MEMMI, 1977).

Todorov (1982, p. 34), em seu célebre livro sobre a questão da alteridade, analisou diversos documentos do período da “Conquista das Américas” e, avaliando o olhar dos espanhóis frente aos nativos, afirma que “limitam-se, frequentemente, ao aspecto físico das pessoas: sua estatura, cor da pele (mais apreciada na medida em que é mais clara, ou seja, mais parecida com a pele branca)”. Esse olhar dominador e fundador de atributos externos, de marcas fenotípicas justificou o genocídio de inteiras populações (WERNECK, 2010).

Se no início da acumulação primitiva do capitalismo foi preciso hierarquizar o trabalho (escravos, assalariados, servos) para ampliar mercados, essa hierarquização se

deu em base à criação de raças para justificar a exploração de umas sobre outras. Categorias foram criadas, como Ocidentais vs Orientais, mágico vs racional, primitivo

vs civilizado, “Negro vs Branco” e, embora negros e indígenas fossem inseridos nas

categorias mais inferiores dessa classificação, o Oriente, a princípio, é que foi considerado o principal Outro do Ocidente, segundo Quijano (2005), enquanto os primeiros, sobretudo os negros, eram percebidos como “os primitivos”. No entanto, o período que marca de forma incisiva e mais elaborada49 a construção do Outro e de raças se dá a partir do século XVIII com o surgimento de vários discursos, estudos e pesquisas científicas de forma mais sistematizada e com maior alcance acerca das características dos humanos, dos traços, qualidades, propensões e essas formas de classificações, apontavam “espécies, gêneros e raças humanas” (MBEMBE, 2014, p. 37).

Esse período foi determinante para afirmar e fixar no imaginário coletivo, não sό europeu, as diferenças físicas, biológicas e culturais, a supremacia branca. Foi também nesse período que começaram as exposições “étnicas” na Europa, trazendo para o Velho Continente, povos colonizados para servir de espetáculo e “estudos” para os olhares sedentos de diversão e experimentações. Os “zoológicos humanos” marcaram a separação entre “o belo e o bruto, o bem e o mal, entre nόs (brancos) e eles (indígenas, negros)” (DOMENICI, 2015, p. 30). Pessoas sozinhas ou grupos inteiros foram expostos em feiras de cidades como Paris, Londres e Roma. Diferentemente dos Freak

Shows, que exibiam pessoas com alguma anomalia física como anões, gigantes, crianças

barbudas etc., essas feiras mostravam o corpo “exótico” proveniente das colônias européias no final no século XIX.

Esses eventos foram fundamentais para a criação da visão racista sobre o Outro e das teorias raciais, cujos princípios se apoiavam sobre as diferenças biológicas que determinariam até mesmo a ideia de culturas inferiores e superiores. A Itália também recebeu exposições do gênero e ainda contribuiu com a descoberta do craniômetro, instrumento portátil inventado em 1886 para medir o tamanho do crânio dos indivíduos, relacionando alguns corpos a maior propensão para o crime e a delinquência (DOMENICI, 2015). Um dos cientistas que utilizava o craniômetro é justamente o italiano e médico higienista Cesare Lombroso (1835-1909), ainda em uma época de transição entre os diversos reinos para um único e centralizado “Reino da Itália”. Esse

médico, fundador da Escola Italiana de Criminologia, é autor da tese que sustentava ser a criminalidade genética e hereditária, além da ideia de que algumas “raças” são mais propensas que outras para o crime e que a evolução humana levada ao estágio mais avançado era representada nos corpos brancos, enquanto o estágio primitivo era a “raça negra”. Ele também foi um dos propulsores do racismo italiano ao distinguir entre uma “raça do sul” e uma “raça do norte”, por causa da influência árabe na região e de outros povos do mediterrâneo, como gregos e espanhóis.

Para Hall (1997, p. 83), foram três os momentos determinantes que marcaram o “encontro” do ocidente com o seu outro dando origem ao que ele chama de “avalanche de representações populares”. O primeiro aconteceu em meados do século XVI entre os comerciantes europeus e os reinos da África, originando a escravização dos últimos pelos primeiros e um tráfico intercontinental de pessoas altamente lucrativo que durou mais de três séculos. O segundo momento ocorreu com a colonização dos territórios africanos logo após a abolição do tráfico de escravos e a partilha de terras, mercados e matérias primas entre as potências européias. Já o último momento ocorreu com as migrações depois da segunda guerra mundial, levando o “terceiro mundo” para o Norte do globo. Ainda hoje as migrações, embora diferentes nas formas e nas causas, constituem um encontro entre o “legítimo” e seu Outro.

Nas ex-colônias e na Europa, com o advento das sociedades multiculturais, a questão dos corpos é ainda marcada pela racialização. As representações desses corpos ultrapassaram o período colonial e deixaram encarnados muitos resquícios, reconfigurando relações ao invés de criar um “novo racismo”, como aponta Balibar (2004). Para esse filόsofo francês, essa persistência das estruturas coloniais se dá devido à incapacidade da Europa de criar formas políticas renovadas, de administração e institucionais para oferecer parâmetros de relações diferentes entre as pessoas. A Europa ainda possui aparatos administrativos e institucionais que reproduzem o modelo colonial nas relações dos europeus/brancos com os Outros, principalmente com relação ao tratamento desses corpos. Exemplo disso está na burocracia que alguns cidadãos de alguns países enfrentam para obter o visto, para conseguir trabalho, ou as representações e discuros midiáticos, além da política habitacional das cidades europeias que empurram imigrantes para certas áreas e não menos importante é a diferença de salários entre os europeus e imigrantes. Mas mais que isso, essa manutenção dessas estruturas de pensamento e de formas institucionais tem um objetivo, a saber, aquele de diferenciar a mão de obra e desvalorizar os trabalhadores para melhor usufruir deles. Incentiva-se

com isso o conflito entre as classes subordinadas, ao dividi-las, enfraquecendo a luta por direitos e pela valorização do trabalho.

Nos aeroportos internacionais, é perceptível o controle maior com relação aos corpos oriundos das ex-colônias ou países empobrecidos, da limitação do direito de circulação desses corpos e a detenção em Centros de Identificação e Expulsão (CIE) na Itália e por toda a Europa, o que constitui uma ideia tão violenta quanto o próprio princípio de expulsão declarado no nome da sigla, onde os direitos são suspensos e os imigrantes reduzidos à “vida nua” (DI FLORA, 2011; AGAMBEN, 2010). Por toda a Europa foram espalhadas estruturas de contenção desses corpos e na maioria dos casos, sequer sabemos o que acontece lá dentro, pois existe uma política deliberada de cerceamento do campo visual das pessoas e a negação do conhecimento sobre determinados assuntos, exercido por governos, mas também pela mídia hegemônica a serviço do mercado.

A televisão e as mídias em geral são estruturas produtoras e reprodutoras desse discurso colonial e da alteridade. Esse racismo da “descolonização” (BALIBAR, 2004) inverteu o movimento populacional trazendo os ex-colonizados para as antigas metropόles e inserindo esses corpos em um único espaço político e em uma mentalidade que ainda perdura no imaginário coletivo e, como disse Pierucci, “a globalização não apenas coloca o centro na periferia, o colonizador se deslocando até o território do colonizado, mas também termina por levar a periferia para dentro do centro” (1999, p.171).

Para ilustrar como o Outro50 é marcado fisicamente no período colonial Hall

(1997) e Domenici (2015) analisam a naturalidade das sociedades europeias, no final do século XIX e início do século XX, ao usar de violência contra corpos, esvaziando-os da própria história e subjetividade, como no caso da sul-africana Sarah Baartman, conhecida como “The Hottentot Venus”, que foi levada da África do Sul para Londres e depois Paris e exposta em vários espaços públicos e privados, como museus, teatros, casas de shows etc, por um holandês que a levou para Londres. Sarah era o “objeto exótico” das “terras selvagens”, obrigada a se apresentar nua em espetáculos e a ter seu corpo minuciosamente examinado e tocado pelos europeus. Sarah é a perfeita representação da racialização da mulher negra e da mulher colonizada. Seus órgãos genitais foram “estudados”, antes e depois da sua morte, e seus restos mortais ficaram

na Inglaterra até 2002, assim como uma reconstituição do seu corpo foi exposta no Museu do Homem na França até 197051.

Outro corpo explorado, feito espetáculo e desumanizado, foi o de Ota Benga, um jovem levado do Congo em 1906 para Nova York e exposto em um zoológico da cidade, dividindo uma jaula com macacos. O “espetáculo” atraiu naquele ano milhares de visitantes curiosos para ver o jovem negro que, segundo um jornal da cidade, aparentava cerca 23 anos. Diante de sua jaula, os visitantes podiam ler uma placa com as seguintes informações: “Ota Benga, o pigmeu africano. Idade: 23 anos. Altura: 1 metro e 52 centímetros. Peso: 43 quilos.” O jovem sό foi libertado depois do protesto de um pastor evangélico que soube da sua condição. Oto Benga se suicidou tempos depois.

Essa exposição do corpo feito Outro e a busca por imagens ou cenários para o deleite do olhar dos europeus dos países centrais persiste de diversas formas, como programas televisivos tal qual o Show dos Record, transmitido em noventa países, como Estados Unidos, Reino Unido, Austrália, Japão, Espanha, França, Alemanha, Itália, China e Escandinávia. Esse programa de entretenimento traz pessoas com alguma anomalia física, por exemplo, o menor dos anões, uma mulher barbuda, o homem mais alto do mundo, a menina com o rosto coberto de pelos ou a família mais peluda do mundo (DOMENICI, 2015). Esses corpos são todos de terras distantes e de culturas

Outras, de um mundo que parece não haver nada em comum com aquele da branquitude

burguesa europeia.

Existe também um tipo de “turismo da pobreza” bastante difuso no mundo, que leva europeus brancos e dos extratos médios para visitar países pobres e ver os corpos de seus habitantes, ou seja, os “turistas que procuram o selvagem e alimentam o zoológico” (DOMENICI, 2015, p. 263) como as fotografias com mulheres “girafas” na Tailândia, que são aquelas com argolas no pescoço que o torna mais longo, as excursões

51 Para Domenici (2015), a dramática história de Sarah não terminou nem mesmo depois da sua morte, pois o biologista e naturalista Etienne Geoffroy Saint-Hilaire pediu a autorização para desmembrá-la com o intuito de estudar partes do seu corpo e conservá-la no Musée d’Histoire Naturelle de Paris. Seus orgãos genitais e seu cérebro foram retirados e enfim seu inteiro esqueleto, e essa prática foi descrita com detalhes no artigo “Extrait d’obervations faites sur le cadavre d’une femme connue a Paris et à Londres sous le nom de Vénus Hottentotte”, publicado no Memoires do museu em 1817. Os restos mortais de Sarah foram exibidos até 1937 nesse mesmo espaço, passando depois para o Muséee de l’Homme de Paris, outro importante museu para a exposição do gênero humano em suas diversas formas biológicas, culturais e históricas. Os restos mortais do corpo de Sarah sό foram devolvidos à África do sul depois de protestos por parte de feministas nos anos 70, constrangendo a direção a dar fim à exposição e, posteriormente, após reivindicação do célebre antropólogo sul-africano Philip Tobias que, juntamente com a intervenção de Nelson Mandela, conseguiu o retorno dos restos do corpo em 2002 ao seu país de origem.

para visitar populações isoladas como a Jarawa, no interior da Índia, os indígenas da América Latina, os moradores das favelas do Brasil ou dos townships da África do sul.

Atualmente, o “exótico” migrou para as metrópoles européias servindo também de espetáculo na televisão quando, por exemplo, em um banlieue francês, explode alguma revolta popular como a que aconteceu em 2005, em que jovens, “imigrantes de segunda geração”52, expressaram sua revolta pela exclusão social queimando carros e destruindo lojas e estabelecimentos nos arredores da Cidade das Luzes. Na televisão italiana, não é diferente, os imigrantes, há anos aparecem ligados a casos de crime, exclusão, pobreza e seus países de origem são descritos como locus de produção da alteridade radical da Europa Ocidental quando têm suas vidas colocadas de forma a distanciá-los do modo de vida dos países centrais, ou quando os veículos de comunicação os transformam em uma ameaça para o país com a retórica da (in) segurança ou da “invasão dos ultra corpos” (COMBERIATI, 2015, p. 93)53.

52 Coloco entres aspas o termo porque estes jovens nasceram no país, são cidadãos franceses juridicamente e muitos deles e delas não têm nenhuma ligação afetiva, simbólica ou jurídica com o país dos pais ou avόs, mas politicamente e socialmente são tratados ainda como imigrantes.

53 O autor define “Ultra corpos” como aquele corpo que ameaça a suposta pureza do corpo italiano, “sano” e “puro” com relação ao corpo do estrangeiro ou “alienígena”.

4.

O (A) IMIGRANTE NA ITÁLIA

A Itália apresenta grande relevância no contexto atual das migrações internacionais, sobretudo por dois motivos: 1) O país tem sido o centro das atenções nos últimos anos devido à chegada de imigrantes e refugiados em sua costa através do mar Mediterrâneo, apontado pelos países da União Europeia como “porta de entrada” para a União Europeia. 2) Porque partidos políticos fez do fenômeno das migrações a bandeira política e essa tem pautado todo o debate público, criando uma narrativa e uma representação alarmística de invasão estrangeira para fins eleitorais, além de canalizar a crescente insatisfação da classe trabalhadora pelas perdas de direitos, desindustrialização do país e aumento do custo de vida.

Os imigrantes na Itália foram construídos como causa do sentimento de insegurança pela política, pela mídia e nas relações sociais e os governos canalizaram esse sentimento para se colocarem como solução, promulgando uma série de leis que violam direitos humanos e tratados internacionais, dando a impressão de agir contra o “inimigo”, por sua vez, criado. A União Europeia, em junho de 2019, sinalizou à Italia que seu representante para as questões dos imigrantes no conselho não compareceu nas últimas seis reuniões, ou seja, Matteo Salvini, ministro da segurança e personagem importante nessa pesquisa, dentro do país, realiza um discurso de combate à imigração em nome da proteção dos italianos e da Nação, mas ao se tratar de práticas e propostas, ele está ausente em todos os eventos importantes do orgão, sobretudo na última reunião, ( 6 e 7 de junho/2019) que trataria do direito de asilo político e da reempratiação com todos os ministros do Interior e da Segurança dos países membros.

Os italianos também têm um dos maiores índices de percepção da Europa sobre o número de imigrantes, acreditando que a presença deles e delas é maior do que realmente é, superestimando assim o fenômeno e exagerando, além dos números, as consequências (Ipsos Perils of Perceptions, 2017)54. Para o sociólogo Ambrosini (2019) os italianos percebem a imigração no país em torno de 26% da população, enquanto os dados mostram que não passam dos 9% e, em sua análise, os meios de comunicação tem um papel muito importante na exageração dessa percepção, ao enfatizar corriqueiramente o desembarque de migrantes e refugiados na costa italiana e omitir os números reais daqueles que permanecem no país apόs o desembarque: “é sobretudo a

54 Ipsos Perils of Perceptions é uma pesquisa anual que mede o índice de percepção de populações de diversos países sobre variados temas, dentre eles o da imigração.

imigração representada a influenciar o imaginário e menos a experiência a nível local [...] A percepção todavia conta: no final não são os dados efetivos que influenciam o voto e o discurso público.”55.

Essa percepção da realidade é construída em parte pelos meios de comunicação através da linguagem, de símbolos e produção imagética sobre o fenômeno, daí a importância de estudar uma dessas mídias produtoras de percepção, mas também reprodutora de um sentimento coletivo de um país onde, com base nela, se decide eleições e estratégias políticas. O papel da mídia no país foi apontado por diversos estudiosos, sobretudo a sua linguagem sobre os migrantes, mas também pela exposição massiva de imagens de forma degradante, o que, para Shibatu (2004), é a representação do cidadão que não existe e, para Di Luzio (2011), trata-se de um “engano midiático”, isto é, a forma de retrata os imigrantes como feios, sujos e malvados. Os líderes políticos sabem muito bem a diferença entre percepção e realidade, valendo-se dessa percepção equivocada para alimentar e manter a governabilidade ou a

governamentalidade racista, como aponta Almeida (2018) sobre práticas de exclusão

como estratégia política, influenciando assim o campo visual da população. A fala do ministro da Segurança e do Interior, Angelino Alfano, em 2016, é reveladora dessa estratégia política.

[...] No campo da segurança estamos jogando dois jogos intercruzados, mas diversos: um sobre a realidade e o outro sobre a percepção da realidade. A realidade é que os crimes diminuíram, que nós alcançamos em 2015 o número mais baixo de homicídios da história da Itália, os crimes de roubo diminuíram, a criminalidade organizada nunca esteve tão baixa, soubemos gerir 10 mil manifestações de ordem pública e, sobretudo, soubemos desenvolver um ótimo trabalho na prevenção ao terrorismo (...) Infelizmente é assim e não podemos culpar as pessoas. Temos que trabalhar para que uma percepção errada não modifique a realidade, porque no final o medo incide também na sensação de liberdade. O meu ‘não’ ao cancelamento do crime de clandestinidade diz respeito exatamente a isso: o momento é muito particular e não devemos dar aos italianos a ideia de uma diminuição da tensão sobre a segurança exatamente quando pedimos para acolher os refugiados. 56

55 Tradução da autora da entrevista do sociólogo Mauricio Ambrosini a site Lavoce.inf em 18 de novembro de 2019. Disponível em: < https://www.lavoce.info/archives/49791/migrante-diventa-un- capro-espiatorio/>. Acesso em: 21, dez.2019. Cursivo nosso.

56 Tradução livre e grifo da autora. A entrevista na íntegra pode se lida no site disponível em: http://www.repubblica.it/politica/2016/01/10/news/angelino_alfano_riconosce_che_la_norma_anti- irregolari_del_2009_fu_un_errore_renzi_e_io_non_ideologici_usiamo_buon_sens-130935370/. Acesso em: 03, jul. 2016.

Diferentemente de outros países europeus, a Itália não apresenta um passado colonial a ponto dos habitantes das suas ex-colônias migrarem para a metrópole em grande quantidade como aconteceu na França com os argelinos ou mesmo na Inglaterra com a presença de migrantes oriundos das ex-colônias inglesas (indianos, nigerianos, ganeses, etc.) ou mesmo com Portugal com os cabo-verdianos, moçambicanos, guineenses. Os grupos mais numerosos na Itália, à parte os albaneses, não provêm de antigas colônias italianas, como os marroquinos e romenos. Isso pode ser explicado devido à formação tardia de um Estado/Nação italiano, que até 1861 era constituida por vários reinos e somente depois disso, passou a denominar-se o Reino da Itália. Já a República italiana, é de 1946 e essa tarda unicação, juntamente com o que Blinkhorn (2009) chama de “fraqueza econômica e militar” da Itália, e as tentativas frustrantes de ocupação italiana em alguns países africanos, coloca o país em uma posição diferente das outras nações com relação à migração dos ex colonizados para as antigas metrópoles. As primeiras colônias italianas, a Eritreia e a Somália, constam ser do final do século XIX, a Líbia do início do século XX e a Albânia, durante a ditadura fascista de Mussolini na década de 30 do mesmo século, como aponta Blinkhorn (ibidem). Isso não quer dizer que a Itália seja isenta dos danos do sistema colonial e do racismo, enquanto colonizador, cujos cidadãos do seu país são considerados “o normal, geral, universal” (RIVERA, 2010, p. 61), parâmetro e modelos para outros povos, beneficiando-se dessa posição e do ganho da ideologia racista e colonial.

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