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Corpos Suspensos a caminho da Itália: a fronteirização dos corpos em fuga

O fenômeno das Organizações não Governamentais (ONGs), cujos meios de transporte e salvamento de “migrantes” são os navios, ilustra bem essa nova condição: não existe casa, lar ou local de chegada,81pois os portos foram fechados, as rotas terrestres muradas ou altamente vigiadas. Mas, ao invés de apontar essa condição como um problema estrutural reforçada por governos, o TG1 a apresenta de forma a atribuir aos indivíduos a responsabilidade pela situação, fazendo recair sobre os próprios refugiados, as Organizações de regaste e até mesmo sobre a “cultura” dos países atrasados e subdesenvolvidos, a culpa por migrarem e até mesmo a falta de uma vida cotidiana, de uma “normalidade”. A repetição de imagens, sobretudo desumanizantes de corpos já marcados, pode reforçar o que Zygmunt Bauman escreveu ao jornal LA

81 O alto comissário da ONU para refugiados, Filippo Grandi, disse em uma entrevista para um jornal italiano sobre o discurso do senso comum que ronda o país: “Porque não os ajudam na casa deles?” Grandi se referia ao fato de que a Europa não pode acolher todos os africanos, sendo melhor ajudá-los a permanecer em seu próprio país. Nas palavras do comissário, “se tivessem uma casa, eles não fugiriam e não chamariam refugiados”. A entrevista completa se encontra disponível em: <http://espresso.repubblica.it/plus/articoli/2019/09/02/news/immigrazione-filippo-

REPUBBLICA do dia 29 de março de 200482 chamado de “expulsão do sofredor do campo da obrigação moral”, ou seja, eles sofrem, mas esse sofrimento é causado por eles, pela própria “passividade, fraqueza, preguiça” e, no caso dos imigrantes, por sua origem, condição social, cultura e porque migram.

A maior parte das notícias sobre “imigrantes” ou “migrantes”, no telejornal, está relacionada às chegadas de navios pelo mar Mediterrâneo, sem mencionar biografias, locais de origem, sem distinção de gênero, muito menos o destino final da migração ou a perspectiva de uma vida que possa ser reconstruída após a travesssia, pois, no enquadramento da fonte, não há um depois, salvo em casos de criminalidade, como veremos mais adiante. A maioria das notícias privilegia apenas uma modalidade de deslocamento, uma rota, aquela do Mediterrâneo, “esquecendo” das rotas terrestres ou dos outros confins com outros países e, sobretudo, da rota mais usual, aquela através dos aeroportos internacionais. Esse foco nos Navios e no Meditterâneo corrobora a narrativa épica, como a comparação com uma Odisseia, melhor aprofundada no tópico que seguirá.

Se no mês de dezembro a ausência de notícias no telejornal chama a atenção, em janeiro foram 18 edições dedicadas ao tema. Grande parte retrata os navios de Organizações não Governamentais que resgatam imigrantes em países como a Líbia, trazendo-os para países europeus. Por que em dezembro os navios e os “imigrantes” desapareceram do noticiário justamente no mês em que muitos dos requerentes de asilo ou aqueles que já haviam adquirido um visto humanitário tiveram seus pedidos revogados e foram expulsos de centros de acolhida?

Janeiro foi o mês dos navios, dos “Corpos Suspensos”: “São pessoas que mostram marcas, cicatrizes das torturas sofridas no inferno da Líbia”, diz o prefeito de Siracusa, na Sicília, na edição do dia 26 de janeiro. O navio Sea Watch precisava de autorização para desembarcar, mas nenhum país o acolheu. A Itália também negou a permissão. O apresentador do telejornal anuncia que o navio traz a bordo 47 “imigrantes” (termo usado pelo TG1) e ele pede que o governo italiano autorize ao menos o desembarque de menores de idade. Na ocasião, foi lida a declaração do Ministro Matteo Salvini: “Sobre o navio Sea Watch não mudo de ideia e estou pronto

82 Texto de Zigmunt Bauman no jornal La Repubblica do dia 29 de março de 2004 intitulato “Noi spettatori del male”. Disponível em:

<https://ricerca.repubblica.it/repubblica/archivio/repubblica/2004/03/29/noi-spettatori-del-male.html acesso dia 21/02/2020.> Acesso em: 14, abr. 2020.

para processar a tripulação.” A embarcação é propriedade de uma Organização alemã, enfatiza o apresentador.

A notícia sobre migrantes do dia 31 de janeiro traz a seguinte Chamada: “Terminou a Odisseia da Sea Watch”. A jornalista Emma D’aquino anuncia o desembarque de “migrantes” no Porto de Catania e diz que os adultos foram para Messina, sugerindo que menores foram separados. Mas a notícia é rápida. Logo em seguida, Salvini aparece falando em um programa televisivo “A linha firme convenceu a Europa”. Nessa notícia, é interessante a utilização do termo Odisseia. O termo se refere a um poema épico da Grécia antiga atribuído a Homero. O poema narra as aventuras de Odisseu, herói da Guerra de Trόia e, nesse poema, o protagonista viaja, conhece mares, luta e leva dez anos para chegar à terra natal.

Essa metáfora para se referir aos refugiados que chegam pelo Mediterrâneo está presente na fonte estudada, mas também em livros como “L’oddissée des migrants em Mediterranée” (MARI, 2015). Por que transformar em “aventura” um percurso onde milhares de pessoas perdem a vida diariamente, além de ser extremamente violento e perigoso, pois muitas dessas embarcações são precárias e viajam abarrotadas de corpos? E por que o corpo negro é o representante da Odisseia no mar Mediterrâneo? A resposta pode estar na “civilização do espetáculo” (LLOSA, 2012), que transforma as notícias e a informação em divertimento, escândalo e drama, banalizando a violência e generalizando a frivolidade através do jornalismo irresponsável. As imagens viram mercadoria e a mercadoria precisa ser consumível. É nesse sentido que a Odisseia dos refugiados ganha uma utilidade a serviço desse tipo de civilização. Essa narrativa serve para alimentar essa “trágica viagem”, com pitadas de aventuras, cujo desfecho, muitas vezes, é a morte, retirando, assim, a crueldade e a responsabilidade do continente europeu, de governos e mercados, por essas vidas.

Dentro dessa narrativa, o negro, já construído como raça inferior, encarna o “desapossessamento, o descartável, o solúvel” (MBEMBE, 2014, p. 18), ideal para a instrumentalização a serviço dessa narrativa. Doando-lhe certo tom de aventura, a chegada de corpos negros através de navios pode ser mostrada diariamente sem sentimento de culpa ou de horror, tampouco de luto com relação às mortes, vistas como efeito colateral pela ousadia de migrar. Ilvo Diamonti, na abertura do VII Rapporto Carta di Roma (2019), pontuou que “são raros os casos em que os refugiados e os requerentes de asilo são representados como indivíduos dotados de capacidade de ação e de controle e, por outro lado, quando acontece, o orientamento do título é

prevalentemente negativo”. Mas dentre os refugiados, aqueles sírios tiveram outra acolhida na Europa, melhor do que aqueles provenientes dos países africanos e com isso podemos concluir que esse corpo negro, de menor valor diante desses primeiros, podem ser usados para falar de “aventura” no mar mediterrâneo.

Não é somente a condição de refugiado que torna esse corpo vulnerável, mas qual o corpo ela incarna. Na cidade de Lyon, França, caminhando pelas estradas, vi muitos pedintes com cartazes na mão escrito “Sou refugiado sírio”, enfatizar isso é um modo de se diferenciar dos demais. Inclusive, mais de hum milhão deles foram acolhidos pela Alemanha e outros tantos pela Suécia, que sό em 2016 recebeu 51.540 sírios83.

A ênfase na rota do Mediterrâneo é também uma forma de sustentar essa narrativa épica, uma vez que nenhuma outra rota migratória ou de fuga de refugiados é privilegiada como essa, pois o perigo do mar, os corpos que naufragam, gritam por socorro ou se agarram a um fio de vida, torna a narrativa mais próxima da tragédia grega. A narrativa de “braço de ferro” (termo usado em uma das edições), cujo foco é na disputa entre ONGs e governo, mostra prevalentemente o lado somente do segundo e omite o fato que, comtemporaneamente, desembarques continuam acontecendo no sul da Sicília e que, pelos aeroportos internacionais ou portos, migrantes e refugiados continuam, enquanto navios são proibidos de atracar em outros (Diamonti apud Carta di Roma, 2019).

Federici (2015, p. 200) chama de “função corpórea” a utilização de corpos para fins políticos ou a serviço de uma ideologia. A função desses corpos chamados de “migrantes” é a de sublinhar que a migração é um movimento dos pobres para os países ricos e eles “se aventuram” em busca de melhores condições de vida, o que a Europa proporciona e seus países de origem, não. Exemplo disso está na notícia do dia 11 de janeiro de 2009, cuja temática era “Refugiados climáticos”. A notícia fala do aquecimento global, a causa desse fenômeno, e de como isso influencia o deslocamento, gerando refugiados. O Serviço não diz que as mudanças climáticas atingem a todos,

83 Sobre os refugiados sírios na Suécia, é curioso o caso que veio a público das crianças sírias que chegam ao país e entram em coma por meses ou até ano. Em sueco, o nome dado a essse estado, quase vegetativo, que atinge crianças e adolescentes é “uppgivenhetssyndrom”, traduzido para o português como “síndrome da desistência” (tradução nossa). Essas crianças dormem sem nenhuma causa aparente ou problema físico por longos meses e precisam ser alimentadas por soro, movimentadas por terceiros. Especialistas dizem que o trauma da guerra e da fuga é tao forte que elas tentam remover da memória, entrando em um estado de coma e quando acordam não se lembram de nada. Disponível em: <https://www.truenumbers.it/immigrazione-in-svezia>. Acesso em: 23, jun. 2020.

independentemente do lugar, da nação, raça ou classe84. Mas qual corpo foi escolhido para a notícia? Foram utilizados corpos da população do Panamá. Por que não foram usados corpos de franceses se estes são também atingidos pelas mesmas mudanças climáticas? Os corpos de pobres e populações distantes da Europa têm geralmente essa função de falar de algo sem atingir os habitantes do centro do mundo, o stablishment, além de reforçar o imaginário de que quem migra são sempre os condenados da terra.

A imagem abaixo ilustra uma instalação no interior de um navio. Os imigrantes dormem em beliches, pelo chão e em quartos coletivos. O corpo é quase sempre enquadrado no coletivo e dificilmente ele aparece individualmente ou tem voz própria e biografia, tampouco laços afetivos ou sociais como família, amigos, trabalho etc. O corpo do que o TG1 chama de imigrante é esvaziado de sua subjetividade, sempre no meio da massa e em condições precárias e desumanizadoras, por isso, os denomino de “Corpos Suspensos”, uma vez que ainda estão a caminho.

Figura 5 - Dormitório coletivo de “imigrantes” no interior de um navio

Fonte: Imagem exibida na edição do dia 27, jan. 2019 do telejornal TG1.

Na imagem abaixo, vemos o mar e três rapazes que miram o infinito (Fig. 6). Por enquanto, nada de terra. Um dos corpos tem frio, pois está enrolado em um cobertor. São eles, corpos de homens, negros e jovens, o que se repete com frequência. É interessante notar que dificilmente os idosos são representados no fenômeno da

84 Mudanças climáticas estão aumentando a temperatura de países europeus, como a França, com grande impacto sobre a agricultura. Alguns tipos de uva e vinho, na França, estão ameaçando com a situação climática, embora, o sul do mundo seja muito mais atingido, pois suas economias são majoritariamente dependestes dos produtos agrícolas. Mas mesmo assim, o TG1 poderia ter utilizado corpos de agricultores franceses, por exemplo.

migração. Talvez porque não haja uma perspectiva a partir da qual os corpos mostrados estejam inseridos, trabalhando, formando família, criando vínculos e envelhecendo na Itália. A imigração é um fenômeno jovem, segundo a representação dominante, o que para Sayad se dá porque o imigrante é considerado força de trabalho, provisória e precária. Envelhecer no país, criar raízes e existir sem estar trabalhando é impensável para as sociedades acolhedoras (SAYAD, 2002). Por isso, o corpo velho não aparece na representação da imigração.

Figura 6 - Jovens “imigrantes” em um navio olhando para o mar

Fonte: Imagem exibida pelo TG1 na edição do dia 25, jan. 2019.

Figura 7 - Homens no interior de um navio se alimentando

Desde a guerra na Síria, iniciada em 2011 e a desestabilização de diversos países árabes como Líbia, Tunísia, Egito, pessoas dessas áreas fogem em busca de proteção, mas somente 10% dos sírios, por exemplo, pediu asilo na Europa (UNHCR, 2015). O pico de pedidos de asilos por sírios foi em setembro de 2015 com 64.349 pedidos. De 2011 a 2015, calcula-se que 11,5 milhões de pessoas fugiram da Síria e, nesse período, foram 579.184 aqueles que pediram asilo no espaço jurídico europeu. Só na Itália foram 2451 pedidos e, na Grécia, 5229, enquanto na Suécia 11.974 pedidos, já em Portugal, por exemplo, foram somente 205.

Acolher ou não refugiados, facilitar a entrada de grandes grupos e famílias é uma decisão política. E isso diz muito sobre o tipo de corpos que os Estados querem no seu território e quando os querem. Por exemplo, Angela Merkel, mesmo sendo de partido de direita, mudou de forma significativa os termos da acolhida e do estereόtipo de que apenas a direita age como “braço de ferro” contra os imigrantes ao abrir a fronteira da Alemanha, em 2015, para 20 mil pessoas que entraram através do confim com Budapeste. Ao todo, nesse mesmo ano, a primeira ministra alemã aceitou receber mais de hum milhão de refugiados sírios, o que surpreendeu o mundo.

Numa entrevista, o especialista em demografia, Reiner Klingholz, revelou o déficit alemão que se faria sentir fortemente no futuro, com o alto índice de idosos no país e o baixo índice de natalidade, um dos menores da Europa. Para ele, a Alemanha precisaria dos refugiados para que seu sistema de previdência não entrasse em colapso85. Podemos nos perguntar o porquê, diante da tragédia do mar Mediterrâneo, com o intenso fluxo de embarcações e mortes de pessoas, a Alemanha não tenha acolhido estes, mas apenas os sírios? O professor de economia internacional da Universidade de Messina, Bruno Sergi e o doutorando em Ciências Econômicas, da mesma Universidade, Giacomo Morabito, dão uma explicação bastante plausível para a escolha da primeira ministra.

Comparados aos migrantes de outras nacionalidades, os sírios se integram mais facilmente e podem se orgulhar de um melhor nível de educação. Eles podem ser considerados um recurso válido do ponto de vista profissional, como já demonstrado no passado. Os sírios no exterior nunca foram uma comunidade de trabalhadores, mas na maioria eram profissionais (médicos, professores e empresários). Além disso, de acordo com dados do Banco Mundial, em 2010, a Síria recebeu aproximadamente US $ 2 bilhões em remessas (uma quantia que não leva em consideração as remessas por canais

85 Disponível em: <https://www.spiegel.de/international/germany/interview-on-german-demographics- immigration-and-integration-a-973320.html>,. Acesso em: 21, fev. 2020.

informais, como dinheiro recebido de parentes residentes no exterior). Em 2014, no entanto, esse número foi reduzido significativamente (US $ 1,623 bilhão), e isso surgiu principalmente dos dados referentes às remessas provenientes da Alemanha, de US $ 105 milhões (2010) para apenas US $ 26 milhões (2014 ).86

Esse aspecto sobre quais os refugiados são aceitos nos dias atuais, quais nacionalidades têm precedência em relação a outras e qual tipo de corpo é acolhido ou rejeitado é de fundamental importância, pois revela também uma concepção de humanidade e de cidadania que é construída a partir do corpo e da nacionalidade.

Segundo a Agência da Organização das Nações Unidas para refugiados (UNHCR), em 2018, 37 mil pessoas se deslocaram diariamente no mundo. A grande maioria dos refugiados que deixaram seus países foi recebida pelos países pobres. As vítimas da guerra da Síria, por exemplo, foram acolhidas predominantemente pela Turquia, Jordânia, Líbano e Egito, já os refugiados do Sudão foram para países como Uganda, Quênia, República Democrática do Congo e Etiόpia. E dos países da União Europeia, a Alemanha é o primeiro em termos de acolhida de refugiados sírios, seguida da Suécia.87

Os refugiados chegam, sobretudo, do Gâmbia, Senegal, Mali, Guiné Bissau, Costa do Marfim, Marrocos, Somália, Sudão e Camarões (AGENCIA IL VELINO E ANSA in Analisidifesa, 13, março de 2016). Além do número de sírios na Itália ser pequeno com relação aos outros países, os que chegam, chegam prevalentemente por rotas diversas daquela do Mediterrâneo, invisíveis para a mídia, fora da massa, pelo aeroporto, como mostra a reportagem do dia 27 de junho de 2019 feita pelo jornal LA REPUBBLICA, sobre a chegada de 77 sírios no aeroporto de Fiumicino, em Roma. O título da reportagem é “Desembarcados 77 refugiados sírios graças ao Corredor Humanitário” (Rede de apoio da Igreja Evangélica e a Organização Tavola Valdese com o apoio do Ministro do Interior e da Segurança Matteo Salvini).

Fui verificar o TG1 desse dia, apesar de já ter terminado o tempo de coleta de dados, para ver se havia transmitido essa notícia, mas nenhuma nota sobre esse acontecimento. Percebe-se que a chegada de refugiados via aérea não faz parte dessa

Odisseia e tampouco os corpos são os mesmos. Ao contrário, o próprio Matteo Salvini

86 Texto publicado no jornal IL SOLE 24 ORE disponível em: <https://st.ilsole24ore.com/art/commenti- e-idee/2015-09-13/perche-berlino-apre-solo-siriani-081352.shtml?uuid=ACkMJ1w.> Acesso em: 21, fev. 2020.

87 Documento da Agência das Nacões Unidas para refugiados no link

nesse mesmo dia, de acordo com o próprio TG1, anuncia que não receberá mais “migrantes” que chegavam em outro navio. Enquanto o jornal anuncia sua linha dura, no mesmo dia, o próprio ministro negocia e autoriza a entrada desse grupo de sírios no país com uma rede de apoio de Organizações e Igreja. Esses corpos que não aparecem no TG1 têm suporte e encontram na política uma brecha de entrada e até mesmo aceitação.

Vejamos abaixo como esses corpos aparecem, quem pode entrar e quem fica de fora da “Fortaleza Europa” (SASSEN, 1999) e quais as modalidades de transporte com que chegam, pois isso diz muito sobre classe social, raça e sobre Nações, além de revelar o nexo entre “pobreza e corpo” (COCCO, 2014, p. 115). Quem chega de forma invisível são aqueles que, provavelmente, têm uma condição privilegiada com relação a quem chega através das embarcações, expostos de forma exacerbada. A maior parte dos sírios, das camadas mais baixas, por exemplo, encontram-se ainda hoje nos campos de refugiados da Jordânia e do Líbano (OIM, Roma), já os das classes mais privilegiadas e com maior capital social conseguem migrar através de outras modalidades e redes, como vimos acima.

As nacionalidades que chegam na Itália mudam constantemente, dependendo do período, das condições sociais e econômicas de cada país de origem. Em 2013, por exemplo, os refugiados que desembarcaram na Itália eram originários da Síria, Eritreia, Somália e Egito (REPUBBLICA, 4 de outubro de 2013). Em 2018, a principal nacionalidade dos requerentes de asilo e proteção humanitária foram do Paquistão, Nigéria, Bangladesh (EUROSTAT, 2018), já em 2019, as principais nacionalidades foram representadas pela Tunísia (25% do total), Paquistão (10%), Argélia (9%), Iraque (8%) e Costa do Marfim (7%) ( Colombo in Lenius.it, outubro de 2019).

O Jornal LA REPPÚBLICA (2013) trouxe uma matéria trazendo algumas das causas e da situação social, política e econômica dos países de origem dos refugiados:

Eritreia - governo ditatorial.

Somália - Conflito entre forças do governo e grupos armados como o Al- Shalab, além de uma grande carestia, a pior em 25 anos.

Egito - Tensão entre o presidente deposto e os opositores. Nigéria - Perseguição religiosa, grupo extremista Boko Haram. Paquistão - Ditadura e perseguição política.

Gâmbia - Violação de direitos humanos, pobreza extrema. Mali - Golpe de Estado em 2002 e repressão.

Afeganistão - Ataques do grupo talibã e conflitos internos entre diferentes grupos.

Sudão- Repressão e violência do governo, violação dos direitos humanos.88

Entre as pessoas que chegam, algumas nacionalidades são ausentes, por exemplo, a Namíbia, Ruanda, Botsuana e mesmo Serra Leoa que possuem um dos maiores índices de pobreza e um dos menores Indices de Desenvolvimento Humano (IDH) do globo. Em países onde não há guerra, onde ainda há recursos naturais, uma economia estável, onde grupos religiosos e etnias vivem pacificamente, a fuga e deslocamentos em massa não acontecem como nos demais países. Na Nigéria, por exemplo, um dos países mais ricos em termos de recursos naturais (Petróleo), vive-se uma grande crise hídrica, levando as pessoas a migrarem por motivos climáticos,

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