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3 HISTÓRIA E IMAGEM

3.1 A CONSTRUÇÃO DA HISTÓRIA

A constituição da área de História como campo disciplinar está situada no século XIX, quando a produção historiográfica passa a contar com o estabelecimento de um paradigma que orientava o registro do conhecimento histórico – o historicismo, desenvolvido por Leopold Von Ranke (1795-1886). Com o desenvolvimento da Escola Rankiana, estabeleceu-se que, por meio das fontes oficiais existentes nos arquivos, e só por meio delas, se poderia escrever história. Uma história-narração dos grandes acontecimentos políticos e militares, que se apresentava como a história de grandes heróis, distante do cotidiano da população comum. Tal visão sobre o fazer histórico se coadunava ao pensamento intelectual da época, buscando mostrar a verdade sobre o que aconteceu no passado. Esta concepção ficou conhecida como história tradicional e também foi influenciada pelo positivismo de Augusto Comte, que não via nesse campo de conhecimento, a possibilidade de ser científico, uma vez que era incapaz de estabelecer leis universais e de se valer do método físico-matemático para estudar os fatos históricos, vistos como singulares, únicos e irrepetíveis (CORSETTI, 2001).

Uma visão alternativa começa a surgir na França, no início do século XX, com a publicação da Revista Annales d’Histoire Economique et Sociale, em 1929, sob influência de Marc Bloch e Lucien Febvre inaugura-se a Escola dos Annales, a qual se opunha à chamada história événementielle, ou história factual, interessada apenas nos fatos singulares, os quais estavam registrados em documentos preservados em arquivos oficiais. Bloch e Febvre demonstraram a

fragilidade das crenças dos praticantes da história factual, em sustentar a cientificidade deste campo do conhecimento, na atribuição do valor de verdade, contido nas informações presentes nestes documentos. A partir dessa nova visão, surge a possibilidade de se conhecer o cotidiano das populações que viveram e produziram a sua realidade no passado e, para isso, alargou-se o conceito de fonte para a escrita da história.

A historiografia passa a ser produzida a partir de poesias; músicas; memórias; objetos de trabalho; fotografias e pinturas, sendo composta por todos os vestígios que auxiliam os pesquisadores na construção interpretativa da realidade experimentada no passado. Com a ampliação do conceito de fonte, a historiografia também passa a interagir com outros campos do conhecimento, estabelecendo diálogos interdisciplinares com a antropologia, a paleontologia, a geografia, a psicologia, a arte, a engenharia, a demografia, enfim, com qualquer área que possa auxiliar na interpretação das fontes localizadas (VAINFAS, 1997).

Em 1956 Fernand Braudel assume a direção dos Annales e até 1969 constitui a sua segunda geração. São delineados os contornos de uma escola e estabelecidos novos métodos, como a história serial, em que Braudel demonstra os diversos tempos presentes na história das sociedades: onde há o tempo longo, da relação dos seres humanos com a natureza; o tempo médio, onde se delineiam as conjunturas sociais, econômicas e políticas e, por fim, o tempo curto dos acontecimentos. Estabelecem-se também os conceitos de estrutura e conjuntura, como suportes da produção historiográfica. Nessa fase a escola assume um caráter mais sintético em que predomina uma visão socioeconômica da história (VAINFAS, 1997).

Na terceira geração dos Annales, a partir da década de 1970, com a direção de Jacques Le Goff emerge com mais claridade a história das mentalidades, definidas por Vainfas (1997, p. 199) como “estruturas de crenças e comportamentos que mudam muito lentamente, tendendo por vezes à inércia e à estagnação” delineia-se um estudo da vida cotidiana e suas representações, com foco nos processos mentais. Assim se origina a Nova História, que propunha novas perspectivas para prática da pesquisa, definindo o seu caráter científico enquanto uma ciência em construção, abrindo-se consideravelmente os campos de pesquisa. A atenção passa aos microtemas do cotidiano social, como as representações, a morte, o medo, o amor, o corpo, as relações de gênero, a criança, os modos de comer, de vestir, de estudar. Emerge a micro- história e abandonam-se as explicações globalizantes, sendo adotadas a descrição e a narrativa dos fenômenos sociais e culturais.

Na década de 1980 emerge a Nova História cultural, contando com a contribuição, não só dos intelectuais franceses. Sendo identificada pela pluralidade, Vainfas (1997, p. 223-224) delineia três maneias distintas de produzi-la, concebidas pelos historiadores: a história da cultura, construída pelo italiano Carlo Ginzburg, por meio das noções de cultura popular e de circularidade cultural; a história cultural de Roger Chartier, de origem francesa, constituída a partir dos conceitos de representação e de apropriação; e, a história da cultura, desenvolvida na Inglaterra por Edward Thompson, especialmente nos seus estudos acerca dos movimentos sociais e o cotidiano das “classes populares” inglesas do século XVIII. Para Vainfas (1997, p. 235), é possível identificar na obra destes autores, três modelos de história cultural, os quais, apesar das significativas diferenças, compartilham de uma reabilitação da importância dos contrastes e conflitos sociais no plano cultural, sem cair nas concepções interclassistas que foram severamente criticadas na corrente da história das mentalidades.

É importante salientar que este percurso de construção do conhecimento historiográfico, à medida que integra ao seu campo de investigação uma variedade de temáticas, precisa desenvolver aproximações com as mais diversas disciplinas para ser eficiente em suas análises e interpretações. Assim se constrói também a necessidade nesta pesquisa, de uma aproximação interdisciplinar dos conhecimentos de história e seu ensino, em conjunto com o uso das imagens e das tecnologias digitais.