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3.3 Semiárido Brasileiro (SAB)

3.3.3 A convivência com o semiárido

A Conferência de Estocolmo (1972) tornou-se um marco na construção do debate sobre as relações essenciais entre desenvolvimento e meio ambiente, resultou na estratégia para harmonizar as necessidades básicas da humanidade com as capacidades limitadas dos recursos naturais. Essa ocasião expressa à manifestação de um novo paradigma, a passagem da

concepção mecanicista para uma visão holística e ecológica, reconciliando ser humano e natureza e rompendo com a visão antropocêntrica (SILVA, 2003, 375).

O crescimento econômico passa a ser observado com bons olhos desde que, justiça social e eficiência no uso dos recursos naturais façam parte do processo. Essa idealização passou a conduzir o discurso sobre o conceito de desenvolvimento sustentável e ao mesmo tempo constituir avanços na formulação de alguns princípios e critérios de sustentabilidade.

A partir desse enfoque,

A dimensão social da sustentabilidade expressa a perspectiva includente do desenvolvimento como estratégia de redução das disparidades de renda e de riqueza, com um patamar razoável de homogeneidade social. Submetida a essa orientação sociocultural e ambiental, a sustentabilidade econômica é a promoção do crescimento das forças produtivas e da produtividade ambientalmente equilibrada, com a construção de novas dinâmicas de geração e de redistribuição social das riquezas, incentivando atividades produtivas adaptadas às condições ecológicas de cada território, baseando-se na utilização racional dos recursos naturais e na valorização do trabalho humano. A sustentabilidade política é explicitada num processo contínuo e participativo de conquista da cidadania, com a democracia definida em termos de apropriação universal dos direitos humanos, incluindo a capacidade de participação na formulação e implementação de projetos de desenvolvimento (SILVA, 2007, 475).

Com base no que foi exposto, o desenvolvimento sustentável deve ser entendido como algo que é durável, sustentado primeiramente pela natureza, o ecossistema, do qual somos dependentes para tudo. Por conseguinte, ―para que possa sustentar-se, ele tem que levar em conta as regras e os limites da natureza. Sem descuidar do bem-estar humano, dos valores da cultura, da realização plena da cidadania‖ (CAVALCANTI, 2012, p.36).

As críticas ao atual modelo civilizatório de desenvolvimento segundo Silva (2003), tem direcionado a formulação do pensamento rumo a sustentabilidade e ao desenvolvimento sustentável. É neste sentido que a convivência com o semiárido está sendo edificada, levando em consideração a necessidade e a possibilidade de conviver com a Caatinga a partir da valorização do local, da educação formal e informal, da diversidade cultural e a recomposição e afirmação de identidades e territórios.

A convivência com o Semiárido deve justificar-se socialmente através da:

Possibilidade de construção de alternativas apropriadas de trabalho e melhoria de renda, principalmente para a população sertaneja que vive de atividades agrícolas. A construção de novas perspectivas de desenvolvimento junto a populações marcadas pela condição de pobreza exige a articulação das medidas de gestão ambiental sustentável com as iniciativas sociais que resultem em melhoria das condições de vida (SILVA, 2007, p.477).

O discurso da convivência pode tornar-se vazio caso essa conjectura não seja colocada em prática, fazendo com que a miséria que permanece na região fique sem uma resposta adequada dando continuidade a esse panorama marcado pela vulnerabilidade da população pobre. A solução para essa problemática, ―implica e requer políticas públicas permanentes e apropriadas que tenham como referência a expansão das capacidades humanas, sendo necessário romper com as estruturas de concentração da terra, da água, do poder e do acesso aos serviços sociais básicos‖ (SILVA, 2003, p.379).

Essa mudança paradigmática passou a ocorrer de fato com a seca de 1992/93 que mobilizou a sociedade civil organizada e esboçou reação pressionando o governo federal por ações imediatas e cobrando a elaboração de um plano permanente para o Semiárido, a resposta do governo foi a formulação do Projeto Áridas que se trata de uma proposta de desenvolvimento sustentável para o Nordeste.

Este projeto está pautado no reordenamento do espaço e da economia do Semiárido propondo um conjunto de medidas para ocupação demográfica e produtiva compatível com a capacidade de suporte dos recursos da terra e da água, preocupando-se com o meio ambiente e com a melhoria da qualidade de vida nesse espaço inspirado na Conferência Mundial do Meio Ambiente e Desenvolvimento ocorrido no Brasil em 1992 (Rio-92) (SILVA, 2007, p.478).

Outro marco importante foi a constituição da Articulação do Semiárido (ASA) a partir da união de várias organizações governamentais que estiveram presentes durante a Terceira Sessão da Conferência das Partes das Nações Unidas da Convenção de Combate à Desertificação (COP 3) ocorrida em Recife/PE no ano de 1999, por conseguinte, foi divulgado a Declaração do Semiárido assegurando a possibilidade de convivência com as condições do Semiárido brasileiro (GOMES; PENA, 2012, p.45).

O Programa de Formação e Mobilização Social para Convivência com o Semiárido – Um milhão de Cisternas Rurais (P1MC) foi idealizado pela Articulação do Semiárido (ASA) no ano de 2001. Em dez anos foram construídos cerca de 400 mil cisternas de placas no semiárido brasileiro beneficiando, aproximadamente, 1.200.000 pessoas. A partir do ano de 2007 a rede de entidades elaborou o projeto Uma Terra e Duas Águas – P1+2 fomentando a utilização sustentável da terra e o manejo adequando dos recursos hídricos para produção de alimentos, com a função de promover a segurança alimentar e a geração de renda (GOMES; PENA, op cit., p.46).

O Programa Água para Todos, foi instituído pelo Decreto nº 7.535, de 26 de julho de 2011, tem desempenhado um papel importante ao possibilitar a acessibilidade das águas às populações mais pobres do SAB através de várias tecnologias sociais como cisternas de

consumo, de placas ou de polietileno, barreiros e kits de irrigação. Esse programa está voltado ao atendimento prioritário a população de baixa renda ou em situação de extrema pobreza. A meta inicial desse programa foi de instalar 750 mil cisternas, no período de julho de 2011 a dezembro de 2014, até março de 2015 já foram instaladas 823 mil cisternas (BRASIL, 2015).

Das Políticas Públicas que atuam no combate a pobreza cabe destacar o Programa Bolsa Família (PBF) instituído em 2003 ao incorporar benefícios anteriores (Bolsa Escola, Auxílio Gás, Bolsa Alimentação, Cartão Alimentação) trata-se de um programa de transferência direta de renda.

De acordo com Pires e Jardim (2014, p.101) o PBF concentra-se em três dimensões essenciais para o enfrentamento da fome e da pobreza: a) o alívio imediato da pobreza, por meio de transferências diretas de renda; b) o apoio ao desenvolvimento das capacidades das famílias por meio de programas complementares, como o Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (PETI); e c) o reforço ao exercício de direitos sociais básicos como saúde e educação, através das condicionalidades, ou seja, dos tipos de ações desenvolvidas pelo Estado para promoção social, ruptura do ciclo intergeracional da pobreza possibilitando direitos sociais garantidos na Constituição.

O Programa Garantia Safra foi estabelecido em 2002, trata-se de uma política voltada para a agricultura familiar destinada ao segmento mais vulnerável desta categoria social visando garantir renda aos agricultores mais pobres afetados pelas perdas de safras em caso de secas. Os municípios afetados devem estar localizados na região Nordeste do País e dentro da área de atuação da SUDENE, esse programa é executado no âmbito do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf) (GRISA; SCHNEIDER, 2014, p.136).

Segundo Campos (2014) os programas sociais como o Garantia Safra, associado ao Bolsa Família, tem demonstrado ser eficiente na redução dos impactos sociais causados pela secas recentes. No entanto, esses programas precisam ser melhorados e adaptados às condições locais das populações que serão atendidas.

São inegáveis os avanços que essas políticas públicas e sociais têm alcançado, mas para mudar a realidade de forma permanente da população vulnerável do semiárido existe um longo caminho a ser percorrido. Questões como o acesso a terra, redução das desigualdades regionais, o combate a pobreza e de modo geral a promoção do desenvolvimento humano deve ser priorizado sem deixar de incorporar as dimensões ambientais a partir de uma visão sustentável.

Nessa conjuntura o fenômeno das secas no Semiárido Brasileiro (SAB) passa ter uma nova compreensão, ao invés de ser atribuída meramente a fatores físicos que tem servido para

ocultar a condição real de vulnerabilidade da população sertaneja afetada periodicamente pelos efeitos das secas, passou a ser caracterizado como produto das relações sociais estabelecidas ao longo de séculos de povoamento nessa região.