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4.1 Breve introdução

4.1.3 Caatinga do Cariri paraibano

Segundo Souza, I. B.(2008) as microrregiões do Cariri encontram-se localizados no centro-sul do estado da Paraíba, num eixo que se distancia de 180 a pouco mais de 300 km de João Pessoa (capital), perfazendo um vasto território com uma área de 11.192,01km², o que equivale a pouco mais de 20% do estado em questão. Em termos administrativos, essa região é composta por 29 municípios, dos quais 12 fazem parte do Cariri Oriental e 17 estão inseridos no Cariri Ocidental (IBGE, 2010).

O Cariri Oriental de acordo com Souza, I. B. (2008) apresenta médias pluviométricas baixas (400 a 500mm/ano), relevo com topografia suave ondulada a ondulada. O Cariri Ocidental registra médias pluviométricas um pouco maiores (500 a 600mm/ano), relevo com declividade mais acentuada e economia mais dinâmica, tanto na pecuária como na agricultura.

A cobertura vegetal encontrada no Cariri trata-se ecologicamente segundo Duque (2004), de uma Caatinga alta (densas ou fechadas) situadas em altitudes que podem variar de 400 a 600m, constituída também de espécies espinhentas, unidas, de pequeno porte, de caules duros com exceção das cactáceas.

A temperatura média anual é 26°C, com médias mínimas inferiores a 20°C e a umidade relativa do ar não ultrapassa 75%. A riqueza e a diversidade da vegetação são condicionadas pela pluviosidade reduzida e o relevo dividido em basicamente duas unidades: terrenos dissecados e o nível da Borborema (BARBOSA et al., 2007, p.314).

Espécies como macambiras (Bromelia laciniosa), caroá (Neoglasiovia variegata) cobrem o chão, intercalados de arbustos lígneos e retorcidos e de algumas espécies típicas

como o umbuzeiro (Spondia tuberosa), cardeiro (Cereus peruvianus), catingueira (Caesalpinia pyramidalis) quixabeira (Sideroxylon obtusifolium) entre outras (DUQUE, 2004, p.124).

Ao estudar as Caatingas do Cariri Alves (2009) identificou quatro grandes tipos, um deles foi citado por Andrade Lima (1981). Trata-se da vegetação arbustiva aberta que faz parte da comunidade de Caesalpinia-Aspidosperma típica de terras altas da Borborema, especificamente Cariris da Paraíba com 1 ou 2 m de altura presente em setores com aridez edáfica severa com solos compactos e pedregosos e com grande quantidade de afloramentos rochosos. Os outros três tipos são:

- Astronium-Schinopsis-Caesalpinia: Caatinga arbórea média variando entre 8 e 15 m geralmente situadas em relevos acidentados;

- Caesalpinia-Bursera-Spondias-Aspidosperma: Caatinga arbustiva com altura inferior a 7 m, com substrato muito ramificado desde o nível do solo;

- Calliandra-Pilocereu: Caatinga arbustiva aberta baixa com cerca de 70 cm de altura, formadas por pequenos arbustos dispostos em tufos esparsos e separados por grande extensão de solo nu, ou recobertas por um tapete gramíneo e herbáceo por vezes bastante desenvolvidos.

O entendimento do papel da ação antrópica na alteração da cobertura vegetal da Caatinga ao longo do tempo no Cariri paraibano e as consequências da degradação ambiental é necessário levar em consideração os diversos usos da terra e destacar as principais atividades econômicas desenvolvidas nesse espaço.

Para isto, é importante recorrer a relatos históricos contendo aspectos ecológicos que indicam o estado da vegetação em tempos pretéritos. Frei Martin de Nantes em uma viagem ocorrida no século XVII entre a Capitania de Pernambuco e uma aldeia Kariri no Sertão da Paraíba (atual município de Boqueirão) descreve algumas características:

Marchávamos desde a manhã até à noite, sob os ardores do Sol, a oito graus e meio da linha, do lado do Sul, e durante o tempo mais quente do ano nesse país. Não foi esse o maior trabalho, pois que, não havendo caminhos batidos, era preciso romper moitas espessas e florestas de canas selvagens, ocas por dentro, mas grossas como um braço e cheias de espinhos fortes e rijos em todos os nós, da altura de uma lança ou mais, entrelaçadas umas nas outras. E porque apoiavam o seu peso umas nas outras, era necessário que os nossos índios abrissem o caminho por meio de facões do tamanho de um pé e meio, cortando do alto a baixo para passar por baixo, como sob uma abóbada; e porque esses pobres índios não podiam, em tão pouco tempo, limpar o caminho e havia necessidade de olhar tanto para cima como para baixo, para não ferir o rosto, eu esbarrava muitas vezes nas canas com muita dor, de sorte que não tinha mais dedo do pé que não estivesse ferido [...]. Entrando nas solidões vastas e assustadoras, fui surpreendido por certo medo, tanto mais quando não havia uma folha sobre as árvores e pareciam com as nossas, em tempo do inverno, e não se

cobriam de folhas senão quando viam as chuvas, nos meses de fevereiro e março (NANTES, 1979, p. 31-32).

O relato aponta para o período de estiagem, ele destaca pontos interessantes a respeito da vegetação ao afirmar que se apresentava densa e com porte arbóreo, atentou-se para perda da folhagem e os espinhos. Em seu retorno para o Pernambuco Nantes (1979) apresenta mais alguns detalhes sobre a vegetação no período chuvoso e a mudança na paisagem:

Fiquei somente oito meses nessa aldeia; porque, tendo sabido que havia muitas aldeias de cariris no rio São Francisco resolvi para lá seguir; por essa razão, voltei a Pernambuco com quase tanto trabalho quanto o que havia suportado na ida para a missão, debaixo de chuva desde o dia de nossa partida até proximidades de Pernambuco, já perto da quaresma. Pensei perder-me numa floresta que tem doze a catorze léguas de percurso, distanciado dos índios por minha inadvertência. Quando percebi, eles estavam longe, tendo tomado outro caminho. Foi com dificuldades que eles me ouviram, quando gritei várias e várias vezes a plenos pulmões. (NANTES, op. cit., p. 33).

Os relatos do frei Nantes indicam que a fisionomia da vegetação Caatinga apresentava- se pouco alterada. A cobertura padrão típica da área de Caatinga era relativamente fechada, como descrita nos relatos supracitados. No entanto, ―uma proporção considerável dessa vegetação (não há dados precisos, mas é estimada entre 30% e 50%) está bem mais aberta e mais baixa que originalmente, pelo desmatamento repetido, para usos diversos (lenha, agricultura e pecuária)‖ (SAMPAIO, 2010, p.35).

Mesmo tendo uma grande variedade de espécies da fauna e da flora, a pressão antrópica no Bioma Caatinga tem evidenciado ao longo do tempo uma degradação acentuada desse ambiente. O esgotamento dos recursos naturais torna-se um problema grave e as consequências são sentidas em um grau mais elevado pelas populações rurais carentes e pouco assistidas pelo poder público, vulneráveis a eventos de secas prolongadas e expostos ao perigo da desertificação.