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Breve histórico das políticas públicas de ―combate à seca‖ no Nordeste

3.3 Semiárido Brasileiro (SAB)

3.3.2 Breve histórico das políticas públicas de ―combate à seca‖ no Nordeste

Política pública segundo Souza, C. (2006, p.26), deve ser entendida como ―o campo do conhecimento que busca, ao mesmo tempo, ―colocar o governo em ação‖ e/ou analisar essa ação e, quando necessário, propor mudanças no rumo ou curso dessas ações‖. Trata-se de uma ferramenta governamental responsável por ações e decisões que possam beneficiar direto ou indiretamente a sociedade, voltada para solucionar ou não certos problemas. As políticas públicas também podem ser representadas como o produto final da disputa entre uma fração da sociedade que procura proteger e garantir seus privilégios.

No Nordeste brasileiro, as políticas públicas e sociais desenvolvidas ao longo do tempo foram baseadas na relação de poder entre os diversos atores sociais presentes nesse espaço. Os prolongados períodos de estiagem e o flagelo vivido pelas populações vulneráveis do semiárido serviram para manter durante muito tempo o status quo da elite latifundiária e das oligarquias, uma vez que esse fenômeno foi responsabilizado por todos os problemas sociais e econômicos.

Desse modo, a compreensão sobre os eventos das secas periódicas e a elaboração de soluções que serviram para minimizar seus impactos são mostrados a seguir de forma breve, não é o foco principal dessa pesquisa tratar especificamente da construção das políticas públicas e sociais desenvolvidas nesse espaço, mas é necessário compreender como elas foram iniciadas e a quem serviram ou servem.

Os relatos dos períodos de secas no Brasil de acordo com Gareis et al. (1997) são descritos desde o século XVI, o jesuíta Antônio Pires (1552) foi responsável por uma das primeiras referências ao fenômeno das secas no Nordeste brasileiro junto com outro jesuíta chamado Fernão Cardim (1583).

O fenômeno das secas no SAB só passou a ser historicamente consideradas como problema nacional a partir da segunda metade do século XVIII (1877-1879). Segundo Villa (2000), os efeitos desse fenômeno foram catastróficos, teria dizimado cerca de 4% da população nordestina, erigindo o Nordeste desde então em ―região-problema‖. As políticas

assistencialistas criadas para atender essa região surgiram a partir da solicitação de providências a serem tomadas pelo imperador Dom Pedro II para amenização da situação ocasionada por essa grande seca.

No final do século XIX e início do século XX as lideranças políticas locais aumentaram a pressão sobre o governo por ajuda durante os períodos de escassez de chuva, as ações emergenciais e as ações hídricas estavam entre as principais reivindicações. A institucionalização das propostas de combate aos efeitos da seca surge dentro dessa conjuntura com a instalação da ―Comissão de Estudos e Obras Contra os Efeitos das Secas‖ em 1904, e posteriormente com a criação da ―Superintendência de Estudos e Obras Contra os Efeitos das Secas‖ (SILVA, 2007, p.472).

Alguns anos depois foi criada a Inspetoria de Obras Contra as Secas (IOCS) a partir do decreto presidencial nº 7.619, de 21 de outubro de 1909, ―esse órgão iniciou suas pesquisas nas regiões mais atingidas pelas estiagens e concluiu que a melhor solução seria estabelecer uma política de armazenamento de água para suprir a população e a agricultura nos momentos de escassez‖, por conseguinte, as bases da política hidráulica para o ―combate à seca‖ foram consolidadas (ANDRIGHETTI, 1998, p.20).

No ano de 1919 esse órgão se transformou na Inspetoria Federal de Obras Contra a Seca (IFOCS), com a severa seca no ano de 1932 o governo autorizou a construção de reservatórios, grandes, médios e pequenos com o pressuposto de tornar a região menos vulnerável aos efeitos das secas, houve também a criação de frentes de trabalho que foram direcionadas aos flagelados nos municípios de origem. Para Campos (2014, p.77) é a partir desse período que se intensifica o paradigma da ―solução hidráulica‖.

Esse órgão foi responsável também pelo estabelecimento do Polígono das Secas no ano de 1936, essa delimitação tinha como suposição o desenvolvimento e a operacionalização das políticas de mitigação aos efeitos da seca transformando-se em área de atuação desse aparelho estatal (TRAVASSOS, 2012, p.74).

No ano de 1945 o IFOCS tornou-se Departamento de Obras Contra a Seca (DNOCS), surgiu com uma proposta bem ampla ao se propor ―combater a seca‖ em qualquer lugar do país. No entanto, como aparelho estatal operante estava subordinado às intervenções políticas das elites regionais que disputavam nos parlamentos as verbas disponíveis. O DNOCS mostrava-se impossibilitado de atuar sem ter que seguir as diretrizes que permeiam os interesses dos grandes latifundiários e coronéis (ANDRIGHETTI, 1998, p.20).

Uma das mais intensas secas da história climática do Nordeste aconteceu no ano de 1958, independente de dispor de uma rede de açudes, estradas e um aparato institucional

significativo, tais como o DNOCS, Banco Nacional do Nordeste (BNB), a Comissão do Vale do São Francisco (CVSF) e a Companhia Hidro Elétrica do São Francisco (CHESF), foram criadas frentes de serviço para atender 500.000 habitantes da região semiárida, o dobro dos que foram atendidos na seca de 1932 (CAMPOS, 2014, p.78).

O Seminário para Desenvolvimento Econômico do Nordeste, realizado em Garanhuns (PE), de 26 de abril a 3 de maio de 1959, de acordo com Campos (2014, p.78) foi o marco para o desenvolvimento regional do Nordeste, foi debatido tanto por cientistas, como por técnicos, políticos e empresários. É nesse contexto que a Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste (SUDENE) emerge sob o comando de Celso Furtado.

O paradigma da solução hidráulica no Nordeste deixou de ser prioridade a partir do momento que as leituras sobre o fenômeno das secas deixam de ser baseadas apenas em aspectos climáticos passando a ser aceita a condição econômica e social. A busca da ―modernização econômica e técnica‖ das atividades produtivas no Semiárido passaram a nortear as políticas oficiais como forma de solucionar o problema das secas (SILVA, 2007, p.473).

Com o início do Regime Militar houve uma modernização conservadora, uma parte dos projetos desenvolvidos a priori pela SUDENE passaram a ser abandonados e outros foram desenvolvidos através da política industrial com a transferência de empresas sediadas no sudeste, modernização do setor agrícola e o fomento a práticas de irrigação em algumas localidades, conhecidas como ―ilhas verdes‖. O DNOCS passou a desempenhar papel preponderante frente à construção de mais reservatórios.

O que se pode observar com base nessa política desenvolvida pelos governos ao longo do tempo, no tocante a amenização dos efeitos da seca através do IOCS/IFOCS/DNOCS e SUDENE, é que esses mecanismos não contribuíram efetivamente para minimizar os problemas dos trabalhadores rurais e os pequenos proprietários de terra que sempre e ainda estão na condição de extrema vulnerabilidade.