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Apesar das receitas cambiais crescentes, o balan¸co de pagamentos e a balan¸ca do com´ercio em particular, ficaram deficit´arios nos anos 70. A crise do petr´oleo, em 1973, ´e um fator- chave para esse desequil´ıbrio da balan¸ca do com´ercio. O pre¸co do petr´oleo quadruplicou por decis˜ao da OPEP.21 Nota-se que muitos bens intermedi´arios passaram a ser importados pelos pa´ıses latino-americanos para manter o n´ıvel de produ¸c˜ao. Esse crescimento das im- porta¸c˜oes contribuiu para essa situa¸c˜ao, e muitos pa´ıses foram for¸cados a tomar empr´estimos de curto prazo para financiar o d´eficit em conta corrente. Esse processo foi um dos fatores que causaram a crise da d´ıvida externa da Am´erica Latina.

Al´em disso, o colapso financeiro em 1982 foi visto por muitos como sinal claro do esgo- tamento do modelo de substitui¸c˜ao das importa¸c˜oes.22 Uma das cr´ıticas mais comuns feitas ao processo de industraliza¸c˜ao na Am´erica Latina destaca o problema dos altos custos dos bens produzidos, um fenˆomeno freq¨uentemente atribu´ıdo `a falta de competi¸c˜ao.23

a) Fluxos de Capitais para a Am´erica Latina

O desenvolvimento do fluxo de capital internacional desde o fim da Segunda Guerra Mundial at´e os anos 80 pode ser dividido em trˆes per´ıodos. De 1945 at´e 1960, investimentos privados de empresas norte-americanas dominaram o fluxo. O capital do setor p´ublico tinha um papel secund´ario. Esse cen´ario mudou drasticamente com a crise de Cuba em 1962, que alertou os Estados Unidos da Am´erica (EUA). A estagna¸c˜ao no continente sul-americano

21 OPEP=Organiza¸c˜ao dos Pa´ıses Exportadores de Petr´oleo.

22 Mewes (2000, p. 1) destaca o problema do planejamento estrat´egico das economias latino-americanas. Os recursos

n˜ao foram alocados de forma eficiente. As ind´ustrias que surgiram n˜ao foram, em muitos casos, capazes de operar sem a prote¸c˜ao de barreiras tarif´arias.

podia levar a uma probabilidade maior de golpes social-revolucion´arios. Em seguida, um programa de apoio foi iniciado, o que levou a um fluxo significativo de capital dos Estados Unidos para os governos da regi˜ao. Esse fluxo de capital cessou no final dos anos 60 e no in´ıcio do anos 70.

O lugar do governo dos Estados Unidos e das grandes institui¸c˜oes financeiras de fomento foi tomado pelos bancos internacionais que procuravam oportunidades lucrativas para aplicar os petrod´olares.24 Os juros eram baixos, comparados com as taxas de infla¸c˜ao vigentes.

Al´em disso, os cr´editos n˜ao eram condicionados `a execu¸c˜ao de pol´ıticas econˆomicas, como, por exemplo, os cr´editos do Fundo Monet´ario Internacional (FMI). Apesar disso, em poucos anos, os pa´ıses da Am´erica Latina multiplicaram seus n´ıveis de endividamento.

Os pa´ıses latino-americanos n˜ao tinham recebido antes cr´editos em propor¸c˜oes iguais. Os investidores preferiam as economias com grande mercado interno, pois as perspectivas futuras desses pa´ıses pareciam muito promissoras. Por isso, Argentina, M´exico e Brasil concentravam quase 70% da d´ıvida da Am´erica Latina. No come¸co, o endividamento n˜ao parecia problem´atico, a receita das exporta¸c˜oes foi crescente e os juros sobre a d´ıvida externa foram baixos. Mas o quadro internacional mudou com a emiss˜ao de t´ıtulos do governo norte- americano na gest˜ao de Ronald Reagan. Os juros nos mercados internacionais de capital alcan¸caram um patamar relativamente elevado. A Am´erica Latina perdeu, com o in´ıcio da recess˜ao mundial, uma parte das receitas provindas das exporta¸c˜oes. Al´em disso, os termos de troca come¸caram a se deteriorar. O resultado foi que, em 1986, em m´edia 40% das receitas de exporta¸c˜ao foram usadas para pagamentos de juros e amortiza¸c˜oes. No caso da

24 O termo petrod´olar ´e usado para denotar o grande fluxo de d´olares, primeiro para os pa´ıses, produtores de

petr´oleo, que se beneficiaram da quadruplica¸c˜ao do pre¸co de petr´oleo no ano de 1973, e, depois, para os bancos comerciais na Europa e nos Estados Unidos, onde os ´Arabes aplicaram os fundos. A abundˆancia dos recursos pressionou o n´ıvel das taxas de juros para baixo.

Argentina, esse n´umero alcan¸cava 80%.25 Em 1984, a Bol´ıvia cancelou todos os pagamentos

para credores estrangeiros ap´os ter usado mais de 60% das receitas de exporta¸c˜oes para pagar juros.

b) Fatores Internos e Externos da Crise da D´ıvida Externa

Podemos, ent˜ao, citar v´arios fatores externos e internos que contribu´ıram para a crise da d´ıvida externa da Am´erica Latina em 1982. Os pa´ıses centrais enfrentaram uma recess˜ao, e os desenvolvimentos nesses centros financeiros afetaram o tamanho dos fluxos de capitais para os pa´ıses em desenvolvimento.26 O aumento significativo das taxas de juros interna-

cionais dificultava a rolagem da d´ıvida dos pa´ıses emergentes. Um terceiro fator externo foi o choque dos termos de trocas nessa d´ecada. Entre os fatores internos, destacam-se falhas no gerenciamento da pol´ıtica cambial.27 Muitos pa´ıses entraram em dificuldades de pagamento por causa das supervaloriza¸c˜oes da moeda dom´estica.

A supervaloriza¸c˜ao foi, por sua vez, em muitos casos, o resultado de pol´ıticas fiscais inconsistentes, em combina¸c˜ao com um sistema de cˆambio de desvaloriza¸c˜oes nominais pro- gramadas. A supervaloriza¸c˜ao do cˆambio em combina¸c˜ao com um d´eficit crescente da conta corrente afetou a credibilidade do pa´ıs. A crise cambial do M´exico, em fevereiro de 1982, foi um aviso claro da morat´oria do ano seguinte.28 Como rea¸c˜ao, os bancos comerciais dos pa´ıses centrais reduziram drasticamente os fluxos para fundos em pa´ıses em desenvolvimento, em particular para os da Am´erica Latina. Ainda assim, pa´ıses que tentaram evitar os dese- quil´ıbrios econˆomicos, como a Colˆombia, foram afetados pela redu¸c˜ao dr´astica do fluxo de

25 De acordo com Waldmann (1997, p. 41-42).

26 De acordo com Calvo, Leiderman e Reinhart (1996, p. 124). 27 Segundo Edwards (1995, p. 22).

capital. A tendˆencia geral de fuga de capital devido `a supervaloriza¸c˜ao do cˆambio foi, talvez, o impacto mais negativo para as economias da Am´erica Latina.29 Os anos anteriores `a crise foram caracterizados por um aumento da d´ıvida externa da Am´erica Latina de US$ 45,2 bilh˜oes para US$ 176,4 bilh˜oes entre 1975 e 1982.30

No M´exico, por exemplo, o governo populista de Luis Echeverr´ıa Alvarez e Jos´es L´opez Portillo financiaram uma expans˜ao de gastos do governo com empr´estimos externos. A recente descoberta de petr´oleo tinha aumentado o otimismo a respeito da economia mexicana. Sem fluxos de capital, a ´unica op¸c˜ao era usar todos os instrumentos dispon´ıveis para inverter a posi¸c˜ao na balan¸ca comercial e gerar o maior super´avit poss´ıvel.