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A cronologia do progresso e da civilização do Brasil, em Caetano Lopes de Moura

PARTE I H ISTÓRIA N ARRATIVA

3.3 A cronologia do progresso e da civilização do Brasil, em Caetano Lopes de Moura

A centralidade da noção de civilização também é evidente no Epitome

Chronologico da Historia do Brasil, publicado em 1860 pelo baiano Caetano

Lopes de Moura. Trata-se de uma espécie de resumo da história do Brasil que organiza fatos cronologicamente e que oferece uma narrativa na forma de um catálogo de eventos datados no interim entre 1500 e 1840, atenta, sobretudo, àqueles que "concorrerão para o progresso da civilização".22

20 LIMA, José Inácio de Abreu e. Op. cit., 1843, p. 303-304. Grifo do original.

21 LIMA, José Inácio de Abreu e. Introducção. In:___. Op. cit., 1843, p. VI-VII. Grifo do original. 22 MOURA, Caetano Lopes de. Epitome Chronologico da Historia do Brasil, para o uso da Mocidade Brasileira. Paris: Aillaud, Monlon, 1860, p. 1.

Essa mesma estrutura de catálogo factual em organização cronológica foi utilizada por Joaquim Manoel de Macedo, porém com a diferença de sua cronologia organizar-se por dias e meses ao invés de anos. Cf. MACEDO, Joaquim Manoel de. Ephemerida Historica do Brasil. Rio de Janeiro: Typographia do Globo, 1877.

Moura enumera sobretudo os feitos da colonização pela civilização, como, por exemplo, ao enaltecer que a administração de Mem de Sá, que ocupou o posto de governador geral do Brasil em 1558, "deu o maior impulso á colonização do Brasil e á conversão e civilização dos Brasís, seus brutos e selvaticos aborigenes, ajudado dos padres da companhia de Jesus". Sua fala acerca do período colonial frequentemente trata de medir "progressos" das capitanias, conforme demonstrado por sua preocupação com o "estado de prosperidade e pujança" de Olinda, ao observar que "a capitania de São-Vicente tinha também feito grandes progressos", e ao celebrar que "a capitania do Espirito-Santo, desafrontada dos temiveis Aimores, começava a florescer, graças ao estabelecimento de um collegio de jesuitas, que fizerão um semnumero de néophitos". Para Moura, o veredito é que Portugal havia feito bem para a civilização do Brasil, porém dentro dos limites em que lhe era permitido pelas circunstancias, mas, ainda assim, julgava, os colonizadores portugueses teriam sido capazes de fundar, "n'uma região delles tão remota, uma colonia tão adiantada em civilização, população e riqueza". Nesse compasso, dizia, "ia progredindo a colonização do Brasil".23

A cronologia de Moura trata com especial atenção as invasões de holandeses no Brasil durante o período colonial. Indagava, por exemplo, sobre o impacto para o desenvolvimento da colônia: "Que capital immenso, incalculado, se achava assim apartado e distrahido do emprego [...]! E como era possivel que progredisse a agricultura e com ela a civilização dos indigenas?"; para Moura, a investida da "occupação hollandeza foi uma das maiores pancadas que teve o Brasil quando colonia".24 Contudo, Moura compreende que, apesar do impacto das invasões holandesas, a civilização persistia no Brasil:

Apezar das desgraçadas circumstancias em que se achava a metropoli, e da impossibilidade em que se via, incerta do seu proprio porvir, de entender no augmento e prosperidade das diversas capitanias do Brasil, aquellas dentre ellas que tiverão a felicidade de não serem alcalcanhadas hos hollandezes não deixarão de progredir, se bem que com lenteza e vagar [...]. Donde se conclue que, apezar das guerras [...], não deixou de ir em augmento no Brasil a população e a colonização.25

23 MOURA, Caetano Lopes de. Op. cit., 1860, p. 31-45. 24 MOURA, Caetano Lopes de. Op. cit., 1860, p. 86-87. 25 MOURA, Caetano Lopes de. Op. cit., 1860, p. 112-114.

A história da colonização concebida por Moura também se preocupou com o papel dos nativos indígenas em relação à civilização do Brasil. Para Moura, enquanto "ao homem civilizado pouca terra abasta", os indígenas viviam dos recursos "que a terra espontaneamente lhe dá" e mudavam "de pouso logo que esta lhe não acode com o costumado pasto e novidade", e, como consequência, os nativos opunham resistência "a tudo quanto lher coarctava a liberdade e sultura com que vivião". Por conseguinte, concluía, os nativos acabavam por "necessariamente retardar o progresso da começada colonização". Além disso, observava Moura que "a injustiça manifesta com que os colonos Portuguezes, a despeito das leis e ordens de seu proprio Soberano", sujeitavam os indígenas criou uma indisposição de ânimos e "lhes tornou odiosa a civilização".26

De acordo com sua narrativa da trajetória do Brasil, a colônia ganhou importância no ministério de Pombal, durante o qual, segundo Moura, "não deixou de progredir a colonização" porque o ministro instituiu o diretório dos índios.27 Elaborado em 1755 e publicado em 1757, o documento dispôe sobre aldeamentos indígenas do Estado do Grão-Pará e Maranhão e é composto por 95 artigos dedicados à "civilização e conversão dos Brasís", dos quais Moura cita 56 "quasi por inteiro" porque, justificava, "encerra elle maximas e conselhos de que ainda nos podemos aproveitar no concernente á civilização de nossos Brasís"28; isto é, devido à utilidade reconhecida no passado e que ainda seria útil no presente "para civilisar seus rudes e desconversaveis habitantes".29

O século XIX, segundo Moura, é a "época marcada pela providência para a emancipação do Brasil", cuja importância teria sido inaugurada em 1807 com a chegada de D. João VI ao Brasil.30 Nesse período, teria ocorrido toda

A Ephemerida de Joaquim Manoel de Macedo também destaca, ao tratar da importância da liberdade de imprensa para o progresso do país, que o domínio holandes trouxe desenvolvimento para o Brasil: "em Pernambuco, no Recife, capital do Brazil hollandez, o principe Mauricio de Nassau tinha contado entre os consideraveis elementos de progresso e de civilisação, que illustraram o seu sabio governo, uma typographia, cujas publicações não eram por certo

amesquinhadas pela coacção da censura prévia" (MACEDO, Joaquim Manoel de. Op. cit., 1877, p. 11-12).

26 MOURA, Caetano Lopes de. Op. cit., 1860, p. 114-115. 27 MOURA, Caetano Lopes de. Op. cit., 1860, p. 154. 28 MOURA, Caetano Lopes de. Op. cit., 1860, p. 154-158. 29 MOURA, Caetano Lopes de. Op. cit., 1860, p. 218. 30 MOURA, Caetano Lopes de. Op. cit., 1860, p. 230.

uma ordem de "providencias, que se derão para o engrancedimento, civilização e augmento progressivo da população" no país, entre as quais:

instituiu-se uma junta chamada da conquista e civilização do Indios e navegação do Rio-Doce [...]; vulgarizou-se a pratica da vaccina, a qual só por si foi uma das causas efficientes do augmento da população [...]. Deo-se princiio á creação duma Academia de bellas artes, creação que, se ao principio encontrou não poucas difficuldades por se não acharem bastantes sujeitos versados nas disciplinas que ás artes liberaes dizem respeito, não deixou de progredir com o volver dos annos de progredir.31

Do retorno de D. João VI para Portugal até a abdicação de D. Pedro I ao trono em 1831, e de 1831 até 1840, a cronologia do Brasil elaborada por Moura lista a criação de vilas e destaca o desenvolvimento das províncias. Desse modo, a narrativa de Moura configura uma história preponderantemente política do Brasil cuja reunião de fatos que parece integrar o mesmo processo de civilização, progresso e desenvolvimento iniciado com a colonização.32

Na obra da Caetano Lopes de Moura, observa-se a composição de uma história da autonomia do Brasil, de colônia a país independente, cuja narrativa percorre o trajeto da chegada dos portugueses, passando pela colonização, até a abdicação de D. Pedro I. O enredo narra, notadamente, o empenho civilizatório de Portugal, de colonos e de jesuítas, frequentemente contra a natureza e os nativos, pelo estabelecimento de populações em vilas, cidades, etc. Dai, diante da exposição de tamanho empreendimento, Moura chegar a dizer que "a colonização do Brasil, do flurescente imperio sud-americano", iniciada "pouco mais ha de trezentos annos", era uma "verdade historica tão palpavel e evidente que ella só basta em sendo enunciada para mostrar com quanta injustiça levantão os estrangeiros que somos, só e aqueles de quem descendemos, desleixados, inertes e preguiçosos".33

31 MOURA, Caetano Lopes de. Op. cit., 1860, p. 239-243. 32 MOURA, Caetano Lopes de. Op. cit., 1860, p. 327-349. 33 MOURA, Caetano Lopes de. Op. cit., 1860, p. 25.

3.4 O retrato dos potenciais e dos entraves para a civilização do

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