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4. SISTEMAS DINÂMICOS COMPLEXOS

4.1 A dinâmica de sistemas complexos

O discurso deve ser entendido como um sistema, o qual pode até se tornar previsível em determinados momentos, contudo ao longo da interação com outros participantes não é possível controlar seu fluxo (LARSEN-FREEMAN E CAMERON, 2008). No discurso empreendido pelos professores sobre violência escolar em análise, perguntas foram realizadas pelo moderador, o qual estava na expectativa de certas respostas, que até apareceram, mas muitas vezes os interlocutores desenvolviam aquele tópico com exemplos particulares, complementavam as suas e as réplicas dos outros

participantes do grupo focal, de modo que outros assuntos foram discutidos, novas concepções emergiram e foram construídas colaborativamente.

Um sistema complexo é caracterizado por ser formado a partir de outros sistemas complexos, podendo gerar resultados imprevisíveis, devido as suas condições iniciais. Augusto (2009) diferencia sistemas complexos de sistemas lineares ao afirmar que os primeiros são todos constituídos de outros todos, isto é, são subsistemas de sistemas. Ela exemplifica esta afirmação com um relógio, que desmontado, é constituído de partes e não de todos, pois se uma das partes faltar, o relógio não funcionará. Os sistemas complexos, em contraposição, não têm este tipo de relação de dependência entre seus elementos, pois se uma célula morre ou uma formiga se perde, isto tem pouco efeito sobre o sistema ao qual pertencem (PALAZZO, 1999 apud AUGUSTO, 2009). O sistema do discurso construído em um grupo focal é autônomo e se mantém vivo, mesmo sofrendo algumas adaptações. As conexões entre os elementos do sistema são tão complexas, que rapidamente este encontra um meio de adaptar-se, embora não seja possível determinar o impacto destas adaptações. De acordo com Brooks (2007), é onde caos e complexidade se complementam, pois a imprevisibilidade dos sistemas caóticos surge da sensibilidade a qualquer transformação nas condições que controlam o seu desenvolvimento.

As sequências de adaptações estimulam a dinamicidade do sistema para que este continue existindo. O sistema não se encaminha para um equilíbrio, pois estará morto, mas busca a estabilidade. Larsen-Freeman e Cameron (2008) argumentam que um sistema no limite do caos muda adaptativamente para manter a estabilidade, demonstrando um alto nível de flexibilidade e sensibilidade. Um sistema simples se desenvolve de forma previsível, já que estabelece conexões estáticas, como por exemplo, os semáforos (LARSEN-FREEMAN E CAMERON, 2008), os quais não são de maneira alguma afetados por elementos externos a si (carros, motoristas, pedestres, outros sinais de trânsito, etc.). É característico de um Sistema Dinâmico Complexo, por outro lado, variar inúmeras vezes, já que quanto mais variações tiver, mais forte e duradouro ele se torna, uma vez que há uma ampla gama de conexões entre os diversos elementos internos e externos que o formam. Para Waldrop (1992), em sistemas complexos, cada componente ou agente se encontra em um ambiente produzido por suas interações com outros agentes no sistema. Por essa razão nada que o compõe é fixo. O discurso possui variações conceituais, pois as infinitas possibilidades de conexões que pode haver entre os agentes proporcionam essa característica, ainda que o

sistema apresente agentes que por si já são estáveis, as suas relações com os outros agentes especifica e altera o sistema, fazendo emergir particularidades inerentes ao próprio discurso. A cognição é um dos agentes do discurso, pode-se dizer, desse modo, que as operações cognitivas não se manifestam sempre da mesma forma, mas fazem emergir metáforas de maneiras específicas e a depender do contexto discursivo.

Outra característica que tem sido apontada frequentemente por diversos autores (DE BOT, LOWIE E VERSPOOR, 2007; LARSEN-FREEMAN E CAMERON, 2008) como recurso necessário do sistema para atingir momentos de estabilidade é a variabilidade. Ao variar, o sistema está transformando o seu padrão de comportamento, encaminhando-se para estados denominados como atratores. Segundo Larsen-Freeman e Cameron (2008) um atrator é entendido como uma região específica no espaço de fases no qual o sistema tende a se movimentar, ou seja, um conjunto de estados para os quais o sistema tende a emergir. Dentre os possíveis estados, aqueles que não são preferíveis são chamados de estados repelentes (DE BOT & VERSPOOR, 2007). Os atratores são temporários, mas dependendo da força que eles têm, maior ou menor quantidade de energia será exigida do sistema. Isso ocorre no discurso quando o tópico discursivo se torna interessante e facilmente se conecta a conhecimentos prévios dos participantes do grupo. O sistema alcança certa estabilidade e mais difícil fica para que outro tópico seja desenvolvido, já que o tópico discursivo funciona como um atrator, e dependendo de outros agentes no sistema ele pode ganhar mais ou menos força.

A fim de exemplificar o conceito de atratores, Augusto (2009), baseando-se em Larsen-Freeman (1997; 2007) e Larsen-Freeman e Cameron (2008), apresenta ilustração de um casal dançando uma sequência de ritmos diferentes, segundo o autor cada ritmo se configura como um atrator, pois o casal terá que assumir um padrão diferente de comportamento na elaboração dos diferentes estilos de dança e assim permanecer por algum tempo. No entanto, o casal de dançarinos poderá em um mesmo ritmo apresentar variações de comportamento.

Reforçando o conceito de sistema, podemos afirmar que eles se encontram de forma submolecular, ou seja, envolvidas em outros sistemas que, por sua vez, igualmente estão contidos em outros sistemas. No momento da interação discursiva, por exemplo, outros sistemas estão envolvidos, tais como os sistemas socioculturais e cognitivos de cada participantes. Além disso, o discurso como um todo pode revelar outros discursos dentro de si, com tópicos mais definidos, por exemplo, quando se fala da violência na mídia, os participantes também expressam sentimentos de medo

vivenciados em seu local de trabalho, apontam possíveis causas para o alto índice de violência nas escolas atualmente como desestrutura familiar, desigualdades sociais, etc.

Esta noção de discurso presente no interior de outro discurso pode ser traduzida como fractal. O conceito de fractal foi trabalhado por Mandelbrot (1982) com objetivo de descrever exemplos semelhantes, independentemente da escala de visualização. Alguns exemplos de fractais podem ser observados na natureza como a árvore, pois quando se corta um galho de uma árvore, o galho apresenta os mesmos aspectos da árvore original (folhas, pequenos galhos e ramos). Em diferentes escalas, através dessa semelhança, pode-se reconhecer as mesmas estruturas. O fractal é uma reprodução em menor escala do todo, ou seja, do sistema como um todo (LARSEN-FREEMAN, 1997). O discurso também apresenta padrões característicos de sua formação que podem ser observados em trechos do próprio discurso, como se fossem minidiscursos, por exemplo, introdução, desenvolvimento e conclusão.

Na tentativa de apresentar delineamento satisfatório de Sistemas Dinâmicos Complexos, afirmamos que o sistema não é completamente desordenado, mas é regido por regras simples, por exemplo, os papéis sociais devem ser respeitados, para que seja possível encontrar a sua auto-organização temporária. O sistema não precisa ser acabado para se adequar ao seu ambiente, basta que seja melhor do que outras possibilidades para adaptar-se temporariamente e se configurar de modo satisfatório. A Teoria dos Sistemas Dinâmicos Complexos oferece um modo de pensar o mundo e a vantagem de realizar análises para além dos dados, ao prever que possíveis organizações o sistema poderia ter e descobrir que elementos específicos causam desestabilização no sistema, a partir de um entendimento adequado de representações sociocognitivas relacionadas ao fenômeno da violência escolar. Para alcançar essa compreensão, é necessário entender os modos de conceitualização do fenômeno, ou seja, o uso da linguagem na forma de metáforas, esquemas imagético-cinestésicos como agentes integrantes de sistemas sociocognitivos complexos, com os quais fatores neurofisiológicos, psicológicos, ecológicos e socioculturais interagem dinamicamente.

4.2 Metáforas Sistemáticas a partir do discurso, em uma perspectiva de Sistemas