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1.3 ASPECTOS RELACIONADOS À PERSPECTIVA DA DEMANDA QUE REPERCUTEM NO DIMENSIONAMENTO HABITACIONAL

1.3.1 A DIVERSIFICAÇÃO DEMOGRÁFICA E OS NOVOS ARRANJOS FAMILIARES

De acordo com Brandão (2002), os fenômenos demográficos têm implicação direta na habitação. Na segunda metade do século XX, notadamente nas duas últimas décadas, as mudanças têm sido significativas, pois as composições familiares passaram a apresentar uma grande diversidade de configurações. A diminuição na taxa de natalidade, o aumento da expectativa de vida, a protelação do casamento, a diminuição do tamanho das famílias, o aumento da taxa de dissolução dos casamentos, dentre outros fatores, geraram um maior número de estruturas familiares não tradicionais.

Correia (2004) afirma, apoiada em Pasternak, que a taxa de fecundidade no Brasil reduziu-se em 44% entre 1950 e 1990. A partir do Censo Demográfico de 2000, eximindo-se as diferenças entre os patamares regionais, fica esclarecido que o número médio de filhos por mulher diminuiu 20% entre 1991 e 1999. Reduziu-se também o número de pessoas por família, na área urbana, que passou de 3,8 em 1991, para 3,4 em 2000.

Tramontano (1993), considerando o conjunto da população brasileira na década de 60, observa que a taxa de fecundidade de 5,8 caiu para 4,3 no período de 1975-80. Dados mais recentes sobre tendências demográficas mostram, acorde Brandão (2002), números em contínua redução: 2,7 filhos por mulher em 1992 e 2,3 em 1999. Entretanto, no Brasil, essas taxas variam muito de acordo com a região e o grau de instrução. As menores médias estão entre 2,1 e 2,2 no Sudeste, Sul e Centro-Oeste, enquanto no Nordeste e no Norte essas taxas são maiores: 2,6 e 3,1, respectivamente.

Brandão (2002) descreve, a partir da demógrafa Elza Berquó, que a queda acentuada da taxa de fecundidade, o aumento da longevidade, a crescente inserção da mulher no mercado de trabalho, a liberação sexual, a fragilidade cada vez maior das uniões e o individualismo acentuado são tendências que vêm atuando no sentido de alterar o tamanho, a estrutura e a função da família nuclear.

Para as alterações da família nuclear – composta de pai, mãe e filhos – e aos múltiplos tipos de novos grupos domésticos decorrentes, para Tramontano (1993), devem corresponder novas formas de habitar e, portanto, novas tipologias do espaço da habitação. Segundo o autor, este novo quadro sociodemográfico ressalta a existência de cinco grupos fundamentais: 1. famílias monoparentais; 2. pessoas vivendo sós; 3. uniões livres; 4. coabitação sem vínculo conjugal ou de parentesco; e 5. a nova família nuclear. A seguir, cada um dos grupos estruturados pelo autor citado serão brevemente descritos.

• FAMÍLIAS MONOPARENTAIS

Grupo familiar constituído em torno da mãe ou do pai, separados ou viúvos, com ou sem novo cônjuge. Brandão (2002) expõe, a partir de Castelo Branco, que a porcentagem de famílias monoparentais sobre o total dos grupos domésticos no Brasil vem aumentando: em 1970 representava 11,5%, passando a 13% em 1980. Considerando-se apenas o meio urbano, 18% das famílias brasileiras eram monoparentais em 1987.

Em 1999, em várias cidades brasileiras, o número de mulheres sem cônjuge e com filhos constituem mais de 20% dos tipos de arranjo familiar (BRANDÃO, 2002). Esta elevação, segundo Tramontano (1993), é a expressão de três realidades: 1. o aumento do número de divórcios e separações; 2. o aumento da viuvez; e 3. o crescente número de mães solteiras.

O crescimento do modelo monoparental, cuja pessoa responsável é a mulher, evidencia-se nas pesquisas do IBGE. Em 2000, de acordo com Brandão (2002), o Censo Demográfico mostrou que 24,9% dos domicílios têm esta característica, um percentual que era de 18,1% em 1990, representando um crescimento relativo de 37,6% em 10 anos. Destes domicílios, 91,4% estão localizados nas cidades, indicando que este crescimento é um fenômeno urbano.

O aumento desse tipo de família provoca diversas conseqüências. Segundo Tramontano (1993), as separações multiplicam o número de grupos domésticos, diminuem o seu tamanho médio e aumenta a

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demanda por habitação. O cônjuge que passa a morar sozinho irá necessitar de espaço para receber os filhos nos finais de semana ou até por mais tempo, nos casos de opção pela guarda alternada.

• PESSOAS VIVENDO SÓS

Para Tramontano (1993), este é um modo de vida urbano, de pessoas cultas e instruídas, adotado sobretudo por homens, devido à saída da casa dos pais, o que se associa, em parte, ao retardamento do casamento. Há, por parte dos jovens, uma tendência crescente por uma vida solitária, não excluindo fases de coabitações antes ou depois desse período, ou de coabitação parcial simultaneamente.

Em todos os países industrializados, o número de pessoas vivendo sós, duplicou, triplicou ou mesmo quadruplicou como ocorreu no Canadá. O aumento do número de divórcios, o retardamento da idade para o casamento, o fortalecimento da opção por não casar, a emancipação da mulher e o aumento do número de viúvos na Terceira Idade provocaram, nas últimas décadas, um aumento do número de pessoas vivendo sós (TRAMONTANO, 1993).

A partir do número total de pessoas morando sozinhas no Brasil, em 1980, Brandão (2002) revela, a partir de Berquó, que 48% eram solteiras, 35% eram viúvas e 17% separadas. A população de jovens vivendo sozinha é relativamente baixa e, sobretudo masculina. Apoiando-se em tendências demográficas do Censo de 2000, o autor destaca que, em 1999, as pessoas morando sozinhas, com menos de 30 anos, representam apenas 13,1% do total desse grupo. O aumento relativo nas faixas acima de 39 anos, no período 1992-1999, deve refletir o aumento das separações e divórcios, além da viuvez.

Apoiado em Leal, Brandão (2002) destaca que este segmento, denominado público avulso pelo setor imobiliário no Brasil, compõe-se de pessoas que possuem, em média, um poder aquisitivo alto e disposto a investir na própria moradia. Além disso, sendo indivíduos mais independentes, os empreendimentos e os serviços oferecidos para esse nicho buscam reforçar essa característica disponibilizando infra-estrutura que permita ao morador resolver alguns problemas do dia-a-dia no próprio edifício.

• UNIÕES LIVRES

Para Tramontano (1993), na segunda metade do século XX, o casamento começa a ser questionado como instituição e tornar-se uma formalidade. Valores como casar, formar um lar, ter filhos, lançar as

bases de uma realidade social nitidamente definida e visível dentro da sociedade, vem, aos poucos, sendo abolidos.

Brandão (2002), a partir de Castelo Branco, revela que no Brasil é crescente a preferência pela coabitação sem vínculos legais, ou seja, a união consensual ou livre. Entre os tipos de união de pessoas casadas, a união livre representa, 6,9% em 1970, subindo para 11,8% em 1980. Para o primeiro autor, na década de 90, o crescimento foi de 55% atingindo em 2000 a proporção de 28,3% das formas de união.

A união livre – como opção de vida das faixas mais jovens – reflete-se no espaço de moradia, freqüentemente, pela recusa das convenções. Esta postura repercute na recusa do mobiliário clássico (mesas, cadeiras, sofás) e na ausência de preocupação em adquirir bens perenes, inclusive a própria casa. A situação se modifica quando a união livre precede a união legal, ou quando ocorre em faixas etárias mais elevadas (TRAMONTANO, 1993).

• COABITAÇÃO SEM VÍNCULO

Pouco conhecido, e pouco expressivo demograficamente, este grupo baseia-se em afinidades pessoais, profissionais, estudantis ou ideológicas. A coabitação de trabalhadores jovens, as uniões homossexuais e as repúblicas de estudantes são representantes desses grupos no Brasil, excetuam-se os conventos e asilos. Na maioria das vezes, tais grupos ocupam os mesmos espaços habitacionais projetados para a família nuclear (TRAMONTANO, 1993).

• NOVA FAMÍLIA NUCLEAR

De acordo com Brandão (2002), mesmo com novos formatos de família, a grande maioria dos indivíduos ainda vive o ciclo da vida nuclear. Estatísticas recentes do IBGE mostram que o tipo majoritário de família ainda é o daquela formada pelo casal com seus filhos (55,0% em 1999), revelando a permanência de um padrão, constituído historicamente como o modelo básico de arranjo doméstico.

Como resultado da redução da fecundidade e suas causas e também pelo envelhecimento da população, esse grupo familiar vem diminuindo de tamanho, tanto nos países de capitalismo avançado como em países de capitalismo tardio. A rigor, há dois tipos de diminuição: a do número de filhos e da participação no total dos grupos domésticos (TRAMONTANO, 1993).

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Chamam atenção algumas transformações desta nova família nuclear. Para Tramontano (1993), uma das características está na redistribuição da autoridade. Não há mais um “chefe de família” (termo substituído por “pessoa de referência” em estatística), devido ao deslocamento da função de provedor para outro membro do grupo, ou a falta de consenso entre os membros sobre quem é realmente o chefe. O aumento do número de mulheres no mercado de trabalho, contribuindo para o sustento da família de forma igual ou até mesmo superior, reforça esta indefinição. A nova família nuclear necessita, no mínimo, de espaços de habitação que propiciem a preservação das individualidades de seus membros, suas atribuições, e, mesmo, novos hábitos.