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A docência na Educação Superior: o professor mediador pedagógico

Capítulo 1 – A Educação Superior e a formação do profissional-cidadão

1.3 A docência na Educação Superior: o professor mediador pedagógico

Masetto (2015) apresenta um princípio-chave que, segundo ele, sustenta o magistério no contexto da Educação Superior: a aula constitui-se em tempo e espaço do professor e do aluno, em que ambos, professor e aluno, aprendem segundo um itinerário formativo de convi- vência e interação estabelecido entre adultos. Com efeito, Zabalza (2004, p. 187-188) também reconhece essa característica de “adultos aprendizes” dos estudantes das Instituições de Ensi- no Superior.

De acordo com essa perspectiva, é necessário destacar que a aprendizagem de adultos distingue-se pela autonomia e pela experiência. De fato, a andragogia caracteriza-se pela au- tonomia do adulto na direção de seu próprio processo de aprendizagem e pelo uso de sua ex- periência pessoal como recurso para que aprenda.

Essas condições são adequadamente favorecidas à medida que a sala de aula transfor- ma-se em espaço de profícua interação entre professor e grupo de alunos, que assumem, con- comitantemente, a responsabilidade pelo trabalho. Nesse sentido, Masetto (2010) entende que é possível ao professor estabelecer com o estudante “uma relação entre duas pessoas que estão interessadas em alcançar alguns objetivos comuns e que poderão consegui-lo mais facilmente se trabalharem em conjunto, com respeito mútuo, com diálogo, integrando forças de modo corresponsável e parceiro” (MASETTO, 2010, p. 44-45).

Da mesma forma, Imbernón (2012) reconhece a importância das relações de comuni- cação biunívocas e multidirecionais – que superam aquelas de natureza unívocas por parte dos professores – para que os alunos possam construir sua própria aprendizagem, inclusive na relação com as aprendizagens dos colegas. Para Imbernón (2012), docentes e estudantes de- vem compartilhar a atividade de aprender.

Esse novo modo de relacionamento exige, de imediato, uma mudança de atitude, tanto do professor quanto do aluno: este deve assumir seu protagonismo, como sujeito do processo de aprendizagem; aquele, exercer a função de mediador pedagógico, isto é, de estimulador da aprendizagem. Assim, “os professores devem trabalhar na criação de situações para ativar a participação dos estudantes e nos métodos de ensino centrados neles” (IMBERNÓN, 2012, p. 51).

No âmbito da Educação Superior, uma ação concreta que promove essa efetiva copar- ticipação é a atividade de planejamento e definição de conteúdos e objetivos do curso, reali- zada pelo professor com a classe, no início do semestre letivo, o que proporciona a convenien- te articulação das expectativas dos estudantes à especificidade da disciplina. Logo, professor e alunos assumem, reciprocamente, o compromisso de fixar o que se quer aprender – e de mobi- lizar esforços para isso – e avaliar o que, efetivamente, foi aprendido, em que nível e por quê. A clareza com relação à definição de metas a serem alcançadas pelo estudante é importantís- sima para a aprendizagem de adultos.

Certamente, esse procedimento didático viabiliza a aprendizagem significativa, sobre- tudo de adultos, os quais são fortemente motivados quando o aprendizado vincula-se àquelas áreas que se constituem relevantes para o desenvolvimento atual de suas tarefas. Assim, espe- ra-se que o professor, além do indispensável domínio científico acerca de sua especialidade e do desejo de compartilhar seus conhecimentos, seja capaz de agir de acordo com as caracterís- ticas apresentadas pelo conjunto de alunos com o qual ele deve trabalhar, a cada novo período letivo, adaptando-se às novas demandas que lhes são impostas e identificando o que os estu- dantes já sabem e o que não sabem, mas precisam saber.

Se os adultos aprendem melhor quando lhes é outorgado protagonismo sobre a condu- ção de seu processo de aprendizagem, ou seja, se determinam aquilo que precisam aprender e estabelecem os recursos que lhes serão necessários para tal empreitada, seu aprendizado é potencializado quando lhes são propostas atividades de aprendizagem centradas na análise e solução de problemas, que os ajudam a transferir, imediatamente, o conhecimento produzido às diversas situações de suas vidas. Mais uma vez, a mediação do professor é imprescindível, pois ele deve saber a melhor maneira de se aproximar dos conteúdos, abordando-os sob pers- pectivas atuais.

É justamente porque acumularam muitas experiências em suas vidas que os adultos possuem diferentes modos de aprender. Neste sentido, o professor deve ser hábil o bastante para selecionar e propor estratégias metodológicas e tarefas acadêmicas, suficientemente vari- adas, convenientemente vinculadas aos objetivos estabelecidos e que tenham um maior im-

pacto como facilitadoras da aprendizagem, fazendo com que o material ensinado seja interes- sante e exigindo, ao mesmo tempo, a integração do grupo e o trabalho cooperativo dos alunos.

Aliás, estilos cooperativos de ensinar e aprender, através da argumentação, da exposi- ção de pontos de vista e da troca de experiências, desenvolvem o autoconceito dos adultos. Estabelecendo com os estudantes uma boa comunicação, individual e coletiva, é papel do pro- fessor garantir um clima de sala de aula cuidadosamente marcado pela abertura, pela compre- ensão, pelo interesse e pelo respeito.

Enfim, os adultos precisam contar com um feedback adequado e regular, que os orien- tem com relação à sua aprendizagem. Em discussão com o grupo, o professor deve organizar um processo de avaliação (em termos de autoavaliação e heteroavaliação) que ofereça a ele próprio e aos alunos um feedback de máxima qualidade acerca do desempenho de todos com relação a seus trabalhos e que se constitua num indicativo seguro de adequação do programa, e, se necessário, de reorientação da aprendizagem.

Para tanto, o professor deve ter sua visão centrada nos conceitos-chave dos temas e nos erros conceituais dos estudantes, antes de tentar levar a classe a dominar todos os conteú- dos do programa.

É preciso observar que existe uma hierarquia de importância e abrangência de conteú- dos: há temas suficientemente amplos e complexos, os quais incorporam vários itens, de tal modo que se pode organizar o conteúdo programático a partir de grandes temas integradores, garantindo a adequação do volume de informações à carga horária disponível. Por isso, Im- bernón (2012) adverte que “no currículo deve-se dar preferência à profundidade e não à ex- tensão. Sobretudo quando os professores pensam, erroneamente, que compactando uma maté- ria se aprende mais” (IMBERNÓN, 2012, p. 51).

Essa mudança de atitude do professor não se restringe à revisão das atividades que de- vem ser desenvolvidas pelo corpo docente, mas exige, sobretudo, a reconstrução de sua iden- tidade pessoal e a redefinição de sua cultura profissional:

[...] os professores devem ser capazes de construir um tipo especial de profissiona- lismo, que não pode ser aquele antigo, no qual tinham autonomia para ensinar da forma como bem quisessem, ou o que lhes fosse mais familiar [...]. Em vez disso, devem construir um novo profissionalismo, do qual os principais componentes são:

 Promover a aprendizagem cognitiva profunda.

 Aprender a ensinar por meio de maneiras pelas quais não foram ensinados.

 Comprometer-se com aprendizagem profissional contínua.

 Trabalhar e aprender em equipes de colegas.

 Desenvolver e elaborar a partir da inteligência coletiva.

 Estimular a confiança nos processos (HARGREAVES, 2004, p. 40).

A docência, exercida na perspectiva da mediação pedagógica, pressupõe tanto a dis- ponibilidade quanto o comprometimento do professor com o ensino, a pesquisa, o trabalho em equipe, o estudo e, em particular, a formação continuada na ação, a qual acontece em um con- texto de mudança, por meio de reflexões coletivas:

Nenhum professor sabe o suficiente para se manter atualizado ou se aperfeiçoar por conta própria. É vital que os professores se envolvam conjuntamente em ações, pes- quisas e solução de problemas, em equipes de colegas, ou em comunidades de aprendizagem profissional. Por meio de tais equipes, os professores podem realizar o desenvolvimento curricular conjunto, responder de forma efetiva e criativa a de- mandas externas de reforma, desenvolver pesquisa-ação cooperativa e analisar cole- tivamente dados sobre o desempenho dos alunos, de forma a beneficiar o aprendiza- do destes (HARGREAVES, 2004, p. 41-42).

Ao longo deste capítulo argumentou-se que a vinculação do conceito de formação pro- fissional à ideia de crescimento e desenvolvimento de uma pessoa humana em sua totalidade – condição sine qua non para que se satisfaça a exigência hodierna de se formar profissionais- cidadãos – impõe, às Instituições de Ensino Superior, a necessidade de que seja estabelecido um novo paradigma educativo, que se assenta sobre o protagonismo do aluno, pois o interesse está centrado no estudante.

Por conseguinte, na relação ensino-aprendizagem, é preciso enfatizar o processo de aprendizagem – segundo um princípio epistemológico orientado para a aprendizagem signifi- cativa, a qual assegura o desenvolvimento da capacidade de aprendizagem ao longo da vida.

Trata-se de uma verdadeira ressignificação acerca da concepção de aprendizagem, que supera sua natural identificação com o desenvolvimento dos aspectos exclusivamente cogni- tivos dos alunos – ampliando seu alcance para a aprendizagem afetivo-emocional, de habili- dades humanas e profissionais e de atitudes e valores – e que outorga ao professor a inaliená- vel atribuição de mediador pedagógico.

Porém, tendo em vista os objetivos desta pesquisa, analisar-se-á, no próximo capítulo, especificamente, os aspectos que dizem respeito à aprendizagem de atitudes e valores, como mecanismo de favorecimento da dimensão ética junto aos processos de formação profissional oferecidos no âmbito da Educação Superior.