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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP. Luis Eduardo Duarte Novais

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Academic year: 2021

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP

Luis Eduardo Duarte Novais

Ressignificando o processo de formação profissional:

a aprendizagem de atitudes e valores no âmbito da Educação Superior

DOUTORADO EM EDUCAÇÃO: CURRÍCULO

São Paulo 2020

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP

Luis Eduardo Duarte Novais

Ressignificando o processo de formação profissional:

a aprendizagem de atitudes e valores no âmbito da Educação Superior

DOUTORADO EM EDUCAÇÃO: CURRÍCULO

Tese apresentada à Banca Examinadora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como exigência parcial para obtenção do título de Doutor em Educa-ção: Currículo, sob a orientação do Prof. Dr. Marcos Tarciso Masetto.

São Paulo 2020

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Banca Examinadora ______________________________ ______________________________ ______________________________ ______________________________ ______________________________

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À João Rodrigues Ferrazolli Camargo, in memorian

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O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – Brasil (CAPES) – Código de Financiamento 001.

This study was financed in part y Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Su-perior – Brasil (CAPES) – Finance Code 001.

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AGRADECIMENTOS

À Deus, Trindade Santíssima, que confirma, cotidianamente, o chamado que me fez à consagração de vida, segundo um carisma específico, em Sua Igreja: somente por Cristo, com Cristo e em Cristo é possível tornar-me pão partido e repartido que alimenta o outro, faminto da presença salvífica de Jesus.

Aos meus irmãos da Comunidade Católica Querigma: a vida fraterna sustenta-nos em nossa missão de formarmos para a santidade.

Aos meus pais, Luiz Carlos (in memorian) e Ester, meus primeiros educadores na fé, e às minhas irmãs, Maria Angélica e Luciana.

À minha esposa, Rosa Maria: o Sacramento do Matrimônio expressa o transbordamen-to do Amor de Deus em nossas vidas; com efeitransbordamen-to, “como fundamentransbordamen-tos eternos sobre pedra firme, assim são os preceitos divinos no coração de uma mulher santa” (Livro do Eclesiástico, capítulo 26, versículo 24).

Aos meus filhos, Daniel (minha nora Amanda e meus netos Samuel e Matias), Luisa (meu genro Francisco e minhas netas Maria Josefina e Teresa de Jesus), Lucas e Maria Vitó-ria: encanta-me o empenho de cada um deles em viver sua vocação à santidade.

Ao Prof. Dr. Marcos Tarciso Masetto: para além de um magnífico educador, pesquisa-dor e orientapesquisa-dor, Deus concedeu-me encontrar um amigo; em seu nome, agradeço, igualmen-te, a todos os professores e funcionários do Programa de Pós-Graduação em Educação: Currí-culo, da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.

À Profa. Dra. Marina Graziela Feldmann e à Profa. Dra. Elize Keller-Franco, pelas va-liosas contribuições apresentadas por ocasião do Exame de Qualificação.

À Fundação São Paulo (FUNDASP), entidade mantenedora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, e à Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), fundação do Ministério da Educação, pela concessão de bolsa de estudos para o custeio das taxas escolares.

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A distância entre a obsessão pelo próprio bem-estar e a felicidade compartilhada de toda humanidade parece ampliar-se cada vez mais: chegando-se a pensar que entre o indivíduo e a comunidade humana esteja em curso um verdadeiro cisma.

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RESUMO

NOVAIS, Luis Eduardo Duarte. Ressignificando o processo de formação profissional: a aprendizagem de atitudes e valores no âmbito da Educação Superior.

A sociedade contemporânea organiza-se segundo um modelo econômico que se fundamenta sobre a disponibilidade crescente do conhecimento, o qual, valorizado por sua natureza prag-mática e utilitária, é tratado como mercadoria, sujeita à lógica do mercado financeiro global. Assim, ao desempenharem as atividades que lhes são inerentes, quais sejam a produção e a difusão do saber, as Instituições de Ensino Superior assumem uma tendência tecnicista e mer-cadológica, privilegiando percursos formativos que se preocupam com o domínio técnico al-tamente especializado e a utilização instrumental de informações. Portanto, negligenciando-se aspectos humanísticos, não se incentiva o compromisso ético do estudante com o bem-comum, indispensável para a prática da cidadania democrática nos contextos socioculturais plurais que se verificam atualmente. Deste modo, esta pesquisa postulou a tese de que é ne-cessário ressignificar os processos de formação profissional oferecidos no âmbito da Educa-ção Superior, alcançando a noEduca-ção de formaEduca-ção humana plena – isto é, integrando suas dimen-sões epistemológica, técnica e ético-política –, para que se estabeleçam condições que possi-bilitem a formação de profissionais-cidadãos. Sob esta perspectiva, a partir do estudo dos pro-jetos pedagógicos de dois cursos de graduação distintos, cada um deles mantido por uma de-terminada Instituição de Ensino Superior, analisou-se se esses documentos manifestam a emergência contemporânea de se promover a dimensão ética junto aos itinerários formativos que promovem, particularmente com relação ao desenvolvimento de atitudes e valores, com o objetivo de identificar elementos curriculares que se prestam à formação de profissionais-cidadãos. Concluiu-se, então, que a pretendida ressignificação dos processos de formação profissional impõe que se fixe um novo paradigma educativo, em que se articulem, conveni-entemente, os seguintes aspectos: o protagonismo do aluno; a compreensão da aprendizagem como processo de crescimento e desenvolvimento de uma pessoa em sua totalidade; a cons-trução de conhecimento significativo, por meio de uma estreita vinculação entre reflexão teó-rico-conceitual, prática profissional e experiência extra-escolar; a mediação pedagógica exer-cida pelo professor, de tal modo que a ação de ensinar consista em promover uma aprendiza-gem significativa; a instalação de espaços de gestão participativa que envolvam todos os seg-mentos da comunidade acadêmica; a elaboração de uma arquitetura curricular que, superando um arranjo estritamente técnico-linear, promova a interdisciplinaridade e a integração pro-gressiva e complementar do conhecimento; a proposição de estratégias metodológicas que permitam, ao aluno, apropriar-se de sua formação, como verdadeiro protagonista; a avaliação entendida como possibilidade de aprendizagem.

Palavras-chave: Formação do profissional-cidadão; Formação humana plena; Aprendizagem na Educação Superior; Dimensão ética da aprendizagem; Aprendizagem de atitudes e valores.

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ABSTRACT

NOVAIS. Luis Eduardo Duarte. Resignifying the process of vocational training: the learn-ing of attitudes and values in the context of Higher Education.

Contemporary society is organized according to an economic model based on the growing availability of knowledge, which, valued for its pragmatic and utilitarian nature, is treated as a commodity, subject to the logic of the global financial market. Thus, in performing their in-herent activities, namely the production and diffusion of knowledge, the Higher Education Institutions assume a technician and market tendency, favoring training courses that are con-cerned with the highly specialized technical domain and the instrumental use of information. Therefore, by neglecting humanistic aspects, the student’s ethical commitment to the common good is not encouraged, indispensable for the practice of democratic citizenship in the plural sociocultural contexts that exist today. Thus, this research postulated the thesis that it is nec-essary to resignify the processes of vocational training offered in the context of Higher Educa-tion, reaching of full human formation – that is, integrating its epistemological, technical and ethical-political dimensions – so that conditions are in place to enable the training of profes-sional citizens. From this perspective, from the study of the pedagogical projects of two dif-ferent undergraduate courses, each one maintained by a certain Higher Education Institution, it was analyzed if these documents manifest the contemporary emergence of promoting the ethical dimension along the formative itineraries which they promote, particularly with regard to the development of attitudes and values, with the aim of identifying curriculum elements that lend themselves to the training of professional citizens. It was concluded, therefore, that the intended resignification of the processes of professional formation requires the establish-ment of a new educational paradigm, which conveniently articulates the following aspects: the protagonist student; the understanding of the learning as a process of growth and development of a person in its entirety; the construction of meaningful knowledge through a close link be-tween theoretical and conceptual reflection, professional practice and out-of-school experi-ence; the pedagogical mediation exercised by the teacher, so that the action of teaching con-sists in promoting meaningful learning; the installation of participatory management spaces that involve all segments of the academic community; the elaboration of a curricular architec-ture that, overcoming a strictly technical-linear arrangement, promotes interdisciplinarity and the progressive and complementary integration of knowledge; the proposition of methodolog-ical strategies that allow the student to appropriate his formation as a true protagonist; the evaluation understood as a possibility of learning.

Keywords: Professional-citizen training; Full human formation; Learning in Higher Educa-tion; Ethical dimension of learning; Learning of attitudes and values.

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LISTA DE SIGLAS

Aciepes – Atividades Curriculares de Integração Ensino, Pesquisa e Extensão CEETEPS – Centro Estadual de Educação Tecnológica “Paula Souza” CES – Câmara de Educação Superior

CNE – Conselho Nacional de Educação DCNs – Diretrizes Curriculares Nacionais EESC – Escola de Engenharia de São Carlos

FORPEC – Grupo de Pesquisa “Formação de Professores e Paradigmas Curriculares” PUC-SP – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo

UFABC – Universidade Federal do ABC UFPR – Universidade Federal do Paraná UFSCar – Universidade Federal de São Carlos

UNESCO – Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura USP – Universidade de São Paulo

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SUMÁRIO

Introdução ... 13

Formação acadêmico-profissional e realidades socioculturais do pesquisador ... 13

Aproximação ao tema de pesquisa ... 14

Problema de pesquisa ... 15 Objetivos ... 15 Delimitação do problema ... 16 Fontes de dados ... 16 Relevância do problema ... 17 Metodologia da pesquisa ... 20 Estrutura da Tese ... 22

Capítulo 1 – A Educação Superior e a formação do profissional-cidadão ... 23

1.1 A formação do profissional-cidadão: um processo de formação humana plena ... 25

1.2 Um novo paradigma educativo: ênfase no processo de aprendizagem ... 29

1.3 A docência na Educação Superior: o professor mediador pedagógico ... 34

Capítulo 2 – A Educação Superior e a dimensão ética da aprendizagem ... 38

2.1 A integração da ética junto aos currículos ... 40

2.1.1 A definição de conteúdos curriculares relativos à aprendizagem de atitudes e valo-res ... 40

2.1.2 A proposição de arranjos curriculares que se diferenciam da tradicional organiza-ção por disciplinas ... 42

2.2 Os professores e a aprendizagem de atitudes e valores ... 46

2.3 A necessária mudança de comportamento dos alunos ... 49

2.4 Estratégias metodológicas para a formação de profissionais-cidadãos ... 50

Capítulo 3 – O Projeto Pedagógico de um Curso de Bacharelado em Engenharia Elétri-ca ... 55

3.1 Diretrizes Curriculares Nacionais dos Cursos de Graduação ... 58

3.2 Diretrizes Curriculares Nacionais do Curso de Graduação em Engenharia ... 62

3.3 Projeto Pedagógico do Curso de Bacharelado em Engenharia Elétrica oferecido pela Instituição A ... 64

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Capítulo 4 – O Projeto Pedagógico de um Curso de Bacharelado em Teologia ... 77

3.1 Diretrizes Curriculares Nacionais do Curso de Graduação em Teologia ... 78

3.2 Projeto Pedagógico do Curso de Bacharelado em Teologia oferecido pela Instituição B ... 81

Considerações finais ... 91

Referências ... 96

Apêndice A – Os dez maiores grupos educacionais privados do Brasil, em 2016 ... 101

Apêndice B – Perfil do profissional a ser formado pela Instituição A: aspectos definido-res e cordefinido-respondentes competências ... 102

Apêndice C – Estrutura curricular do Curso de Bacharelado em Engenharia Elétrica oferecido pela Instituição A ... 103

Apêndice D – Integralização curricular do Curso de Bacharelado em Engenharia Elétri-ca oferecido pela Instituição A ... 104

Apêndice E – Estrutura curricular do Curso de Bacharelado em Teologia oferecido pela Instituição B ... 105

Apêndice F – Integralização curricular do Curso de Bacharelado em Teologia oferecido pela Instituição B ... 107

Apêndice G – Novas Diretrizes Curriculares Nacionais do Curso de Graduação em En-genharia ... 108

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INTRODUÇÃO

Formação acadêmico-profissional e realidades socioculturais do pesquisador

Em 1990, graduei-me em Engenharia Elétrica (modalidade Eletrônica) pela Escola de Engenharia de São Carlos da Universidade de São Paulo (EESC/USP). Nos dez anos que se seguiram, concomitantemente ao exercício dessa profissão, fui professor junto à Escola Téc-nica Estadual “Paulino Botelho”, uma unidade do Centro Estadual de Educação Tecnológica “Paula Souza” (CEETEPS), em São Carlos.

Em 1998, ao lado de um grupo de professores, participei da constituição de uma asso-ciação civil de direito privado, sem fins lucrativos, para criarmos e mantermos, também em São Carlos, uma escola confessional que oferecesse a Educação Básica, nas etapas da Educa-ção Infantil (Pré-Escola), do Ensino Fundamental e do Ensino Médio, atendendo, preferenci-almente, a população mais pobre da região.

Considerando que, àquela altura, minha experiência docente estava restrita ao magisté-rio das disciplinas da Educação Profissional em Nível Médio, para poder colaborar, adequa-damente, com as atividades de implantação da Escola idealizada, optei por cursar Pedagogia, em 1999, licenciando-me pela Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), em 2003.

Em 2000, solicitei minha exoneração do Serviço Público e afastei-me, por completo, da prática da engenharia para me dedicar, inteiramente, à instalação da Escola, pois o Estabe-lecimento de Ensino obtivera a devida autorização dos órgãos de Supervisão Escolar para funcionar. A Escola iniciou suas atividades no ano seguinte. Desde então, já exerci, no âmbito dessa Instituição, as funções de professor, coordenador pedagógico e diretor.

Nos últimos anos, tenho me preocupado com aquilo que se designa, em geral, “crise de sentido da escola” – a qual alcança, indistintamente, todos os estabelecimentos de ensino, inclusive os confessionais –, cuja compreensão privilegia explicações que evidenciam sua inadequação à ideologia do mercado e da modernização e a necessidade de se introduzir, mas-sivamente, as novas tecnologias digitais da informação e da comunicação junto aos processos de ensino e aprendizagem que se desenvolvem no espaço educativo escolar, atribuindo-lhes a condição de panaceia para a solução de qualquer problema e agregando-lhes o valor enganoso de que é suficiente dominar algumas competências e habilidades técnicas para acessar o sem-pre crescente arsenal informativo.

Não ignoro os efeitos da globalização econômica e das sensíveis mudanças nos siste-mas produtivos sobre a escola. Contudo, entendo que essas demandas contribuem para que se

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instale, em seu interior, um inequívoco reducionismo antropológico; negligencia-se que ela – a escola – seja atingida por uma complexa crise axiológica, caracterizada pela emergência de um novo paradigma sociocultural, que se sustenta sobre a premissa de um relativismo ético, como constata Severino (2006): “no que concerne ao conceito de educação, tal qual vem sen-do constituísen-do, não há mais valores éticos referenciais: conta, apenas, o sentir bem sen-dos sujei-tos humanos” (SEVERINO, 2006, p. 633).

Assim, com a intenção de estudar as funções e os significados atribuídos à escola, na contemporaneidade, ingressei, em janeiro de 2015, no Programa de Pós-Graduação em Edu-cação: Currículo da Faculdade de Educação da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP).

Orientado pela Profa. Dra. Nadia Dumara Ruiz Silveira, concluí minha pesquisa, redi-gindo a Dissertação de Mestrado “Escola na contemporaneidade e o sentido humanizador da Educação: concepções da Igreja Católica Apostólica Romana” – cuja apresentação pública aconteceu em dezembro de 2016 –, na qual sustento que toda ação educativa deve encerrar um itinerário de formação humana plena; ademais, postulo que a escola, superando considera-ções de natureza estritamente pragmática e utilitária, deve promover a alteridade de seus alu-nos, resgatando as dimensões ética e transcendental da cultura.

Nesse ínterim, a Associação da qual faço parte deliberou pela criação e manutenção de uma faculdade de caráter confessional, cujo Projeto Pedagógico assegure o primado das im-plicações éticas inerentes a todas as atividades acadêmicas.

Aproximação ao tema de pesquisa

Evidentemente, os compromissos que dizem respeito à Faculdade que se pretende ins-talar unem-se a aspectos centrais de minha Dissertação de Mestrado – quais sejam o empenho em oferecer uma formação de caráter humanista e uma explícita preocupação ética – o que suscitou, em mim, a necessidade de ampliar meus estudos, dirigindo-os, agora, à Educação Superior.

Na PUC-SP, conheci o trabalho desenvolvido pelo Prof. Dr. Marcos Tarciso Masetto1, educador para quem o cenário hodierno desafia as Instituições de Ensino Superior a ressigni-ficarem seu entendimento acerca dos processos de formação profissional. A produção acadê-mica desse pesquisador – especialmente no campo da formação pedagógica do professor

1 O Prof. Dr. Marcos Tarciso Masetto lidera o Grupo de Pesquisa “Formação de Professores e Paradigmas

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versitário – permitiu-me vislumbrar a possibilidade de aproximar os conceitos de formação humana e formação profissional.

Todavia, de acordo com autores como Delors (1997), Carbonell (2002), Pozo (2002), Hargreaves (2004), Zabalza (2004), Masetto (2010, 2012a, 2015, 2018), Imbernón (2012) e Severino (2012), essa concepção de formação profissional, entendida como um exercício de educação integral da pessoa humana, desafia Instituições de Ensino Superior e seus professo-res a reconsiderarem tanto os desenhos curriculaprofesso-res dos cursos oferecidos, permitindo que os alunos integrem, em seu percurso formativo, um amplo conjunto de competências, que trans-cendam a imprescindível preparação teórico-prática inerente ao desempenho de uma profis-são, quanto as ações didático-pedagógicas desenvolvidas, as quais, geralmente vinculadas à atividade docente de ensinar, valorizam tão somente aspectos de natureza intelectual.

Portanto, há que se deslocar o eixo da relação ensino-aprendizagem, enfatizando-se o processo de aprendizagem, centrado no estudante, que assume o protagonismo de sua forma-ção profissional, à medida que o professor passa a exercer a funforma-ção de mediador pedagógico.

Espera-se, com isso, favorecer a formação de profissionais não somente competentes no que diz respeito ao domínio dos conhecimentos próprios de seu campo de atuação, mas, também, eticamente comprometidos com sua responsabilidade social: trata-se de assegurar a formação de profissionais-cidadãos.

Assim, as relações a serem estabelecidas entre ética e formação profissional constitu-em o foco desta pesquisa, orientada por uma investigação circunscrita ao estudo da aprendi-zagem de atitudes e valores no âmbito da Educação Superior.

Problema de pesquisa

Essas considerações introdutórias conduziram-me à seguinte questão de pesquisa: em que medida as Instituições de Ensino Superior têm contemplado a aprendizagem de atitudes e valores, no contexto dos processos de formação acadêmico-profissional que oferecem?

Objetivos

Subjacente a esse problema, fixa-se, como objetivo geral desta pesquisa, investigar se a concepção de formação profissional presente nos projetos pedagógicos de cursos de gradua-ção explicita-se segundo um itinerário de formagradua-ção humana plena, contemplando a aprendi-zagem de atitudes e valores.

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Especificamente, pretende-se:

a) pesquisar os projetos pedagógicos de dois cursos de graduação distintos, cada um deles oferecido por uma determinada Instituição de Ensino Superior, analisando se esses documentos manifestam a emergência contemporânea de se promover a dimensão ética junto aos processos de formação profissional que sustentam, parti-cularmente com relação ao desenvolvimento de atitudes e valores;

b) identificar, à luz dessa análise, elementos curriculares que devem compor projetos pedagógicos que assegurem a formação de profissionais-cidadãos.

Delimitação do problema

Esta pesquisa é desenvolvida junto a duas Instituições de Ensino Superior. A primeira, designada, no âmbito desta Tese, por Instituição A, é uma universidade pública federal; a se-gunda, denominada Instituição B, é um centro universitário comunitário, de direito privado, confessional, sem fins lucrativos.

Dentre todos os cursos de graduação oferecidos por essas instituições, optou-se por in-vestigar o Curso de Bacharelado em Engenharia Elétrica mantido pela Instituição A e o Curso de Bacharelado em Teologia mantido pela Instituição B.

Assim, este estudo analisa os projetos pedagógicos dos dois cursos de graduação em questão (no que diz respeito à aprendizagem de atitudes e valores) e os mecanismos de inte-gração da dimensão ética da formação profissional em seus respectivos currículos.

Fontes de dados

Além dos projetos pedagógicos relativos aos cursos de graduação examinados, consti-tuíram-se fontes de dados para o pesquisador:

a) os Pareceres CNE/CES nº 776, de 3 de dezembro de 1997, CNE/CES nº 583, de 4 de abril de 2001, e CNE/CES nº 67, de 11 de março de 2003, que estabelecem ori-entações e referenciais para as Diretrizes Curriculares Nacionais dos Cursos de Graduação;

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b) o Parecer CNE/CES nº 1.362, de 12 de dezembro de 2001, e a correspondente Re-solução CNE/CES nº 11, de 11 de março de 2002, acerca das Diretrizes Curricula-res Nacionais do Curso de Graduação em Engenharia;

c) o Parecer CNE/CES nº 60, de 12 de março de 2014, e a correspondente Resolução CNE/CES nº 4, de 16 de setembro de 2016, acerca das Diretrizes Curriculares Na-cionais do Curso de Graduação em Teologia.

Relevância do problema

Este trabalho de investigação inscreve-se no contexto das reflexões que, contempora-neamente, discutem os sentidos atribuídos aos processos formativos desenvolvidos pelas Ins-tituições de Ensino Superior.

Decerto, a formação profissional oferecida por essas Instituições tem sido amplamente influenciada pela chamada “economia do conhecimento”, a qual desloca a atividade de gera-ção do conhecimento para próximo dos círculos produtivos empresariais e industriais, lugares em que ele é valorizado, essencialmente, por suas dimensões pragmática e utilitária:

Em uma organização, uma “pesquisa” é uma estratégia de intervenção e controle de meios ou instrumentos para alcançar uma meta específica. Em outras palavras, uma “pesquisa” é uma “enquete” sobre os problemas, dificuldades e obstáculos que im-pedem a realização de um objetivo, envolvendo o encontro de meios para a solução parcial de problemas e obstáculos locais. Nesse caso, “pesquisa” não significa a aquisição de conhecimento de alguma coisa, mas a posse de instrumentos para inter-vir em algo e controlá-lo. Por isso mesmo, não há tempo em uma organização para a reflexão, a crítica e a análise do conhecimento instituído e as possibilidades para transformá-lo e superá-lo. Em uma organização, não há sentido ou justificativa para exercer atividade cognitiva. Pelo contrário, no jogo estratégico da competição no mercado, a organização se mantém e se afirma, se é capaz de propor áreas de pro-blemas, dificuldades e obstáculos sempre renovados, o que se faz fragmentando ve-lhos problemas em novos microproblemas, sobre os quais parece haver ainda maior controle. A fragmentação, condição para a sobrevivência da organização, se torna efetiva e propõe a especialização como principal estratégia, entendendo-se “pesqui-sa” como a demarcação estratégica de um campo de intervenção e controle. Está cla-ro que esse trabalho só pode ser avaliado em termos que são compreensíveis para uma organização, isto é, em termos de custo-benefício, regulado pela ideia de produ-tividade, que avalia em quanto tempo, com que custo e quanto foi produzido (BER-NHEIM; CHAUÍ, 2008, p. 13).

Consequentemente, firma-se uma compreensão reducionista acerca do conceito de co-nhecimento, circunscrita à noção de aplicabilidade técnica de um conjunto de informações para que seja alcançada a solução de um problema típico. Portanto, imediatismo, especificida-de e rápida obsolescência são características intrínsecas ao conhecimento hodierno: se, por um

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lado, observa-se uma vertiginosa diminuição do tempo transcorrido entre a gênese de um no-vo conhecimento e sua aplicação em nível tecnológico, de outro, constata-se um fenômeno comumente designado por “explosão do conhecimento”, relacionado ao acelerado aumento do volume de conhecimento produzido; trata-se, porém, de um conhecimento superespecializado, que se torna obsoleto simplesmente com a escala dos problemas que se propõe resolver.

Evidentemente, a própria natureza desse conhecimento – subordinada a um novo ethos instrumental, utilitário e comercial – afeta as atividades acadêmicas, condicionando-as às exi-gências de aplicabilidade, utilidade e valor mercadológico (GOERGEN, 2010a, p. 898). Deste modo, as Instituições de Ensino Superior assumem uma tendência tecnicista e mercadológica, privilegiando processos de formação profissional que se caracterizam pelo domínio técnico altamente especializado.

Essa concepção de formação profissional, entendida como especialização técnica, evi-dencia uma nítida despreocupação humanista. Assim, é de se esperar que as futuras gerações tornem-se cada vez mais despreparadas para o exercício da cidadania democrática e desenco-rajadas em suas opções pessoais por projetos que se comprometam com os ideais de justiça e solidariedade.

Logo, é fundamental que as Instituições de Ensino Superior não abdiquem de possibi-litar, a seus alunos, itinerários de formação que superem os limites determinados pelos aspec-tos exclusivamente instrumentais do conhecimento; ele é um bem social e, como tal, somente pode ser produzido, organizado e transmitido em benefício da sociedade. Isto exige um com-promisso irrenunciável dessas Instituições com a dimensão ética da formação profissional:

Nunca antes na história da humanidade as responsabilidades do pensamento foram tão esmagadoras. O grande desafio é se seremos capazes de criar “um novo sistema de ideias”, de “repensar o mundo” porque chegou o momento de redefinir o rumo e o sentido da vida, se não quisermos que ela se extinga da face da Terra. Só podere-mos superar essa crise da concepção do mundo e da vida se forpodere-mos capazes de in-ventar um novo humanismo e de dar ao nosso rumo um horizonte ético (MORIN

apud BERNHEIM; CHAUÍ, 2008, p. 25).

Entretanto, esta pesquisa postula a tese de que é insuficiente limitar a ética a atividades extensionistas ou contá-la, apenas, como mais uma disciplina justaposta à grade curricular dos cursos de graduação.

Aqui, sustenta-se a ideia de que a ética somente será favorecida à medida que um novo paradigma educativo for constituído junto às Instituições de Ensino Superior; este, organizado segundo a noção de formação humana plena – isto é, integrando as dimensões epistemológica,

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técnica e ético-política da formação profissional – deverá articular, necessariamente, os se-guintes aspectos:

a) a centralidade atribuída à aprendizagem, compreendida como processo ativo de construção de conhecimento significativo, do qual o estudante é protagonista;

b) a mediação pedagógica exercida pelo professor, de tal modo que a ação de ensinar consista em promover a aprendizagem por compreensão e não por repetição;

c) um desenho curricular que viabilize um tratamento interdisciplinar do conheci-mento;

d) a formação de caráter generalista, por meio do desenvolvimento de competências que permitam ao estudante mobilizar conceitos e procedimentos, práticas cogniti-vas e socioemocionais, atitudes e valores para resolver demandas complexas de sua vida cotidiana.

Nesse sentido, Bernheim e Chauí (2008) identificam as seguintes competências bási-cas, cuja apreensão deve ser assegurada pelos itinerários formativos oferecidos pelas Institui-ções de Ensino Superior:

 capacidade reflexiva e crítica;

 capacidade de solução de problemas;

 capacidade de adaptação a novas situações;

 capacidade de selecionar a informação relevante nas áreas de trabalho, cultura e exercício da cidadania, que lhe permite tomar decisões corretas;

 capacidade de continuar aprendendo em contextos de mudança tecnológica e so-ciocultural acelerada, com a permanente expansão do conhecimento;

 capacidade de buscar espaços intermediários de conexão entre os conteúdos das várias disciplinas, de modo a realizar projetos que envolvam a aplicação de co-nhecimentos ou procedimentos próprios de diversas matérias;

 capacidade de apreciar a leitura e a escrita, o exercício do pensamento e a ativi-dade intelectual, de modo geral (BERNHEIM; CHAUÍ, 2008, p. 34).

Há que se sublinhar a abrangência desse novo paradigma educativo; daí que sua im-plementação não se esgota em medidas pontuais, tampouco se resume a mudanças meramente epidérmicas. Com efeito, trata-se de transformar – sistemática e intencionalmente, de acordo com Carbonell (2002, p. 19-20) – atitudes, ideias, culturas, conteúdos, modelos curriculares e práticas pedagógicas.

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Metodologia da pesquisa

Com o objetivo geral de investigar se a concepção de formação profissional presente nos projetos pedagógicos de cursos de graduação explicita-se segundo um itinerário de for-mação humana plena, contemplando a aprendizagem de atitudes e valores, justifica-se que esta pesquisa assuma, como opção metodológica, a abordagem qualitativa, pois

[...] ela [a pesquisa qualitativa] se preocupa, nas ciências sociais, com um nível de realidade que não pode ser quantificado. Ou seja, ela trabalha com o universo de significados, motivos, aspirações, crenças, valores e atitudes, o que corresponde a um espaço mais profundo das relações, dos processos e dos fenômenos que não po-dem ser reduzidos à operacionalização de variáveis (MINAYO, 2001, p. 21-22).

Considerando, precisamente, essa natureza não quantificável do objeto de estudo nas Ciências Sociais, Minayo (2001) distingue características que são próprias de uma pesquisa qualitativa. Dado que seu objeto é histórico, ou seja, ele existe num determinado espaço cuja formação social e configuração são específicas, a investigação define-se pela provisoriedade, pelo dinamismo e pela especificidade. Por conseguinte, o objeto de estudo possui consciência histórica: não é apenas o investigador que outorga sentido a seu trabalho intelectual; os seres humanos, os grupos e as sociedades oferecem significado e intencionalidade às suas ações.

Minayo (2001) prossegue, destacando que, no âmbito da pesquisa qualitativa, existe um substrato de identidade entre investigador e objeto. Esta aproximação entre pesquisador e objeto de pesquisa é observada, também, por Severino (2000):

A temática deve ser realmente uma problemática vivenciada pelo pesquisador, ela deve lhe dizer respeito. Não, obviamente, num nível puramente sentimental, mas no nível da avaliação da relevância e da significação dos problemas abordados para o próprio pesquisador, em vista de sua relação com o universo que o envolve (SEVE-RINO, 2000, p. 145).

Portanto, como na investigação qualitativa a relação entre o pesquisador e seu campo de estudo estabelece-se de tal forma que a visão de mundo de ambos está implicada em todo o processo de conhecimento – desde a concepção do objeto aos resultados do trabalho e à sua aplicação –, um outro aspecto é o fato de que ela é, de acordo com Minayo (2001), intrínseca e extrinsecamente ideológica.

Nesse sentido, Franco (2003) afirma que a pesquisa qualitativa “organiza-se em torno de um quadro de referências, quadro este decorrente de posturas, crenças, valores, que se

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con-figuram sob forma de concepções de mundo, de vida, de conhecimento” (FRANCO, 2003, p. 193).

Chizotti (2006) admite que as pesquisas qualitativas dependem do pesquisador – sua concepção, seus valores, seus objetivos. Todavia, é preciso assegurar que o percurso seguido pelo pesquisador para esclarecer o problema e sistematizar uma afirmação fidedigna sobre ele implique coerência epistemológica (os fundamentos do conhecimento que dão sustentação à investigação), metodológica e técnica, respondendo, desta forma, às necessárias exigências de credibilidade, consistência e fiabilidade:

Em suma, a pesquisa segue uma metodologia de trabalho, ou seja, a lógica subjacen-te ao encadeamento de diligências que o pesquisador segue para descobrir ou com-provar uma verdade, coerente com sua concepção da realidade e sua teoria do co-nhecimento (CHIZOTTI, 2006, p. 26-27).

Este trabalho de investigação encerrou pesquisas do tipo bibliográfica e documental. A pesquisa bibliográfica ofereceu, ao pesquisador, a possibilidade de elaborar, convenientemen-te, o arcabouço teórico-conceitual que sustentou a investigação, vinculando a concepção de formação humana plena às reflexões que problematizam os sentidos atribuídos aos processos formativos desenvolvidos pelas Instituições de Ensino Superior, na contemporaneidade.

Esperou-se, assim, organizar um referencial que evidenciasse a emergência de um pa-radigma educativo centrado no estudante, cuja ênfase está situada no processo de aprendiza-gem, compreendido como itinerário de crescimento e desenvolvimento de uma pessoa em sua totalidade, devidamente integrado aos projetos curriculares, em função dos perfis profissio-nais estabelecidos pelas respectivas DCNs. Assim, procedeu-se à pesquisa documental, anali-sando-se as DCNs e os projetos pedagógicos dos cursos de graduação investigados.

Estrutura da Tese

Quatro capítulos compõem esta Tese. Sob o título “A Educação Superior e a formação do profissional-cidadão”, o capítulo inicial vincula a concepção de formação humana plena às discussões que, contemporaneamente, problematizam os sentidos atribuídos à Educação Supe-rior. Esta compreensão ampliada acerca da formação profissional oferecida pelas Instituições de Ensino Superior – a qual permite entrever a possibilidade de se formar profissionais tecni-camente competentes e etitecni-camente comprometidos – assenta-se sobre a ideia de que um novo paradigma educativo deve ser constituído junto a essas Instituições, implicando em uma

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mu-dança de ênfase, dos processos de ensino para os de aprendizagem, em que o aluno torna-se o protagonista e o professor assume a condição de mediador pedagógico.

O segundo capítulo – “A Educação Superior e a dimensão ética da aprendizagem” – encerra uma análise crítica acerca das dificuldades inerentes à aprendizagem de atitudes e valores no âmbito dos itinerários formativos desenvolvidos pelas Instituições de Ensino Supe-rior. Entretanto, este trabalho de investigação não se resigna às vicissitudes estudadas. Assim, para superá-las, postula-se a necessidade de se constituir um currículo que promova a devida integração da ética à sua própria arquitetura, articulando, convenientemente, as relações inter-pessoais estabelecidas entre professor e grupo de alunos por meio de Metodologias Ativas.

O estudo do Projeto Pedagógico de um Curso de Bacharelado em Engenharia Elétrica encontra-se no terceiro capítulo. À luz do referencial teórico-conceitual elaborado nos capítu-los anteriores, pretende-se identificar se os elementos que compõem esse documento viabili-zam as condições necessárias para que a dimensão ética da formação acadêmico-profissional oferecida pela Instituição de Ensino Superior em questão seja realmente concretizada junto ao currículo daquele curso.

O quarto capítulo desta Tese compreende um estudo semelhante ao do capítulo anteri-or, circunscrito, porém, a um Curso de Bacharelado em Teologia.

Enfim, as Considerações Finais permitem retomar o problema de pesquisa que orienta este trabalho de investigação, tendo em vista as reflexões desenvolvidas a partir da análise dos dois cursos de graduação examinados. Deste modo, é possível sistematizar um conjunto de elementos curriculares os quais devem estruturar projetos pedagógicos que assegurem a for-mação de profissionais-cidadãos.

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CAPÍTULO 1

A EDUCAÇÃO SUPERIOR E A FORMAÇÃO DO PROFISSIONAL-CIDADÃO

Entre os dias 5 e 9 de outubro de 1998, celebrou-se, em Paris, a I Conferência Mundial sobre Educação Superior, convocada pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO).

O evento reuniu mais de quatro mil pessoas, representantes de 182 nações – nenhuma conferência realizada pela UNESCO, até então, reunira tamanha quantidade e diversidade de participantes. Naquela oportunidade, professores, pesquisadores, estudantes, parlamentares, integrantes de organizações governamentais e não-governamentais, de diferentes setores da sociedade civil, do mundo da economia e do trabalho, de organismos financeiros e de grupos editoriais discutiram um amplo conjunto de questões relacionadas às missões, às funções e às ações que deveriam ser desenvolvidas pelas Instituições de Ensino Superior, no contexto de uma sociedade globalizada, complexa e submetida à rápidas transformações. Com efeito, o extraordinário interesse demonstrado pela temática debatida no âmbito daquela Conferência revelou a significativa importância outorgada à Educação Superior para a promoção do de-senvolvimento socioeconômico dos povos, na contemporaneidade.

Logo, os consensos estabelecidos em torno das discussões acerca de que tipo de Edu-cação Superior se pretendia para o século XXI foram diligentemente consignados junto à

De-claração Mundial sobre Educação Superior no Século XXI: Visão e Ação, aprovada por

oca-sião do encerramento dos trabalhos da Conferência, cuja relevância deve ser reconhecida. Em particular, o documento propugna o entendimento de que o objetivo prioritário da Educação Superior deve ser o de vincular a capacitação para o trabalho à preparação para o exercício da cidadania, tendo em vista a formação de profissionais altamente qualificados e cidadãos responsáveis (UNESCO, 1998, p. 21-22).

Assim, de acordo com essa Declaração, as Instituições de Ensino Superior devem ser orientadas para que atendam às necessidades de todos os aspectos da atividade humana, a fim de que seu egresso possa cooperar, efetivamente, com o progresso da sociedade, contribuindo para a consolidação dos direitos humanos, do desenvolvimento sustentável, da democracia, da justiça social e da paz.

Para que isso aconteça, o documento aponta que deve ser oferecido, ao estudante, um itinerário formativo que lhe permita aprimorar um conjunto de competências que estejam à altura dos tempos modernos – caracterizado por contínuas e profundas mudanças –, no qual sejam combinados conhecimentos teóricos e práticos de alto nível, mediante cursos que

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este-jam constantemente adaptados às exigências presentes e futuras, além de lhe proporcionar a oportunidade de analisar a realidade segundo perspectivas críticas e independentes, que forta-leçam seu posicionamento sobre problemas relevantes para a sociedade, a partir de enfoques humanistas.

Por conseguinte, a Declaração preconiza a urgência de se implementar um novo mode-lo de Educação Superior, que deve estar centrado na figura do aluno, assegurando-lhe a possi-bilidade de desenvolver, plenamente, suas próprias capacidades, com responsapossi-bilidade social (UNESCO, 1998, p. 25).

Essas considerações sugerem que a formação do profissional-cidadão – isto é, “aquele que se vê primeiramente como um cidadão ativo e significativo em seu tempo histórico e que age profissionalmente em sua área tendo, primordialmente, como perspectiva, a sua condição de cidadão inserido em uma sociedade e um mundo global e complexo” (PEREIRA, 2007, p. 65) –, como compromisso fundamental que deve ser assumido, contemporaneamente, pelas Instituições de Ensino Superior, impõe-lhes a condição imperativa de elaborarem projetos pedagógicos cujos interesses tenham, como foco, o próprio estudante, segundo diretrizes cur-riculares que favoreçam o crescimento do aluno em sua completude.

Portanto, este trabalho de investigação sustenta-se sobre a tese de que é possível am-pliar a compreensão que se tem do conceito de formação profissional, alcançando a noção de formação humana plena. Por outro lado, essa perspectiva alargada da concepção de formação profissional integra-se ao estabelecimento de um novo paradigma educativo, o qual enfatiza o processo de aprendizagem, centrado no estudante, que assume o protagonismo de sua própria formação.

Nesse sentido, o entendimento de autores como Delors (1997), Pozo (2002), Hargrea-ves (2004), Zabalza (2004) e Masetto (2012a), acerca da centralidade do processo de aprendi-zagem e da responsabilidade do aluno em seu percurso formativo, permite entrever a possibi-lidade de aproximação entre os conceitos de formação humana plena e formação profissional, alternativa também indicada por Severino (2012).

Contudo, para se conferir ao estudante essa condição de sujeito de um necessário pro-cesso de formação integral, requer-se do professor uma importante mudança de atitude: além do indispensável domínio técnico-científico acerca de sua especialidade docente, espera-se que o professor desempenhe a função de mediador pedagógico.

As reflexões de Zabalza (2004) – corroboradas pela produção acadêmica de Masetto (2010, 2015) e Imbernón (2012) – apontam nessa direção:

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Antes do compromisso com sua disciplina, está o compromisso do docente com seus alunos, motivo pelo qual ele deve servir como facilitador, fazendo o que estiver ao seu alcance para que os alunos tenham acesso intelectual aos conteúdos e às práticas da disciplina. Por isso, fala-se tanto atualmente sobre a “dupla competência” dos bons professores: a competência científica, como conhecedores fidedignos do âmbi-to científico ensinado, e a competência pedagógica, como pessoas comprometidas com a formação e a aprendizagem de seus estudantes (ZABALZA, 2004, p. 169).

Assim, três seções compõem este capítulo inicial, em que se pretende articular concei-tos inerentes à formação do profissional-cidadão a partir de um processo de formação humana plena, à emergência de um novo paradigma educativo, que enfatiza o processo de aprendiza-gem e o protagonismo do aluno, e às características do docente da Educação Superior enquan-to mediador pedagógico.

1.1 A formação do profissional-cidadão: um processo de formação humana plena

A sociedade contemporânea orienta-se segundo um paradigma econômico-financeiro que se vincula à crescente disponibilidade de conhecimento, favorecida pelo advento de novas tecnologias digitais de informação e comunicação. Convenientemente integrado aos processos de produção – isto é, articulando-se às complexas relações que se estabelecem entre capital e trabalho, matéria-prima e energia, junto aos sistemas produtivos –, o conhecimento assume a condição de imprescindível elemento gerador de riqueza coorporativa. Generaliza-se, assim, a tendência em tratá-lo como mercadoria.

Evidentemente, essa realidade impacta as Instituições de Ensino Superior: no exercício das funções que lhes são inerentes, isto é, a produção, a organização e a difusão do conheci-mento, essas Instituições assumem uma tendência exacerbadamente pragmática e utilitária, privilegiando processos de formação profissional cada vez mais restritos ao manuseio instru-mental de informações momentaneamente aplicáveis, tendo em vista a capacitação de traba-lhadores adaptados ao mercado.

De acordo com Severino (2012), essa concepção reduz a Educação Superior ao “espa-ço/tempo de mera habilitação profissionalizante, destinada a preparar mão de obra técnica para o processo produtivo responsável pela condução do mercado de trabalho” (SEVERINO, 2012, p. 24). Entretanto, não se deve esquecer que nenhum profissional será, efetivamente, apenas um técnico:

[...] ele será necessariamente um sujeito interpelado pela história, pela sociedade, pe-la cultura e pepe-la humanidade, devendo dar-lhes respostas que vão muito além de seu desempenho puramente operacional no âmbito da produção.

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[...] por profissional deve ser entendida a pessoa que intervém no processo de vida da sociedade mediante a aplicação de seus conhecimentos científicos e de suas habi-lidades técnicas (SEVERINO, 2012, p. 29).

Por isso, é fundamental que as Instituições de Ensino Superior não abdiquem de possi-bilitar, a seus alunos, um processo de formação integral, que não se circunscreva, apenas, ao desenvolvimento de sua competência cognitiva e ao aprimoramento de suas habilidades práti-cas.

Logo, Zabalza (2004) sugere incorporar o conceito de formação humana plena à noção de formação profissional, propondo uma compreensão de formação profissional que se une, intrinsecamente, à ideia de “crescimento e aperfeiçoamento das pessoas, aperfeiçoamento que tem de ser entendido em um sentido global: crescer como pessoas” (ZABALZA, 2004, p. 39). Afinal, pergunta o autor, “qual é o sentido de sermos profissionais cada vez mais informados e competentes se isso, ao mesmo tempo, não supõe nos aperfeiçoarmos como pessoas?” (ZA-BALZA, 2004, p. 39).

Para ele, “a formação deve servir para qualificar as pessoas. Não é suficiente equipá-las com um perfil profissional padrão ou com uma determinada bagagem de conhecimentos e hábitos culturais, ou, ainda, adaptá-las melhor a uma atividade profissional qualquer” (ZA-BALZA, 2004, p. 41).

Esse ponto de vista ampliado acerca da concepção de formação profissional incorpora um grupo de dimensões que a pessoa pode aprimorar, como consequência da formação que lhe é disponibilizada: novas possibilidades de desenvolvimento pessoal, novos conhecimen-tos, novas habilidades, atitudes e valores, enriquecimento das experiências.

Sob essa perspectiva, as novas possibilidades de desenvolvimento pessoal referem-se a um processo de “crescimento pessoal equilibrado, aprimoramento das capacidades básicas do indivíduo e da satisfação pessoal, enriquecimento da autoestima e do sentimento de ser cada vez mais competente e de estar em melhores condições para aceitar os desafios inerentes à vida e não apenas os profissionais” (ZABALZA, 2004, p. 41).

Já os novos conhecimentos – que envolvem cultura básica geral, cultura acadêmica e cultura profissional – dizem respeito à possibilidade de os estudantes saberem mais e de se-rem mais competentes, como consequência do percurso formativo a que foram submetidos.

De outra parte, o desenvolvimento de novas habilidades – sejam elas genéricas, isto é, relacionadas com as tarefas da vida cotidiana, ou especializadas, relacionadas com o desem-penho de alguma função específica – supõe que os alunos sejam capazes de realizar suas

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ati-vidades melhor do que as executavam antes de participarem do programa de formação profis-sional que lhes foi oferecido.

Segundo Zabalza (2004), “as atitudes e valores podem se referir à própria pessoa ou a outras (dos colegas de trabalho aos grupos de referência com que se convive); aos eventos e às situações da vida cotidiana; aos compromissos assumidos ou à forma de orientar o traba-lho” (ZABALZA, 2004, p. 42).

Enfim, o pesquisador assevera que as melhores experiências formativas – as mais coe-sas e ricas, tanto pessoal como profissionalmente – são aquelas que proporcionam, aos estu-dantes, a possibilidade de obterem um desempenho mais autônomo, tomando, eles mesmos, decisões em seus próprios itinerários de formação:

As experiências coesas são aquelas em que se avalia por completo o sujeito em for-mação (seu intelecto, suas habilidades manuais, suas emoções, etc.). Participar de uma pesquisa, ter uma experiência em uma fábrica, fazer uma viagem ao exterior, trabalhar com um profissional competente, fazer parte da resolução de problemas complexos, etc. abrem espaço para essas experiências coesas. As experiências ricas caracterizam-se pelo tipo de conteúdos que se incorporam a elas: tecnologias novas, processos de calado social, atividades de grande interesse, etc. (ZABALZA, 2004, p. 42).

Portanto, considerando que as atividades realizadas pelas Instituições de Ensino Supe-rior devem assegurar, aos alunos, uma oferta formativa que contemple tanto a dinâmica geral de seu desenvolvimento pessoal quanto o aprimoramento de seus conhecimentos e de suas capacidades, além da imprescindível referência ao mercado de trabalho –, Zabalza (2004) apresenta um conjunto de questões que podem orientar a elaboração dos projetos pedagógicos dessas Instituições:

[...] O que estamos oferecendo a nossos estudantes em relação ao seu desenvolvi-mento pessoal? Além do crescidesenvolvi-mento que é produto da idade, podemos constatar que os alunos estão amadurecendo, tornando-se mais seguros, mais responsáveis, mais comprometidos? O que estamos fazendo para facilitar tal processo?

[...] O que aprenderam de novo durante esses anos de universidade? O que eles con-seguiram desenvolver em relação às suas capacidades iniciais? De fato, que compe-tências assumiram? Que dimensões do perfil profissional, para o qual se prepararam, não foram supridas?

[...] O que proporcionamos de significativo para eles em relação à inserção no mer-cado de trabalho ou à ascensão profissional? No caso de que não seja esse o propósi-to da formação, a situação profissional deles melhorou como consequência do pro-cesso formativo realizado, voltado para responder melhor as exigências existentes nesse contexto? (ZABALZA, 2004, p. 44-45).

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As respostas a cada uma dessas questões apontam para a formação de profissionais al-tamente qualificados e cidadãos responsáveis, consubstanciando a meta que deve ser atingida pelas Instituições de Ensino Superior, na contemporaneidade.

Do mesmo modo, para satisfazer essa expectativa de se formar o profissional-cidadão competente, Severino (2012) insiste que a formação profissional deve envolver, obrigatoria-mente, três dimensões: uma dimensão epistemológica, abrangendo o conhecimento dos obje-tos que constituem o universo de sua ação, uma dimensão técnica, que fornece os instrumen-tos para tornar eficaz essa ação, e uma dimensão ético-política, que insere essa ação num con-texto sociocultural (SEVERINO, 2012, p. 31).

Ademais, a adequada articulação desse conjunto de dimensões de natureza epistemo-lógica, técnica e ético-política, no contexto dos projetos pedagógicos desenvolvidos pelas Instituições de Ensino Superior, também associa a noção de formação humana plena à ideia de formação profissional.

Para Severino (2012), a dimensão epistemológica da formação, no âmbito da Educa-ção Superior, vincula-se à apropriaEduca-ção do acervo de conhecimentos científicos que se relacio-nam ao exercício de uma profissão e ao domínio dos processos metodológicos de produção desses conhecimentos.

Naturalmente, essa dimensão não se limita, apenas, ao acúmulo de informações relati-vas aos conhecimentos produzidos no contexto de uma área de atuação profissional, por mais importantes que sejam; ela consiste, sobretudo, em fazer com que os estudantes adquiram a capacidade de saber codificar a informação, integrá-la, contextualizá-la, organizá-la e inter-pretá-la, conferindo-lhe significado.

Trata-se de oferecer, aos alunos, a possibilidade de se constituírem construtores do sa-ber científico, não somente pela utilização criteriosa e sistemática dos procedimentos adequa-dos ao tratamento adequa-dos fenômenos; há que se exigir, adequa-dos estudantes, principalmente, consistên-cia teórica, qualidade epistêmica e rigor metodológico.

Por outro lado, segundo Severino (2012), a dimensão técnica da formação compreende o desenvolvimento de um conjunto de habilidades adequadas à prática profissional. Todavia, elas não devem restringir-se à aplicação dos resultados operacionais obtidos a partir do co-nhecimento científico produzido, pois, embora o mercado de trabalho demande essa habilida-de instrumental, ele também atribui extrema importância às habilidahabilida-des afetivas e comporta-mentais.

Assim, espera-se que as Instituições de Ensino Superior oportunizem a apreensão, pe-los alunos, de uma miríade de novas competências: abertura à mudança e disposição para o

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risco, autonomia e autorregulação das próprias funções, comunicação e expressão, cooperati-vismo, criatividade, criticidade, disponibilidade para a pesquisa e para a inovação, empreen-dedorismo, flexibilidade, iniciativa, interculturalidade, trabalho colaborativo.

Finalmente, Severino (2012) afirma que a dimensão ético-política da formação conduz a ação profissional para uma prática socialmente comprometida. Logo, “a questão ética que o profissional tem que colocar por ocasião de cada ato concreto é como esse ato se reconstitui frente à dignidade das pessoas, até que ponto ele contribui para a construção da cidadania e da democracia” (SEVERINO, 2012, p. 32).

No horizonte do pensamento educativo de Severino (2012), assim como no de Zabalza (2004) – em ambos se integram múltiplas dimensões formativas –, vislumbra-se que os estu-dantes participem como atores de sua própria formação. Deve-se lhes outorgar, então, o devi-do protagonismo.

Essa condição exige que se desloque o eixo da relação ensino-aprendizagem, para que seja enfatizado o processo de aprendizagem, centrado nos alunos. Contudo, é necessário de-senvolver uma compreensão de aprendizagem que se una, coerentemente, com a concepção de formação profissional entendida como formação humana plena.

1.2 Um novo paradigma educativo: ênfase no processo de aprendizagem

Decerto, os processos de formação desenvolvidos, contemporaneamente, no âmbito da Educação Superior, priorizam aspectos de natureza técnica e cognitiva. Assim, os currículos dos cursos oferecidos pelas Instituições de Ensino Superior não permitem que os estudantes articulem, em seu percurso formativo, uma diversidade de competências – tais como as apon-tadas, anteriormente, por Zabalza (2004) e Severino (2012) – que os conduzam para além da imprescindível preparação teórico-prática inerente ao bom desempenho de uma profissão: não se lhes proporciona a possibilidade de uma formação humana plena, que integre, convenien-temente, a capacitação para o trabalho e a disposição para o exercício da cidadania.

Masetto (2012a) explica essa realidade a partir da ênfase que se atribui, no contexto da Educação Superior, à atividade docente de ensinar. Nessa perspectiva, ensinar assume o signi-ficado de “instruir, comunicar conhecimentos e habilidades, fazer saber, mostrar, guiar, orien-tar, dirigir” (Masetto, 2012a, p. 44) e a ideia de formação, esvaziada de sentido, termina vin-culada à noção de modelar e conformar (Zabalza, 2004), ou seja, os alunos, modelados pelo professor, conformam-se ao planejamento didático-pedagógico estabelecido por ele,

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obede-cendo-lhe passivamente e renunciando, ainda que involuntariamente, à sua própria autonomia e responsabilidade e ao aperfeiçoamento de sua capacidade crítico-reflexiva.

Entretanto, profissionais formados sob essa óptica não atendem às exigências da soci-edade hodierna, na qual o conhecimento, “um recurso flexível, fluido, em processo de expan-são e mudança incessante” (HARGREAVES, 2004, p. 32), está intrinsecamente incorporado a uma matriz econômica submetida ao mercado financeiro:

[...] assim como outros tipos de capitalismo, a economia do conhecimento é, nas pa-lavras de Joseph Schumpeter, uma força de destruição criativa, estimulando o cres-cimento e a prosperidade, ao mesmo tempo em que sua busca incansável de lucro e de interesse próprio desgasta e fragmenta a ordem social. Sendo assim, [...] nossas escolas devem estimular também a compaixão, a comunidade e a identidade cosmo-polita, as quais compensarão os efeitos mais destrutivos da economia do conheci-mento, que serve basicamente ao bem privado, ao passo que a sociedade do conhe-cimento também inclui o bem público. Nossas escolas devem preparar os jovens pa-ra ambos (HARGREAVES, 2004, p. 17).

Por conseguinte, Hargreaves (2004, p. 37-38) postula a necessidade de se formar pro-fissionais caracterizados pela chamada inventividade social, que encontrem respostas rápidas e eficazes à profusão de problemas urgentes e imprevisíveis, de ordem prática, técnica e soci-al, gerados por um mundo cada vez mais complexo, interdependente e que funciona em ritmo acelerado.

Nesse sentido, Hargreaves (2004) preconiza que os processos de formação profissional devem permitir que os estudantes assumam, eles mesmos, o compromisso de se desenvolve-rem permanentemente, pois “o sucesso econômico e uma cultura de inovação contínua depen-dem da capacidade dos trabalhadores de se manterem aprendendo acerca de si próprios e uns com os outros” (HARGREAVES, 2004, p. 34).

Trata-se, portanto, da emergência de um novo paradigma educativo que, assentado so-bre o protagonismo do aluno, assegura-lhe a promoção de sua capacidade de aprendizagem ao longo da vida – lifelong learning –, seja em termos técnico-cognitivos – no que diz respeito à apreensão e aplicação de novos conhecimentos –, seja em termos socioemocionais – os quais se expressam por meio de sólidos vínculos de relacionamento, pautados pelo caráter individu-al, pela confiança coletiva e pelo trabalho cooperativo, tendo em vista o bem comum, a soli-dariedade e a justiça social.

Esse modelo formativo articula-se às conclusões apresentadas pela Comissão Interna-cional sobre Educação para o Século XXI – instituída, em 1993, pela UNESCO e presidida por Jacques Delors –, que, em 1996, publicou o célebre relatório Educação, um tesouro a

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princípio-chave para a contemporaneidade, estabeleceu ser imprescindível que as instituições de ensino organizassem-se em torno de quatro aprendizagens fundamentais, identificadas como “pilares do conhecimento”, quais sejam o aprender a conhecer, o aprender a fazer, o aprender a viver

juntos e o aprender a ser. De acordo com o documento,

[...] cada um dos “quatro pilares do conhecimento” deve ser objeto de atenção igual por parte do ensino estruturado, a fim de que a educação apareça como uma experi-ência global a levar a cabo ao longo de toda a vida, no plano cognitivo como no prá-tico, para o indivíduo enquanto pessoa e membro da sociedade (DELORS, 1997, p. 90).

Para Delors (1997), o aprender a conhecer supõe que os estudantes aprendam a com-binar uma cultura geral suficientemente vasta – o que implica abertura para outros campos do conhecimento, onde se opera a interdisciplinaridade – com a possibilidade de trabalhar, em profundidade, um determinado número de assuntos. Isso porque, contemporaneamente, ob-serva-se uma vertiginosa diminuição do tempo transcorrido entre a gênese de um novo conhe-cimento e sua aplicação em nível tecnológico; constata-se, assim, um fenômeno comumente designado por “explosão do conhecimento”, relacionado ao acelerado aumento do volume de conhecimento produzido – um conhecimento superespecializado, que se torna obsoleto sim-plesmente com a escala dos problemas que se propõe resolver.

Já o aprender a fazer compreende não apenas a qualificação profissional, mas a aqui-sição de competências que tornem os alunos aptos a enfrentar desafios, dispondo-se ao risco e lidando com a mudança constante.

Preparar os estudantes para aprender a viver juntos é, segundo Delors (1997), o gran-de gran-desafio gran-de qualquer empreendimento educativo: ele exige que se gran-desenvolva a compreen-são do outro e a percepção de interdependências, realizando projetos comuns e gerindo inevi-táveis conflitos, no respeito pelos valores do pluralismo, da compreensão mútua e da paz.

Enfim, o aprender a ser deve dispor os alunos a agirem com cada vez maior capacida-de capacida-de autonomia e capacida-de discernimento, para formularem seus próprios juízos capacida-de valor, capacida-de modo a poderem decidir, por si mesmos, como agir em diferentes circunstâncias.

O entendimento que se firma em torno da ideia de formação profissional, subjacente às considerações anteriores, envolve todas as dimensões da vida da pessoa. Então, há que se re-lacionar aprendizagem a um processo de formação humana plena. O arcabouço teórico elabo-rado por Masetto (2012a) responde a essa necessidade. De acordo com esse autor, por

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[...] buscar informações, rever a própria experiência, adquirir habilidades, adaptar-se às mudanças, descobrir significado nos seres, nos fatos, nos fenômenos e nos acon-tecimentos, modificar atitudes e comportamentos.

[...] Ao se falar de processo de aprendizagem, refere-se a um processo de

crescimen-to e desenvolvimencrescimen-to de uma pessoa em sua crescimen-totalidade, abarcando minimamente quatro grandes áreas: a do conhecimento, a do afetivo-emocional, a de habilidades e a de atitudes e valores (MASETTO, 2012a, p. 44-45).

Assim, Masetto (2012a) enumera um conjunto de características que se vinculam ao desenvolvimento da área cognitiva dos estudantes:

[...] aquisição, elaboração e organização de informações; acesso ao conhecimento existente; relação entre o conhecimento que se possui e o que se adquire; reconstru-ção do próprio conhecimento com significado para si; inferência e generalizareconstru-ção de conclusões; transferência de conhecimentos para novas situações; compreensão dos argumentos apresentados para defesa ou questionamento de teorias existentes; iden-tificação de diferentes pontos de vista sobre o mesmo assunto; emissão de opiniões próprias com justificativas; desenvolvimento da imaginação e da criatividade, do pensar e do resolver problemas (MASETTO, 2012a, p. 46).

O pesquisador sublinha, ainda, que se deve “desenvolver um saber integrando os co-nhecimentos de uma área específica com os de outras áreas, de forma interdisciplinar, voltada para os compromissos sociais e comunitários” (MASETTO, 2012a, p. 46).

Evidentemente, essa concepção epistemológica provoca uma ruptura com o paradigma empírico-positivista, sobre o qual se assenta uma tradição acadêmica estritamente disciplinar, em que a formação profissional é promovida por um currículo com características fragmenta-das, composto por disciplinas autônomas e independentes entre si. Com efeito, a complexida-de da estrutura do conhecimento contemporâneo impõe a conveniência complexida-de uma abordagem interdisciplinar.

Nesse sentido, Masetto (2015) aponta que o perfil do profissional universitário estabe-lecido pelo próprio mercado de trabalho exige um padrão interdisciplinar cada vez mais ele-vado:

[...] a interdisciplinaridade na área do conhecimento e a interprofissionalidade em ações e projetos coletivos vêm apoiando e sustentando a integração de duas ou mais profissões no enfrentamento dos problemas emergentes, incentivando o surgimento de novas profissões, que envolvem, por exemplo, biologia e engenharia; educação e urbanismo; administração, economia e direito; engenharia e medicina; turismo, co-municação social e marketing; medicina, psicologia, serviço social e educação para realização de projetos de saúde coletiva e educação (MASETTO, 2015, p. 20).

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Por outro lado, o desenvolvimento dos alunos em sua área afetivo-emocional propor-ciona-lhes uma maior autoestima e autoconfiança, permitindo-lhes que aperfeiçoem sua capa-cidade de trabalho em equipe por meio de um relacionamento cooperativo e solidário.

Para Masetto (2012a), o desenvolvimento de habilidades (humanas e profissionais) deve incluir a possibilidade de os estudantes aprenderem a se expressar e a se comunicar ade-quadamente, nos mais diversos contextos: com seus colegas, professores e pessoas que não participam, propriamente, do ambiente acadêmico, com profissionais de suas respectivas áreas de atuação e com aqueles de outros campos de estudo. Espera-se, também, que os alunos se-jam capazes de fazer relatórios técnicos, realizar pesquisas, redigir e apresentar trabalhos ci-entíficos, utilizar novas tecnologias digitais de informação e comunicação, e participar de situações simuladas nos locais onde exercerão, efetivamente, suas profissões.

Finalmente, a aprendizagem de atitudes e valores aponta tanto para o desenvolvimento de aspectos pessoais quanto para aqueles de alcance social:

[...] responsabilidade pelo seu processo de aprendizagem, ética, respeito ao outro e a suas opiniões, honestidade intelectual, criticidade, curiosidade, criatividade, auto-nomia, o desenvolvimento de valores cidadãos e políticos – como não se limitar a soluções técnicas dos problemas de sua área, ter abertura para perceber e analisar as consequências de soluções técnicas à luz das ciências ambientais, da antropologia, da sociologia, sentir-se comprometido com o crescimento e a melhoria da qualidade de vida da população a que se serve – e o desenvolvimento de valores éticos, históri-cos, sociais e culturais.

[...] situar-se historicamente no contexto e no espaço do movimento de sua socieda-de; estar aberto para captar fatos e acontecimentos que agitam seu mundo, o traba-lho, a família, o emprego, as políticas, a cidade, o país; analisar criticamente os en-caminhamentos e as soluções apresentadas pelos dirigentes; e, no seu contexto de profissional e cidadão, participar da sociedade, comprometendo-se com seu desen-volvimento (MASETTO, 2012a, p. 49).

Obviamente, a concepção de formação profissional implícita a essas reflexões não se circunscreve à etapa acadêmica, mas a transcende. Por isso, é indispensável que as Institui-ções de Ensino Superior preparem os estudantes para que eles administrem sua própria apren-dizagem, isto é, sejam capazes de aprender a aprender. Por isso, Pozo (2002) assevera que

[...] os aprendizes devem aprender a controlar e regular seus processos cognitivos, assim como se habituar a pensar sobre seu próprio conhecimento, quer dizer, exerci-tar o metaconhecimento. [...] Em geral, a transição, exigida cada vez mais pela nossa cultura de aprendizagem, de um aprendiz passivo, disposto a aprender de forma re-produtiva o que lhe é pedido, para um aprendiz ativo e construtivo, orientado para a busca do significado do que faz, diz e pensa, se sustenta numa aprendizagem cada vez mais metacognitiva e controlada. Ou seja, nossa sociedade exige com crescente insistência aprendizes reflexivos e conscientes de sua tarefa, e não simples autôma-tos que reproduzam mecanicamente conhecimenautôma-tos elaborados por outros. Tal

Referências

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