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2 TEMAS GERADORES

2.5 A docência universitária

Algumas/alguns estudiosos da temática “formação de professorxs” têm se dedicado às reflexões sobre a especificidade desta para o ensino superior. Abordaremos aqui algumas dessas reflexões e propostas, baseando-nos especialmente na leitura de Veiga (2009), Dias (2013), Dias, Therrien e Leitinho (2016) e Vieira e Braga (2016).

Inicialmente, consideramos importante salientar que deveria existir uma política de formação para o exercício da docência universitária, já que se trata de uma profissão com demandas e características específicas (DIAS, 2012). Entretanto, até os tempos atuais, a preparação para o ingresso na carreira docente no Ensino Superior acontece, conforme determina a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, “[...] em nível de pós-graduação, prioritariamente em programas de

mestrado e doutorado” (DIAS, 2012, p. 153), com destaque para o fato de que “[...] essa exigência do título acadêmico pode ser suprida com o reconhecimento de notório saber por uma universidade” (DIAS, 2012, p. 153).

Entretanto, Veiga (2009) chama a atenção para o fato de que, nos programas de pós-graduação, o foco se concentra na formação de pesquisadorxs para cada área específica, não havendo nenhuma exigência em relação à formação pedagógica. Diante disso, fica o questionamento: basta saber os conteúdos específicos da área para saber ensiná-los? Dessa forma, Dias, Therrien e Leitinho (2016, p. 22) lançam alguns questionamentos:

– Para ser professor de uma IES, basta dominar o saber técnico?

– Uma boa formação em pesquisa seria suficiente para a carreira na educação superior?

– Qual o lugar da formação pedagógica para ser docente nessas instituições?

– Como articular o saber técnico com a necessária (trans)formação didática, para que os estudantes compreendam melhor e mais significativamente o conteúdo e possam fazer as necessárias adaptações ao seu cotidiano, realidade e momento histórico, econômico e social em que vivem?

Dias (2016, p. 188) contribui trazendo mais questionamentos sobre essa reflexão:

[...] onde fica a formação pedagógica para ser docente? Como articular o saber técnico com o saber ensinável e a ser ensinado, para que os estudantes compreendam melhor e mais significativamente o conteúdo e possam fazer as necessárias adaptações ao seu cotidiano, realidade e momento histórico-econômico-social em que vivem? Nesse caso, resta aos professores de IES a busca, por conta própria, de formação (na maioria das vezes, uma autoformação)...

Estas são questões importantes e pertinentes ao se pensar a formação para a docência universitária. Reforçamos que se faz necessária uma “profissionalização acadêmica formal” (DIAS, 2012) da docência universitária, visto que, conforme afirma Veiga (2009), inspirada em Zabalza (2004), existem funções específicas para o professor universitário, como o ensino, a pesquisa e a administração nos diversos setores da instituição, além da orientação acadêmica.

É necessário, portanto, que, além do saber técnico e científico, o docente universitário seja preparado para o caráter pedagógico de seu trabalho. Entretanto, isto ainda acontece de forma secundária, conforme asseveram Vieira e Braga (2016). Corroborando com esse entendimento, Veiga (2009, p. 46) afiança que “[...] a titulação deve ser considerada condição necessária – mas não suficiente – para o desempenho adequado da docência”. Esta autora adverte, portanto, que o(a)

professorx, além do domínio no campo científico, deve ser portador de conhecimentos pedagógicos que lhe possibilitem exercer bem a sua função. Veiga (2009, p. 46-47) recomenda, ainda, que

O locus adequado para o desenvolvimento desses programas de formação docente – tanto para a educação básica quanto superior – é a Faculdade de Educação. Fora desse espaço, os programas de desenvolvimento profissional de docentes universitários tendem a desaparecer por falta de continuidade, pela dicotomia entre teoria e prática, ensino e pesquisa, científico e pedagógico, educação e trabalho, graduação e pós-graduação.

Consideramos esse destaque da autora supracitada, por reconhecer que a Pedagogia, como ciência da prática e para a prática, configura-se como ciência da educação (PIMENTA, 2002), realçando sua importante contribuição para a formação para a docência universitária em todas as áreas do saber. Dias (2016, p. 190) lamenta que

[...] nas IES, ainda temos a estrutura de ‘Departamentos’, que impede maior responsabilidade, mais autonomia e maior visibilidade às instâncias organizativas e deliberativas dos Cursos de Graduação; falta, ainda, um projeto de efetiva integração com a Escola de Educação Básica.

Por fim, gostaríamos de ressaltar a contribuição da proposta educativa freireana na formação para a docência universitária. Sobre essa questão, Dias, Therrien e Leitinho (2016, p. 29) informam que “Essa compreensão aparentemente diferenciada do trabalho do educador tem antecedentes conhecidos: Paulo Freire (2005) e uma racionalidade que “permite” a leitura e a escrita do mundo junto a outros sujeitos [...]”. Os autores mencionados acima destacam ainda que o trabalho docente, inclusive na universidade, deve se configurar

[...] como uma práxis de saberes entre sujeitos, centrada na aprendizagem pela construção de sentidos e significados, portanto, de novos saberes, por meio da ação comunicativa em direção ao entendimento pela

dialogicidade, tendo por horizonte a emancipação e a autodeterminação fundada no ser social. (Grifos nossos).

Vieira e Braga (2016, p. 153) concordam com esse pensamento, afirmando que a docência universitária deve considerar a dimensão política da educação, bem como a “[...] construção de sujeitos histórico-sociais que têm um papel político e uma responsabilidade pedagógica perante o seu meio social, para além da universidade”, em uma práxis esperançosa, crítica e humanizadora.

Algumas formulações apontadas por Veiga (2009) coadunam com essa temática da docência universitária na perspectiva freireana, quando sugere

características da mesma ligadas à “inovação”, como, por exemplo: o rompimento com as formas conservadoras e tradicionais de ensino, de pesquisa, de aprendizagem, de avaliação; a superação das dicotomias entre saber cientifico e saber de experiência feito, entre ciência e cultura, entre teoria e prática; a busca por novas metodologias pedagógicas; o exercício baseado na ética; entre outros.

Para finalizar, trazemos as palavras do próprio Paulo Freire (2003a, p. 174), ao tratar do papel da universidade:

A universidade [...] tem de girar em torno de duas preocupações fundantes, de que se derivam as outras e que têm que ver com o ciclo de conhecimento. Este, por sua vez, tem apenas dois momentos que se relacionam permanentemente: um é o momento em que conhecemos o conhecimento existente; o outro, em que produzimos o novo conhecimento. [...] O papel da universidade, seja ela progressista ou conservadora, é viver com seriedade os momentos deste ciclo. É ensinar, é pesquisar, é formar. O que distingue uma universidade conservadora de outra, progressista, jamais pode ser o fato de que uma ensina e pesquisa e a outra nada faz. [...] O que

se quer é diminuir a distância entre a universidade e o que se faz nela e as classes populares, mas sem a perda da seriedade e do rigor. Sem

negligenciar diante do dever de ensinar e de pesquisar.

Assim, concluímos este capítulo, destacando a importância da atuação da universidade junto à comunidade, visto que um de seus papeis fundamentais é produzir e divulgar conhecimento. Preferencialmente, que seja este construído com vistas à melhoria da sociedade na qual se insere. Portanto, reforçamos a necessidade de formação específica para a docência universitária, visto que ainda não há uma política de formação com este intuito, apenas ações isoladas e atitudes de autoformação (DIAS, 2012).