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5 A DIALOGICIDADE NA DOCÊNCIA NA UFC – FUNDAMENTOS DA

5.1 Fundamentos da Educação Dialógica Freireana

5.1.5 Pensar crítico

Como o último dos fundamentos da dialogicidade, Freire anuncia o pensar crítico, que ele denomina, algumas vezes, também de pensar certo e pensar verdadeiro. Ele informa que este é essencial para a prática docente crítica, pois “[...] envolve o movimento dinâmico, dialético, entre o fazer e o pensar sobre o fazer” (FREIRE, 1996, p. 38).

Desse modo, apresentamos aqui os trechos das entrevistas que, na nossa compreensão, se relacionam com o pensar crítico, começando pelo relato da professora Acerola, que afirma que utiliza muito a pesquisa em suas aulas e que a escolha dos textos a serem estudados na disciplina é feita de forma parceira com xs estudantes.

“Eu exijo deles o uso de multimídia, muita pesquisa, por exemplo, uma capacitação eu digo o autor, eles escolhem o texto que eles vão usar: ‘Não, professora, mas a senhora tem que deixar na xérox!’, eu digo assim: ‘Mas vocês que são a geração Google, é só colocar ali no Google e fazer

uma pesquisa. Vocês escolham’. No início, eles estranhavam muito: ‘Mas

a senhora não vai dar o texto?’, eu entrava em sala e eles: ‘Professora, e

a ementa?’, eu disse: ‘Não, a ementa é feita no processo, primeiro eu

quero saber o que é que vocês esperam dessa disciplina’ e aí a gente vai

fazendo a partir das demandas. A única coisa que eu proponho são os autores, aí eles vão atrás, às vezes trazem textos que eu não conhecia, e

que é muito legal porque eu aprendo também, e às vezes são textos que

são clássicos”. (Profa. Acerola)

Nos trechos abaixo, ela traz exemplos de como essa prática gera situações inusitadas que partem da iniciativa e autonomia dxs estudantes.

“[...] Foi muito legal, porque eu trabalhei, por exemplo, Foucault, e o pessoal da moda fez uma camisa de força com retalhos de tecidos de grife e aí fez toda uma análise do quanto a gente é forçado a usar determinados padrões, então fica muito trocado, assim, e eles se

organizam muito rápido”. (Profa. Acerola)

“Na escola que eu fui, foi na Adalto, a gente passou o filme V de Vingança e aí foi toda uma discussão de uma proposta de uma sociedade anarquista com uma democracia direta e sem democracia representativa, aí a discussão dessa crise, da democracia representativa. Então, foi muito bom”. (Profa. Acerola)

O professor Caju destaca a possibilidade de formular e construir o conhecimento, a partir do entendimento dxs estudantes, para, depois, dialogar com o conhecimento teórico “clássico”.

“E o primeiro passo pra isso, eu acredito que seja essa capacidade de dialogar, de responder questões, de levantar questões, de propor suas próprias respostas, mesmo que essas respostas repitam respostas clássicas, isso me parece que não é nenhum problema, isso me parece um exercício muito proveitoso, porque o aluno consegue reesclarecer as suas próprias ideias e, depois, quando vai pras fontes, quando vai ver que alguém já falou aquela ideia, ele consegue ver o que falta na sua ideia, ou o que a sua ideia tem de original, e ele consegue, dessa forma, se inserir de forma mais própria num debate filosófico”. (Prof. Caju)

No trecho a seguir, a professora Acerola confessa que se utiliza de diversos saberes e variadas áreas do conhecimento ao trabalhar as temáticas com xs estudantes.

“Alguns dizem que isso não é filosofia, isso é sociologia e começam a fragmentar, mas eu não vejo a Filosofia sem estar com a sociologia, com a história, com a geografia, com a pedagogia, com a arte, com a ciência,

então eu digo pra eles: ‘Todos os grande filósofos na sua época

conversaram com os grandes cientistas, com os grandes artistas sem

uma hierarquia’ então, eu falo do Kant, que conversava com Newton, com

a física mecânica e que hoje esses filósofos conversam com a física quântica, tentar procurar a menor partícula da matéria, quer dizer, quebrar com a unidade, quebrar com o sujeito, quebrar com o ser e pensar na

multiplicidade, tentar pensar a singularidade e isso imediatamente remete

à nossa vida”. (Profa. Acerola)

Como assevera Freire (1996, p. 38), “A prática docente crítica, implicante do pensar certo, envolve o movimento dinâmico, dialético, entre o fazer e o pensar sobre o fazer”.

Esta professora exemplifica, ainda uma situação em que orientou suas/seus estudantes de estágio a elaborar as atividades e as aulas a partir da realidade social e das demandas dxs estudantes, como vemos a seguir:

“No estágio, eu presenciei aulas que a professora estava falando dos três poderes e ele queria porque queria empurrar o Montesquieu, que foi o cara que pensou politicamente esses poderes e tal... e tinha aquelas criaturas dizendo lá... a Dilma... o Impeachment... o Cunha... não sei o

que... e eles perguntavam pra ele e ele não sabia e ele dando aula: ‘Não,

mas o legislativo...’, ‘Mas o que adianta ter o legislativo se ele não tá

apoiando o executivo e o judiciário que é corrupto e aí como é que fica?’ e

ele: ‘Não, eu vou chegar lá...’ aí nos últimos cinco minutos, ele abre pra

conversação. E eu: ‘Lembra que eu dizia na aula, partam do cotidiano pra

depois chegar e tal...’”. (Profa. Acerola)

No trecho a seguir, o professor Caju afirma que o estímulo ao pensar crítico faz parte do seu cotidiano docente na relação com xs estudantes, como podemos ver abaixo:

“[...] eu acho que são princípios importantes pra mim, eu tento seguir, eu espero que esteja conseguindo fazer isso. Eu tento estimular essa criticidade nos alunos, tendo ter esse diálogo como você falou [...]. [...] eu gosto de fazer com que eles pensem, exponham algumas ideias, sempre

peço que eles avaliem criticamente”. (Prof. Caju)

Do mesmo modo, o professor Murici confessa que o pensar crítico faz parte de sua práxis, e que este se relaciona à humildade e à horizontalidade. Vejamos os trechos a seguir:

“Eu me proponho a fazer esse movimento dentro dessa humildade acadêmica e da criticidade também. Eu acho que eu ofereço a eles alguns elementos que, talvez, dentro das reflexões que eles tenham, não tinham aparecido ainda e isso faz com que haja um processo de criticidade dentro da formação deles [...]”. (Prof. Murici)

“[...] e aí eu volto de novo ao princípio que eu acho que o Freire também vai defender um pouco, apesar da horizontalidade, mas são papeis diferenciados. O professor tem a sua responsabilidade em sala de aula

como o estudante tem a sua responsabilidade em sala de aula. A gente tem que reconhecer também quais são os nossos papeis diferenciados, pra que a gente não caia numa horizontalidade espontaneísta, esse é um cuidado que a gente tem que ter em relação... Mas nesse conjunto de fundamentos que você trouxe, eu me considero, continuo me considerando até agora dialógico”. (Prof. Murici)

Para finalizar, trazemos o relato da professora Seriguela, demonstrando que o andamento de suas aulas extrapola o conteúdo que foi planejado e que, inclusive, antecipa assuntos e temáticas quando levantados pelxs estudantes.

“Eu acho que sim. Como eles fazem muitas perguntas, coisas que, às vezes, não tá nem no contexto da aula. É como eu falei pra você, às vezes, eu não sei... quando é do próximo semestre, eu procuro e já

coloco aqui [...]”. (Profa. Seriguela)

Assim, encerramos este tópico, informando que, em nossa compreensão, o pensar crítico se encontra presente nas práxis docentes dxs professorxs entrevistadxs, se manifestando por vários caminhos, seja através da própria autorreflexão sobre a prática, seja no estímulo à criticidade com suas/seus estudantes, e até na tomada de decisões consciente e escolha dos conteúdos e temáticas de forma dialogada e partilhada.

6 A DIALOGICIDADE NA DOCÊNCIA NA UFC – FORMAÇÃO E PRÁXIS