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A DOCUMENTAÇÃO PEDAGÓGICA NA EDUCAÇÃO INFANTIL

DÉBORA GOMIERI DELUCA Graduação em Pedagogia pelo Centro Universitário Fundação Santo André (2004); Profes- sora de Educação Infantil no CEI Jardim Clímax II.

REVISTA EXATTO EDUCACIONAL | V.2 | N.9 | SETEMBRO 2020

RESUMO

Este trabalho tem a intenção primeiramente, de contextualizar por meio de aporte bibliográfico, uma retrospecti- va histórica dos conceitos de infância e educação infantil, buscando elucidar a evolução das concepções de infância e seus impactos nas práticas educativas, especialmente no nosso país e na Itália, berço de um trabalho desenvolvido para a educação com crianças pequenas, na cidade de Reggio Emilia, cuja abordagem foi

reconhecida pela excelência em qualidade das experiências e vivências proporcionadas às crianças, a partir da “teoria das cem linguagens”, desenvolvida por Loris Malaguzzi, impulsionado pelas teorias psicopedagógicas inovadoras da época, cujo paradigma educativo consistia no desenvolvimento integral das potencialidades (intelectual, emocional, social e moral das crianças), buscando acompanhar o nível evolutivo na trajetória das mesmas, alicerçado no respeito à diversidade, na observação em profundidade, na escuta atenta e ativa para posterior contribuição na construção de projetos coletivos significativos aos interesses das crianças, bem como para que servissem de subsídios para a elaboração de documentação pedagógica qualitativa, a fim de emprestar visibilidade, para a família e a comunidade no sentido de quanto, de que e de como estão aprenden- do e se desenvolvendo; possibilitando também, às crianças a revisitação das vivências, bem como permitir aos professores pesquisarem suas práticas, enquanto acompanham a trajetória de aprendizagens de suas crianças. A documentação consiste em uma ferramenta essencial para conhecer o processo de aprendizagens. Portanto é possível identificar a relevância da documentação pedagógica nos processos de autorreflexão sobre a prática, na consolidação de uma proposta pedagógica, para a avaliação das aprendizagens e na comunicação e socialização dos caminhos percorridos.

Palavras-chave: Educação Infantil; Aprendizagens; Documentação Pedagógica. INTRODUÇÃO

Este artigo de caráter bibliográfico tem como objetivo geral suscitar a reflexão sobre a importância da docu- mentação pedagógica na educação infantil, por ser considerada por diversos estudos como uma ferramenta essencial para impulsionar o processo de aprendizagens das crianças, contando com a observação, a docu- mentação e a reflexão como a base de uma prática defendida como instrumento e fonte de autorreflexão para os profissionais da educação infantil, além de possibilitar o entendimento das linguagens e do pensamento da criança pequena, assim como estar intimamente relacionada à concepção de criança potente, capaz, produtora de cultura, e que acolhe o universo destas crianças na construção de suas aprendizagens, provocando cada vez mais o interesse pelos profissionais que trabalham junto à infância e anseiam por uma prática reflexiva, cada vez mais democrática. Por outro lado, levantamos a questão de que nem sempre todo registro contribui para a compilação de uma documentação pedagógica de qualidade, uma vez que não se pode restringir à curadoria um amontoado de fotos, vídeos, relatos, produções sem uma real contextualização de vivências significativas de forma a acompanhar e valorizar o desenvolvimento de um trabalho pedagógico e a evolução das aprendizagens das crianças, por meio do compartilhamento dos conhecimentos e saberes, da criatividade e imaginação por meio de múltiplas linguagens, tais como: canto, dança, desenho, interpretação e pintura para garantir também, a visibilidade do trabalho pedagógico realizado.

INFÂNCIA E EDUCAÇÃO: RETROSPECTIVA

A Educação Infantil vem passando por várias transformações nos últimos tempos. Durante este processo, observamos o surgimento de novas concepção sobre criança e infância totalmente diferentes daquelas de antigamente que a criança era vista como um ser sem importância, quase invisível, um adulto em miniatura. Atualmente a criança passou a ser considerada em todas as suas especificidades, inclusive com identidade pessoal e histórica. Estas modificações se originaram das novas situações sociais e econômicas da sociedade, que terminaram por conferir à criança um papel de investimento futuro, passando a valorizá-la e cujo acompa- nhamento educacional deveria estar alinhado às exigências da sociedade. Portanto, a Educação Infantil aban- donou a abordagem de cunho assistencialista, e assumiu uma orientação pedagógica aliada ao cuidar, buscan- do ofertar um atendimento integralizado, cujas especificidades (psicológica, emocional, cognitiva, física, etc.)

fossem contempladas e respeitadas.

Dentro desta perspectiva, este trabalho busca elucidar a evolução da concepção de infância e sua repercussão em instituições de Educação Infantil. Seguindo com a apresentação da concepção de infância atualmente, destacando que a visão que se tem hoje, é algo construído historicamente, portanto podendo ser reconhecido o contraste em relação às concepções de infância no decorrer do tempo. Atualmente pode parecer um contras- senso a indiferença dirigida à criança pequena alguns séculos atrás. A humanidade nem sempre enxergou a criança como um ser em particular, e por muito tempo, ela foi tratada como um adulto em miniatura. No entanto, de um ser sem importância, quase imperceptível, a criança passou a ganhar um papel de destaque na socieda- de.

De acordo com Ariès (1978), o sentimento de infância não pode corresponder ao mesmo que ter afeição pelas crianças, satisfazendo de fato à consciência da particularidade infantil, que essencialmente, distingue a criança do adulto. Assim sendo, o sentimento de infância caracteriza a criança, a sua essência enquanto ser, o seu modo de agir e pensar, que a diferencia do adulto tem direito a um olhar diferenciado.

Na época da Idade Média não havia muita clareza quanto ao período que determinava a infância, sendo que alguns se baseavam no físico e no período entre o nascimento dos dentes até os sete anos de idade e, devido às péssimas condições sanitárias e de saúde em geral, a mortalidade infantil era bastante expressiva, por isso a criança tinha que ser vista como um ser que não deveríamos nos apegar muito, porque a qualquer momento poderia morrer, encarando-se com imensa naturalidade o fato da perda.

Nessa época, como as crianças eram consideradas como um adulto imperfeito, e tão logo pudessem desempe- nhar determinadas tarefas, eram inseridas no mundo adulto, sendo expostas a todo tipo de experiências. Ainda por volta do século XVII, houve grandes transformações sociais que contribuíram definitivamente para modificar o conceito de infância da época, sendo as reformas religiosas (católicas e protestantes), os movimen- tos que trouxeram um novo olhar sobre a criança e seu aprendizado.

De acordo com Ariès (1978), a aprendizagem das crianças, que antes era resultado apenas da convivência com os adultos em tarefas cotidianas, passou então a ser desempenhada pelas escolas, surgindo uma preocupação com a formação moral das crianças e a igreja se encarregou de direcionar o processo educativo, visando corrigir os desvios da criança, e assim, entre moralistas e educadores do século XVII, transformou-se o senti- mento de infância que inspiraria todo o processo educativo do século XX.

No século XVIII além da educação, a família passou a se interessar por questões pertinentes à higiene e à saúde das crianças, acarretando na diminuição dos índices de mortalidade. As mudanças beneficiaram as crianças da burguesia, pois as outras crianças continuaram a não ter acesso à educação e a cuidados mais específicos, ainda sendo direcionadas para o trabalho. No entanto, a criança sai do anonimato e lentamente começa a ocupar um espaço de maior destaque na sociedade, trazendo modificações profundas em relação à educação, que teve que atender às novas demandas desencadeadas pela valorização da criança.

Atualmente, a criança é vista como sujeito de direitos, situado historicamente e que necessita ter as suas necessidades físicas, cognitivas, psicológicas, emocionais e sociais supridas, caracterizando assim, um atendimento integralizado. Portanto, a nova concepção de criança como um ser particular, com características bem diferentes dos adultos, e contemporaneamente, portador de direitos enquanto cidadão, produziu as maiores mudanças na Educação Infantil, tornando o atendimento às crianças de 0 a 5 anos ainda mais específi- co, exigindo do educador uma postura cada vez mais consciente quanto à importância do trabalho a ser desenvolvido com as crianças pequenas.

Nos séculos XVIII e XIX ainda predominavam dois tipos de atendimento às crianças pequenas, sendo um considerado de boa qualidade destinado às crianças da elite, que tinha como característica a educação, e outro que servia de custódia e de disciplina para as crianças das classes menos favorecidas. Dentro deste panorama, elevou-se a discussão de como melhor educar as crianças e pensadores como Comênio, Rousseau, Pestalozzi, Decroly, Froebel e Montessori desenvolvem novas teorias educativas, reconhecendo que as crianças possuíam características diferentes dos adultos, além de necessidades próprias.

No contexto de pós-segunda Guerra mundial, emerge a preocupação com a situação social da infância e o conceito da criança como portadora de direitos. A ONU promulga em 1959, a Declaração dos Direitos da

Criança, em decorrência da Declaração dos Direitos Humanos, fator preponderante na concepção de infância na contemporaneidade. Enquanto isso, o histórico da educação infantil no Brasil, de certa forma, passa a trilhar os parâmetros mundiais, com suas características próprias, embora ainda marcada pelo assistencialismo e improviso.

No início do século XIX, surgem iniciativas isoladas, como a criação de creches, asilos e internatos, que eram vistos como instituições destinadas a cuidar de crianças pobres. E no final do século XIX, inicia-se o projeto de construção de uma nação moderna. A elite do país absorve os preceitos educacionais do Movimento das Escolas Novas, disseminados devido às transformações sociais ocorridas na Europa e trazidas ao Brasil pela influência americana e europeia. Surgem então, os “jardins-de-infância” que foram recebidos com muito entusiasmo por alguns setores da sociedade, embora também gerassem discussão, pois a elite não queria que o poder público não se responsabilizasse pelo atendimento às crianças carentes. Em meio a essa polêmica, em 1875 no Rio de Janeiro e em 1877 em São Paulo, foram criados os primeiros jardins-de-infância.

Na metade do século XX, com a crescente industrialização e urbanização do país, a mulher passa a conquistar maior espaço no mercado de trabalho, produzindo um aumento pela busca por instituições que tomassem conta de crianças pequenas.

Nos anos 70, o Brasil dá origem ao atendimento fragmentado, destinado às crianças carentes a partir das teorias desenvolvidas nos Estados Unidos e na Europa, que sustentavam que as crianças das camadas sociais mais pobres sofriam de “privação cultural” e esta concepção direcionaria por muito tempo ainda a Educação Infantil, enraizando uma visão assistencialista e compensatória.

Por volta dos anos 80, com o processo de abertura política no nosso país, houve pressão por parte das cama- das populares para a ampliação do acesso à escola e a educação da criança pequena passa a ser reivindicada

como um dever do Estado, que até então não havia se comprometido legalmente com essa função.

Nos anos 90, ocorreu uma ampliação sobre as teorias sobre a concepção de criança, que passou a ver a criança como um ser sócio-histórico, cuja aprendizagem ocorria por meio das interações com seus pares, com os adultos e com o entorno social. Esta perspectiva sócio interacionista teve como principal representante Vygot- sky, que enfatizava a criança como sujeito social, fortalecendo a nova concepção de infância. Surgiu então, o ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente); a nova LDBEN, Lei nº9394/96, que incorporou a Educação Infantil como primeiro nível da Educação Básica, e formalizou a municipalização desta etapa de ensino e em 1998, foi elaborado o RCNEI (Referencial Curricular Nacional para Educação Infantil), documento norteador do trabalho a ser realizado com crianças de 0 a 5 anos de idade, representando um avanço na busca de melhor estruturação do papel da Educação Infantil, trazendo uma proposta que visava a integração entre o cuidar e o educar. A PEDAGOGIA DA ESCUTA: UMA NOVA ABORDAGEM

Na década de 90 teve início a veiculação internacional do trabalho desenvolvido para a educação com crianças pequenas, na cidade localizada na região norte da Itália, cuja abordagem foi reconhecida pela excelência em qualidade de experiências proporcionadas às crianças, a partir da “teoria das cem linguagens”, desenvolvida por Loris Malaguzzi – jornalista, pedagogo, diretor das pré-escolas municipais da cidade, em parceria com educadores, crianças e famílias. Esta teoria também conhecida como a Pedagogia da Escuta buscou fundamen- tos nos estudos em educação e neurociências dos anos 1960 e 1970. E ao término da Segunda Guerra Mundial, quando um grupo de cidadãos sentiu a necessidade de reconstruir o contexto social, cultural e político da comunidade, materializando este desejo através da construção de uma escola para crianças pequenas – a escola “25 Aprille”, em Villa Cella, a partir de um esforço comunitário, do qual o próprio Malaguzzi participou, contando com verba obtida da venda de um tanque de guerra abandonado, alguns caminhões e cavalos deixados pelos alemães em retirada e com a doação de um terreno e do material de construção, sendo batizada de “Scuola Robinson”. Esta escola ficou universalmente conhecida pela inusitada abordagem pedagógica para a educação infantil, dando início, naquele momento, a reconstrução de ideias e redirecionamento da educação infantil italiana.

E antes, em 1950 e 1960 na Europa foi quando surgiram e se fortaleceram as teorias psicopedagógicas inovado- ras de Piaget, Vygotsky e Dewey, bem como as dos pedagogos italianos Montessori e Ciari que impulsionaram ideias e práticas que revolucionariam as discussões sobre educação. E Malaguzzi, ao entrar em contato com todos estes autores, teve a convicção de que o processo pedagógico deveria ter como centro o desenvolvimen- to intelectual, emocional, social e moral das crianças, dando início ao que hoje conhecemos como Pedagogia da Escuta ou Linha Pedagógica Malaguzziana.

A Pedagogia da Escuta consiste em um modelo educativo diferenciado que busca incentivar os professores a considerarem o que as crianças são no momento presente, e não somente pelo que poderão vir a se tornar no futuro, incorporando também a ideia de que cada criança tem infinitas formas de manifestações própria para se comunicar, construindo seu conhecimento, reformulando, atualizando, compartilhando e aprendendo com o outro. Esta abordagem pedagógica valoriza o processo educativo cultural, cujo objetivo é fazer com que as crianças compartilhem seus conhecimentos e saberes, sua criatividade e imaginação por meio de múltiplas linguagens, tais como: canto, dança, desenho, interpretação e pintura. Portanto o professor necessita lançar mão de sua sensibilidade para ouvir a criança ativamente, percebendo estas linguagens, seus códigos e os símbolos que as crianças utilizam para se expressar.

Hoyuelos (2013) defende que a imagem de criança que cada um tem é uma declaração dos princípios éticos que traduzem uma teoria de fundo, portanto essencial para que se possa estabelecer uma organização de ações e intenções pedagógicas de trabalho com as crianças, buscando construir uma coerência entre teoria e prática; descartando estágios, tabelas, níveis prefixados para aferir o nível de desenvolvimento das crianças, primando pelo respeito à diversidade, pela observação em profundidade, pela escuta ativa para a construção de projetos em conjunto e pela realização da documentação pedagógica apresentada como ferramenta essencial à melhoria da qualidade e eficiência do trabalho pedagógico (registro de acontecimentos; registro de observações;

registros fotográficos de situações do dia a dia; seleção de produções das crianças para construir uma memó- ria sobre as experiências e trajetórias conquistadas), constituindo-se assim, em instrumento de reflexão e produção; além de emergir como poderosa ferramenta de pesquisa para os professores, facilitando o conheci- mento das trajetórias de aprendizagens das crianças, possibilitando ao adulto aproximar-se de sua lógica e, por fim, evidenciando a imagem de uma criança “competente”, nas palavras de Malaguzzi. Segundo Malaguzzi (apud EDWARDS; GANDINI; FORMAN, 2002), documentar as experiências torna-se, ainda, elemento essencial ao pensar sobre a prática em um contexto de construção de uma proposta pedagógica para a criança pequena pois, observar as crianças em atividade, produzir relatos sobre o cotidiano, repensar posturas, espaços, materiais e propostas, discutindo com os pares, significa apropriar-se do fazer em sua relação com a teoria, em um processo de formação continuada.

Um outro princípio da pedagogia da Escuta reside na ampliação da oferta de oportunidades para desenvolvi- mento máximo das potencialidades das crianças, levando em consideração suas potencialidades, bem como na organização da escola e na valorização de todos os profissionais que nela trabalham, buscando torná-la um espaço de criação, de convivência entre crianças e adultos, de desenvolvimento, de cultura e especialmente de difusão das culturas infantis, encerrando os direitos das crianças garantidos pela escuta qualitativa e recíproca entre as crianças e os adultos, para que os profissionais possam proporcionar experiências variadas e eficien- tes para o desenvolvimento das crianças em suas múltiplas linguagens, privilegiando a autonomia e o protago- nismo na construção do conhecimento.

Malaguzzi quando trata de documentação pedagógica, refere-se também à importância de a escola ganhar visibilidade junto à comunidade, aproximando-se desta seja tanto pela criação de espaços para o diálogo e a valorização da criança, enquanto produtora de saberes; para realizar atividades ao ar livre, como em praças e ruas, quanto pela organização de mostras das experiências desenvolvidas no espaço da escola que terminam por tornar-se maneiras de desvelar o valor do trabalho pedagógico desenvolvido na instituição.

DOCUMENTAÇÃO PEDAGÓGICA: REFLEXÃO E PRODUÇÃO De acordo com Edwards, Gandini e Forman (2002, p. 155-156):

A documentação pode ser apresentada de muitas maneiras diferentes, incluindo painéis, materiais escritos a mão ou digitados, como livros, cartas, panfletos, e ainda caixas, tecidos, instalações e outros tipos de mate- riais. Podem ser apresentadas de todas as maneiras e combinações possíveis. Uma importante parte da documentação vem diretamente dos trabalhos bi e tridimensionais das crianças, estejam eles já acabados ou sendo elaborados. Esse tipo de documentação deve vir acompanhado pelas interpretações do professor e, quando possível, dos diálogos e pensamentos das crianças. (Edwards, Gandini e Forman 2002, p. 155-156) No século XX, Celestin Freinet, educador francês que viveu entre 1896 e 1966, e cujas propostas ainda são referência para a educação na atualidade, utilizava formas de documentar, de registrar a fim de tornar os processos de aprendizagem mais visíveis, como é o caso do “Livro da Vida”, uma de suas propostas, que consistia em um grande caderno no qual professores e estudantes registravam, com desenhos e textos, os fatos mais importantes do dia.

De acordo com Sampaio (1989, p.23, 51),

[...] Nele ficavam gravados os momentos mais vivos e as anotações podiam ser feitas por quem o quisesse, inclusive por Freinet. [...] E ele constitui um documento vivo que pode e deve ser lido por todos os que estão diretamente ligados às crianças: pais, amigos, colegas e visitas. Freinet, em 1928, em um de seus boletins assim se expressou: “Pois nossos ‘livros da vida’ e nossos jornais, onde se exprimem livremente nossos alunos, constituem, a partir de então, milhares de depoimentos sobre a vida e o desenvolvimento infantis. Somos capazes, agora, de estudar a vida das crianças em todos os meios e em todas as idades: seus pensa- mentos mais íntimos, seus sonhos, suas brincadeiras, sua concepção do mundo etc. Podemos definir de modo seguro os interesses e necessidades sobre os quais se pode apoiar a pedagogia do futuro”. (Sampaio, 1989, p.23, 51)

A prática da documentação dos processos pedagógicos pode ter diversas finalidades. Segundo Edwards; Gandini; Forman (1999), a documentação concorre para:

- Dar visibilidade, para a família e a comunidade quanto, o que e como os seus filhos estão aprendendo e se desenvolvendo;

- Permitir às crianças revisitarem as suas vivências, observando o que foi feito e ouvindo o que foi dito. Assim, serão capazes de reconstituir e reinterpretar suas vivências, tomando-as como ponto de partida para os próximos estágios das aprendizagens;

- Assegurar que tanto o grupo, quanto cada uma das crianças possa se enxergar de um ponto de vista diferente, enquanto está aprendendo, de modo que percebam que suas conquistas são significativas;

- Permitir que os professores sejam pesquisadores de suas práticas, relembrando-as, apropriando-se delas e desvelando-as, de sorte a reconstruir seus conhecimentos e práticas, enquanto acompanham a trajetória de aprendizagens de suas crianças. A documentação consiste em uma ferramenta essencial para conhecer o processo de aprendizagens. Portanto é possível identificar a relevância da documentação pedagógica nos processos de reflexão sobre a prática, na consolidação de uma proposta pedagógica, para a avaliação das aprendizagens e na comunicação e socialização dos caminhos percorridos.

Assim sendo, a documentação revela-se como um elemento indispensável à verdadeira profissionalização competente dos professores e a uma práxis pedagógica que se efetiva pelo contínuo exercício da reflexão,