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2 BASES TEÓRICAS

2.1 TEORIA CRÍTICA

2.1.6 A Educação e a Teoria Crítica

“A Educação não é necessariamente um fator de emancipação”, afirma Adorno (1995, p.9). O autor discute “como pôde um país tão culto e educado como a Alemanha de Goethe16

desembocar na barbárie nazista de Hitler?” (idem, p.15).

Para esse autor, “o centro de toda educação política deveria ser que Auschwitz não se repita. [...] Para isso teria de se transformar em sociologia17 informando sobre o jogo de forças

localizado por trás da superfície das formas políticas” (ADORNO, 1995, p. 137).

A experiência de Auschwitz, bárbara como foi, exige ser lembrada e reelaborada no que Adorno chama de “elaboração do passado”, compreendendo seus impactos no presente, para que tal terror não seja repetido. Assimilar o passado como esclarecimento é uma dimensão da hermenêutica, no papel de interpretar a história contraditória dos homens; “é libertar-se dos pesadelos do passado”; “anular o passado”; com esclarecimento e afirmação da autoconsciência do sujeito (ADORNO, 1995 p.53).

Mas, ao contrário do que geralmente se propõe, “é preciso buscar as raízes nos perseguidores e não nas vítimas, assassinadas sob os pretextos mais mesquinhos” (ADORNO, 1995, p. 121). É preciso revelar os mecanismos de tais atos, despertando uma consciência geral e, quem sabe, aos próprios assassinos. No entanto, Adorno ressalta que a volta ao passado pode ser progressista ou conservadora e que a assimilação do passado somente poderá ser efetivada quando as causas que o produziram forem eliminadas.

[...] que haja pessoas que, em posições subalternas enquanto serviçais, façam coisas que perpetuam sua própria servidão, tornando-as indignas[...], contra isso é possível empreender algo mediante a educação e o esclarecimento (ADORNO, 1995, p.138)

Os autores frankfurtianos, sem a pretensão de propor teorias pedagógicas fechadas, destacam o papel da Educação como colaboradora de uma formação cultural que permita a elaboração de uma consciência crítica sobre a realidade cultural, econômica, social e histórica, e, sobretudo, a compreensão dos mecanismos da indústria cultural. A importância da Educação e a responsabilidade da escola no processo de desbarbarização está em se colocar contra a identificação cega com o coletivo. A barbárie deseduca, deforma e está

16 Referindo-se ao intenso desenvolvimento das artes, da literatura e das ciências naturais na Alemanha, entre

eles o estadista e autor Goethe, considerado o mais importante escritor alemão, cuja obra é fonte de pesquisa e influência sobre a literatura de todo o mundo, com vasta e variada produção.

17 É ainda mais perturbadora tal afirmação no contexto atual do Brasil, em meio a um movimento reacionário

profundamente presente nas relações sociais dominantes. Afinal, é pela Educação que se desenvolve, por vias complementares, a conscientização dos mecanismos subjetivos, o processo de conscientizar-se da frieza do capitalismo e a passagem da ignorância para o conhecimento pelo esclarecimento, apesar das dificuldades que a indústria cultural impõe, pois promove semiformação.

Em sua concepção de Educação, não está, para Adorno, a “modelagem de pessoas”; “a mera transmissão de conhecimentos”, “a formação de pessoas bem ajustadas na sociedade”, mas o papel de “produção de uma consciência verdadeira” (ADORNO, 1995, p.143), de fortalecer a resistência mais do que a adaptação.

Adorno (1995) aponta alguns pontos nevrálgicos na Educação: que se dirija a uma autorreflexão crítica, ao esclarecimento geral (que produz consciência sobre os motivos que conduzem a uma barbárie)18; que seja “concentrada na primeira infância” (p.122), já que é

nessa fase que se forma o caráter; que destaque o papel da história, como processo educativo; que não premie a dor e a capacidade de suportá-la; que não reprima o medo, “permitindo-se ter tanto medo quanto a realidade exige” (p.129); que discuta a relação com a técnica, “não como um fim em si mesma, mas como meio” (p.132); que torne ciente a “frieza” na sociedade (p.135), as “participações oportunistas” (p.134) motivadas por interesses práticos individualistas e os “mecanismos subjetivos em geral” (p.136).

Pucci (1994) indica sinteticamente como contribuições da Teoria Crítica para uma teoria pedagógica diversos aspectos, entre eles: a) a consideração da reflexão crítica na busca pela autonomia, sob influência de Kant; superando os limites da semiformação. Nesse sentido, o esclarecimento carrega um potencial emancipatório na medida em que os dominados podem ser esclarecidos a respeito de sua situação enquanto classe. No saber acumulado através dos tempos, a reflexão crítica tem como consequência uma ação transformadora; b) a defesa da formação cultural no processo de emancipação como parte intrínseca da pedagogia, o que implica entender e problematizar a cultura na sociedade capitalista.

18 Não se encontrar preparada psicologicamente para autodeterminação quando em liberdade leva a pessoa a

aderir/curvar-se ao que é mais forte, a um coletivo e a uma estrutura que se coloca como autoridade e que pode ser muito destrutiva. Está aí o potencial autoritário latente numa sociedade (ADORNO, 1995).

Não há sentido para a educação, na sociedade burguesa, senão o resultante da crítica e da resistência à sociedade vigente responsável pela desumanização. A educação crítica é tendencialmente subversiva. É preciso romper com a educação enquanto mera apropriação de instrumental técnico e receituário para a eficiência, insistindo no aprendizado aberto à elaboração da história e ao contato com o outro não-idêntico, o diferenciado (MAAR, 1995, p. 27).

Os teóricos críticos destacam a importância dos intelectuais no processo de desbarbarização, pela via da autorreflexão crítica, seja dentro do ensino formal, pelos meios de comunicação e por outras vias.

Para os frankfurtianos, a Teoria Crítica é um sinal de resistência. Resistência aos irracionalismos da barbárie fascista, do autoritarismo estalinista, da semicultura capitalista, resistência individual e coletiva, resistência através da Razão, da cultura, da educação/formação, da arte (ADORNO, 1995, p.33).

Pucci (1994) retoma como contribuição da Teoria Crítica o potencial emancipatório da Educação quando Adorno enfatiza que a atividade do pensar não é inocente e sim perigosa, já que pode trazer indagações sobre a cultura tradicional e influências sobre as práticas dos educadores.

Adorno e demais autores aqui mencionados despertam para o papel fundamental da Educação como colaboradora da formação cultural, no desenvolvimento da autorreflexão crítica sobre a semiformação. A autorreflexão crítica permite indagações sobre a realidade cultural, econômica, social e histórica, sobre a generalização da alienação e a dissolução da experiência formativa e, sobretudo, sobre o poder da indústria cultural e suas influências para a manutenção do status quo em nossa sociedade. A emancipação é uma busca que pode se realizar, num processo de reconhecimento das limitações do esclarecimento (superação racional da menoridade e da tutela), de promoção da liberdade, de autonomia e da necessária transformação das condições materiais da sociedade.

São conceitos e fundamentos que se interrrelacionam e que compõem as referências problematizadoras de cada passo desta pesquisa, desde sua concepção até sua divulgação, dando elementos em potencial para uma leitura abrangente do campo da EA e da pesquisa participante desenvolvida. Fazem refletir que a EA e suas pesquisas não podem descansar em si mesmas, sem uma crítica sobre sua própria história, conceitos e práxis, se não, se tornam semiformação e teoria tradicional.

Portanto, buscou-se oferecer elementos em potencial para uma leitura abrangente do campo da EA e da problemática ambiental planetária, contribuindo para responder as questões desta investigação, por meio de i) aprofundamentos e críticas à Teoria tradicional, sendo esta conservadora e conveniente para a burguesia se manter no poder e se defender; ii) compreensão sobre a possibilidade de emancipação do ser humano de sua condição de menoridade e exploração ; iii) crítica à semiformação ‒ condição que implica na formação de uma consciência crítica para sua superação, e iv) crítica à indústria cultural, a partir de conceitos e análises dos principais autores teóricos críticos.