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1. INTRODUÇÃO TEÓRICA

1.2. Sensores e Biossensores Eletroquímicos para a Determinação de Catecolaminas

1.2.2. A Eletroquímica e as Neurociências

Um dos primeiros estudos eletroquímicos envolvendo as catecolaminas remonta a 1967, quando Ralph Adams em conjunto com a sua equipa41 da Universidade de Kansas, desvendaram os mecanismos de oxidação de alguns NTs, entre as quais a DA, a Adr e a NA, em função do pH do meio. Os autores concluíram que as catecolaminas apresentavam comportamentos eletroquímicos diferentes consoante o pH e identificaram os intermediários formados no passo eletroquímico (E) e químico (C) da oxidação destes neuroquímicos41.

Ralph Adams é também consensualmente aceite como tendo sido o primeiro a implantar um microeléctrodo de carbono no cérebro de um rato com o objetivo de medir in

vivo a concentração de NTs do tipo catecolamina e seus metabolitos no fluido

extracelular42,43. Estes estudos pioneiros foram como que a primeira lição acerca da importância da seletividade e da necessidade de identificar e confirmar a fonte química que origina as correntes de oxidação medidas, uma vez que foi rapidamente descoberto que as

* do inglês Atomic Force Microscopy;

19 catecolaminas e seus metabolitos não eram as únicas moléculas presentes no cérebro a oxidar-se no elétrodo de carbono (ver Figura 1.11). Posteriormente, nos anos 80, Adams e os seus colaboradores44 conceberam o é atualmente comummente conhecido como as “cinco regras de ouro da eletroquímica in vivo”. Estas regras constituem uma lista de critérios que devem ser tidos em conta na identificação de substâncias durante os estudos eletroquímicos in vivo.

As catecolaminas e os seus metabolitos são compostos eletroquimicamente ativos e são talvez os neuroquímicos mais estudados45. Os mecanismos de oxidação da DA e dos seus principais metabolitos, o DOPAC e o HVA, encontram-se representados na Figura 1.10. No caso das catecolaminas, o grupo catecol é oxidado a orto-quinona quer em meio fisiológico (pH 7.4) quer in vivo, num processo envolvendo dois eletrões.

O neurotransmissor serotonina (5-HT) e o seu principal metabolito (o 5-HIAA) também são eletroativos e foram alvo de vários estudos voltamétricos45, tendo como base as reações de oxidação-redução apresentadas na Figura 1.10.

Figura 1.10: Reações de oxidação-redução da DA e serotonina e dos seus principais metabolitos. Figura adaptada da referência 45.

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Outras substâncias eletroquimicamente ativas encontradas no cérebro são o ácido ascórbico (AA), o NO, o O2 e o H2O2 e podem ser facilmente detetadas com recurso a

técnicas voltamétricas. As suas reações de oxidação-redução45 encontram-se representados na Figura 1.11. Destas espécies, o anião ascorbato tem um papel muito importante pois existe no fluido extracelular do SNC em concentrações entre os 200 e os 400 µM (cerca de três ordens de grandeza superior à concentração de DA, por exemplo), sendo uma das moléculas mais abundantes no cérebro humano. O ascorbato oxida-se a um potencial muito próximo do das catecolaminas e, atualmente, um dos maiores desafios dos métodos eletroquímicos para a determinação das catecolaminas é a eliminação deste anião como interferente45 (ver Figura A1.11 do Anexo 1). No entanto, moléculas como o AA e o ácido úrico (UA) têm uma enorme importância biológica no organismo humano como antioxidantes, pelo que foram desenvolvidos sensores eletroquímicos específicos para deteção e monotorização destas moléculas46,47. Assim, muitos dos sensores eletroquímicos reportados na literatura foram desenvolvidos com o propósito de detetar as catecolaminas e o AA (e/ou UA) em simultâneo.

Figura 1.11. Reações de oxidação-redução de outras espécies eletroativas encontradas no cérebro humano. Figura adaptada da referência 45.

Desde os trabalhos pioneiros na década de 60, muitos outros trabalhos científicos foram surgindo utilizando elétrodos sólidos modificados quimicamente como dispositivos eletroquímicos para a determinação das catecolaminas, na presença de vários interferentes.

21 Alguns desses trabalhos são apresentados em maior detalhe no Anexo 1 e as estratégias usadas foram:

• elétrodos modificados com polímeros condutores, principalmente o Nafion e filmes poliméricos de ácidos orgânicos, em que a interferência do AA é inibida por repulsão eletrostática (ver Tabelas A1.1 e A1.2 do Anexo 1);

• elétrodos modificados com filmes organizados, como SAMs de ácidos mercaptocarboxílicos ou SAMs incorporando espécies com propriedades eletrocatalíticas (ver Tabela A1.3);

• elétrodos modificados com ADN (biossensores de ADN); • elétrodos modificados com líquidos iónicos (RTILs);

• elétrodos modificados com nanomateriais, como nanopartículas de metais e óxidos de metais, nanotubos de carbono e grafeno, cujas propriedades únicas aumentam a sensibilidade da determinação (ver Tabelas A1.4 e A1.5);

• elétrodos modificados por ligação covalente de aminoácidos à superfície; sensores com base em tensioativos catiónicos e aniónicos para a formação de micelas com o AA e DA, respetivamente; sensores que incorporam novos materiais que surgiram ao longo da última década, como o filme de diamante dopado com boro, por exemplo (ver Tabela A1.6).

Na Tabela 1.2 estão resumidos algumas características analíticas de metodologias eletroquímicas utilizadas para a determinação das catecolaminas na presença de vários interferentes. Muitos dos sensores fabricados foram testados em amostras reais com a determinação das catecolaminas em fluidos biológicos ou em amostras farmacológicas.

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Tabela 1.2: Resumo das características de metodologias eletroquímicas utilizadas na determinação de catecolaminas.

Catecolamina

(interferentes) Elétrodo modificado

Tec.

Eletroq. Gama de conc. (LD) / µM pH Aplicação

DA

(AA, UA) Au/polímero de DA

48

CV 1 – 600 (0,2) 7 --- DA, Adr

(AA, Glu, ácido cítrico, glicina, entre outros)

GC/politaurina49 DPV DA: 1 – 800 (0,1)

Adr: 2 – 600 (0,3) 7,4 Ampolas

DA

(AA, UA) Au/poli(1-naftol)/[Fe(CN)6] de Ni

50

DPV 0,1 – 9,6 (0,021) 7,0 Ampolas

Adr, AA, UA GC/ PBCACPM51 DPV

Adr: 0,20 –175 (0,4) AA: 1,0 – 2000 (0,03) UA: 0,020 – 2000 (0,009) 4,0 Ampolas, Urina, Plasma. DA (AA) Au/L-cisteína 52 CA 0,1 – 12 (0,02) 7,0 Ampolas NA

(AA, DA, Adr, metais) Au/2-mercaptoetanol

53

SWV 2 – 1000 (0,7) 5,5 Ampolas NA

(AA) GC/ADN dopado com Au-NPs

54 DPV 0,005 – 800 (0,005) 7,4 --- DA (AA) Au/SAM/Au-NPs 55 SWV 0,22 – 5,92 (0,22) 7,2 --- DA (AA) GC/SAM/Au-NPs 56 DPV 0,01 – 25 (0,004) 7,0 Ampolas DA

(AA, Glu, metais, glutamina, entre outros)

Pt/ filme de Au-NPs funcionalizadas

com mono-6-tio-β-CD e Fc/Nafion57 DPV 2,0 – 50 (0,009) 6,5 Ampolas

DA (AA) Elétrodo impresso de grafite/MWCNTs58 AdSV 0,050 – 1,0 (0,015) 7,4 Ampolas, Urina DA (AA) GC/polivinilpirrolidona/GR 59 CA 0,0005 – 1130 (0,0002) 6,0 Urina, soro DA, AC

(AA, ácido cítrico, ácido tartárico, entre outros)

Elétrodo de Pd-Al/K2UO2[Fe(CN)6]

60 DA: HA

AC: ASV

DA: 1 – 50 (0,41)

AC: 1 – 35 (0,45) 5 Ampolas Glu: glucose; CA: cronoamperometria; PBCACPM: poli(3,3´-bis[N,N-bis(carboximetil)aminometil]-o- cresolsulfoneftaleína); Au-NPs: nanopartículas de ouro; Fc: ferroceno; MWCNTs: nanotubos de carbono de parede múltipla; AdSV: voltametria de redissolução adsortiva; AC: aminocromo; HA: amperometria hidrodinâmica; ASV: voltametria de redissolução anódica.

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