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CAPÍTULO II – SEMILIBERDADE: O RELATO DE UMA EXPERIÊNCIA

2.2. SEMILIBERDADE: O RELATO DE UM CASO PARTICULAR

2.2.1 A equipe

Sobre a equipe socioeducativa da Casa de Semiliberdade, para o desenvolvimento do trabalho com até 12 adolescentes do sexo masculino, conforme regimento interno da unidade, a Casa contava com 20 servidores vinculados à unidade, dentre eles educadores sociais, direção, auxiliares de serviços gerais e técnicas (psicólogo e assistente social). A partir da observação e pelo contato com a equipe também na função de servidora, a pesquisadora verificou que, do total de servidores, os dois auxiliares de serviços gerais são terceirizados e outros dois educadores sociais estão sob o regime de contrato seletivo temporário, os demais são todos funcionários de carreira.

Além disso, a pesquisadora também analisou que, apesar do número de servidores no início da pesquisa ser de 20, ainda não contemplava todas as áreas que deveriam atuar na unidade, que conforme projeto do SINASE de 2006 faltaria pedagogo, advogado e auxiliar administrativo. Cabe pontuar que advogado não é previsto na proposta de gestão atual, conforme regimento interno da Casa de Semiliberdade, nem na lei do SINASE promulgada em 2012. O texto da lei do SINASE (BRASIL, 2012b) estabelece áreas de atuação, prevendo necessidade de representantes da área da saúde, da educação e da assistência social para compor uma equipe interdisciplinar, não especificando funções. Para tanto, a defesa dos adolescentes atualmente está sendo suprida pela recentemente instalada Defensoria Pública do Estado do Paraná. Consta também pela organização da SEDS uma previsão de motorista, até então uma função exercida pelo educador social, que faz esse trabalho na falta de um motorista. No caso das Casas de semiliberdade, é imprescindível a presença do motorista, pois a equipe precisa se deslocar constantemente nas atividades externas, que constituem a maioria das atividades dos servidores, haja vista não ter previsão de vale-transporte e os locais nem sempre serem acessíveis a pé.

As funções de 20 servidores estavam divididas da seguinte forma: um diretor, um assistente social, uma psicóloga, dois educadores executando funções preeminentemente

administrativas e dois auxiliares de servidos gerais, estes sete em regime de trabalho de 40 horas de segunda a sexta-feira; os demais servidores eram quatorze educadores sociais, trabalhando também em regime de plantão 12x36 (12 horas trabalhadas, 36 de descanso), ficando dois educadores em cada plantão de 12 horas, de forma a ter estes profissionais 24 horas por dia dentro da unidade. Assim, durante a semana em horário comercial a unidade possui 9 profissionais da equipe para até 12 adolescentes. Já fora dos horários comerciais são dois educadores sociais para até 12 adolescentes.

Conforme caderno de Semiliberdade (PARANÁ, 2010a) e regimento interno da unidade, as atribuições são divididas conforme as respectivas funções. Destaca-se que para todos os profissionais os documentos de referência do trabalho socioeducativo pontuam a necessidade de os servidores serem modelos positivos para os adolescentes, bem como seguirem as normas e regras da unidade e do servidor público.

À direção cabe organizar, gerenciar e acompanhar as atividades de trabalho da equipe, bem como realizar a avaliação dos adolescentes, planejá-las e acompanhá-las de forma integrada junto a sua equipe. Além disso, o diretor ficava incumbido de representar a Casa, buscando parcerias e articulando o trabalho junto à rede de formalização dos processos gerenciais.

A equipe técnica fica responsável, sem divisões específicas de tarefa expressas nos documentos, por: a) realizar encaminhamentos nas diversas áreas para o desenvolvimento do adolescente (saúde, educação, profissionalização, esporte, cultura, lazer etc.); b) realizar visitas domiciliares às famílias dos adolescentes, atendimentos individuais e/ou grupais tanto para a família quanto para o adolescente, desenvolver oficinas pedagógicas e participar de reuniões internas e externas à unidade; c) realizar estudos de caso e relatórios técnicos; e d) acompanhar o processo do adolescente junto ao judiciário e fazer as ações necessárias para o seu andamento no que compete à unidade.

À equipe de educadores sociais compete acompanhar as atividades rotineiras dos adolescentes, seja interna ou externamente, devendo participar dos procedimentos de recepção, acolhimento e PIA, de forma a garantir os direitos e deveres dos adolescentes.

Já as demais funções não estavam especificadas nos documentos, mas conforme observações realizadas os auxiliares de serviços gerais se dividiam em tarefas ligadas à manutenção da Casa, realizada pela pessoa do sexo masculino, e de serviços de limpeza, pela pessoa do sexo feminino. Já os educadores sociais vinculados às funções administrativas se

dividiam na organização e no planejamento de atividades escolares, comunicações junto ao judiciário, matrículas e inserções em cursos, aquisição de passagens e comunicação com a equipe da SEDS.

Cabe salientar que, no período da pesquisa, a Casa de Semiliberdade de Foz do Iguaçu, PR, teve redução no número de funcionários efetivamente trabalhando de 20 para 16 servidores, devido à exoneração de um educador social a pedido e ao afastamento de três meses de outros dois educadores sociais e um técnico por licença prêmio42 por tempo de serviço. Do total de 15 educadores sociais vinculados à unidade, 13 trabalhavam em regime de plantões de 12x36 horas de trabalho, com dias de folgas intercalados e substituição pelo folguista para que ficassem no mínimo dois educadores por plantão. Os outros dois educadores auxiliavam nos encaminhamentos para escola e cursos e organizações administrativas para o funcionamento da unidade. Os técnicos, a direção e os auxiliares de serviços gerais trabalhavam no regime de 40 horas de segunda a sexta-feira em horário comercial.

A proporção de servidores em relação ao número máximo de adolescentes atendidos deve-se ao fato de a unidade funcionar 24 horas em escalas de plantão e dever ter no mínimo dois educadores por plantão de 12 horas. Assim, durante a semana no horário comercial, o número de funcionários variava entre 7 e 10 servidores, devido ao intervalo para o almoço, a troca de plantão em três horários do dia e a presença de equipe técnica, direção e auxiliar de serviços gerais. O número de educadores por plantão diurno era superior a dois, pois dois atuavam em funções administrativas em horário comercial, questão que se altera conforme demandas da unidade com servidores em férias ou folgas e divisões de tarefas.

Em relação ao perfil dos profissionais, conforme informações43 levantadas na entrevista e coletadas posteriormente junto à direção, as características identificadas foram de gênero, escolaridade, faixa etária, tempo de experiência em semiliberdade ou trabalhos anteriores com adolescentes, experiência anterior na socioeducação em internação e cidade de moradia antes de trabalharem na semiliberdade.

Na questão de gênero, como pode ser observado pela figura 1, dos 20 servidores, 25% (5 profissionais) representavam o total de funcionários do gênero feminino e 75% (15 profissionais) de masculino, como sinalizado abaixo.

42 É um benefício estatutário em que o servidor por desempenho adequados em suas funções pode ficar afastado do

trabalho por um período de três meses com remuneração, a cada cinco anos.

Figura 1 – Gênero versus funções dos servidores da unidade de semiliberdade

Fonte: elaboração própria com base na observação institucional e entrevistas semiestruturadas.

Destaca-se que, no caso da função de educadores sociais, a prevalência masculina se deve ao fato de a unidade atender exclusivamente adolescentes do gênero masculino, de modo que, considerando os procedimentos de segurança como revista pessoal minuciosa, se necessita de alguém no mesmo gênero para desempenhar tal função. A presença de educadores do gênero feminino seria indicada para realizar revistas em familiares do sexo feminino que fizessem visita à unidade, o que na semiliberdade não é previsto, e possibilitar uma interação com diferentes gêneros no convívio da unidade, como dito em algumas discussões em capacitações da antiga SECJ. Já no percentual da equipe técnica, na ocasião composta por psicologia e serviço social, no cargo de dirigente e de auxiliar de serviços gerais, o gênero não é previsto. Destaca-se ainda que a questão de gênero é uma questão administrativa, não sendo indicado pela legislação nem para a função de educadores sociais.

Já na questão da escolaridade, verificou-se que os profissionais de nível superior na área de humanas representam 40% (8 servidores), os com nível superior de áreas diferentes da de

2 0 2 13 0 1 1 1 0 2 4 6 8 10 12 14 Q u an ti d ad e Técnicos Educadores Sociais Diretor Auxiliar de Serviços Gerais Funções

Gênero versus função dos servidores Semiliberdade - 1º Trimestre 2014

humanas totalizam 35% (7 servidores), 15% (3 servidores) apresentam ensino médio e 10% (2 servidores) possuem ensino fundamental, conforme figura 2.

Figura 2 – Escolaridade e áreas de formação dos servidores da unidade de semiliberdade

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ont e:

elaboração própria com base na observação institucional e entrevistas semiestruturadas.

Os dados da figura 2 sobre escolaridade, cruzados com as informações da figura 1 sobre gênero e percentual de servidores por função, permite avaliar que, apesar de não ser exigido nível superior para a maioria dos cargos, parcela significativa dos servidores o possui. Tal análise é realizada considerando que somente três profissionais deveriam ter nível superior, de psicologia, serviço social e pedagogia, e o gráfico aponta que 15 do total de 20 servidores vinculados possuem nível superior.

Esclarece-se que entre os cursos de nível superior encontram-se psicologia, serviço social, direito, história, turismo, economia, arquitetura e gestão de políticas públicas. Verifica-se que em termos de escolaridade a unidade tem profissionais com formação acima do esperado na categoria, e só faltam os profissionais da área administrativa e de pedagogia. Apesar da prevalência de profissionais com curso superior, verifica-se que a maioria dos servidores não tem uma formação na área de humanas, que seria o principal foco do trabalho socioeducativo, conforme legislação. Por outro lado, a diversidade de formações dentro de um objetivo de

8 7 3 2 0 1 2 3 4 5 6 7 8 Q ua nt id ad e Escolaridade

Escolaridade e áreas de formação dos servidores Semiliberdade - 1º Trimestre de 2014

Superior Área Humanas Superior Área Não Humanas

formação social, parece ser relevante, caso os potenciais sejam direcionados e compartilhados dentro das ações da instituição. Ou seja, traz a possibilidade de discussões diversas que podem enriquecer o trabalho.

Explica-se ainda que os 10% (2 servidores) que possuem ensino fundamental são os profissionais da área de serviços gerais e os 15% (3 servidores) que possuem nível médio são educadores sociais, ou seja, 65% dos educadores possuem curso de nível superior, sendo 35% da área de humanas. Cabe destacar que, dos cargos vinculados na época à unidade, somente o de psicólogo e o de assistente social exigiam as formações nas respectivas áreas.

Sobre a faixa etária de idade44 dos servidores, verificou-se que os membros da equipe tinham entre 25 e 64 anos e o tempo de experiência em semiliberdade variava entre 5 meses e 5 anos, conforme detalhado os gráficos das figuras 3 e 4 respectivamente. A figura 3 ainda aponta que do total de 20 servidores vinculados na época da pesquisa 15% (3 servidores) possuíam entre 25 e 29 anos, 20% (4 servidores) entre 30 e 34 anos, 25% (5 servidores) 35 a 39 anos, 5% (1 servidor) entre 40 e 44 anos, nenhum servidor de 45 a 49 anos, 30% (6 servidores) entre 50 e 59 anos e 5% (1 servidor) entre 60 e 64 anos. A análise dos dados permite avaliar que 60% dos servidores estavam entre 25 e 39 anos e 30% entre 50 e 59 anos.

Figura 3 – Faixa etária de idade dos servidores da unidade de semiliberdade

44 Faixa etária de idade com base na tabele do IBGE.

3 4 5 1 0 6 1 0 1 2 3 4 5 6 Q ua nt id ad e Faixas Etárias

Faixa etária de idade dos servidores Semiliberdade - 1º Trimestre de 2014

Entre 25 a 29 anos Entre 30 a 34 anos Entre 35 a 39 anos Entre 40 a 44 anos Entre 45 a 49 anos Entre 50 a 59 anos Entre 60 a 64 anos

Fonte: elaboração própria com base na observação institucional e entrevistas semiestruturadas.

O tempo de experiência em semiliberdade, conforme dados coletados junto à direção e aos servidores, variava, na ocasião da pesquisa, entre 5 meses e 5 anos, como pode ser verificado na figura 4 representada abaixo. A figura 4 permite avaliar que, entre os entrevistados, 45% (9 servidores) tinham menos de 1 ano e ½ de experiência e 40% (8 servidores) tinham entre 4 e 5 anos. Já os que estavam entre 2 e 3 anos e ½ de experiência totalizam 15% (3 servidores). No geral, verifica-se que 55 % (11 servidores) possuíam experiência acima de 2 anos na execução da medida de semiliberdade. Contudo, conforme o relato histórico todas as ações e intervenções foram sendo construídas coletivamente a partir de acertos e erros. Consta também que os profissionais tiveram poucas capacitações e orientações sobre como deveria ser o trabalho específico em semiliberdade.

Figura 4 – Tempo de serviço dos servidores da unidade de semiliberdade

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ont e:

elaboração própria com base na observação institucional e entrevistas semiestruturadas.

Outro destaque diz respeito à quantidade de membros da equipe que tiveram experiência anterior na execução da medida de internação, 75% (15 servidores), em contraste com 25% (5

9 3 8 0 2 4 6 8 10 Q ua nt id ad e Tempo de Serviço

Tempo de serviço dos servidores Semiliberdade - 1º Trimestre 2014

servidores) que não tiveram nenhuma experiência anterior com outra medida. Em paralelo aparecem 80% (16 servidores) com experiência anterior com adolescentes, conforme figura 5. O primeiro quesito pode estar associado às dificuldades apontadas sobre a implementação de uma proposta pedagógica e métodos de trabalhos menos enrijecidos, conforme aponta o servidor Francis e uma possível hipótese sobre os dados apresentados a seguir, sobre a experiência anterior dos servidores. Por outro lado, pode revelar uma formação anterior nos princípios socioeducativos e o fornecimento das ferramentas previstas para a sua execução, naquilo que a semiliberdade segue as orientações da medida de internação. Esclarece-se que os princípios socioeducativos similares entre internação e semiliberdade ocorrem desde as orientações legislativas, que assemelham as duas modalidades de medidas socioeducativas. Além disso, o índice de servidores com experiência em internação parece transparecer o modo de seleção adotado para a composição da equipe desta Casa de Semiliberdade, em que a direção pode escolher colegas de trabalho durante o período que atuava na internação, mantendo tal processo de escolha até hoje, como dito pela direção em um dia de campo.

Figura 5 – Experiências anteriores em internação e com adolescentes dos servidores

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ont e:

elaboração própria com base na observação institucional e entrevistas semiestruturadas. 15 16 14,4 14,6 14,8 15 15,2 15,4 15,6 15,8 16

Experiências anteriores em internação e com adolescentes Semiliberdade - 1º Trimestre 2014

Experiência anterior em Internação Experiência anterior com adolescentes

Por fim, apresenta-se o percentual de servidores que já moravam na cidade de Foz do Iguaçu antes de iniciar os trabalhos na semiliberdade, conforme figura 6. Os dados demonstram que do total de 20 servidores, somente 3 não eram residentes em Foz do Iguaçu, talvez pelo fato de a grande maioria já estar anteriormente trabalhando com a medida de internação no CENSE de Foz do Iguaçu. Tais dados são apresentados no gráfico abaixo para melhor visualização, revelando que 85% (17 servidores) já conheciam a realidade da cidade de Foz do Iguaçu, PR, por residirem antes mesmo de iniciarem o trabalho na unidade, e que apenas 15% (3 servidores) não conheciam a realidade local. Tal aspecto é relevante por poder ser um facilitador no trabalho e nos encaminhamentos dentro dos serviços da rede de atendimento, somados ao fato de 80% já ter experiência anterior no trabalho com adolescentes e 75% possuir experiência em execução de medida socioeducativa de internação.

Figura 6 – Cidade de moradia dos servidores antes do ingresso da unidade de semiliberdade

Fonte: elaboração própria com base na observação institucional e entrevistas semiestruturadas.

A apresentação de tais aspectos, sobre o perfil da equipe de trabalho na semiliberdade em estudo, evidencia a prevalência de profissionais do gênero masculino, com formação de nível superior, faixa etária entre 25 e 39 anos, maioria residente na cidade de origem da unidade e com

17 3 0 2 4 6 8 10 12 14 16 18 Q u an ti d ad e

Cidade de moradia dos servidores antes do ingresso na unidade Semiliberdade - 1º Trimestre 2014

experiência no trabalho socioeducativo e com adolescente. Destaca-se que a apresentação do perfil dos profissionais da unidade em sua totalidade foi uma estratégia para preservar o sigilo das identidades dos servidores entrevistados, que totalizaram 13 servidores do total de 20, representando um percentual de 65%.