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A escalada da violência nos países amazônicos, as fumigações e

4. A CONFIGURAÇÃO DO NARCOTRÁFICO NA REGIÃO AMAZÔNICA:

5.9 A escalada da violência nos países amazônicos, as fumigações e

Desde os anos 1970 os países americanos observam realidade controversa onde a decisão de se proibir e reprimir a produção, tráfico e consumo de grande número de psicoativos coexiste com a disposição de milhões de pessoas em transgredir sistematicamente essa proibição. Esse cenário está de certa forma na origem de várias mazelas nos países amazônicos: da escalada da violência rural e urbana, das conseqüências negativas para a ecologia e a economia advindas das fumigações na floresta amazônica e do grande número de refugiados colombianos.

A escalada de violência nos meios rural e urbano dos países amazônicos é efeito, em parte, das ações de grupos criminosos e dos métodos estatais de contenção desses

grupos. Nesse sentido, um dos fatores centrais são as práticas violentas das redes narcotraficantes – seqüestros, roubos, intimidações e guerras por poder e controle de área.

Os métodos de repressão às redes narcotraficantes nos centros urbanos e nos campos impulsionam espiral de conflitos e retaliações entre as partes. Por isso, argumenta-se que os esforços estatais para combater o narcotráfico além de não dissolver as redes criminosas têm intensificado a violência nos países amazônicos nas últimas décadas250. A realidade violenta dos países amazônicos torna possível uma comparação com a época da Lei Seca nos Estados Unidos. No período o tráfico de álcool financiava grupos criminosos que se imbricavam em outras atividades ilícitas, e cooperaram para um período de violência exacerbada em alguns centros urbanos estadunidenses251.

Outra prática a acarretar sérias conseqüências ecológicas e econômicas na Região Amazônica são as fumigações às plantações ilícitas realizadas pelos agentes estatais. As fumigações, ou aspersões aéreas com herbicidas, para a erradicação de cultivos ilícitos iniciaram-se na Colômbia em meados dos anos 1970. Desde 1986 utiliza-se oficialmente o agente Glifosato para tais fins nesse país252. Ao fim da década de 1990 Washington pressionou Bogotá a desenvolver ações com venenos mais poderosos tendo em vista os resultados inexpressivos alcançados com o Glifosato253.

Em INESC254 analisa-se o alerta de especialistas e ambientalistas para os riscos ambientais e sócio-econômicos das fumigações com o agente Glifosato:

“Segundo a American Cancer Society, a exposição ao glifosato pode causar um tipo de câncer conhecido como Non-Hodgkin’s Lymphoma. A Agência de Proteção ao Meio Ambiente dos EUA adverte também que produtos à base de glifosato podem causar vômito, pneumonia e danos aos pulmões, olhos e pele. O aumento do número de pessoas com problemas de intoxicação e respiração nos hospitais das regiões fumigadas parece confirmar os efeitos nocivos do herbicida. As fumigações aéreas estão igualmente colocando em perigo o frágil ecossistema da Região Amazônica [...] Segundo o ecologista Ricardo Vargas, a situação é muito alarmante já que

250

ANZOLA, 2000; TOKATLIAN, 2002; INESC, 2002; MEZA, R. “Cultivos ilícitos, conflito e processo de paz na Colômbia”. Política Externa. Vol. 9, n° 4, 2001.

251

Cf. 3.4, pp. 53-4.

252

MEZA, 2001, p. 74.

253

Em Meza (2001, pp. 75-6) encontram-se dados sobre a área fumigada na Colômbia na década de 1990, os gastos usados para isso e a previsão de hectares erradicados. Os números que o autor apresenta sobre o resultado da estratégia de fumigação e derrubada forçada de cultivos ilícitos são retrato claro de seu fracasso na década de 1990: a área inicial da coca mais que triplicou entre 1994 e 1999 (ver Tabela 6, p. 104), “o que quer dizer que cerca de US$ 41,5 milhões de dólares que foram gastos somente com a operação [de fumigação da coca entre 1994 e 1998] e grande parte dos US$ 625 milhões de ajuda militar [orçamento do governo da Colômbia às forças de segurança; dados do Departamento de Estado e Defesa colombiano] por quase uma década perderam-se totalmente, se calcularmos seu uso em face de um dos objetivos propostos como era a redução das áreas”.

254

plantas, pássaros, mamíferos e a vida aquática de uma região com incrível biodiversidade estão sendo eliminados sem possibilidade de recuperação.

“[...] A erradicação das plantações de coca e papoula através de fumigação aérea, além de afetar o ecossistema, traz conseqüências negativas para as comunidades indígenas e camponesas. Como o glifosato não é um herbicida seletivo — destrói tanto as folhas de coca como outros tipos de plantas — as comunidades rurais de camponeses e indígenas são forçadas a mudarem-se para novas áreas. [...] Sem poder plantar nas terras fumigadas, os camponeses tendem a vendê-las a fazendeiros ou criadores de gado — los gamonales — aumentando dessa forma a concentração oligárquica de terra no sul da Colômbia”.

Além dos perigos que as fumigações representam à floresta amazônica e suas populações há indícios de que a prática resulte no deslocamento das plantações ilícitas para novas regiões. Muitas vezes para áreas mais elevadas da floresta aumentando os impactos negativos. Segundo Meza255:

“As aspersões aéreas de herbicidas [...] conseguiram apenas na melhor das hipóteses, obstaculizar temporariamente a produção ilegal. [...] Essas ações não conseguiram, de maneira nenhuma, incidir sobre a demanda de matéria-prima para produzir psicotrópicos. A política de erradicação forçada não tem efeito nem sobre os preços no final da cadeia, nem sobre a disponibilidade das drogas nos países consumidores”.

O fenômeno dos desplazados (pessoas que se deslocam forçadamente para outros países ou regiões) é outra chaga social presente na Colômbia e países vizinhos. Nos últimos anos número expressivo de camponeses colombianos têm sido obrigados a abandonar seus lares originais para escapar da espiral de violência nos campos ou da contaminação do solo e dos rios decorrentes das fumigações.

Em fevereiro de 2006, o ACNUR (Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados) estimava em meio milhão o número de colombianos refugiados para países vizinhos. Desses apenas 50.000 foram registrados pelas autoridades. Os principais países receptores são o Equador, a Venezuela e o Panamá. Ainda segundo o ACNUR, o governo da Colômbia avaliava que entre 2 e 3 milhões de colombianos haviam sido obrigados a fugir de suas casas para abrigar-se em outras regiões do país256.

255

MEZA, 2001, p. 74.

256

Para mais informações acessar a página da Internet do ACNUR: http://www.unhcr.org/country/col.html, último acesso em: 20/02/2006.